Rugia o tambor. O cais vibrava com o
compasso do bater das botas. O desfile prosseguia e a chuva manchava o
verde, molhando aqueles rostos de ares cansados e tristes.
Muitos pensamentos ocorriam à mente dos que
iam partir. Olhavam, levantando a cabeça, para aquele enorme monstro
flutuante (Vera Cruz); um monstro, que não trará de regresso todos
aqueles que agora partem.
Vera Cruz – aquele enorme monstro flutuante
Esta é a luta onde estou por dentro. Uma guerra subversiva, de tiros, de
guerrilhas, de fantasmas, onde se luta contra tudo e contra nada, onde
se procura o inimigo-camaleão.
A vossa, no continente, é diferente, pacífica
e com um sentido válido. Atinge-se com o objetivo-amor, que aqui não se
consegue.
Chegou a hora. Todos subiram a bordo e procuraram o melhor lugar no
varandim, para dizer adeus. Durante dois anos não voltariam a ver
aquelas pessoas – pais, irmãos, mulheres e filhos, que do outro lado da
corda, choravam ao deixar os seus.
Um apito. O motor roncava cada vez mais. O barco começava agora a
afastar-se lentamente. Em cada mão, cá e lá, um lenço que oscilava ao
vento, até que entramos num mundo enorme e denso de água, deixando
aquela massa de gente a ondular-se e a desaparecer cada vez mais e mais.
Vamos para aos camarotes cabisbaixos,
relembrando os melhores momentos passados na terra que íamos deixar.
Depois só mar, céu e, durante a noite,
estrelas.
O nosso grupo de Especialistas – Mecânicos,
Condutores, Enfermeiros, Transmissões e Vagomestre.
Ali permanecemos fechados durante os nove dias de viagem.
O vício do jogo, o álcool e o tabaco eram o passatempo normal. Alguns
grupos falavam do passado. E como será o futuro? Era um pensamento que
nos bailava sempre no cérebro.
Eu tinha levado umas chouriças, que com o nosso primeiro Sargento
(responsável pela companhia) e o Tenente Magalhães (da CCS) fomos
comendo, acompanhadas por algumas cervejas e alegres conversas, passando assim algum tempo entre as refeições a bordo.
As sensações de mal-estar acompanharam até
ao fim da fatídica viagem a maior parte dos homens. Já era grande o
desejo de pisar terra firme, caminhar sem fazer alguns exercícios de
equilíbrio e dormir sem ser abanado como um bebé.
Os oficiais, sargentos e cabos foram
instalados em camarotes com bastante conforto, mas a maior parte dos
soldados foram armazenados em camaratas montadas no porão do navio.
As condições eram péssimas e o cheiro a
vomitado pelo enjoo era constante.
Terra! Terra! Gritavam os primeiros que
viram a costa esbatida de África.
A costa esbatida de África
E aqui estamos nós, moléculas verdes, ou verde negros; longe das nossas
terras, com um sentimento de saudade, sempre aumentado diariamente.
Quase não acredito!...
Chegada ao Cais de Luanda |