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Académica de Timor (juniores).
Em Díli "és capital" fui um senhor Alferes "mimado" por
todos. Estava na messe dos oficiais, junto à praia e ao porto, onde se
comia muito bem e no bar bebia-se o melhor café do mundo, 1/3 do lote
arábica e 2/3 do lote robusto de Timor. Foi um privilégio. Recordo-me
que em dias de festa, à meia-noite, íamo-nos refrescar no "mar salgado
quanto do teu sal são lágrimas de Portugal (...)" (Fernando Pessoa).
Para se recordar é necessário viver e, por isso, vivíamos esses momentos
únicos, porque tudo o que é vivido ao máximo é recordado para a vida.
Assim, com uma
/ 162 / garrafa de espumante na mão, brindávamos no mar
nosso português e saiu num ápice EFFE-R-A intenso e saudoso da minha
terra natal, Coimbra, Capital das Ciências e das Civilizações
Ocidentais. A torre da Universidade estava presente no desporto –
futebol em Timor com o emblema da marca da sua Académica de Timor.
No dia de "São Correio", por ser único e especial, ia com
os meus amigos ao Ácem (cantina de um chinês, em Díli) comer camarões do
rio e beber a bela cerveja "Laurentina". Calculem que ainda me lembro,
que para desenjoar, alternava com rolas fritas. Uma vez, o senhor chinês
referiu que não tinha marisco e eu, Alferes Rocha, fui obrigado a fazer
uma busca forçada a todos os frigoríficos do dito senhor. Consegui que o
melhor marisco escondido aparecesse na mesa dos senhores Oficiais
Alferes. Garanto-vos que nunca mais faltou. Fui humano... Não gostávamos
de passar por lorpas. Éramos arrogantes.
Via em Díli alguns jipes militares em mãos de civis.
Indignei-me e constatei que eram oriundos do equipamento militar que
tinham dado "baixa" com autos de ruína prematura militar, com o
fundamento de abate, originado pela formiga branca. Também aconteceu. Há
quem seja assim...
Adorei dar educação cívica de minha "lavra" dum alferes
miliciano ocidental. Aprendi que o Ocidente era diferente do Oriente.
Tinham o direito de ser diferentes e deviam ser respeitados. Ouviu-os e
reflecti.
Para mim andavam os seus antepassados sempre em guerra,
uns contra os outros, pessoas diferentes, bravas até, falavam muitos
dialectos e havia muitos reinos, nunca conseguindo territorialmente um
império como o conjunto de muitos liurais de reinos. Os missionários
conseguiram unir em Cristo e prepararam para uma vida melhor e mais
aberta. Criaram ao longo dos tempos, escolas, oficinas e capelas com
catequistas, pregando Cristo Redentor. O seu ADN diferenciador é serem
católicos apostólicos romanos muito diferentes dos seus vizinhos
indonésios, que são o maior
/
163 / país islâmico do mundo. Esses meus
oficiais de segunda linha falavam bem Tétum e Português e estavam
imbuídos dum espírito cultural missionário católico.
Valeu a pena e senti-me útil e irmão. Respeitei sempre a
sua cultura e procurei ser universal humanista cristão. Aprendi aí um
pouco de Tétum que me iria ser útil mais tarde em Díli.
Tive direito a um mainato, isto é, um serviçal
indígena, que falava Português e se chamava Francisco, duma lealdade
amiga ímpar, que me arranjou um cavalo timorense (kuda) para o Senhor
alferes Rocha conhecer a terra.
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O autor num cavalo timorense.
