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N.º 14

Publicação Semestral da Junta Distrital de Aveiro

Dezembro de 1972 

Freguesia de S. Nicolau da Vila da Feira

Capelas – Oratórios – Alminhas – Cruzeiros – Vias Sacras – Passos – Outros Padrões

Por Roberto Vaz de Oliveira


Licenciado nas Faculdades de Direito e Letras – Secção de

Ciências Histórico-Geográficas – pela Universidade de Coimbra

Introdução

A publicação deste trabalho preocupa-me, com grande receio de ter incorrido em erros que, aliás, não pude evitar.

As informações que consegui colher foram insuficientes, estão muito dispersas e incompletas, assentando, muitas vezes, em meras conjecturas, quando não se entregam à fantasia de ousados narradores.

Muito tive que procurar em terras quase «hermas», como antigamente se classificavam as que estavam despovoadas, reduzidas a mato, tornadas em solidão ou não cultivadas, como as definiu Santa Rosa de Viterbo, no seu Elucidário das palavras, termos e frases (Vol. 2.º, fls. 313).

Limito o estudo à freguesia de S. Nicolau da Vila da Feira, dada a impossibilidade que tenho, por agora, de o alargar às outras freguesias do concelho, como era meu desejo.

Espero que, em cada uma delas, surja quem se encarregue desse trabalho, esperança do no concurso daqueles que, pela sua cultura, garantam a justificada esperança de um bom êxito de modo a, dentro de anos, fazer-se um trabalho de conjunto que dê a devida cobertura a todo o concelho, – uma monografia bem original.

*

Pela afinidade espiritual dos motivos englobo, no mesmo estudo, as Capelas, Oratórios, Alminhas, Cruzeiros, Vias Sacras e Passos, temas que despertam o mesmo sentimento de fé e procuram atingir o mesmo e altíssimo fim – o da salvação das almas sob o signo da Cruz. Outros Padrões.

Além deste intróito, finalizo com uma conclusão.

Antecedo, cada um dos capítulos, de um breve estudo, para que, em limitada explicação, se possa abranger, no seu conjunto, toda a matéria versada, facilitando a marcha nas estradas, tão pouco iluminadas, de penetração em tantos séculos passados.

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Foi muito penoso o arrolamento de tudo que me foi possível encontrar disperso em livros, jornais, revistas e outras formas de divulgação escrita, ao que associei o que se mantém na tradição oral e o mais que consegui apreender pela voz dos monumentos e dos outros bens que ainda perduram.

Para dar seriedade a este trabalho, procurei seleccionar – apartando o trigo do joio – dando àquele as condições necessárias para uma boa germinação, convertendo-o em alimento sadio da investigação que procuro alcançar.

Todos os que se dedicam a estes estudos sabem quantas surpresas nos reserva a descoberta de documentos e a permanente evolução de conceitos já formados – o que nos leva a ver, muitas vezes, como mau o que consagrados já consideraram como bom.

Depois de registar, seleccionar e sistematizar, tentei, na medida das minhas possibilidades, juntar harmónica e lógica mente, o que me pareceu válido e de interesse para o efeito, dando vulto e continuidade a uma história que se prolonga – na possibilidade dos elementos / 64 / encontrados – desde tempos muito recuados até ao dia de hoje.

Infelizmente, na maioria dos casos, tive que trabalhar entre ruínas, entre inúmeras dúvidas e contradições, sempre na legítima aspiração de ir cada vez mais longe, sem desprezar a verdade,

*

Não quero impor o meu raciocínio, nem sujeitar os outros ao critério da minha interpretação: por isso, transcrevo grande parte dos textos onde me informei, para que todos os possam ler e interpretar com o seu próprio sentimento e inteligência.

No mesmo propósito alarguei a documentação gráfica, contributo de uma valiosa presença.

*

Não preciso encarecer o valor que um estudo desta natureza representa para a história local, falada e ensinada através de pedras, peças e motivos, que formam padrões que faço correr diante dos vossos olhos – mais dos da alma do que dos do corpo -, símbolos de épocas mais ou menos remotas e lembranças dos que os ergueram e ampararam, vivendo à sua sombra.

Tomei a voz dos antepassados para a transmitir aos vindouros, através do presente, voz que, em pouco tempo, pertencerá também ao passado.

*

Reservo para estudo autónomo a história da Igreja da Misericórdia que, embora não seja matriz, é nomeada tradicionalmente por aquele distinguido título.

Também ficará, para outra oportunidade, o estudo do templo que está a ser levantado, no lugar da Cruz, pelos P. P. Passionistas a par do edifício do seu semi. nário, já em adiantado estado de construção,

*

Lamento não ter chegado mais cedo, a tempo de colher notícias que já se perderam com a morte de tantos que, na sua memória, retinham elementos preciosos pelo que viram e ouviram em dilatadas vidas.

Se me acuso, também lamento que os do meu tempo e os que pertenceram a tantas gerações que me antecederam, não tenham tido a feliz iniciativa de abrir o caminho, de modo a, agora, apenas me competir continuar e reparar, à sombra de novas e sempre necessárias investigações.

Estamos sempre a tempo de salvar muito, embora cada vez menos.

Exorto, por isso, o que faço em apêlo renovado, os meus compatrícios a lançarem-se no caminho da investigação, enriquecendo a história da nossa terra em múlt;plos aspectos ainda tão esquecidos.

Por minha parte, enquanto não me faltarem as forças, continuarei a trabalhar, arando o terreno «hermo», cultivando-o com a melhor semente que me for possível encontrar.

Contento-me, quanto ao particular deste estudo, que ele baste como alicerce que possa suportar obra que sirva de apoio e de ponto de partida.

Lanço este trabalho à publicidade – como um tímido esboço – para ser completado por aqueles que quiserem dedicar-se a estes estudos: daqui os incito e saúdo com votos de muitas felicidades.

CAPITULO I

CAPELAS

Começo por lembrar uma distinção que convém ter presente, referente ao significado de «capela».

Além do que resulta de «simples oratória, igreja de uma comunidade isenta, altar colocado dentro e em volta da igreja, em espaço maior ou menor com disposição especial e templo filial da igreja matriz», também por ela se designavam os «bens onerados perpetuamente, tendo encargo de missas ou doutros ofícios religiosos, por intenção com o fim de sufragar a alma do fundador» (O Cabido da Sé do Porto – pelo cónego António Ferreira Pinto – Capítulo VI – Capelas e Morgados – a fls. 43).

Gama Barros, na «História da Administração Pública em Portugal nos séculos XII a XV (2.ª edição – fls. 223), nas suas considerações sobre «capelas e morgados», diz-nos quanto à propriedade vinculada perpetuamente: «Estabelece-se o vínculo quer fosse quando o instituidor destinava os bens principalmente a obras pias, indicando porém a ordem a seguir na sucessão ou administração delas (capelas), quer o fim principal da instituição, posto que onerada com encargos pios, fosse imobilizar os bens em determinada família para ela manter para sempre o seu estado e condição (morgados). Mas nos documentos, como veremos, designou-se muitas / 65 / vezes ambas as fundações com qualquer desses nomes, e a característica legal, que as distinguia, só foi formulada no primeiro quartel do século XVI, nas Ordenações Manuelinas».

Estas (L. I. T. 62 § 63), reproduzidas nas Filipinas, dispuseram que «por não vir em dúvida qual he Morgado, ou Capela: Declaramos ser Morgado se na Instituição que dos bens os defuntos fizerão, for conteudo, que os Administradores, e possuidores dos ditos bens cumprão certas Missas, ou encargos, e o que mais renderem hajão para si; ou que os Instituidores lhe deixarão os ditos bens com certos encargos de Missas, ou de outras obras pias. E se nas Instituições for conteudo, que os Administradores hajão certa cousa, ou certa quota de rendas, que os bens renderem, assim como terço, quarto ou quinto e o que sobejar se gaste em Missas, ou em outras obras pias: em este caso declaramos não ser Morgado, senão Capella. E nestas taes Instituições, e similhantes, pode e deve entender o Provedor, posto que nas Instituições se diga que faz Morgado, ou que faz Capella, porque as similhantes palavras não haverão respeito, somente à forma dos encariagos».

Para melhor elucidação sobre a matéria pode-se ler «Tratado prático de Morgados por Manuel de Almeida e Sousa de Lobão» – 2.ª edição correcta e adicionada pelo autor –Capítulo X – fls. 148 e seguintes, de onde extratei aquele trecho das ordenações.

A fls. 470, em adições, sintetiza: «Neste reino já havia o que hoje chamamos Capelas, que erão imposições de Missas e Encargos Pios, com que se oneravão os prédios; e isto ia pelos anos de 1314, 1347, 1392, como vêmos no Elucidário de Fr. Joaquim de Santa Rosa debaixo das palavras = Testamento, Missas públicas – Encixamento.

Como adiante referirei, já em 2 de Setembro da era de 1343 (ano de 1305) o rei D. Dinis doou a «Capela de Santa Maria do Campo» (que entendo ser «instituição» e não edifício) à Igreja de S. Nicolau da Feira.

Por «capela» também se chamaram os «ornamentos, peças, trastes de altar e tudo que serve à liturgia», bem como a «todas as alfaias, ornamentos, livros, peças que se costumam empregar na celebração dos diversos ofícios e tremendo sacrifício do altar» (cit. ob. de Viterbo – Vol. 2.0, fls. 68).

*

O presente estudo dirige-se às capelas – edifícios ou seja às que se incorporam no primeiro conceito, embora mereçam especial referência as que como capelas-instituições, se fundaram naquelas, como sucedeu na velha capela de N. Senhora de Campos.

Outras, e foram muitas, serão referidas quando me dedicar ao estudo da Igreja do Convento do Espírito Santo, desta vila.

As capelas, no seu primeiro significado, são para uma localidade, o que a pedra de armas representa para uma família.

Cada uma delas associa-se à história e grandeza do brasão da terra onde foram implantadas.

Pertencem muito a um passado que não podemos deixar em sossego: temos que o agitar a cada passo e momento, exigindo-lhe informações e respostas.

É o que passo a fazer.

