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INTRODUÇÃO
Uma exposição, em si mesma, é carregada de significados
culturais e encarna uma série de opções e reinterpretações,
que estão relacionadas com a mente de quem as concebe e com
as peças que apresenta, opções essas, que obedecem a uma
lógica interna.
Em termos semióticos, uma exposição não deixa de se
constituir como um "sistema linguístico" ainda que complexo,
que combina objectos de todo o tipo – legendas, vitrinas,
sistemas de iluminação – os quais se estruturam de uma forma
determinada. As peças sobreviveram desde o passado e, como
tal, incorporam-se na "língua" contemporânea
da nossa sociedade;' assim, o passado elabora-se à luz de
conceitos actuais. A criação e
recriação constantes de significados, em virtude dos quais
os signos e os símbolos geram outros novos, são uma parte
importante do processo imaginativo, através do qual damos
sentido ao nosso passado comum e à nossa actividade
presente, processo no qual os museus e as exposições
desempenham um papel preponderante. Como consequência surge
o facto de cada exposição se constituir num acto de
comunicação.
Graças à exposição de objectos, os museus reflectem e
fortalecem a memória
colectiva das pessoas e permitem que se adquira consciência
cultural. Os objectos museais; "testemunhos mudos do
passado", requerem um enfoque multidisciplinar para se
poder transmitir um conhecimento multidimensional relacionado com o desenvolvimento geral da
sociedade humana. A
informação ou aprendizagem assim obtidos, constituem uma
mensagem para os visitantes. Pode-se dizer que uma exposição
de museu se ocupa essencialmente de três elementos: os
objectos do museu, a mensagem e as pessoas que a recebem, ou
seja, o público.
A maior parte das exposições giram em torno de um tema que
contribui para transmitir a dita mensagem. Os seus fins e
objectivos dependem, em grande parte, do tipo de mensagem que se pretende passar. A realidade objectiva é a
fonte de todo o conhecimento
humano, os objectos concretos e visíveis, constituem
"factos" do processo histórico e têm, por conseguinte, uma
importância considerável. Para estabelecer uma relação
dinâmica entre o museu e o público, é necessário analisar os
materiais a expor, o
público e as técnicas de exposição mais eficazes. Os
objectos seleccionados devem ser estudados de tal forma que
revelem quer as suas qualidades intrínsecas, quer as
explicitas, a sua origem e procedência e a função que
cumprem ,na natureza e sociedade, num espaço
e tempo determinados.
Condição importante de uma mostra num museu é o espaço,
trata-se de deslocar os objectos e reagrupá-los num lugar
novo, que
,se vai converter no espaço da exposição. Esta
formula as suas próprias afirmações, através de convenções
formais, nas quais figura em primeiro lugar a dimensão
limitada da galeria, sendo a relação com esse espaço que
vai
influenciar decisivamente a forma como se gera o
conhecimento.
IDENTIFICAÇÃO DAS PEÇAS QUE
VÃO SER EXPOSTAS
Conjunto formado por sete painéis de azulejo monocromáticos
que apresentam características idênticas: são do período
barroco, situando-se em meados do século XVIII; a sua
proveniência, do antigo
Recolhimento de S. Bernardino de Aveiro; devem-se
provavelmente a feitura de oficina
/ 20 / coimbrã (escola de Vital
Rifarto).
O quadro que se segue, apresenta as dimensões da composição
de cada um dos painéis.
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Nº DE INV. |
ALTURA |
LARGURA |
PAINEL * |
118/Ea |
3,10 m |
1,07 m |
A |
119/Ea |
2,34 m |
1,61 m |
G |
120/Ea |
3,07 m |
1,07 m |
D |
121/Ea |
3,00 m |
1,00 m |
F |
122/Ea |
3,08 m |
1,06 m |
C |
123/Ea |
3,06 m |
1,07 m |
E |
124/Ea |
2,95 m |
1,07 m |
B |
|
|
|
*
Localização. Ver planta |
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Tal como foi referido, este grupo de painéis de azulejo, que
se propõe serem
expostos numa sala do Museu de Aveiro,
apresentam características comuns, formando
assim, um conjunto coerente. Um dado
comum a todos é a sua proveniência: o antigo
Recolhimento de S. Bernardino, em Aveiro.