«O cavalo timorense de proveniência árabe, pequeno e
nervoso, duma resistência inesgotável, quando bem tratado, constitui
para o indígena e para o europeu uma aquisição indispensável, como
animal de condução. Os indígenas empregam-no também no transporte de
seus artigos a vender no
/ 164 / bazar, aparelhado com uma sela
feita de corda que lhe faz ganhar chagas crónicas, tratadas depois com
tabaco e cal. É impressionante o timorense colado a um cavalo bravio,
apanhado na manada, segurar-se destribado, em correrias desenfreadas na
pista ou na caça do veado. Não se sabe, então, a que ascendência terá
ido buscar o timorense aquela destreza de equitação demoníaca. Não
existia gado muar nem asinino em Timor e talvez não fosse desacertado de
todo procurar introduzir-se até essa espécie de animais de carga,
procurando dar-se ao cavalo timorense serviços mais nobres, compatíveis
com as suas qualidades.» (Artur Basílio de Sá).
Falava-se na altura que a província de Timor tinha também
muito petróleo e que Portugal não o queria explorar porque havia de ser
reserva para o futuro. «No longínquo ano de 1658. Isto quer dizer que
um século antes dos estabelecimento da capital o fundeadouro de Deli ou
Dilly já era frequentado pelas embarcações dos portuguesses
possivelmente já no séc. XV, embarcações de lava, da China, e de Macáçar,
Molucas tinham aportado em Dille, Hera, Manatuto e Laga por causa da
venda de madeira de sândalo, Dylly ou Dilly fazia parte do Reino de
Mutael ou Motael. Em 1702 o rei dessa localidade foi a Lifau prestar
vassalagem ao governador António Coelho Guerreiro. No lado oposto, a
leste, situava-se o Reino de Bidau, ligado ao Reino de Hera. Entre estes
dois reinos estendia-se a praia defendida pela restinga de corais, a que
tomava a baía segura e tranquila.» (D. Carlos Filipe Ximenes Belo).
«Os seus limites estavam ainda por definir. Reinos
havia que jogavam com o facto da dupla soberania, segundo os seus
interesses, acolhendo-se, umas vezes à sombra da bandeira portuguesa,
outras quando não cumpriam e receavam o castigo, içavam o pavilhão dos
holandeses. A estes mais do que a nós, convinha remediar esta situação.
A guerra com os ingleses havia-lhes afectado o seu prestígio. Vários
reinos, que os holandeses consideravam sob a sua jurisdição, vinham a
Dili prestar vassalagem. Por sua
/
165 /
conveniência, as autoridades de lava tomaram a iniciativa de
estabelecer, definitivamente, os limites de ambas as soberanias.
Em 1848 chegou a Dili o comissário Steyn Parvé, enviado
pelo governador geral das ilhas Neerlandesas, com instruções para
resolver o caso dos limites. Governava então em Timor, José de Silva
Vieira, que não tendo instruções de Lisboa, acordou apenas em se ocupar
do assunto, com o fim único de preparar os trabalhos prévios a uma
rectificação definitiva e nomeou uma comissão. Reclamava o comissário
holandês direitos sobre muitos reinos que obedeciam a Portugal, a
comissão portuguesa, contestava inteiramente esses direitos, o resultado
final destas negociações foi considerar portugueses, todos os reinos que
arvoraram a bandeira portuguesa, e holandeses os que atestavam o
pavilhão holandês. Em 1850 o ministro dos Negócios Estrangeiros dos
Países Baixos voltava ao assunto insistindo para que fosse arrumada a
questão dos limites. A 9 de Novembro de 1850 partiu de Lisboa o
conselheiro Lopes de Lima, como governador e comissário régio, com
poderes para nomear uma comissão na ilha, que negociasse com os
representantes holandeses a demarcação dos limites entre os territórios
de ambas as nações. O acordo a que chegassem seria definitivamente
resolvido pelos dois governos, ficando ad referendum para o governo de
sua Majestade Fidelíssima qualquer estipulação em que as duas comissões
convenham (art. 4° das instruções). Estas nos encontros vários que
realizaram compuseram um acordo em que Portugal cedia à Holanda a ilha
de Flores e desistia de quaisquer intenções sobre o arquipélago de Solor
e outras ilhas mais pequenas. Em compensação Holanda entregaria ao
governo de Timor a quantia de 200.000 florins, em prestações de 80.000,
devendo aquelas ilhas passar para o domínio holandês, logo que Timor
recebe-se a primeira prestação. Nesta ilha as coisas ficaram mais ou
menos como estavam, indicando-se os respectivos reinos limítrofes.
