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Thomas Mann, Evolução. Da «existência artística» ao humorismo - Coimbra, 1960, pp. 1 a 3

Prefácio

Intentamos dar na parte I um resumo das principais obras de THOMAS MANN, agrupando-as em períodos evolutivos; a II é uma interpretação dessa evolução; na parte III, apresentamos duas traduções, uma de um conto do primeiro período e outra de um escrito do último período, procurando assim abranger, com modestos exemplos, toda a obra, nos seus dois aspectos fundamentais: o novelístico e o ensaístico.

É difícil resistir à tentação de identificar passos da vida de MANN com a sua obra, e isto por duas razões: 1.º – pela força com que se impõe a presença da sua pessoa (THOMAS MANN morreu ainda em 1955); 2.º – por o Autor não ser parco em auto-interpretações. THOMAS MANN repetiu algumas vezes por outras palavras o que resumiu, já em 1911, em versos do "Gesange vom Kindchen": – "War nicht Leben und Werk mir immer eines gewesen? (...) Aber Leben und Werk, – ich wussts niemals zu scheiden" [Aufbau Verlag, (Berlin, 1956), p. 638]. Isto é: como GOETHE, também MANN considerou as próprias obras como "fragmentos / 2 / de uma grande confissão"...

Quase sempre aceitámos a sua interpretação das próprias obras; mas é evidente que um autor não pode ser o seu melhor crítico e, considerar uma obra como espelho de uma personalidade é coisa atraente sobretudo para os principiantes da crítica literária, – como nós –, sempre mais inclinados a explorar questões extra-literárias... Trata-se de um problema dificílimo de resolver. E, neste caso, como dissemos, sobretudo porque MANN está ainda "demasiado vivo" e a sua pessoa muito dada a questões de ordem não literária. O tempo precisa de passar e velar por completo o homem, deixando apenas a descoberto a obra do artista.

Mas, seja como for, o certo é que nunca se poderá isolar MANN – o homem e o artista – da atmosfera de decadência da burguesia, da "dualidade de existência" (em que ele vive a juventude), do movimento de ideias que se renovam e bruxuleiam ainda incertas. 

No ano de 1875 (cinco lustros antes do despontar do novo século) nascem R. M. RILKE e THOMAS MANN; H. von HOFMANNSTHAL nasce um ano antes e H. HESSE, em 1877. É a viragem para uma nova época, de onde partem directrizes, por vezes divergentes, para o futuro. Não se pode, evidentemente, separar MANN deste complexo histórico-filosófico-social. E só devagar ele se vai adaptando à realidade nascente, / 3 / apressada pelas duas catástrofes mundiais, mas aceite sempre com uma certa nostalgia pela "guten alten Zeit"...

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Nota – AS CITAÇÕES EM ALEMÃO APRESENTAM OS CASOS EXIGIDOS PELO CONTEXTO PORTUGUÊS. TAMBÉM OS GÉNEROS SÃO OS DAS PALAVRAS ALEMÃS.

 

 

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