*

Além de outros livros, que nomearei oportunamente, encontrei muita utilidade na consulta dos que passo a enumerar, onde, as capelas e ermidas desta freguesia de S. Nicolau, foram inventariadas.

– Catálogo dos Bispos do Porto – por D. Rodrigo da Cunha, 1623:

«O Mosteiro do Espírito Santo esta na Vila do Feira junto do Castelo, he de Religiosos de Santo Eloy, tem quatro Frades. Ermidas, S. Nicolao, N. S. de Campos, N. Senhora do Castelo, São Francisco, Santo André, Santa Margarida, Santa Luzia».

Este descritivo consta da parte II – pág. 247 sob o capítulo «Das Igrejas da comarca da Feira, suas Ermidas, fregueses e rendimentos» – da 2.ª edição publicada em 1742, adicionada por António Cerqueira Pinto.

Como este não introduziu qualquer adicionamento na parte II, como declarou no prólogo da edição de 1742 e exactamente nesta parte é que se faz referência às ermidas (Capítulo XXXIV), temos que aceitar as informações como reportadas ao ano em que o livro foi ao prelo, pela primeira vez, ou seja em 1623.

O autor ao anotar a ermida de S. Nicolau deve referir-se à que estava junto à demolida igreja de S. Nicolau, isto é, a que foi exceptuada no contrato de transferência da sede da freguesia da antiga igreja do mesmo nome para a do Convento do Espírito Santo, desta vila, datado de 17 de Dezembro de 1566.

Parece-me evidente que não se refere à nova igreja, como se deduz da prática usada com outros conventos.

Assim, quando se refere ao de Pedroso diz «Mosteiro de S. Pedro de Pedroso, que foi dos Padres de S. Bento» e a seguir indica as ermidas existentes, no número das quais não figura a igreja daquele mosteiro.

– O «Episcopológio», de Manuel Pereira de Novais, concluído em 1690 e editado por José Pereira de Sampaio / 66 / (Bruno) apenas cita, como ermidas da Vila da Feira, as de S. Nicolau, Nossa Senhora do Castelo, de S. Francisco, de S. André, Santa Margarida, Santa Luzia e Nossa Senhora de Campos.

Vê-se, assim, que se mantiveram todas as ermidas enunciadas em 1623, sem qualquer acréscimo.

– O «Ceo aberto na terra», do padre Francisco de Santa Maria – 1697 – informa (L II, Cap. XLI, pág. 533-537): «Tem mais esta Igreja sette Ermidas: a primeira de N. S. da Encarnação, sita no Castelo, a qual reedificou à sua custa a excelentíssima senhora D. Joana Forjaz Pereira Meneses e Silva, he toda de cantaria sextavada, cousa perfeitíssima. Nella se guardão notáveis relíquias de Sãtos: a segunda he de S. tuzia Virgê e Martyr: a terceira he do Archãjo S. Miguel: a quarta he de todos os Santos: a quinta do patriarca S. Francisco, q se edificou no lugar onde esteve a matriz: a sexta de N. S. da Piedade; a sétima de Santo André.»

Deste texto vê-se que em 1697 e em relação a 1690 – não há referência à ermida de S. Nicolau, à de Campos (o que deve resultar de lapso pois sabemos que ainda existiam em 1707) e à de Santa Margarida: acrescentaram-se a do «Arcanjo S. Miguel», a de «Todos os Santos» e a da «Piedade» (Ver Memórias e datas para a história de Ovar – por João Frederico Teixeira de Pinho).

– «Corografia Portuguesa e descrição topografica do famoso reino de Portugal, com as notícias das fundações das Cidades, Vilas e Lugares que contem varões ilustres, genealogias das Rainhas Nobres: fundamentos de Conventos, Catálogos dos Bispos, antiguidades maravilhosas da natureza, edifícios e outras curiosas observações» – 1707 – pelo padre António Carvalho da Costa, clérigo do hábito de S. Pedro e matemático, natural de Lisboa.

As respectivas licenças do Santo Ofício e do Ordinário são, respectivamente, de 7 e 26 de Janeiro de 1707 e os demais vistos de 4 e 5 de Dezembro de 1708.

Por isso, o seu texto data, pelo menos, de 1707.

Referindo-se à freguesia desta vila, que é a do «Convento dos Cónegos Seculares da Congregação de S. João Evangelista» diz:

«Tem Casa de Misericórdia, Hospital e estas Ermidas: São Nicolao, que era antigamente a Matriz, N. Senhora de Campos, N. Senhora da Encarnação situada no Castelo (cuja Ermida he toda de cantaria sextavada, e tem notáveis relíquias de Santos), São Francisco, Santo André, Santa Margarida, Santa luzia, o Archanjo São Miguel; e outra de todos os Santos» (fls. 107).

Assim, mantêm-se as ermidas mencionadas em 1690, renovando-se a referência às de S. Nicolau, Campos e Santo André, excluindo-se (o que se deve o lapso) a da Piedade.

Deve haver equívoco quando se diz que «São NicoIao era a antiga matriz porque menciona-se esta e a de S. Francisco.

Tendo esta sido implantada onde esteve a de S. Nicolau (como se diz no já referido «Ceo Aberto na Terra» e o mesmo se diz pela pena do vigário Quintela), temos que concluir que a de S. Nicolau devia corresponder à velha ermida de S. Nicolau que foi exceptuada no aludido contrato de 1566.

Pela forma como está redigido aquele texto vê-se claramente que coexistiam em 1707 e anos anteriores (pois o autor diz no prólogo que «para esta obra trabalhou muitos anos nos mais antigos arquivos destes reinos»), a igreja paroquial de S. Nicolau, no convento e as ermidas de S. Nicolau e de S. Francisco no lugar da Misericórdia.

Num artigo publicado no jornal «O Povo Feirense» de 3 de Dezembro de 1938, assinado por V, este afirma que encontrou um exemplar daquela «Geografia» tendo à margem da referência àquelas capelas, uma anotação inventariando outras nos termos seguintes:

«E outra da Piedade, outra de S. Sebastião, capela de Dionísio Pereira homem principal: outra de Santo António na Praça da vila, pequena, para os presos ouvirem missa, a qual mandou fazer o Campelo. É hoje seu capelão o P. Baltazar Joaquim Pereira. Hoje 6 de Junho de 1742.»

Esta informação está errada, em parte, porque a capela de Dionísio Pereira tinha a invocação de S. Miguel e não de S. Sebastião; esta e a da Piedade já tinham sido mencionadas em 1697 no «Ceo aberto na terra», do padre Francisco de Santa Maria.

– Dicionário Geográfico de Portugal, no tocante à freguesia de S. Nicolau, desta vila, segundo as respostas dadas, em 1758, às perguntas do respectivo questionário, pelo vigário da mesma freguesia – padre José de São Pedro Quintela, cónego de S. João Evangelista no Mosteiro da Feira, manuscrito que está guardado na Torre do Tombo (vol. XV, fls. 195 e segt.es): «11.º e 12.º – No lugar em que estava a freguesia de São Nicolau e depois ficou a Capela de São Francisco, se vê hoje a Misericórdia.

13.º – Tem mais esta freguesia oito capelas que são – Nossa Senhora da Incarnação sita no Castelo a qual reedificou à sua custa a Excelentíssima Senhora Dona Joana Forjaz Pereira Menezes e Silva da / 67 / nobilissima casa dos Condes desta vila, he toda de cantaria sextavada cousa perfeita, nella se guardão notaveis reliquias de santos das quais muitas pelo decurso do tempo tem levado descaminho; tem esta capela trez altares, em hum dos quais esta novamente colocada a Imagem de Santa Luzia por se ter arruinado a capela da dita Santa que estava extra muros do mesmo Castelo sem romagem. A segunda he do archanjo S. Miguel sita no lugar de Fijo, he vínculo com obrigação de algumas missas que hoje pertence a Manoel de Gouveia desta freguesia. A terceira é de São Bento sita no mesmo lugar que dizem ser vínculo de Manoel Pereira falcão desta freguesia. A quarta é de todos os santos no lugar de Justas, foi vínculo que finalizou e hoje pertence, por comprar o dito vínculo a Dionísio Ferreira desta freguesia. A quinta he de Nossa Senhora da Piedade Imagem muito milagrosa porem sem romagem pertence ao Povo. A sexta he a de São José sita no lugar da Velha que pertense a José de Freitas desta freguesia. A setima, a de Santo André, sita extra-muros da quinta de Santo André pertence ao Povo. A oitava he a de Nossa Senhora de Campos que foi antigamente freguesia da qual fizemos mensão supra está sita no Lugar de Campos e pertensse ao Povo. Todas estas capelas não tem romagem só a da Senhora da Incarnação como abaixo dizemos: ha mais na prassa desta vila defronte da cadea, e caza da camera della um oratório da Invocação de Santo António para se dizer missa aos Prezos. Todas as sobreditas Capelas e oratória, estão subordinadas a jurisdição Parochial do Vigario desta freguesia.

19.º... Todos os anos no dia vinte e cinco de Março he outra Feira extra muros do Castelo ao pé da Senhora da Incarnação a que nesta terra chama o vulgo a Senhora de Março e por concorrer a esta Capela romagem: neste dia se faz no circuito huma Feira por todo o dia franca.»

Devo notar que este vigário Quintela não era muito cuidadoso na recolha das informações históricas, aceitando-as sem procurar a sua verdadeira justificação, ou copiando de outros que, menos escrupulosos, a tantos induziram em erro.

Assim e com verdade se diz, na nota lançada a fls. 4 v do exemplar que tenho daquele livro: «Foi tal a fúria com que o P. José de São Pedro Quintela desatou a copiar o que o p.e Francisco de St.ª Maria escreveu na chronica das Congregações de Cónegos Seculares de S. João Evangelista (L. II, Cap. XLI, pag. 533 e seg. – ed. de Lisboa 1697) a respeito da villa da Feira que não obstante ser Cónego Secular e Vigário da Paroquia de S. Nicolau (egreja Matriz da referida Villa) não se deu ao trabalho de verificar no mesmo templo a exactidão das informações do p.e Francisco de St.ª Maria e transcreveu ipsis verbis o epitáfio do Conde D. Manoel Pereira, que o p.e Fr.º de St.ª Maria descreve, quando a verdade é que o mencionado epitáfio qual se encontra na Egreja Matriz é totalmente diverso. O seu verdadeiro teor é este – Aqui jaz o muito ilustre S.or Dom Manoel Pr.ª Conde da Feira..,.

