Meus Amigos, faz hoje 50 anos que passei o Primeiro Natal em Angola.
Sou feliz, de uma forma plangente, lágrimas que teimam sempre em
aparecer, fruto desta nostalgia que, por força das circunstâncias,
deixei para trás nestas terras, e que, se calhar, nunca devia ter
conhecido.
No entanto, dizia um ditado popular que quem beber água do Bengo nunca
mais vai esquecer Angola! O Bengo é um gigante líquido, que passa pelos
Dembos, onde estive, e vai desaguar a norte de Luanda, na Barra de Dande.
No momento desta fotografia, ao almoço, em 25 de Dezembro de 1968, já eu
estava casado, com 23 anos. É no refeitório do nosso quartel, na
província do Zaire, bem acima de São Salvador do Congo, onde recebemos a
visita do CMDT da ZIN, brigadeiro Henrique d’Avellar, Oficial-General de
duas estrelas. Confidenciou-me que foi “Cabo de Guerra”. Por ironias do
destino, na mesa de Oficiais e Sargentos, eu não sou visto, mas estava
lá. Apenas vejo de costas o meu amigo, o furriel Araújo. Também não
estava presente o nosso primeiro sargento Mendes, por estar a fazer
rabanadas na padaria!
A saudade leva-me ao etéreo poeta madeirense, Cabral do Nascimento,
virando páginas do meu livro:
NATAL AFRICANO
Não há pinheiros nem há neve,
Nada do que é convencional
Nada daquilo que se escreve
Ou que se diz…Mas é Natal.
Que ar abafado! A chuva banha
A terra, morna e vertical.
Plantas da flora mais estranha,
Aves da fauna tropical.
Nem luz, nem cores, nem lembranças
Da hora única e imortal.
Somente o riso das crianças
Que em toda a parte é sempre igual.
Não há pastores e ovelhas,
Nada do que é tradicional.
As orações, porém são velhas
E a noite é Noite de Natal.
Texto dedicado aos meus Amigos, no dia 25 de Dezembro de 2018
João Pires Simões
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