Lopes de Lima aceitou a primeira prestação, e entregou
aos holandeses,
/ 166 / a ilha de Flores e outros territórios.
O padre Gregório foi incumbido de assistir ao arrear da nossa bandeira
para evitar uma revolta, pois os larantuqueiros recusavam-se a passar
para o domínio holandês. O governo de Lisboa, logo que soube do que se
passava procurou reparar o mal, dando ordem de prisão a Lopes de Lima,
que morreu a caminho da Metrópole, e propondo novos entendimentos a que
o holandeses se esquivaram pois o acordo celebrado, pelas comissões em
Timor, tinha entrado em execução e a ilha de Flores estava já em sua
posse.
Deste modo o governo da Metrópole teve que rectificar o
desastre de Lopes de Lima pelo tratado de 20 de Abril de 1860.
Lopes de Lima ignorava por completo o valor da ilha de
Flores e, por isso, não teve escrúpulos em vendê-la por 200.000 florins;
depois, as dificuldades financeiras, que não permitiam satisfazer as
despesas mais urgentes levaram-no a cair no dolo holandês de aceitar a
primeira prestação.
A delimitação dos nossos domínios estava feita com imensa
desvantagem e infelicidade para nós, o que importava, agora, era
valorizar o pouco que nos ficara do quanto fora nosso naquelas paragens,
onde somos ainda hoje, respeitados e queridos.»
(Artur Basílio de Sá).
«Os nossos domínios estavam definidos. Impunham-se,
pois, a sua ocupação, em todos os sectores. Tínhamos passado mais três
séculos em pelejas constantes, a fim de evitar que a nossa presença na
ilha se extinguisse. Depois acautelar nossos direitos de ambições que
faziam concorrência à nossa expansão naquela terra conseguimos enfim
salvaguardar a nossa soberania. Era necessário, agora exercê-la em todas
as parcelas do território que nos pertenciam, pois até aqui, primeiro
Lifau, depois Díli, era os redutos onde, praticamente, nos vinha sendo
permitido mandar.»" (Artur Basílio de Sá).
«No prosseguimento das conversações, o residente de
Kupang, barão Von Lynden, deslocou-se a Díli durante o mês de Julho,
conferenciou
/ 167 / com Lopes de Lima, que era assessorado pelo
régulo leal de Motael, um homem que era considerado como tendo vasto
conhecimento das alianças das redes locais em Timor e nas ilhas.
Pélisser, que estudou as fontes holandesas sobre este assunto, sugere
que Lopes de Lima não estava apenas manietado, era também um homem
condenado. Díli estava na Banca Rôta e certas práticas de comércio
ilegal eram correntes. Certamente conforme Boxer observa, Lopes de Lima
apenas tinha poderes para negociar ad referendum e consequentemente, não
podia actuar sem referir o assunto a Lisboa.» (Geoffrey C. Gunn).
«A perda dos territórios em
Solor e Flores.
Até meados do séc. XIX, os holandeses tinham praticamente
ocupa
do grande parte da Província de Servião (Sonbai) toda a
ilha das Flores, excepto Larantuca, as ilhas de Adonara, Lomblem, Pantar,
Alor, excepto Solor, e tinham içado a bandeira neerlandesa nesses
territórios. O último reduto português a ser usurpado foi Atapupo, em
1818. Nessa província de Servião, Portugal conservava apenas os enclaves
de Ouécusse, Ambeno e Noemuti. A Holanda sentia-se cada vez mais forte e
iria exigir também a parte oriental da ilha de Timor, apresentando as
antigas pretensões de que Timor era uma suserania do reino de Temate
(Molucas). Portugal, uma potência distante, assoberbada com outros
problemas nos territórios de África, não tinha capacidade para
administrar a longínqua colónia de Timor. Contínuos esforços de anexar e
desanexar as ilhas de Timor e Solor ao Estado da Índia ou à província de
Macau não favoreciam o desenvolvimento do território, sempre em estado
de precariedade, por falta de orçamentos financeiros, e mais pelos actos
de sublevações dos reinos no interior do território a fim de terminar
com a incerteza dos limites entre as duas possessões...»