Os lugares das sepulturas, como os errou o p.e Fr. de St.ª Maria, também os errou o p.e Quintela. As descritas por ambos, são todas razas e situadas no pavimento da Egreja.»

A este indesculpável erro se refere, comentando, o Dr. Aguiar Cardoso em «Migalhas de História do Concelho da Feira», no jornal «Vila da Feira», número 54 de 12 de Maio de 1921.

No estudo detalhado de cada uma destas ermidas terei ocasião de me referir, comentando, a todo aquele descritivo do vigário Quintela.

*

Consegui tomar conhecimento das seguintes capelas e ermidas, nesta freguesia de S. Nicolau da Feira, que relaciono tendo em consideração as respectivas localidades, que enumero pela sua ordem alfabética: todas as conhecidas foram implantadas na área da vila.

 

Lugar de Campos

A

––

Nossa Senhora de Campos

Lugar do Castelo

B ––

Nossa Senhora da Encarnação

C ––

Ermida de Santa Luzia

D ––

Nossa Senhora de Monserrate

Lugar de Fijô

E ––

S. Miguel

F ––

S. Bento e S. José

Lugar da Igreja

G ––

Ermida do Espírito Santo

Lugar de Justas

H ––

Todos os Santos

Lugar da Misericórdia

I ––

S. Nicolau

J ––

S. Francisco

Lugar da Piedade

K ––

Nossa Senhora da Piedade

Praça Velha (do Dr. Gaspar Moreira)

L ––

S. António   / 68 /

Lugar de Santo André

M ––

S. André

Lugar da Velha

N ––

S. José

Não localizada (1)

O ––

St.ª Margarida

 

(1) - Só esta não me foi possível localizar: a última referência que tenho dela consta da «Corografia Portuguesa», do padre Costa – 1707.

*

Do estudo feito posso concluir: Quanto à sua existência:

Já não existem – A, C, F, G, I, J, L, N, O

Existem, mas profanadas – E, H

Existem abertas ao culto – B, D, K, M

Quanto à sua natureza:

Públicas – A, B, C, G, I, J, K, L, M, O

De administração particular – D, E, F, H, Não

Quanto à O, nada se pode dizer, pelas razões já invocadas.

As invocações escolhidas para aquelas diversas capelas e ermidas podem agrupar-se pela forma seguinte:

 

a – Espírito Santo

b – Nossa Senhora

Campos

Encarnação

Monserrate

Piedade

c – Santos

Santa Luzia

S. Miguel

S. Bento e S. José

Todos os Santos

S. Nicolau

S. Francisco

S. António

S. André

S. José

S. Margarida

 

Na conclusão final, além do mais, farei uma resenha da antiguidade de cada uma das mencionadas capelas e ermidas e das datas, por vezes prováveis, do seu desaparecimento, o que reservo para então, para englobar essa matéria no estudo conjunto de toda a versada nos diversos capítulos.

Notas diversas

Parte das ditas capelas foram inspeccionadas, pelo menos, entre os anos de 1726 a 1886, como consta do livro das «Visitações à Igreja de S. Nicolau da Feira», que teve o seu início em 26 de Outubro daquele ano e tem o seu termo de nova abertura datado de 9 de Agosto de 1834 (época em que foram confiscados os bens do convento).

Este livro, a que faltam as páginas finais (68 a 78 inclusive), ainda existe na igreja.

Foi antecedido, pelo menos, por outro, pois sabe-se pelo livro do padre Jorge de S. Paulo – «Livro e memorial da fazenda deste concelho para se dar princípio ao tombo tão necessário para sua aumentação», muito citado neste trabalho (transcrito, em parte, pelo Dr. Vaz Ferreira, no seu artigo sobre «O Convento da Feira», publicado no Arquivo do Distrito de Aveiro, números 63, 64 e 65), que a nossa igreja foi «visitada» em: 1634 (fls. 36), entre 1649-1660 (fI. 281) e 26 de Setembro de 1705 (fI. 282 v.).

A nossa diocese também foi «visitada» pelo Bispo do Porto (dentre elas algumas deveriam caber à nossa igreja de S. Nicolau e, assim, é possível que se tivessem alargado a algumas das nossas capelas): em 1538, por D. Fr. Baltasar Limpo, entre 1603-1607 por D. Gonçalo de Morais, entre 1619 a 1627 por D. Rodrigo da Cunha, entre 1684 e 1696 pelo Dr. João de Almeida Ribeiro, abade de S. Miguel da Gandra, que foi governador do Bispado e visitador na comarca da Feira por D. João de Sousa e arcebispo eleito de Braga.

Tudo refiro, neste momento, para abrir caminho à necessária investigação sobre aquelas «visitas» que muito interessam ao estudo das capelas e oratórios, como bem serviu aquele livro que ainda se conserva na nossa igreja.

O livro, ou livros, de «visitas», anteriores a este último, deve ter sido confiscado juntamente com o arquivo do Convento do Espírito Santo, desta vila, em 1834, desaparecendo a partir de então, como aconteceu à maior parte desse arquivo que escapou às invasões francesas.

O que ainda existe livrou-se da sorte dos demais, naturalmente por ser o corrente à data daquela abusiva confiscação. / 69 /

Daquele arquivo apenas conheço – por informação do cónego António Ferreira Pinto, que foi distinto professor e reitor do Seminário do Porto, o que diz no seu estudo sobre a «Colegiada ou Colégio do Espírito Santo na Vila da Feira» (cit. Arquivo do Distrito de Aveiro – Vol. 4.º, fI. 81) e ainda os tombos do convento existentes na Biblioteca Municipal desta vila.

Um, formado por 10 livros (com falta do 6.º) e o «Tombo Velho da Igreja de S. Nicolau da Vila da Feira», que abrange o do Mosteiro (Igreja de S. Nicolau) e o da «Igreja de S. Cristóvão de Nogueira da Regedoura anexa ao Convento de S. João Evangelista».

*

Segundo o edital do Bispado do Porto de 6 de Maio de 1785, em conformidade com a providência da rainha D. Maria I – de 16 de Novembro de 1784, foi proibido que «antes de nascer o Sol e meia hora depois delle posto esteja mais algüa Igreja deste nosso Bispado aberta ou Capela» (Copiado no citado livro de «Visitações» em 30 de Março de 1785, pelo vigário António de Pádua Corrêa e Silva – fls. 69 v. a 70 v.).

*

Nos anos santos eram nomeados, para a visitação, para alcançar o jubileo nesta freguesia da Feira, a igreja matriz e algumas das capelas, entre as já referidas.

Assim, tomei conhecimento das seguintes:

a) Pastoral do Bispo do Porto (Dom Frei José Maria da Fonseca e Évora) de 4 de Junho de 1751, segundo o breve do Pontífice Bento XIV de 25 de Dezembro de 1750, remetida com data do 1.º ano de 1751. Em conformidade com estes diplomas o vigário da freguesia de S. Nicolau da Feira – José do Nascimento nomeou para a «visitação das Igr.as qe serão de visitar para alcansar o jubileo nesta freguesia em pr.º lugar esta Igra Matriz e a segda a Igrª da Misericórdia – a 3.ª a Capela de S. Miguel Archanjo sita em Fijô e a 4.ª a Capela de Nossa Senhora de Campos» (fls. 24 a 28 cit..º das Vis.).

b) Edital do Bispo do Porto – Dom Frey João Rafael de Mendonça, Monge de São Jerónimo, de 5 de Outubro de 1776 em que se mandou publicar a extenção do jubileo do ano santo, por virtude do qual o vigário desta freguesia – Tomaz de S. José do Nascimento nomeou para «a vesitação das Igrejas que se hão de vesitar para alcançar o Jubileo nesta freguezia em primeiro lugar esta Igreja; a segunda a Igreja da Misericórdia; a terceira a capela de Nossa Senhora de Campos e a quarta a capela de Santo André...» (fls. 56 a 58 – cit. L. das Vis.).

*

No mencionado livro das «Visitações» encontram-se outras disposições referentes a capelas que julgo conveniente divulgar neste trabalho.

a) «...e na observância de tudo encarrego muito a consciência o Reverendo Parocho como também que não fassa a missa que pessoa alguma se confeçe em Ermidas e capelas desta freguesia excepto nas ocasions declaradas em a Constituição deste Bispo e só nestes podera sêr confessada e no Adro da Igr.ª alguma mulher velha e mouca no caso em que na Igrª haia começo de gente (visitação de 26 de Outubro 1726 fls. 2 v.);

b) «...por sêr informado de que muitos sacerdotes Parochianos desta Igreja dão comunhão a varias pessoas nas Capelas da fregª sem licença do Verº Parocho delle sem que este seja sabedor do referido. Mando que aqui em diante nenhum dos ditos sacerdotes de a comunhão nas das Capelas sem Licª do mesmo Rev.º Parocho sob pena de suspensão (visitação de 10 de Maio 1746 – fls. 18);

c) foi determinado que o Rdo Pároco fizesse guardar a custódia da Igrª e vasos sagrados por pessoas «não só de intra confidencia e probavelide...» e que «seja o todas havidas por legitimos christãos velhos e com as mesmas qualidades e lhe recomenda admita na sua Igrª os sacristaes e o mmo observara nas Capelas desta fregª e concentindo o contr.º se lhe extranhara gravemente» (visitação de 25 de Junho de 1769 – fls. 47);

d) em algumas visitações, há recomendações por vezes muito duras, sobre o estado em que foram encontradas as capelas e suas alfaias: darei nota enquadrando-as no estudo da capela a que respeitarem.

Por ser de ordem geral transcrevo, agora, apenas, o que sobre a matéria consta da visitação de 23 de Junho de 1754, a fls. 30 V. e 31.

