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Isabel Pereira, O Museu e a AMUSA: a reciprocidade que se deseja. In: "AMUSA", N.º 1, Outubro de 1999, pp. 3 a 5


O Museu e a AMUSA: a reciprocidade que se deseja
 

1. Foi comum os Museus usufruírem apoio de associações empenhadas na investigação e na divulgação das suas colecções. Foi essa a missão das Sociedades Arqueológicas, nascidas. no séc. XIX, nomeadamente da Sociedade Arqueológica da Figueira da Foz (1) que se inspirou em princípios inovadores já experimentados na Sociedade Carlos Ribeiro, do Porto, e divulgados através da sua prestigiada Revista das Sciencias Naturaes e Sociaes (2).

Na Sociedade Carlos Ribeiro trabalharam e participaram activamente homens que, mais tarde, ficaram ligados, com grandes responsabilidades, a Museus. Referimo-nos a António Augusto Rocha Peixoto que foi director da Biblioteca Pública e do Museu Municipal do Porto.

 

Nessa época, trabalhava na Figueira da Foz, intimamente ligada ao Museu, a Sociedade Arqueológica. Procurava enriquecer as colecções do Museu nomeando delegados nas freguesias que contribuíssem para a conservação e descoberta do património local.

O elevado nível científico atingido e os trabalhos realizados projectaram o grupo de intelectuais figueirenses. Foi fundada em 1898 com o nome de Sociedade Archeológica da Figueira e operou com este nome, até 1903, data em que mudou de denominação para Sociedade Archeológica Santos Rocha, em honra ao seu principal dinamizador.

 

Na mesma época, em Coimbra, o Instituto de Coimbra, com o seu Museu de Antiguidades, desempenhou um papel semelhante. Foram seus consócios. distintos António Augusto Gonçalves, Aires de Campos, Filipe Simões e Adolfo Ferreira Loureiro (3).

 

Ambas as instituições se empenharam em produzir uma linha editorial forte: a primeira com o Boletim da Sociedade Archeológica,(4) a segunda com a revista o Instituto (5).

 

É, pois, evidente que a ligação de associações científicas aos Museus, relacionadas com a defesa e com a valorização do património e, ainda, com outras acções de divulgação, tiveram raízes antigas, evidentes no séc. XIX.

 

2. Em. Portugal, já no séc. XX, apareceram diversos "Grupos de Amigos" cuja finalidade foi apoiar os Museus na investigação, na conservação e na comunicação das colecções. Muitas vezes os seus objectivos estendiam-se ao património edificado ou, até mesmo, ao património natural.

 

O grupo mais antigo nasceu ligado ao Museu Nacional de Arte Antiga Grupo dos Amigos do Museu Nacional de Arte Antiga de Lisboa. Foi fundado, sendo director D Dr. José de Figueiredo, a 27 de Abril de 1912. Sofreu a primeira alteração dos estatutos em 1946, já com o Dr. João Couto na direcção do Museu. Só, recentemente, em 1988, os estatutos foram, de novo, revistos adaptando-se às Leis e aos novos conceitos de Museu(6). É inegável a importância que os serviços educativos do Museu de Arte Antiga exerceram sobre as outras instituições congéneres, sob a égide do Dr. João Couto. Dado o prestígio alcançado e o trabalho desenvolvido no campo da formação, educação e investigação foram considerados modelos e, ao mesmo tempo, escola (7).

 

A necessidade do Grupo dos Amigos do Museu foi reconhecida por João Couto. Frisa a operacionalidade do grupo do Museu de Arte Antiga, focando as facilidades de aquisição / 4 / "própria" de peças que, depois, foram oferecidas ao Museu, ultrapassando os processos burocráticos. Realça o apoio que sempre prestou aos directores. Enumera as palestras e exposições efectuadas e especifica os trabalhos correntes editados demonstrativos de uma editorial dinâmica (8).

 

Entre 1926 e 1935, talvez por influência do Museu de Arte Antiga, funcionou, em Viseu, um Grupo de Amigos do Museu Grão Vasco que apoiava o director, Francisco António de Almeida Moreira, no difícil papel de criar e dinamizar o Museu. Perdeu-se o rasto desta associação e só, em 1985, renasceu o grupo (9).

Em 1939, nasceu na Figueira da Foz o Grupo de Amigos do Museu Municipal, implementado pelo professor António Vítor Guerra. Tinham-se passado 29 anos sobre a morte do fundador do Museu, Santos Rocha (10).

Os objectivos expostos foram inspirados nos antigos princípios averbados nos documentos da Sociedade, embora com visão mais limitada. Tinha como funções a "propaganda, acréscimo ou inovação das suas colecções e condigna instalação do Museu; concorrer para a difusão dos estudos arqueológicos, artísticos e históricos, em especial da região figueirense; procurar recolher no Museu, por compra, troca, donativo ou depósito, objectos dignos de exposição; organizar exposições de carácter arqueológico, etnográfico ou artístico; fazer publicações atinentes à divulgação do recheio do Museu; auxiliar .a investigação ou explorações que respeitem às secções do Museu; promover sessões de estudo e de expansão cultural; velar pela boa conservação dos monumentos arqueológicos, artísticos e históricos considerados ou não nacionais".

Vincava, pois, toda a animação e divulgação do Museu.

Em 1942, fundou-se, no Porto, o Círculo Dr. José de Figueiredo, ligado ao Museu Nacional Soares dos Reis (11). As finalidades e objectivos do círculo identificaram-se com os dos outros grupos de amigos.