Neste Recolhimento Feminino, da Ordem
Terceira de S. Francisco, com a sua fundação
.
em inícios de 1680, as recolhidas sempre se
regeram pelos Estatutos das Religiosas
Conceicionistas de Portugal, chamadas
vulgarmente de Capuchas Franciscanas
Descalças. Professavam os três votos
substanciais da religião e também o da
clausura perpétua, voto que, no entanto,'.não
era obrigatório. Na medida em que foi
crescendo o número de recolhidas e o seu
viver se tornou mais rígido e fechado, trataram
de ampliar o edifício e de mandar construir
uma igreja de maiores dimensões, a qual, em 1745, se achava concluída.
Segundo Rangel
de Quadros(1): "O templo do
Recolhimento de S. Bernardino é todo de abóbada de
tijolo e até
quase metade da altura, tem as paredes
revestidas de bons azulejos, representando
paisagens e alguns passos da vida de S.
Francisco de Assis, a cuja Ordem pertencia"(2). Em todo o
conjunto do templo e das suas
dependências nota-se não só uma rigorosa
simetria, mas também a simplicidade própria
de uma Ordem que tem como apanágio a humildade. Em 1832, o templo
transformou-se em sede episcopal, e por força
do decreto de
1834, este Recolhimento é
extinto sucedendo-lhe o mesmo que às casas das outras
Ordens. Hoje
não existem
vestígios do Recolhimento, demolido já no nosso século.
Outro elemento que contribui para a
unidade estilística deste conjunto é o seu
possível fabrico coimbrão da "escola" de Vital
Rifarto. Este, pintor de azulejos e debuxador de retábulos de talha, trabalha activamente no
segundo quartel do século XVIII. Raras são as
obras assinadas em azulejo e este conjunto não
é excepção, como tal, só através de uma
análise estilística detalhada se poderá apontar
o nome do autor ou "escola". Ao nível compositivo acresce que todos estes painéis
apresentam uma complexa solução decorativa,
sobretudo no enquadramento ornamental em
detrimento das partes figurativas.
Por fim a constatação de que pertencem ao mesmo período
histórico-artístico, o barroco
com todo o seu esplendor e riqueza,
coincidindo com uma fatia substancial do
reinado de D. João V, que desenvolve as
potencialidades cénicas do azulejo, tanto na sua organização
compositiva, que privilegia as
bocas de cena onde se desenvolvem as
narrativas, como nos enquadramentos
arquitectónicos. Surgem inicialmente em
igrejas construídas em épocas anteriores
dotadas de espaços estáticos que urgia
/ 21 /
renovar com estes conjuntos que se impõem ao olhar do
crente, seduzindo-o e convencendo-o.
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Antigo
recolhimento de S. Bernardino. Vestígios dos painéis de
azulejos |
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DEFINIÇÃO DOS OBJECTIVOS
(EXPOSIÇÃO)
A exposição que se propõe realizar, pretende sobretudo
provocar impacto emocional e estético no visitante, não
esquecendo nunca a preocupação de comunicar e informar.
Estes painéis de azulejo podem ser entendidos como elementos
animadores do espaço arquitectónico, que exprimem a ousadia
decorativa do barroco como expressão original da arte
portuguesa. Aqui não se pretende só informar, mas também
permitir que o visitante se relacione de uma forma íntima e
directa com as peças, fruindo-as em plena liberdade.
O conjunto não pode deixar de ser apreciado pela sua
aparência visual e propõe-se ser apresentado de tal forma que as suas qualidades
visuais particulares possam Ser inteiramente apreciadas pelo
visitante. Deste modo, o espaço pré-existente, com determinadas características, vai desempenhar também um papel
importante na concepção da exposição, inclusivamente como
seu potenciador, na medida em que se visa que a forma e a
dimensão dos objectos em relação a esse mesmo espaço tenham
impacto emocional.
SALA DE EXPOSIÇÃO DOS PAINÉIS DE AZULEJOS
Situada num espaço que "precede" a visita ao museu
propriamente dito, assume-se, assim, como sala de passagem.
Ou seja, todo o público que acorre ao museu a ela tem
acesso, no entanto, um local escolhido pelas entidades
(instituições) e museu, para aí se realizarem frequentemente
exposições, actividades culturais e sociais. Ao organizar a
exposição, gostaríamos que esta sala fosse um local de
paragem e de reflexão, no qual todo o visitante pudesse
contemplar e usufruir do ambiente criado.
MORFOLOGIA
DA
EXPOSIÇÃO
COLOCAÇÃO DOS PAINÉIS
Pensando concretamente na exposição seria conveniente que os
painéis de azulejos não ficassem em contacto directo com o
suporte (parede). Para tal, refere-se a sua montagem prévia
em placas de acrílico (dado a elevada altura dos painéis,
deverão existir 3 placas por painel) às quais serão
adossados os azulejos, usando-se para tal silicone. Cada
painel deverá ficar distanciado do chão a uma altura
aproximada dos 60 cm, quer por uma
questão de segurança, quer tendo em conta o olhar e estatura média do visitante.