«Mandamos que as capas dos calices assim da Capela da Snrª da Piedade como das mais capelas da fregª se dourem as capas pela pte de dentro e tambem as patenas no trº de seis meses e passados elles se assim se não fizer co isso ficara suspenso todo o sacerdote, que com eles celebrar e tambem se encaixarão nas taboas dos Altares todas as pedras de Ara, que o não estiverem.»

*

Finalmente, desejo dar conhecimento da legenda que consta do índice do tombo do convento do Espírito Santo, desta vila, referente ao Livro 6.º, letra C – «Sençª dos Pes contra o Pe José Soares desta villa nos impugnavão a Jurisdição das Cappas desta freguezia em 1730 – fls. 174». / 70 /

Este livro 6.º é o que falta na colecção depositada na Biblioteca Municipal desta vila.

O título é muito sugestivo: talvez pela leitura daquela sentença seja possível colher novos e proveitosos conhecimentos sobre as capelas da época.

Aguardemos que apareça aquele volume ou colecção onde ele esteja integrado.

 

LUGAR DE CAMPOS

A

CAPELA DE NOSSA SENHORA DE CAMPOS

1

Descrição

Esta capela, na sua última estrutura, era muito simples, como se vê da fotografia que se publica.

Situava-se no lugar de Campos, num terreno murado com acesso pela antiga estrada que ligava o lugar do Montinho ao da Cruz.

Estava encimada por um triângulo, tendo no vértice superior uma cruz e nos dos lados, sobre os cunhais da frente, pirâmides, tudo em pedra.

A porta principal, ladeada por janelas com grades de ferro, tinha um motivo sobre a sua padieira, a qual era sobreposta por um óculo, tudo também em granito.

O seu adro tinha árvores.

Ultimamente, sobre o seu muro frontal, havia uma vedação com grade e portão de ferro.

Hoje está demolida, jazendo as suas pedras abandonadas no terreiro onde ela outrora se erguia.

2

História

A capela de Campos foi uma das mais antigas, se não a mais antiga da Vila da Feira.

Para nós, só tem passado.

Felizmente, alguns documentos ainda restam, que nos permitem dar alguns passos na sua história.

Os mais antigos, estão insertos no «Censual do Cabido da Sé do Porto»:

a) «Doaçom que fez el Rey da Capela de santa Maria do Campo aa Igreia de sam Nicolao da feira» – 2 de Setembro da era de 1343 (ano de 1305) – fls. 288.

b) «Carta dei Rey que mandou desenbargar todaIas erdades da Capela de santa Maria de Campos a sam Nicolao» – 7 de Setembro da era de 1346 (ano de 1308), fls. 289.

Naquele título, o rei D. Dinis faz saber «que como os Reis que foram ante mim e eu fezemos manteer a serviço de deus e da ssa madre santa Maria hua capella na Eigreia que chamam santa Maria de Campo na fregesia da Eigreia de sam Nicholao da Ffeyra de terra de santa Maria no Bispado do Porto e dessem os Ihi herdamentos pera dizer hy missa cada dia huum Capellam da dicta capella por que achey que non cantavam hi missa aas vezes nem deziam hi oras com outorgamento da Raynha domna Isabel mha molher e de meu filho Inffante dom Afonso primeyro herdeyro».

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Capela de N.ª Sr.ª de Campos (1890)

Em seguida doa à igreja de S. Nicolau, desta vila, «todos os herdamentos e possisoens e de todas as outras coussas que forom dadas pera mantimento da dicta Capella em tal maneyra que a dicta Eigreia de sam Nicholao aia e possoya livremente pera todo sempre todas as coussas de susso dictas e os Rectores que hi pelo tempo fforem seiam obrigados a theudos a ffazer hy dizer cada dia hua missa naquela maneyra que ata aquy se soya (costumava) a dizere a manteer hua lampada na dicta Eigreia de santa Maria do campo todo o assim de noyte». / 71 /

Outrosim o rei dispôs na mesma doação – «E o clerigo que ouver a dizer a missa em essa Eigreia do Campo diga as horas canonicas com os outros na dicta Eigreia de sam Nicholao Et mais em dia de santa Maria daGosto uaam hy cada anno os clerigos de som Nicholao a dizer todas as horas Canonicas E pera conprirsse todo esto. Rogo ao Onrrado padre dom Giraldo Bispo do Porto assi como ordinayro e dom loahanne Bispo de Lixboa assi como padrom (padroeiro) da dicta Eigreia em sam Nicholao a que ende eu dey o padroado nom come a bispo de Lisboa. Mais come a loham martinz per rrazon da sa pessoa que Conçença em estas cousas e as afirme de guysa que a dicta Eigreia de sam Nicholão e os Rectores que hy fforem seiam teudos por sempre para conprir todos estes carregos de susso dictos...»

Seguem-se as aceitações, terminando: «Em testimonho desto eu sobredicto Rey mandey en fazer tres cartas seeladas do meu seelo e que tenha ende eu a hua e o dicto padrom outra e a dicta Eigreia de sam Nicholao outra. E nos sobredictos bispos fezemos poer nossos seelos nas dictas cartas em testimunho de verdade. Dada em Lixboa dous dias de Setembro – EI Rey o mandou pelo Arcebispo de Bragaa – Affonso Reymondo a ffez – Era de Mil e Trezentos e quarenta e Tres anos. Nos Arcebispo a uimos. EI Rey a uyo».

Deste importante documento conclui-se que:

a) em tempo muito anterior a D. Dinis, um rei de Portugal instituiu uma capela (instituição, nos termos já explicados, e não edifício) na igreja de Santa Maria do Campo;

b) que esta, em 1305, lá estava integrada na freguesia da «Igreja de S. Nicolau da Feira» e, por isso, não encabeçava freguesia diferente desta;

c) a designação que se lhe dá de Igreja, pode bem significar que lhe ficara por tradição, do tempo em que fora a igreja da freguesia autónoma do seu nome;

d) a capela instituída deve ser muito antiga pois já decorrera o tempo necessário para, naturalmente, se aviltar o cumprimento de obrigações contraídas;

e) os benefícios reais de que gozava essa capela e património que lhe foi doado, foram transmitidos com as respeetivas obrigações, por meio de doação, nesse ano de 1305, para a igreja de S. Nicolau da Vila da Feira.

Pelo segundo título apontado vê-se que, depois de feita esta doação, da «capela» instituída na «Igreja» de Santa Maria do Campo, à «Igreja de S. Nicolau» da Feira, o mesmo rei, por carta de 7 de Setembro do ano de Cristo de 1308, mandou «desenbargar todalas erdades da Capela de santa Maria de Campos a san Nicolao», o que se processou nos seguintes termos:

Começa o documento por lembrar que ele dera e doara «a mha capella de santa Maria de Campos com seus dereytos e com ssas pertenças aa Eigreia de sam Nicholao da feira em cuya ffreygesia ela sta, assim come conteudo mais compridamente en a carta da doaçom que ende eu ffiz aa dicta Eigreia».

E explica, em seguida, que João Moniz que fora capelão da dita capela, conforme fora devidamente averiguado tinha feito nos bens delas muitas benfeitorias e acrescentamentos na «dicta vinha assi como logo devissarom per dante eles chantando (plantando) dela per ppe e dela acrescentando em prouageens e que tirara huum terreo (baldio, terra livre, inculta) de Mato e que fezere hy huum pumar».

E porque ele não quisera levantar essas benfeitorias, antes «lhi ffezesse o Prior da dicta Eigreia (de S. Nicolau da Feira) algua coussa aguissada (justa, conveniente) pola bemfeitoria que el hy fezera», o rei declarou as benfeitorias como feitas e que todas as herdades que pertencessem à mesma «Capela» ficassem desembargadas, com a obrigação imposta ao prior de dar ao João Moniz em cada «huum anno em dias de ssa vida por dia de sam Miguel de Setembro quinze libras pelos bens da dicta Eigreia de sam Nicholao da Feira».

Determina, logo em seguida, que «estes dinheiros lhe devem a dar ata que aia alguum benefficio ou ata que aia a Eigreia de santandre de Perzelhi (hoje de Mosteirô) em que diz que for confirmado».

Foi «dada em Coymbra sete dias de Setembro – el Rey o mandou pelo Bispo de Lisboa – Martim anes a ffez – Era de Mil e Trezentos e Quareenta e seis Annos (1308 de Cristo) – Episcopus Vlixbonensis».

Neste documento a redacção é mais imprecisa do que a usada no primeiro, pois diz-se «como eu desse e doasse a mha capella de Santa Maria de Campos com seus dereytos e com ssas pertenças aa Eigreia de sam Nicholao da ffeyra em cuja ffreygesia ela sta».

O confronto deste documento com o anterior de 1305, porém, não deixa dúvida que se trata da capela-instituição e não da capela-edifício e que «Campo» e «Campos» se equivalem.

Confirma-se que esta estava implantada na freguesia de S. Nicolau da Feira, o que exclui a  / 72 / existência, então, de duas freguesias distintas: aquela e a de Santa Maria de Campos.

João Pedro Ribeiro catalogou aquela carta de doação de 1343 (1305) e a de desembargo de 7 de Setembro de 1346 (1308) com as suas respectivas súmuIas (Dissertações, Vol. V, fls. 52).

Do «Livro das Igrejas e Capelas do Padroado dos Reis de Portugal» – 1574, com introdução de Joaquim Veríssimo Serrão, em «Título dalguuas capelas, que se acharão instituidas por alguns reis, iffantes e rainhas, com certos encargos», consta a fls. 54:

– «EI Rei dom Afonso o 4.º instituio huua capella na hermida q chamão santa Maria de Campos, a qual leixou certos Casais na terra de Santa Maria» (fls. 46).

– São obrigados os Reitores q pelo tempo forem da igreja de sancto Niculao da Feira de Sta Maria a fazer dizer na ditta igreja cada dia huua missa, e manter huua lampada na igreja de Sta Maria do Campo por certas leiras q lhe foram leixadas e herdamentos» (fls. 46).