(D. Carlos Filipe Ximenes Belo).
Transcrevi textos anteriores de Artur de Sá, D. Ximenes
Belo e de Geoffrey C. Gunn que nos relatam factos históricos de Timor,
Flores e
/ 168 / Solor, em que se evidencia que nas ilhas de Flores
existe uma comunidade extraordinária de cristãos-lusos em Larantuca que
foi vendida por 200.000 florins aos holandeses, protestantes europeus. É
com muita admiração que constato que essencialmente o povo de Larantuca
não aceitou a venda do seu território sito na ilha de Flores, dado que
no contracto nem se quer tinha sido consignado a garantia de liberdade
de culto católico, o humanismo cristão a revelar-se, apesar de ter sido
vendida aos holandeses sem terem sido mandatados pela Coroa Portuguesa e
serem considerados adversários de Portugal. "Je suis Larantuca".
Não resisto a mencionar um texto de José António
Cerejo: «No meio dos mares indonésios, entre Timor e Java,
algumas centenas ou milhares de católicos rezam em português, numa ilha
chamada Flores e celebrava em Abril os últimos 400 anos da Semana Santa
local. São o testemunho vivo de uma tradição que teima em manter-se, com
confraria e imagens sacras portuguesas, mesmo se os fiéis já não
conhecem senão o vago sentido das suas preces – 40 anos depois de o
último missionário e soldado do reino ter deixado a ilha vendida aos
holandeses em 1859, por 200.000 mil florins e um pequeno enclave em
Timor Leste, esta antiga possessão de Lisboa ainda tem 80% de católicos,
em perto de um milhão de habitantes, mas a vila de Larantuca é
praticamente o último reduto de Semana Santa dos portugueses.»(1)
No mesmo artigo é referido que ainda é ocupado o cargo de
procurador da confraria Rainha do Rosário de Larantuca que identifica a
sua sede – uma Irmandade Católica reconhecida pelo Papa Gregório XVI,
desde o ano de 1662. O presidente da irmandade era o rei de Larantuca
que deixou de o ser, face ao reino não ter rei. As mulheres católicas ao
sábado na "Kapele
/ 169 / Marie", o tempo privativo de "confraria às
Ma-Ma Meji" (mães cantoras da terra), todas as manhãs recitavam os
cânticos e rezas que herdaram dos seus antepassados. Mais constatei que
no lugar de honra na procissão vão as imagens da Mater Dolorosa e de
Maria Aleluia (ou Rainha do Rosário) com o menino e em solenes
procissões provenientes de ermidas dos arredores.
O que sabem dos portugueses não vem na História mas o que
a Holanda e Jacarta fizeram nas Flores conhecem. Ocultam de quem veio o
nome das Flores. O que destas coisas as pessoas entendem aprenderam-nas
na vida, na Fé que não explicam, nas raízes que prendem sem se saber até
onde vão. O que eles conhecem dos portugueses, uma vaga gente que por aí
andou, resume-se com duas palavras - "Semana Santa", que desde há 400
anos nomeiam a maior das festividades religiosas deste território.
