Em Comarca incerta e entre dois incertos colegas de toga e lata,
passou-se esta saborosa" estória", filha legítima de dois temperamentos
mestiços de ingenuidade e irreverência, ornados, há muito, com os
galardões nada abonatórios de bronco, um e de chifrudo, o outro.
Nenhum deles era dos da barca de Mestre Gil, da mesma forma que qualquer
deles era tido e havido como de segunda apanha na seara dos colegas
dessa tal Comarca que a varinha do então Conselho Superior Judiciário,
com o beneplácito do Ministério da Justiça, havia plantado em plenas
faldas da serra mais alta desta nesga de terra debruada de mar como lhe
chamou o Torga, num dos seus belos poemas.
Eles não tinham grandes afinidades, para além das ténues de uma
camaradagem distante que nem sequer era por demais aprofundada dado o
feitio, entre agreste e bonacheirão, de qualquer deles.
Um dia encontraram-se à saída do Café da terra onde nem tinham por
hábito pousar e o mais atrevidote deles, aquele de quem se dizia ser
chifrudo, disse ao outro, sem qualquer recato e por detrás de dentes
sorridentes de malícia:
− Ó M... dizem para aí que fazes m... Eu não acredito.
Ao que o outro, aquele de quem se dizia ser bronco, retorquiu
de pronto com o riso escancarado de um detector de verdades:
− Também dizem para aí que és corno e eu acredito!
Uns dias depois, em plena audiência presidida por Juiz
categorizado mas por demais "femeeiro" e que não se livrava das famas de
gozar dos favores da mulher do "chifrudo" do diálogo, encontraram-se de
novo os dois num processo de divórcio baseado no adultério da mulher do
cliente do tal" Chifrudo".
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E em voz um pouco mais que ciciada, o "bronco" largou esta:
− Como podes
tu, ó F... patrocinar com tal ardor um Colega? A resposta não tardou e
com ela o silêncio que aguardava a sentença do Meritíssimo:
− Que queres? Conto sempre com a compreensão dos Juízes.
Mas... nunca fiando.
E por aí se ficaram nas diatribes que, apesar do soez das palavras
escondidas, ambos em sua fé julgavam ser mesuras com punhos de renda. |