O mesmo livro, a fls. 91, acrescenta sobre «Título das Cartas de Administrações de Capellas q forão apresentadas per EIRei Dom Afonso o 5.º «= A Aluaro Afonso escudeiro de Fernão Pireira a administração dhua capella qe Elrei dom dom Afonso o 4.º, instituio na hermida qe chamão santa maria de Campos, a qual deixou certos Casaes na terra de santa Maria, e el rei dom Affonso 5.º depois deu a administraçam desta capela» (fls. 91).

Lembro que D. Afonso V reinou desde 9 de Setembro de 1438 até 28 de Agosto de 1481.

A segunda notícia já referida, dada a fls. 54, condiz com tudo quanto foi descrito.

Outro tanto parece não suceder com a primeira, também de fls. 54, em relação ao que consta na de fls. 91.

Na verdade, não é fácil compreender que Afonso IV, filho de D. Dinis, instituísse «hua capella na hermida que chamão Santa Maria de Campos», a não ser que se tratasse de outra «Capela-instituição», diferente da que seu pai doara em 1305 à igreja de S. Nicolau da Feira.

Naturalmente foi o que sucedeu, o que justifica a clara referência feita no período inserto a fls. 91.

O referido livro das Igrejas e Capelas do Padroado dos Reis de Portugal» – 1574 – foi publicado em 1971, na cidade de Paris, pelo «Centro Cultural Português» da Fundação Calouste Gulbenkian, com introdução do director deste centro, Joaquim Veríssimo Serrão.

É a transcrição do manuscrito daquele «Livro», segundo a cópia existente no Museu Britânico.

Segundo o prefácio, elaborado por aquele director do Centro, o códice foi redigido entre Julho de 1578 e Março do ano imediato, sob a direcção do Dr. António de Castilho, guarda-mor da Torre do Tombo.

Mais desconcertante é a ordem de sequestro que se passou do juízo das «Capelas da Casa Real sobre a Capela da Snr.ª de Campos», expedida em nome do rei D. João 5.º em 25 de Março de 1717 – cuja cópia consta do tombo do Mosteiro do Espírito Santo da Vila da Feira – Vol. V, fls. 242 (Tombo novo).

Por ela comunica-se «ao provedor da comarca do Porto e a todas as justiças da terra da Feira e a todos os mais distritos destes meus reinos e senhorios de Portugal», para devido cumprimento, que «no livro das Capellas da minha Croa se acha o assento do Theor seguinte = Assento de EI Rei D. Afonso o 4º edificou a ermida de Sta Maria de Campos com certos cazais em terra da Feira qe se apossarão os clerigos da Feira athe lha tirar Alvaro Affonso dessa administração de o ano de mil quatrocentos e sincoenta e hu por carta de EI Rei D. Affonso quinto por sua vida por so assim E escudeiro de Fernão Pereira...»

Em consequência e porque não se sabia, então, quem possuía os bens da referida capela «nem se estes andão alheados ou aforados nem qtº rendem cada hu anno, nem outrosim se os emcargos delle se satisfazem», ordena que se averigue «qe bens, propriadades ou foros pertencem a esta Capela com quem partem, confrontão e qto rendem cada hu anno livre dos encargos e se estes se satisfazem e não estando satisfeito os fareis satisfazer e em tudo qe logo achares logo mandareis fazer sequestro qe não sera levantado sem ordem spicial deste Juizo das Capellas da Coroa Real».

Seguem-se as instruções e ordens necessárias para a execução da ordem dada distinguindo-se, entre elas, o que evidencia bem a dificuldade encontrada no êxito da diligência, que «mandareis por Editais nos lugares públicos delle declarando em como eu faço merce della a pessoa que ir delatada neste Juizo dentro do termo de 4 meses qe se contarão do dia do dito Edital ainda qe seja o mesmo possuidor intruso como assim tenho mandado por decreto meu de 5 de Novembro de 706...». / 73 /

Para que este texto possa ser aceite, exprimindo a realidade que aparenta, embora controversa, temos que admitir que a «capela-edifício» foi reedificada e não edificada por Afonso IV: edificar, porém, deve corresponder a fundar, instituir, acrescer.

Ao redigir o referido tombo surgiu a mesma dúvida pois no seu índice – letra C – Vol V diz-se, na súmula do mesmo documento: «Copia da Ordem de Sequestro qe se passou do Juizo das Capelas da Coroa Real sobre a Capela da Snrª de Campos qe se dizia que el Rey D. Afonso 4.º Reedificara ou edificara a da CapelIa ou Ermida com sertos casais em terra da Frª...» (o sublinhado é meu).

A congregação do Convento reagiu, porquanto do mesmo tombo e volume consta, como lembrança a fls. 246 v. – em comentário aquela ordem de 1717: «A Capella de Campos foy erecta pelos fregueses sem obrigação algua. Dionizio Prª qdo foy Juiz do concelho teve a ordem retro e informandoce achou ser a Capela qe se procurava a de N. S. de Campos cita na frego de S. Martª de Argoncil de Grijó e qe esta informação remetera tres vesas pª o Juizo das Capellas a Lisboaª. os Campos junto à Capela erão passais da Igrª».

Esta informação repete-se no volume 10 do mesmo tombo – a fls. 285.

No estudo da capela de S. Miguel, direi quem foi Dionísio Pereira, proprietário dessa capela e da casa de Fijô, onde ela estava situada.

Aquela explicação merece estudo: a instituição (que chamam edificar) da capela de Campos dizia respeito a uma em S. Martinho de Argoncilhe e não à da nossa vila.

Para averiguar.

Na verdade, na freguesia de Argoncilhe, deste concelho, há uma capela da invocação de Nossa Senhora do Campo, já referida no Santuário Mariano, em texto que deve reportar-se a 1721.

Aí se afirma que o «devoto Santuário de Nossa Senhora do Campo, chamada assim vulgarmente desde os princípios e antiguidade, que é muita, porque se não acha memória nem tradição em todos os moradores daquele campo, de onde tomou o nome, porque a ter outro título, de algum mistério seu sempre se conservava na memória dos velhos, e também lhe chamam Nossa Senhora Aparecida, de onde se confirma este nosso discurso em que se manifestou naquele campo».

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«Porém o nome mais próprio da Senhora é o da Sr.ª Gloriosa Assunção, o que se confirma por memórias antigas daquele Convento de Grijó, e nesse dia é obrigado o Pároco da freguesia a celebrar Missa aos seus fregueses, por ser esta festa certamente o seu Orago, e também porque ali teve os seus princípios a primeira paróquia. E consta do arquivo do Mosteiro que já o era no ano de 1686, como se vê de uma doação que naquele ano se fez na mesma Igreja e declara estava ali fundada por estas palavras: «Fundata in Exirtus vilae de Arguncili» que é o mesmo sítio em que se vê hoje a Ermida da Senhora».

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A propósito desta Capela ver o artigo de F. R. – «Capela de Nossa Senhora do Campo» em «Abraço» – jornal da Paróquia de Argoncilhe – que tem a feição de uma monografia.

São bem diferentes, uma da outra, as invocações de Nossa Senhora do Campo e de Nossa Senhora dos Campos ou de Campos.

Muitas vezes estabelece-se confusão entre uma e outra, quer por deficiência do escriba, quer por erro do copista, que é o que sucede no caso presente em que a nossa capela de Campos foi chamada do «Campo», na falada doação de 2 de Setembro de 1305, e de «Campos» nos demais títulos citados.

Por isso, não nos podemos firmar, naquela distinção, para tirar conclusões.

A fls. 243 e seguintes do mencionado Tombo do Convento, sob o título de «Lembranças» e em apoio da afirmação de pertencerem ao convento aqueles bens da capela, cita-se:

a) o emprasamento feito por Dom Frei Pedro Soares «Religioso da ordem de São Domingos que por dispensação apostólica hera actualmente prior desta Igreja Paroquial de São Nicolau»;

b) outro em 1538 (no índice do tombo diz-se 1537) a Luiz Soares e a sua mulher Madalena Dias, do Cazal de Campos, «dizendo he da dita sua Igreia e foi escrito na Cidade do Porto prollu notário João denis aos 11 do sobredito anno por ordem do vigario geral de porto».

Este emprazamento está transcrito a fls. 222 do referido tombo e vol. e ainda a fls. 173 do L. 4.º do mesmo tombo, abrangendo as seguintes terras: – «Casas, Palheiro, quatro currais de gado, pumar, curtinha, chão de penedo, Chão do Agro e hua Lavoura do Reboleiro, da quinta de Rolaens, e mais outra leira no Reboleiro, da quinta de Rolaens, do Chão do Castanheira / 74 / de Madre e hua Leira ao Largo do do Chão, os Chãos de bayxo do rego».

Tudo se transcreve para um possível confronto em documento que porventura, se venha a encontrar sobre os bens que compunham a «capela».

A fls. 17 e 227 do mesmo tombo e vol. transcreve-se o traslado da sentença do «Breve de Confirmação» (concedido pelo Núncio Apostólico cardeal João Sepontino – com poderes de Legado – à látere, no tempo do Papa Júlio 3.º) daquele emprazamento feito em 1539 – o que também é referido naquelas lembranças, com a indicação do encargo enfitêutico e a indicação de que o mesmo casal já está mencionado a fls. 33 do Tombo Velho (que também existe na Biblioteca da Câmara Municipal da Feira) com a diminuta pensão de «meio tostão».

Fui conferir e, na verdade, assim é.

A fI. 246 do mesmo tombo, em «lembranças», insiste-se no direito do convento à posse daquelas terras, contestada na dita carta de 25 de Março de 1717, nos termos que se reproduzem em fotocópia para melhor conhecimento e para facilitar melhor interpretação. / 75 /

A fls. 232 do mesmo tombo (o novo) está copiado o traslado da sentença e arrematação do Casal de Campos, a requerimento dos P.es contra Antº Jorge de Campos, por não pagar rendas decursas em 1576.

Nas referidas «Iembranças» acrescenta-se que a demanda também teve por fundamento aquele António Jorge se ter investido na posse do referido casal sem título válido, esclarecendo que os padres tomaram posse do casal a 9 de Abril daquele ano.