/
22 /
JANELAS
No âmbito da mostra que se propõe levar a cabo, as janelas
desta sala adquirem um duplo sentido, como fonte de luz e
como ponto de fuga através do qual se vislumbra o exterior,
o que em certa medida contraria a
finitude da exposição. A paisagem exterior,
que pode ser
contemplada pelo visitante através das janelas, define-se
por um jardim cujas arvores são magníficas, transmitindo
serenidade e ao mesmo tempo monumentalidade. As janelas
existentes na sala apresentam grandes dimensões e são
formadas por molduras de madeira com vidros em "quadrícula"
e grades exteriores em ferro. A proposta consiste em
substituir, da forma mais adequada, esta estrutura por outra
formada por um vidro de placa inteira
(3), sem grades exteriores, decisão justificada por
duas razões:
● maior aproveitamento lumínico;
● eliminação de interferências na leitura da paisagem.
CONDIÇÕES
AMBIENTAIS LUZ
Para a criação do desejado ambiente lumínico, propõe-se a
conjugação entre a luz solar e a luz artificial. A luz solar
apresenta diversas características: é variável, difusa e
contém grande quantidade de UV (raios ultra violeta). No
caso das cerâmicas, material inorgânico, os raios UV não têm
tantos efeitos nocivos como noutros materiais (exemplo da
pintura, têxteis, papel, etc.) podendo, no entanto,
recorrer-se sempre que possível ao uso de filtros
(incolores), película de protecção UV, que poderão ser
aplicados nos
vidros das janelas. No caso dos azulejos, o
maior problema com
que nos deparamos em termos de luz, é o do brilho que se
reflecte no vidrado do azulejo e provoca o
encandeamento do visitante, dificultando assim a leitura da
peça. Apesar das janelas estarem viradas a noroeste, não
havendo assim incidência directa do sol, será uma questão a
reflectir pelo Conservador e pelo técnico especialista.
Como complemento da luz natural, e por forma a manter o
ambiente de luz difusa, poderá ser utilizado um sistema
compensatório de luz artificial (para períodos de menor
iluminância), para tal pode ser utilizada a denominada
vulgarmente de "luz branca solar", ou seja, uma luz
artificial (que poderá
ser fluorescente) semelhante à luz natural.
As cerâmicas podem ser iluminadas até níveis que podem
atingir os 200 a 300 Lux.
HUMIDADE E
TEMPERATURA
O grande problema com que se debate o "antigo" edifício do
Museu de Aveiro, são as elevadas percentagens de humidade
que se infiltra quer pelo sentido ascendente quer
descendente, justificadas em grande parte pela situação
geográfica do museu, que se encontra numa região onde as
médias anuais de humidade do ar estão compreendidas entre os
79% e os 88%, resultando estas percentagens da evaporação
permanente que se verifica na
ria e ainda a humidade trazida pelos ventos quentes que,
soprando do mar, são influenciados pela corrente do Golfo. O
elevado teor de humidade sofre, no entanto, fracas
amplitudes, tanto diurnas como
nocturnas. Quanto à temperatura, a média anual é de 15°C; as
temperaturas mais baixas e mais altas ocorrem,
respectivamente, em
Dezembro/Janeiro/Fevereiro e Junho/Julho/Agosto.
O material cerâmico é extremamente sensível à humidade, o
seu corpo poroso é
susceptível à migração de sais solúveis cuja
acção é muito
danosa. Em muitos casos dá-se
/ 23 /
mesmo a desintegração da chacota (corpo cerâmico) e outras
vezes a destruição do vidrado, provocado pela cristalização
de sais. As condições consideradas como ponto de partida
para a criação de um ambiente ideal para a exposição, com
níveis constantes, são
as seguintes:
–
Humidade Relativa entre 50% a 65%;
– Temperatura a 19° C.
No entanto, é necessário
arranjar uma
situação de compromisso entre as condições ideais e as
condições ambientais existentes no museu, de modo a
encontrar um ambiente em que a colecção encontre um
equilíbrio.