«Até ao inicio do séc. XVII eram Solor e Timor e não
Timor, que constituíam o foco das actividades comerciais portuguesas e
holandesas no arquipélago Oriental, Timor – incluindo as partes de Lifau,
Kupang, Bahão na baía de Kupang e Díli – era visitado periodicamente
pelos portugueses durante o período de predominância de Solor, mas não
havia um estabelecimento permanente português e nenhuma população da
ilha se encontrava sob a autoridade portuguesa. Ainda está por estudar
como e porque razão a ilha de Timor, chamada de St.ª Cruz pelas
primeiras missões veio a surgir nos fins do séc. XVII, na ribalta das
rivalidades coloniais no arquipélago. Também ainda está por
determinar-se tal como sucedeu em Solor, Portugal também se viu obrigado
a uma acomodação e a enquadrar os circuitos comerciais chineses que
tomaram comercialmente viável aquele empreendimento.» (Geoffrey
C. Gunn).
Devo referir que Timor nunca foi esquecido pela coroa e
pelos portugueses. Foi muito relevante. Vejamos: «Mas a indignação na
Metrópole pela perda de territórios exigia uma consolação. Em 1858 foi
nomeado um novo plenipotenciário português que propôs à Holanda a
cedência
/ 170 / a Portugal de toda a ilha de Timor em troca das
cedências já feitas nas Flores e das ilhas e ainda de um indeterminado
território português em África. Embora, em princípio os holandeses não
fossem avessos à troca de territórios, quando tal lhes convinha, a ideia
de uma grande Timor Lusófona não foi aceite.» (Geoffrey C. Gunn).
«Lifau como maior base local de
poderio português em Timor, a presença portuguesa era cada vez mais
vista como um poder delegado num grupo euro-asiático, católico e crioulo
de Língua Portuguesa. Tal como Dampier observou, os indivíduos deste
grupo resultavam de uma mistura de ligações de nativos com portugueses,
chineses, holandeses e eram chamados Schwartz Portuguese (portugueses
pretos), Topasses ou Larantuqueiros (...).
Indubitavelmente o Dampier, que dá o retracto mais
colorido dos topasses (europeus) de Lifau, embora não utilize este
termo. Na verdade, teve dificuldade em distinguir quem em Lifau era
português ou era nativo especialmente porque a língua de todos era
Português e a religião romana. Num eloquente comentário sobre as
relações do poder, surge que "eles parecem reconhecer nominalmente, o
Rei de Portugal como soberano, no entanto não aceitam qualquer
autoridade por este enviada."
(Geoffrey C. Gunn).
«Não é claro que as autoridades portuguesas alguma vez
hajam encarado a completa substituição do Tétum e de outros dialectos na
instrução primária, mas reconheceu-se que era impossível ensinar as
crianças num babel de línguas diferentes. Também não é muito claro que o
propósito oficial mas ao abrigo da nova legislação as escolas de Timor
deveriam atingir um equilíbrio com as da Metrópole, o que sugeria um
maior papel reservado ao Português, a par do Tétum (...)
Na realidade e como escreveu nos anos 30 o compilador de
um dicionário Tétum-Português, mesmo após quatro séculos era
inconcebível que
/ 171 / os timorenses não falassem Português. A estrutura "tribal" de
Timor, o extremo isolamento de várias comunidades e a história de guerra
intestinas, tudo contribuía para o evitar a generalização do Português.
Pelo contrário, eram os Portugueses e as autoridades militares, civis e
eclesiásticas, bem como os proprietários de plantações, que tinham de
aprender Tétum ou pelo menos a versão latinizada de Tétum chamada Díli
Tétum ou praça Tétum. A publicação de vários dicionários, catecismos e
outras obras em Tétum ou sobre Tétum aceleram efectivamente o processo
que levou à expansão e ao domínio desta língua sobre as outras línguas e
dialectos." (Geoffrey C. Gunn).
É importante também saber-se o seguinte:
«Em Kupang (Cupão) deu-se por
força da presença dos religiosos do minicanos à conversão ao catolicismo
dos reis (liurais) de Cupão, Mera e de Lifau.