É duvidoso que este casal seja o mesmo que foi referido como emprazado a Luís Tavares, pois no índice do mesmo tombo (novo), Letra C, Vol. 8.º, fls. I consta «Descambio que fez Diogo Tavares com os P.es em qe elle deo ao Mostº o Casal de Campos e o Mosteiro deo ao do Diogo Tavares os Casais, de Nadais, por escritura, em 1572».

Muitos outros emprazamentos e referências se encontram no mesmo tombo, do Casal de Campos, outorgados pelos padres da Congregação do Convento, como seja em 1598 (L. 4.º, fls. 369), 1623 (L. 1.º, fls. 291), (carta de levantamento de sequestro) 1630 (L. 3.º, fls. 418), (arrendamento do casal), 1642 (L. 5.º, fls. 213) e 1737 (L. 1.º, fls. 160) – o que tudo pode servir de elemento de estudo para a história da capela.

A esta capela de Campos já se referiu o «Catálogo dos Bispos do Porto» (1623), chamando-lhe ermida de N. Senhora de Campos e o «Episcopológio» de Pereira de Novais (1690), chamando-lhe, também, ermida, e com a mesma designação.

«O Ceo aberto na terra» (1697) do padre Francisco de Santa Maria, por equívoco, não a menciona entre as ermidas existentes, ao tempo, nesta vila.

A «Corografia Portuguesa», do padre António Carvalho da Costa (1707), chama-a de N. Senhora de Campos e o vigário Quintela também a menciona nas suas respostas ao inquérito feito para a elaboração do «Dicionário Geográfico de Portugal» (1758) – «A oitava he a de Nossa Senhora de Campos que foi antigamente freguesia da qual fazemos mensão supra esta no lugar de Campos e pertence ao Povo».

Este vigário Quintela diz nas suas respostas, referindo-se à igreja conventual de S. Nicolau desta vila: «era esta freguesia só a que chamam freguesia de cima, sem o lugar de Campos, que hoje se chama freguesia de Baixo, a qual depois se uniu por imposição dos Condes ao Cardeal João Sepontino que era naquele tempo o Nuncio em Portugal. Com os poderes de Legado obteve, e depois se ratificou esta união por uma Bulla de Júlio III, que se guarda no Cartório deste Convento. Da mesma forma a Igreja de S. Mamede de Travanca era anexa in perpetuum a esta freguesia de São Nicolao, como consta dos manuscritos do sobredito cartório».

Não conheço esta Bula de Júlio III, que Quintela diz estar guardada no Convento: a informação merece estudo.

Consultei o índice do tombo deste convento e não a encontrei aí mencionada.

Encontrei o que está registado no Livro 10, Letra S, fls. 44 com a seguinte rubrica «Suplica ao Papa pela Camara e Povo desta vila, a respeito da união desta Igreja e haver vigário na mesma ordem – 1566».

A deterioração do papel torna difícil a leitura do texto: porém, no verso lê-se distintamente «Pera aver Rtor neste Mosteiro em 30 de Abril de 1566 – Gaveta 4 n.º 30».

Aquela súmula e esta anotação mostram-nos que a súplica diz respeito ao contrato que veio a efectuar-se, por escritura de 17 de Dezembro desse ano, entre os freguezes de S. Nicolau e os padres Loios da congregação de S. João Evangelista desta vila, em ordem a mudar-se a sede da freguesia da velha Igreja, sita na Misericórdia, para a do convento desta congregação.

Em 1566 era Papa S. Pio IV, mantendo-se, ainda, como «Legado à Latere» o Cardeal J. Sepontino.

No mesmo tombo também encontrei referência a bulas do papa Júlio 3.º sobre o nosso mosteiro, a nossa freguesia de S. Nicolau e sua anexa de Travanca, mas não deparei com qualquer que ordenasse a união da «freguesia de Baixo» – Campos, à de Cima.

A ser verdadeira aquela informação do vigário Quintela, a capela de Campos, encabeçou uma paróquia diferente da de S. Nicolau, em época que se situou entre os reinados de D. Dinis e D. Afonso IV – e o de D. João III (1521 a 1557).

De todo o exposto, salvo melhor opinião que convença, por sua merecida justificação, creio que:

a) a fundação da «capela de Campos» antecede, em muito, o reinado de D. Dinis que afirmou, como dissemos: «faço saber como os reis que foram ante mim e eu fesemos manteer a serviço de deus e da ssa madre santa Maria hua capella na Igreja que chamam santa Maria de Campo...»; / 76 /

b) naturalmente foi erecta pelo povo e não por qualquer dos nossos reis pois de contrário não se compreende que estes nela criassem «capelas» ou «capelas-instituições» (capelania);

c) o rei D. Dinis doou a capela que tinha na de Campos, com o seu respectivo património, à Igreja de S. Nicolau da Feira;

d) D. Afonso IV engrandeceu aquela «capela», ou acresceu-a com outra;

f) D. Afonso IV não podia, pelo exposto, ter erguido a capela de Campos no seu sentido originário, admitindo-se apenas a vaga hipótese de uma reconstrução, para o que não temos elementos suficientes para um juízo de certeza;

g) não se pode afirmar que ela tivesse sido sede de freguesia, quer antecedendo, quer coexistindo com a de S. Nicolau;

h) é possível que, uma ou ambos destas hipóteses, se tenham verificado, até sucessivamente, dado o nome de «igreja» que lhe foi atribuído no tempo de D. Afonso IV (embora a declarasse incorporada na freguesia de S. Nicolau), no que se pode ver (o que não é obrigatório concluir em face do que já se expôs) o reconhecimento de uma situação de facto anterior, lembrada através dos tempos pela distinção que tal título conferia;

i) esta possibilidade resulta do facto do rei D. Dinis ter doado à Igreja de S. Nicolau, em referência à mencionada capelania de Nossa Senhora de Campos «Todos os herdamentos e possisões e de todas as outras cousas que foram dadas para mantimento da dita Capela», proporcionando, assim, a criação de uma nova capelania por parte de D. Afonso IV na mesma capela de Campos e, ainda, do que nos diz o vigário Quintela.

A este rosário de dúvidas pode-se acrescentar uma grande interrogação:

Porque escolheram os reis de Portugal esta capelão de Campos para a ligarem às suas capelanias?

Quais os fundamentos históricos que motivaram tal distinção ou justificaram tão importante apoio económico à velha ermida?

Nada posso esclarecer.

Quanto à designação que lhe foi dada de igreja: daí não se conclui à evidência, ela ter sido sede de freguesia.

Segundo Viterbo – no seu Elucidário (Vol. 2.º, fls. 320 e 321) a palavra igreja – comportou muitos significados, além de outros, de uma pequena porção de um bispado, «governada por um pároco, ou pastor a que chamamos paróquia ou igreja paroquial», e ainda «se tomou igreja por um edifício separado de tudo o que era indecente e profano e particularmente consagrado para tributar religiosos cultos ao verdadeiro Deus». E acrescenta, o que merece especial atenção pelo significado ainda hoje abraçado – «...o tempo introduziu chamarem-se matrizes às igrejas paroquiais, não só quando chegaram a ter outras anexas, obediências, subalares, sucursais e dependentes mas ainda quando só tinham algumas capelas, oratórios rurais, em que os montanheses e distantes recebiam alguns dos sacramentos».

V, no já referido artigo sobre Santa Maria de Campos – (Povo Feirense de 3 de Dezembro de 1938), diz: «D. Dinis chamava-lhe «igreja» título de categoria que em recuadas eras se dava a certos templos mesmo não paroquiais. Eram as tais igrejas «simples» como ainda hoje o são a dos Clérigos, dos Congregados e a nossa «igreja» da Misericórdia».

Aquelas e outras congéneres, por certo, receberam a designação de igrejas, por serem os templos de congregações religiosas, do mesmo modo que foram designados os templos das Misericórdias.

Devo lembrar que, em muitos documentos antigos, se designavam por «igrejas» templos modestos, ao contrário do conceito majestoso e de distinção que hoje é, vulgarmente, atribuido àquela palavra.

Convém lembrar, novamente, que as afirmações feitas pelo Vigário Quintela, nas suas respostas ao questionário, nem sempre foram escrupulosamente estudadas, como aconteceu com as referências erradas que fez às inscrições dos túmulos dos Condes da Feira, apesar de dizerem respeito à sua própria igreja.

Do mesmo modo podia ter laborado em erro quando falou da freguesia de Nossa Senhora de Campos, tanto mais que referiu facto que, para ele, já era muito remoto.

No mesmo artigo sobre Santa Maria de Campos – III (Povo Feirense, número 33 de 10 de Dezembro de 1938 publicado em continuação daquele do dia 3) V desenvolve o seu raciocínio, sobre a matéria, nos seguintes termos:

«assim não era em tempo de EI-Rei D. Dinis que se expressou (vid. supra): «Igreja de Santa Maria do Campo na freguesia da Igreja de S. Nicolau da Feira» E nem no Rol das Igrejas da Terra de Santa Maria de 1320, nem nas Inquirições dos monarcas da primeira dinastia, nem nos mais antigos censos da população do paiz se encontra a menor prova do asserto que nunca logramos respigos em centenas de documentos que nos têm passado / 77 / pelos olhos. As designações «freguesia de baixo» e «freguesia de cima» devem ser puramente diferenciativas ou então referência a Travanca que durante séculos foi simples «capela» ou curato anexo à igreja de S. Nicolau, cujo pároco eclesiasticamente a governava por intermédio de um cura ou vigário de sua nomeação. Quanto a Santa Maria de Campos haver sido a primitiva sede da paróquia da Feira, é conjectura provável e inteiramente admissível. Porquanto, muito antes da actual organização e circunscrição das paróquias (cit. Povo Feirense, número 30 de 20 de Novembro de 1938) que deve remontar aos fins do século 12.º ou começos do 13.º, já os povos se aglomeravam em torno de suas igrejas ou ermidas com ministros especialmente deputados ao culto delas pelos respectivos padroeiros ou entidades de direito».

V., no seu citado estudo, chega a fantasiar quando afirma «por demonstração sem réplica»!) que esta capela deu o «nome de Santa Maria ao primitivo núcleo junto às margens do rio Caster».

