O artigo «A MINA», publicado no Litoral n.º
1112, de 4 de Junho findo, sugeriu-me o seguinte:
– Ignoro que qualquer tradição afirme – e,
se tal tradição existe, é evidente que ninguém aceita que os mouros
andassem por aqui... antes do dilúvio. O autor do artigo colocou,
cautamente, esta afirmação entre aspas, nitidamente responsabilizando a
lenda pelo disparate – e nas lendas, todos o sabemos, os disparates são
comuns; a não ser assim, seria caso para perguntar se, antes do dilúvio,
haveria mouros por aqui – ou por outras paragens.
– A história da senhora parteira, no mesmo
artigo referida, parece-me inverosímil: não era possível que alguém que
vivesse em Aveiro de então (que não seria de área muito extensa) fosse
levado a um local desconhecido e sem saber por onde tinha andado.
– Nunca ouvi falar de outra mina que não
seja aquela situada nas Agras do Norte, sendo certo que, quanto a esta,
havia, com efeito, lendas e historietas, que, alguns, alimentavam, como
aconteceu com o sapateiro conhecido por «Besugo», que morava na Rua do
Gravito e era emérito em pregar partidas, o qual propalou – e muito boa
gente acreditou – que, dentro da mina, vivia um urso e que, para o ver,
era necessário levar comida à boca da mina, para o atrair…
O urso – segundo propalou o «Besugo» – só à
noitinha (e não sempre) se chegava à boca da mina e era possível, então,
ver-lhe uma pata ou o rabo, conforme a sua posição.
E houve muita gente – mesmo muita – que
acreditou na balela; e, durante muitos dias, fez-se corrupio para a mina
com comida que o «Besugo» (que, cedo, se ia meter na mina) recolhia e ia
levar para casa logo que, de lá, se podia raspar, a coberto da noite.
Um dia, porém, foi descoberto – e lá se foi
por água abaixo a história do urso e, assim, a comida do «Besugo».
Também, para a mina, eram encaminhados os
espertos, a fim de, à meia-noite, e nos esteiros daquele local,
apanharem gambozinos, com um saco… sendo assoreados quando, fartos de
gritar... pelos gambozinos, verificavam terem sido intrujados…
E, para fins bem diferentes, as miroas –
quando tinham de esperar que as bateiras trouxessem o peixe de que
necessitavam para o seu negócio – por lá estagiavam…
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O resultado das investigações feitas pelo
autor do artigo, na galeria da mina, corresponde ao conhecimento que eu
tinha a tal respeito, pois que, nos meus tempos de rapaz, um grupo de
jovens também tentou descobrir a entrada da mina que – era voz corrente
– se situava em Esgueira no local onde, hoje, se situa a paragem dos
autocarros.
Então, as dificuldades foram maiores, porque
a viagem tinha de ser feita à luz de velas que, de vez em quando, eram
apagadas pelos morcegos, e em todo o comprimento aproveitável, o que
exigia um maior número de aventureiros.
Verificou-se, tal como agora, que a galeria,
a certa altura, estava entaipada.
– Aceito, perfeitamente, que a mina se
destinava a recolher a água transportada por aquela, e, possivelmente,
outras galerias de menor dimensão, a fim de regar a quinta de que a
referida mina devia fazer parte. A existência do tanque dá-nos essa
convicção.
– Quanto às galerias, encontradas nas Ruas
do Dr. Alberto Souto e do Engenheiro Oudinot e, também, aquela que o
autor do artigo diz saber que existe por baixo da estátua do Dr. Alberto
Souto, suponho que não há mistério e segredo algum.
Sabe-se que Aveiro, devido à constituição
geológica do seu subsolo era, e é, escassa em água ao nível normal;
tanto assim que, para o seu abastecimento, foi necessário ir captá-la ao
Vale das Maias por não ser possível, com os recursos técnicos então
existentes, obtê-la mais próximo.
Os conventos, com o seu grande consumo de
água, tiveram necessidade de assegurar o abastecimento privativo; e,
assim, devem ter feito as suas pesquisas e explorações naquele sentido.
Estou convencido de que, para o Convento de
Jesus, a água vinha da mesma nascente que alimenta a fonte de S. Tomás
de Aquino, que se situa nos terrenos que, hoje, pertencem às Fábricas
Campos, Filhos, pois que, antes da construção do Bairro do Dr. Álvaro
Sampaio, se via uma grande parte de uma conduta, coberta com lajes de
pedra, que seguia a direcção acima indicada e se dirigia àquele
Convento. E até o falecido Abílio Campos (que foi o último carpinteiro
do Convento) me falou, algumas vezes, de tal conduta.
Mas, sobre a água, em Aveiro, não vale a
pena falar mais, pois, há muito tempo, uns jovens estudiosos publicaram,
em "O Litoral", um estudo sobre o assunto.
Quanto aos tijolos partidos, no sentido do
comprimento, não oferece dúvida a razão de ser de tal facto, pois, com o
tijolo de 0,10 de largura (não o havia doutras medidas), não se podiam
fazer condutas com o diâmetro de 0,20. |