Tanto os religiosos dominicanos como os reinos
convertidos de Timor e ilhas circunvizinhas tiveram de enfrentar muitos
ataques de inimigos da fé e da soberania portuguesa. Aproveitando-se da
queda de Malaca em 1641, os seis muçulmanos de Java e das Celebes
tentaram apoderar-se dos reinos convertidos convidando-os a obedecer ao
Islamismo. Nesse domínio o soberano de Macaçar foi aquele que quis
estender o seu domínio para sul das Celebes. Os seus habitantes, os
chamados macaçares e bugis, já convertidos ao Islamismo promoveram a
islamização pela força dos reinos e pagãos e aprisionamento de nativos
para vender aos holandeses. Atacaram a ilha de Sumbava em 1617, Lombok
em 1624, Buton em 1624, Solor e Flores em 1641. Derrotado pelos frades e
pelos portugueses e Larantuca, o sultão Muzhafar de Talo dirigiu a sua
armada para ilha de Timor, atacando em Julho de 1641 alguns reinos da
costa e reembarcando a sua frota, carregado de espojos, ao fim de três
meses de chacina e devastação.
/ 172 /
Foi, neste contexto, que as rainhas de Mera e de Lifau
celebraram um pacto com o Padre Frei António de S. Jacinto, prometendo
dar a EI-Rei de Portugal as minas de ouro que estavam nos seus reinos,
ao que EI-Rei os tome debaixo da sua protecção e amparo para as defender
dos seus inimigos, que não são mais que os macaçares ficando-lhes só
sândalo para vender livremente, por ser o com que se hão-de sustentar.»
(D. Carlos Filipe Ximenes Belo).
«No ano de 1661 a Regência de Portugal estabelece um
acordo com a Companhia da Índias Orientais fixando bases seguras de
ocupação das ilhas de Flores, Solor e Timor. A coroa de Portugal
reconheceu aos holandeses posse de Cupão (Kupang ou Coepangue) e os
territórios ocidentais já ocupados. A companhia reconheceu a Portugal a
soberania sobre a aldeia de Larantuca na ilha das flores e
implicitamente as possessões já ocupadas na ilha de Timor. A partir do
ano de 1662, resolvem os frades e o Capitão mor escolher uma localidade
para aí se estabelecer a capitania. E a escolha recaiu sobre a enseada
de Lifau, que se tomou a primeira capital das ilhas de Timor, Flores e
Solor.» (D. Carlos Filipe Ximenes Belo).
«Relatam os historiadores
dominicanos que as conversões de vários reinos de Timor, no segundo
quartel dos século XVII e a derrota dos inimigos de fé (mouros e
holandeses luteranos) se devem à intervenção especial do Céu. E esta
intervenção produziu-se através de três acontecimentos:
1. O aparecimento da Cruz de Cristo no céu de Timor, em
1641 (...)
2. Segundo facto milagroso. Nossa Senhora suava sangue
(...)
3. Terceiro facto milagroso: o próprio patriarca São
Domingos de Gusmão pelejava ao lado dos seus filhos (...)
Estes factos e outros que se seguiram ao aparecimento no
céu de Timor da Cruz Redentora levaram os frades e os cristãos a chamar
à ilha de Timor a "ilha de Sta Cruz".»
(D. Carlos Flipe Ximenes Belo).
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O autor na messe de oficiais.
Verifiquei que em Timor o futebol nos unia. Em Díli, em
1967, existiam o Benfica, o Sporting, a Académica, o União e o CAFÉ.
Souberam que eu era militar no sector militar de Laclubar,
onde teria de permanecer um ano em serviço, regra normal de então para
ser transferido. Mais sabiam que tinha jogado futebol na Académica de
Coimbra.
Eis quando excepcionalmente ao fim de seis meses fui
colocado em Díli, na Companhia de Formação do Hospital Militar, em que
tive a sorte de ter como Comandante um Senhor Coronel Médico Aurélio
Afonso dos Reis de Coimbra, que pertenceu ao grupo ímpar de
guitarristas/viola de Coimbra com o Professor Doutor Brojo e António
Portugal.