Ainda encontramos várias referências a esta capela no mencionado livro das «Visitações» à Igreja de S. Nicolau da Feira. Na de 10 de Maio de 1746: – «E por não ter tempo de visitar pessoalmente a CapelIa da Sr.ª de Campos foi visitada de minha comissão pelo Rdo Vigário desta Igrª e por achar não tinha pedra de Ara e opas mando se lhe ponha huma Logo e no entanto que se não poser nella se não diga missa»;

8 Agosto 1805: – «A Capela da Senhora de Campos, precisa de reparos, tanto no Frontespício, telhados, forro e solho do pavimento e necessitada dos paramentos precisos para a decente celebração do Santo Sacrifício da Missa à excepção do Calix, Corporaes e bolça dos mesmos, toalhas do altar e Sanguineos: pello que enquanto se não concertar o material da dita Capella e provêr de paramentos a suspendo e só será permitido celebrar nella para Sacramentar se algum infermo ou no dia de sua Festividade, levando-se os Paramentos competentes da Igreja e se deve também compôr o Missal: e a Pedra dAra: e sendo-me zelado, que alguns moradores vizinhos da mesma Capella se tem servido della para usos profanos, o Rdo Párocho fara chamar a si a chave da dita Capella e conservara em seu poder não a dando senão para o fim a que he dedicada»;

2 de Novembro de 1813 «...e logo que a Capella de Nossa Senhora de Campos esteja decentemente provida do necessário para a Celebração do Santo Sacrifício da Missa, o mesmo Rdo Párocho poderá permitir que nella possa celebrar qualquer sacerdote e ainda antes, levando-se os Paramentos competentes à Cor do dia, no que encarrego a sua consciência».

13 Outubro de 1840 – «Que sendo muito conveniente que as CapelIas de N. Snr.ª de Campos e Santo André d'Arrifaninha se ponhão em estado de celebrar com decencia o St.º Sacrificio da Missa para maior comodidade dos Povos, ordeno que pellos meios competentes se ponhão no referido estado de nelas se celebrar» (a esta Visitação chama Revista).

Do mesmo livro das Visitações consta, em conformidade com a Pastoral do Bispado do Porto de 4 de Junho de 1751 (com breve do Papa Bento XIV) que, para a extensão do jubileu do ano Santo, o vigário nomeou para a visitação das igrejas que se deviam visitar para alcançar aquele jubileu nesta freguesia de S. Nicolau «em 4.º lugar, a Capela de Nossa Senhora de Campos» e, conforme o edital de 5 de Outubro de 1776, «em 3.º lugar a mesma Capela de Nossa Senhora de Campos».

A capela foi decaindo com o andar do tempo, apesar de diversas reparações que se tornaram insuficientes para a sua sobrevivência.

Às ordens impostas nas visitações sucederam-se apelos, mas tudo veio a ser em vão: atrasou-se, o que já foi muito, a sua demolição.

Entre as principais obras de restauro conta-se a feita, na segunda metade de 1905, por uma comissão de feirenses, composta pelo pároco da vila, o padre Manuel André Boturão, Manuel Maria Correia de Sá, (escrivão-notário), Dr. António Joaquim de Andrade (advogado) e Manuel José da Cunha Sampaio (industrial): importaram em quantia superior a 300.000 reis. Estavam concluídas em Novembro, constando de reboco das paredes, novo telhado, pintura de portas, com restauro do altar que foi prateado.

Foi também reconstruído o muro que vedava o pequeno largo fronteiro, sendo colocado, sobre ele, um gradil de ferro com o respectivo portão.

Em 1916 recebeu outro grande restauro, sendo restituída ao culto em Dezembro desse ano.

As obras devem-se a um grupo de senhoras desta vila sob a direcção de D. Dores Menéres (mulher de Fortunato da Fonseca Menéres) e D. Maria do Carmo Cardoso (mulher do Dr. António Augusto de Aguiar Cardoso) com a cooperação deste grande feirense e do padre Tomaz Fernandes Pinto (que veio a ser cónego e secretário do Bispo-Conde de Coimbra).

Importaram em 205.450 reis; os restantes – 50 000 reis – que conseguiram angariar foram entregues à Cruz Vermelha Portuguesa.

A década de 40 foi funesta para a velha capela.

Já em Março de 1941, o «Correio da Feira» levantava o grito para a sua salvação por meio de obras urgentes: o mesmo jornal, em Novembro de 1946, levantou / 78 / de novo o alarme informando que a parede do nascente se tinha desnivelado estando prestes a desmoronar-se e a arrastar, na sua queda, o resto da edificação.

Em 1947 foi mandada apear a capela por uma comissão presidida pelo pároco da nossa freguesia, padre Pinho Nunes o que, em repetição do que este anunciara na igreja, foi divulgado pelo comunicado que ele publicou no dito jornal, número 2578 de 1 de Maio desse ano: «Esta Comissão procedeu à demolição da Capela depois que ela principiou a cair e por julgar, perante a ruína total, que era a única forma de aproveitar os materiais».

Este jornal, no seu número 2525 de 19 de Abril desse ano, protestando contra o método adoptado para a sua demolição, observa, com louvável grito, em memória da capela de Santa Maria de Campos, de tradições tão antigas: «Já não existe a velhinha. Existe, sim, o esqueleto desmontado, fragmentado, frontal para ali, parietal para acolá, clavículas mais além, tudo numa amálgama censurável: isto é portaes, cruzes, esquadria, pedras, tudo num montão de pedreira e o que era madeiramento foi levado para o lume. Até a porta da frente, presumida de castanho, desapareceu ignorando-se se foi aquecer também algum forno de padeiro...».

Decorridos tantos anos as suas ruínas ainda se encontram no mesmo estado de abandono à espera do dia da sua ressurreição, justamente deseiado por muitos.

3

DIVERSOS

a

Património

Imóveis

Já disse que na ermida de Santa Maria de Campos foi instituída uma ou mais capelas reais com doação de bens imóveis entre os quais se contava o já falado «Casal de Campos» e creio que o «Serrado de Campos», «junto a Campos», mencionados pelo P.e Jorge de S. Paulo no seu referido «Livro e memorial da fazenda deste convento...» e em muitos passos do tombo deste convento, o do Espírito Santo, desta Vila da Feira. 

Árvores

O antigo adro da capela, em tempos idos, foi bem arborizado como se conclui do mesmo «Livro e memorial... a fls. Z77:

«Lembrança a respeito das árvores do Adro da Snr.ª de Campos: «Aos 22 dias do mes de Junho de 1793 foi trazido para esta casa, como pertencendo a ella – hum cedro que tinha aparecido cortado no Adro da Snr.ª de Campos, de cuja condução forão testemunhas de vista Joaquim Rebelo e seu filho Pedro, Manuel Ferreira do Casal, João Ferreira do Seixo, Manuel José da Costa Berlengas do Montinho, Antónia Gomes da Costa Catarino, Francisco Ribeiro, seu f.º Teodózio e António Ferreira todos de Campos e muitas mais pessoas do mesmo lugar. E para a todo o tempo constar, e os moradores do mesmo lugar, e mordomos futuros não se apegarem as mais árvores q.e se achem ou houverem de existir no Adro da Capela fiz esta clareza e a declaração eu M.el da Cunha Teix.ra e Andr.de».

E ainda a fls. 287:

«No dt.º anno (1725) mandou plantar os castanh.os novos q.e estão no adro da capp.ª de N. Sr.ª de Campos e no dt.º a mandou arrancar hum carv.º o qual serve hoje de feixo do lagar; e de torão outro, qe a lenha veyo p.ª este convt.º :e já no tempo do Pe R. Bras da Purificação se mandou arrancar no mesmo sittio outro carv.º de que se fez hum tonel, q.e hoje ha na casa».


Bens mobiliários

Também possuía bens mobiliários, como é natural. Destes apenas conheço o que diz o padre Jorge de S. Paulo – no seu referido «Livro e memorial deste convento... (o de S. João Evangelista desta vila).

A fls. 51 – depois de ter relacionado os «ornamentos» – no inventário da sacristia do Convento: «Esta mais hua vestimenta nova que he da hermida de Nossa Snr.ª de Campos que se fez à conta dos quarenta mil rs que deixou G.ar Lopes, como adiante diremos».

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A seguir, a fls. 52: «outro calix com o pé de Iatão que foi o que nos deram os fregueses que fizeram o contrato de mudança da freguesia (à margem) «está em Campos» (cit. Arq. D. Av. – Vol XXVII, fls. 46).

§ 7.º «Gaspar Lopes, de Campos que morreu na India mandou quarenta mil reis para a senhora condeça (D. Maria de Gusmão, viúva do Conde D. João) os gastasse em alguma obra da ermida de Nossa Senhora de Campos: destes 40$000 reis se fizeram dois castiçais compridos lisos, e um calix pequeno de prata com sua patena e as galhetas de prata pequenas com seu prato, e um frontal de chamalote de lã e uma vestimenta da catalufa sem alva nem amicto. Tudo isto se deu no meu último ano que foi 1638».

Imagem da Nossa Senhora de Campos, que foi transportada para a Igreja Matriz, quando a capela foi demolida.

«O P.e Manuel da Purificação sendo reitor desta casa no 2.º ano que foi o de 1669 achou dois calix de prata na sacristia um que era de Nossa Senhora de / 79 / Campos muito pequeno e quebrado por quatro partes na copa e outro pouco maior e muito delgado que parecia de folha de Flandres, e um vaso do Sr. sem cobertura. Achou por mais acertado fundir esta prata e mandou fazer três cálices que não pôde doirar por lhe faltar dinheiro e fez a cobertura do vaso do Snr. de uma patena que não tinha serventia e o mandou dourar: e fez um vaso grande de lavatório para a comunhão, para quinta feira maior quando andavam dando lavatório por um púcaro de barro» (cit. Arq. Dist. Av., Vol XVII, fls. 49).

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Imagem de S. José que pertenceu à Capela de Nossa Senhora de Campos e está depositada na sacristia da Igreja Matriz.