 

Distingue-se, positivamente, esta associação pela edição da Revista Museu. Com constrangimentos que, algumas vezes, se reflectem na sua irregularidade, tem o Círculo cumprido a difícil missão de manter a publicação. Tem sido um importante órgão de divulgação do Museu, das colecções nortenhas e de estudos museológicos de qualidade.

 

Depois de 1974, nomeadamente nos anos oitenta, surgiram novas associações ligadas aos Museus e outras, já antigas, foram revitalizadas. Enumeraremos: Grupo de Amigos do Museu Grão Vasco (estatutos de 1985), Liga de Amigos de Conímbriga (estatutos de 1986), Grupo de Amigos do Museu dos C.T.T. (estatutos de 1986), Grupo de Amigos do Museu Nacional de Arte Antiga de Lisboa (estatutos de 1988), Associação de Amigos do Museu de Olaria-OLA (estatutos de 1988), Grupo de Amigos do Museu Regional de Arqueologia D. Diogo de Sousa de Braga (estatutos de 1989), Grupo de Amigos do Museu da Cerâmica (estatutos de 1989), Associação de Amigos do Museu de Aveiro­AMUSA (estatutos de 1992).

 

3. Em 19 de Dezembro de 1991 fundou-se em Aveiro a Associação de Amigos do Museu de Aveiro-AMUSA, tendo a escritura sido lavrada em Março de 1992.

 

A finalidade expressa, nos seus estatutos, relata a promoção de "publicações, conservação, e restauro de edifícios e obras de arte, colaboração em actividades culturais, promoção de actividades culturais, aquisição de obras de arte, promover a investigação no sector artístico e promover a educação pela arte" (12). Apesar de todos os esforços desenvolvidos, em sete anos de existência, foi impensável cumprir integralmente objectivos / 5 / tão ambiciosos. Todavia,. a associação tem trabalhado no sentido de atingir a estabilidade necessária. Participou nos eventos preparatórios da formação da federação dos grupos de amigos. O esforço despendido, imprescindível para a publicação deste boletim, exemplifica as preocupações com a visibilidade do Museu e da própria Associação.

 

Neste período de grandes transfor­mações no Museu de Aveiro, que implicam uma qualificação total do Museu, tanto no plano arquitectónico como museológico, questiona-se sobre o papel do grupo de amigos. Deseja-se uma associação forte, crítica, interveniente e, ao mesmo tempo, solidária. O apoio à direcção é essencial. O diálogo aberto e as sugestões sobre o futuro do Museu são indispensáveis e desejáveis. Não se pense, contudo, que sugerimos ou preconizamos uma identificação da direcção do Museu com a direcção da AMUSA. A independência e a liberdade das duas Instituições têm de ser .claramente defendidas. Do diálogo livre entre. as duas sairão as soluções adequadas.

 

A direcção do Museu espera da AMUSA, em primeiro lugar, o cumprimento das obrigações enunciadas nos seus estatutos e, além disso, o reforço do diálogo no sentido de colocar o Museu de Aveiro no plano que se deseja.

 

A AMUSA, naturalmente, espera que a direcção do Museu obtenha dos Poderes Públicos todos os apoios necessários ao engrandecimento do Museu. Espera, igualmente, uma direcção aberta e solidária, capaz de compreender as suas aspirações.

 

Deseja ter, na direcção do Museu, um aliado forte e capaz de defender e lutar pelos projectos da Associação a bem do Museu e de Aveiro.

 

Isabel Pereira

 

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NOTAS

(1) Sociedade Arqueológica da Figueira da Foz 1898­1910: Centenário. – Figueira da Foz, 1999.

(2) Revista das Sciencias Naturaes e Sociaes. – Porto:Sociedade Carlos Ribeiro, 1890-1898, 5 voIs.

(3) António A. Gonçalves: homenagem do "Instituto de Coimbra ". – Coimbra, 1946.

(4) Boletim da Sociedade Archeológica Santos Rocha. – Figueira, 1906.1909, tomo 1,1-10.

(5) Instituto: Jornal Scientífico e Letterario s/n – n.º 1 (Abril 1852). – Coimbra, Imprensa da Universidade.

(6) Esttatutos do Grupo dos "Amigos do Museu Nacional de Artte Antiga de Lisboa". - Lisboa, 1988.

(7) COSTA, Maria Madalena Gagean Cardoso da – "Museus e Educação – Contributo para a História e para a Reflexão sobre a Função Educativa dos Museus em Portugal"; Coimbra, 1996, p. 125-287. (Dissertação de Mestrado em Ciências da Educação. Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação. Universidade de Coimbra. Policopiado).

(8) COUTO, João – "O Grupo dos Amigos do Museu". – In Ocidente: Revista portuguesa e mensal, Lisboa, 1964,312, v. 64, p. 197-198.

(9) Grupo de Amigos do Museu Grão Vasco: breve HistoriaI. – In Museu de Grão Vasco. Boletim dos Amigos do Museu de Grão Vasco, Viseu, 1995, n.º 66, p. 7.

(10) Esttatutos do Grupo dos Amigos do Museu Municipal Dr. Santos Rocha da Figueira da Foz. – Figueira da Foz, 1942.

(11) Círculo Dr. José de Figueiredo: Palácio das Carrancas. – In Museu de Grão Vasco. Boletim dos Amigos do Museu de Grão Vasco, Viseu, 1995, n.º 66, p. 23.

(12) AMUSA, Associação de amigos do Museu de Aveiro. – In Diário da República, III Série, 30 de  Julho de 1992, p. 13628 – (99).

AMUSA, Associação de Amigos do Museu de Aveiro. – In Museu de Grão Vasco. Boletim dos Amigos do Museu de Grão Vasco, Viseu, 1995, n.º 66, p. 25.
 

 

 

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