Em Díli fui alferes miliciano e desenvolvi o futebol
jogando na Académica de Timor. Era convidado para festas familiares,
casamentos, enfim era "lá de casa" e ia-me deslocando na minha moto
Suzuki 50 para todo o lado. Fui feliz, joguei na Académica de Timor,
director, capitão, treinador dos juniores da Académica, dei o meu
melhor... Foi bom.
No ano seguinte tive uma proposta do "Pinto da Costa" de
Timor, o Senhor Manuel Carrascalão, dono da ACAIT (Associação de café de
Timor) e presidente do Benfica Díli. Fui recebido com pompa e
circunstância. Seria a transferência do ano para o Benfica, melhor
equipa nesse tempo. Se mudasse receberia uma moto e mais regalias...
Pedi desculpa e respondi-lhe que não podia aceitar porque adorava a
Académica de Timor e também já tinha uma Suzuki 50 cm3.
Não insistiu o senhor Manuel Carrascalão, casado com uma
princesa timorense e com muitos filhos. Foi um gentleman, um
gentil homem, um homem de posição elevada na sociedade de Díli, um
senhor português sempre.
Sei que com eles o tempo passava depressa.
Um dia organizámos dois jogos internacionais com a
selecção de Kupang (Indonésia) na capital de Timor indonésio e, que já
tinha outrora pertencido a Timor português, antes da limitação de
1851/1852 de Timor actual. Lembro-me como se fosse hoje que jogámos
futebol, num estádio cheio e que ganhámos por 1-0 e 7-0, respectivamente
nos dois jogos que disputámos. Fomos muito bem recebidos, portugueses e
timorenses, por uma multidão amiga. Impressionei-me porque nos
beliscavam considerando os "metropolitanos" como quase sobre-humanos,
fazendo jus à designação de malai-bote (malaio grande). Seríamos de
carne e osso?! Que sensação testemunhei e jamais vou esquecer o que um
grupo de jovens católicos nos proporcionou. Os mesmos levaram-nos a uma
relíquia misteriosa. Era uma gruta onde estava uma "Nossa Senhora dos
Portugueses" e rezámos com eles num Português antigo, mas ainda
inteligível – Avé Maria, cheia de graça! o Senhor é convosco; o Creio em
Deus, Todo o Poderoso; o Sinal da Cruz e o Pai Nosso. Soubemos que era
obra dos dominicanos portugueses. Não consegui saber que Senhora era.
Não sei se era a Senhora do Rosário ou da Aleluia, vindas de Malaca ou
se era a Senhora mais recente trazida de Fátima. Emocionei-me e chorei
de alegria, feliz com os dois jogadores nativos MeIo (Benfica) e Arpad
(Sporting) timorenses de Díli. Retratei momentos marcantes da minha
vida. Lá longe, no mar azul sem fim, encontrei e senti portugalidade
fraterna cristã universal humanista.
Não me esqueço também que quando parti, fizeram uma festa
de despedida no Estádio dos Coqueiros, onde foi realçada a minha
prestação positiva no desporto de Timor, louvando-me pela minha entrega.
Bonito!
Depois de Timor já conheci Guiné-Bissau, ilhas de
Bijagós, Cabo Verde (ilhas de S. Vicente, S. Antão e Sal), Macau, Rio de
Janeiro (casa das Beiras). Os portugueses fizeram muito mais do que
menos.
«Brada o pregador, e não cesses, levanta a tua voz
como trombeta, desengana o meu povo, anuncia-lhe os seus pecados e
diz-lhe o estado em que estão.» (Padre António Vieira).
____________________________
(1) – Designado Tradição Domingo, 28 de Novembro de 1999
– Semana Santa de Larantuca, ilha de Flores – A festa portuguesa dos
indonésios
|