Temos ainda que pensar que o espaço do museu não é só
ocupado pelos objectos, há que considerar também o factor
humano (pessoal e visitantes). O controle do ambiente deve
também ter em conta as condições de conforto, para que as
pessoas o possam visitar
e nele trabalhar. Apesar de, na maior parte das vezes, as
condições ambientais requeri das pelos objectos não serem as
que mais conforto poderão dar às pessoas, há que procurar
equilibrar ambas. Beneficiamos aqui do facto de os materiais
estáveis, neste caso a cerâmica,
serem mais tolerantes relativamente às condições ambientais.
Para melhor combater o problema da humidade, seria
indispensável o uso de um desumidificador, cuja função é
retirar a humidade do ar, de preferência os desumidificadores automáticos que funcionem por dessecantes.
Através de informações obtidas de outros museus, a opção
pela instalação de um ar condicionado, não parece ser muito
eficaz na resolução do problema da humidade,
para além de ter um custo elevado. Outro instrumento de
controle ambiental de grande importância é o termohigrógrafo,
aparelho que regista os valores da humidade relativa e
temperatura, permitindo, desta forma uma rápida e eficaz
intervenção no caso destes sofrerem alterações que possam
ser danosas às peças.
LEGENDA TIPO
A informação contida na legenda que acompanha cada painel
deverá ser apresentada de uma forma sumária, como por
exemplo:
PAINEL DE AZULEJOS MONOCROMÁTICO SÉC. XVIII
OFICINA: COIMBRA. ESCOLA DE VITAL RIFARTO
PROVENIÊNCIA: RECOLHIMENTO DE
S. BERNARDINO, AVEIRO
N° INV.: 122/Ea
Deverá ficar bem posicionada em relação ao objecto, de tal
forma que o visitante facilmente obtenha a informação que
procura. Não se pretende que tenha grandes dimensões, por
forma a não competir em termos visuais com o objecto, e para
que não haja interferências na leitura do próprio painel.
Sugere-se que seja colocada à frente do painel a uma
distância aproximada de 50 cm, sobre o lado esquerdo. Poderá
ser uma placa de acrílico de forma rectangular (10 x 15 cm aproximadamente) com uma ligeira inclinação apoiada numa vara, também
de acrílico, com a altura aproximada de 50 cm.
Na medida em que tratamos de uma
proposta para uma exposição, aferimos todos os detalhes que
propiciem o êxito do evento. Porém o sucesso pretendido só
poderá ser efectivamente avaliado, perante a receptividade
do público. Esta, naturalmente, vai passar também pela
forma como se encararia a sua divulgação, elemento cada vez
mais fundamental para a boa resposta a uma actividade
cultural que, certamente, não surtirá efeito se não criar
empatia e transmitir uma mais valia ao visitante.
Fica a ideia. Existem o espaço, os
objectos, a vontade e a noção de que, a vários níveis, o
museu, a colecção e o público sairiam enriquecidos.
Cláudia Pinho e Melo
José António Rebocho Christo
BIBLIOGRAFIA
CONSULTADA:
– BELCHER, Michael -
Exhibitions in museums,
Leicester Museum Studies, 1991
–
CASSAR, May -
Environmental Management.
Guidelines for Museums and Galleries,
Museums and Galleries
Comission, London, 1995.
–
GOMES, Marques - Memórias de
Aveiro., Aveiro,
1875
–
GONÇALVES, António Nogueira -
Inventário
Artístico de Portugal. Aveiro Zona-Sul,
Academia
Nacional de Belas Artes, Lisboa, 1959.
–
HOOPER-GREENHILL, Eilean
- The
Educational Role of the Museum, Routledge,
Londres,
1994.
–
MECO, José - O Azulejo em
Portugal, Publicações Alfa, Lisboa, 1989.
–
PAPADAKIS, Andreas - New
museology,
Academy Editions, London, 1991
–
QUADROS, Rangel de - Aveiro
Apontamentos
Históricos,
Vol. VI, [fotocopiado, Aveiro, 1978]
–
THOMSON, Garry - The Museum
Environment, Butterworth-Heinemann,
Oxford, 1986
–
THOMPSON, M. A. [et alii]
Manual of Curatorship , -
A guide to museum practice,
Butterworth
Heinemann, 2ª edição, Oxford, 1994.
_________________________________
(1) –
QUADROS, Rangel, Apontamentos Históricos, VoI. VI,
Aveiro, 1978, p. 43.
(2) –
Mediante estudo iconográfico realizado, pode-se afirmar que
as cenas figurativas que se observam nos painéis se
referem a cenas com eremitas ou simples alusões à vida
contemplativa.
(3) –
A espessura do vidro deve ser a suficiente para poder
garantir as melhores condições de segurança passiva.
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