O referido Gaspar Lopes, de Campos, que mandou os 40$000 à Condessa D. Maria de Gusmão e morreu nas partes da Índia «era filho de Pero Lopes, de Campos; deixou em seu testamento, que se comprasse fazenda para todos os sábados se disser uma missa em Nossa Senhora de Campos pelas almas de seus pais e avós e por sua tenção, o que consta de seu testamento que está em poder da senhora condessa D. Maria de Gusmão. Este legado ainda não está aceite em capítulo nem em visitação» – fls. 260 (Cit. livro do P.e Jorge de S. Paulo – no Arq. Dist. Av., Vol. XVII, fls. 56).

Quando foi demolida a capela, transitaram para a igreja matriz a imagem de Nossa Senhora de Campos, que está no altar de S. Francisco e uma de S. José que está na sacristia, ambas de madeira, que se reproduzem em fotografia.
 

B

Confraria de Nossa Senhora do Campo

Do referido livro do padre Jorge de S. Paulo consta: «§ 12 – no campo que nos deu António Rodrigues para a cerra tinha parte nele a confraria de Nossa Senhora de Campos e se pagava de foro à dita confraria, meio tostão.

No ano de 1568 comprou o padre reitor Francisco de Sam Tiago (1568-69) este foro à dita confraria por dois mil e quinhentos reis, o que consta do livro 6.º, fls. 30 (cit. Arq. Dist. Av., Vol XVII, fls. 52).

Ainda do mesmo livro do P. Jorge a fls. 36, verso (§ 6.º): – «Quando nesta casa (convento) se faz algum officio da confraria de Campos manda o tesoureiro vinho para as missas e pelas hostias que lhe damos nos dá o dito tesoureiro pelo Sam Miguel hua quarta de trigo q he Couza bem limitada».

A esta Confraria também se faz referência no Tombo Novo do Convento de S. João Evangelista, desta vila – índice – Letra C, Vol. 3.º, Petição do P.e Reitor à Confraria da Sr.ª de Campos – fls. 292».

Encontrei outra referência no mesmo tombo (a fls. 101 v.) – «No Montinho – Campo junto das Casas / 80 / em que vive Manuel da Costa... confronta norte com a estrada e o Montinho e com terra que possue Domingos Ferreiro de que he senhorio a Confraria de Campos...» Reconhecimento feito por aquele Costa ao Convento dos Loios em 8 de Agosto de 1705. 

c

Festa de Campos

Durante anos e desde tempos muito antigos realizavam-se festejos na capela de Campos e junto a ela.

Neste século tiveram lugar, segundo apurei, em 17 e 18 de Outubro de 1903 – «festividade em devoção da Senhora da Saúde, Sant’Ana e S. José tocando, no local, duas bandas de música e em 27 e 28 de Julho de 1907 com «músico, arraial e fogo hoje (27) e missa solene, sermão e procissão amanhã (28). Nossa Senhora de Campos, Sant’Ana e S. José» tocando as filarmónicas de Souto e de Arrifana («Correio da Feira», respectivamente, de 10 de Outubro de 1903 e 27 de Julho de 1907).

Por estas referências tomamos conhecimento das imagens que existiam na capela e da veneração que lhes dedicavam.

Como já referi ainda axistemas imagens de Nossa Senhora de Campos e a de S. José.

d

Administrador da Capelania

Apenas consegui identificar Alvaro Afonso, do tempo de D. Afonso V, escudeiro de Fernão Pereira, primeiro senhor do Castelo da Feira (1448) e terceiro das Terras de Santa Maria (1453), pai do primeiro conde da Feira – Ruy Vaz Pereira.

e

Capelão

Tenho conhecimento de um.

João Moniz que exercia este cargo em 1305, como consta da carta de 7 de Setembro de 1308, em que D. Dinis mandou «desenbargar todas as herdades da capela a S. Nicolau», como já referi.

 

LUGAR DO CASTELO

B

CAPELA DE NOSSA SENHORA DA ENCARNAÇÃO

I

Descrição

Muito próximo do castelo da Feira, quase pegada à sua muralha poente, existe, desde tempo imemorial, uma capela, da invocação de Nossa Senhora da Encarnação que, além deste nome, já havia recebido o de «Santa Maria do Castelo» e veio a ter, também, o de «Santa Luzia» e o de «Senhora de Março».

O Dr. Vaz Ferreira, no seu «Ferro Velho» – Descrição oficial do Castelo da Feira – I, II, III («Correio da Feira» de 20 de Dezembro de 1952, 3 e 10 de Janeiro de 1953), transcreve as informações que deu para a elaboração do «Cadastro dos bens do domínio público» no tocante ao castelo, sua capela, sacristia e casa do capelão ou do guarda.

Nesse estudo descreve, pormenorizadamente, tudo quanto passo a referir.

«Capela da Senhora de Março da invocação de Nossa Senhora da Encarnação.

Foi reconstruída em 1656 pela condessa D. Joana. É hexagonal, medindo, cada uma das seis faces externas, 7, 7,5 a 7,95 metros e é toda construída em alvenaria no exterior, com cunhais, frisos e cimalha de granito, tendo seis pirâmides com seus pedestais, tudo de granito, pousadas sobre os cunhais. À cobertura de cimento para vedação falta sobrepor o telhado (foi posta a telha nova em Agosto de 1945). A porta principal é artisticamente ornada com pilastras bem trabalhadas e entabelamento de granito. Por cima e igualmente ornada há uma rosácea octogonal com vitral representando a cruz dos Pereiras, posto em Agosto de 1938 pela Comissão de Vigilância.

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Antigas fotografia da Capela de Nossa Senhora da Encarnação, com a casa que a faceava pelo norte.

 

Na face seguinte, para o norte, tem outra porta lateral, simples. No interior é toda revestida e abobadada de cantaria simples mas bem lavrada. Nos ângulos sobre os frisos estão seis figuras de pedra, de tosca escultura, simulando animais que sustentam escudetes. Tem três altares e nas outras faces três tribunas com balaustres de pau preto. Às duas, sobranceiras às portas para o exterior, dão acesso escadas de pedra estreitas e cavadas na grossura das paredes. A sobre a porta da sacristia comunica com a casa antigamente do capelão e hoje do guarda.

Os três altares são ornados de talha em madeira, de grande relevo, com as pilastras artisticamente idênticas, / 81 / às da porta principal e estão douradas excepto o 3.º. O altar do meio, em frente da porta principal, é de Nossa Senhora da Encarnação com sua imagem de madeira bem esculpida e encarnada. Tem por cima, entre a talha, uma tela pintada representando a Anunciação. No altar ao norte do anterior há entre as pilastras telas pintadas representando Santa Luzia e a Rainha Santa Isabel. Está nele a imagem pequena de pedra, com encarnação antiga, da Santa Luzia, dantes pertencente à capela de Santa Luzia perto da tenalha e que ruiu entre 1741 e 1758. Fôra recolhida por vizinhos e o seu possuidor Henrique Brandão restituiu-a ao culto, entregando-a à capela actual em 1893.

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O terceiro altar, para o sul do principal, teve de ser restaurado e conserva-se no preparo branco sem douradura. Tem, entre as pilastras, duas telas representando Santos. Está nele a imagem da Santa Luzia, do mesmo tamanho e feitio da da Nossa Senhora da Encarnação, que a Condessa D. Joana colocou no altar a ela destinada e foi substituída pela antiga em 1893. Serve para o andor na festividade de 25 de Março, restaurada há dois anos.

Entre o altar de Santa Luzia e a porta lateral há um púlpito com balaustres de pau preto sustentado por um suporte de granito esculpido. É pertença do Castelo da Feira.

Casa do guarda, antigamente chamada casa do capelão. Adquirida pela Comissão de Vigilância em 12 de Novembro de 1927. O quintal referido na matriz predial era um logradouro incultivável sobre rocha.

Foi em 1940, entregue à Câmara Municipal para isolamento do castelo e abertura da estrada envolvente. Tem o cunhal único ao oeste-sul de cantaria encimado por uma pirâmide ornamental como as da capela.

Sobre o telhado, pousada na frontaria e sobre duas varandas, está a sineira de cantaria. Tem no rés-do-chão a sacristia da capela com uma porta para esta e outra para o exterior, à frente e dois postigos.

Esta sacristia foi há meses restituída à sua função, deslocando-se um armário que tapava a porta do lado da capela e desemparedando-a do outro. Ao lado da sacristia e com outro postigo há uma parte aterrada quase até ao tecto. No andar superior tem varandas para a frente e, para o sul, a porta com escada exterior de pedra encostada à frente do cubelo da entrada e à barbacã. Está dividida em duas salas à frente e outros comodos atrás, onde há uma chaminé com lareira. Uma das salas tem porta para a tribuna referida.

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Capela de Nossa Senhora da Encarnação: – arco do altar do centro, encimado pelo brazão dos Condes da Feira (Pereiras); tela representando a Anunciação; nos ângulos, sobre os frisos, as figuras de animais com escudetes.  

É pertença do Castelo da Feira.»

O mesmo Dr. Vaz Ferreira, no seu estudo «Castelo da Feira – onde nasceu Portugal» – publicado no cit. Arquivo do Distrito de Aveiro, Vol. lV e V (1939) pormenoriza este descritivo dizendo «Ladeiam a porta lindas pilastras lavradas semelhantes às da talha branca e dourada que guarnecem, no interior, os altares. Desenvolvem-se em duas volutas partindo-se entre elas o perfil com graciosa reentrância e prolongando-se na face pendente da de cima o relevo duma folha de acanto. Parecem-se muito com as que existem na sacristia / 83 / da igreja de S. Francisco em Guimarães. Sobre o entablamento da porta outras iguais pilastras, sobrepujadas por frontão curvo interrompido, enquadram o odógono da rosácea que foi, este ano, guarnecido com um vitral representando a cruz branca floreada e aberta no campo vermelho dos Pereiras, a expensas da Comissão de Vigilância, que também reparou o altar de Nossa Senhora, o púlpito e todas as balaustradas de pau preto.»

Na generalidade podem-se aceitar, como actualizadas, estas descrições.

Juntam-se fotocópias de plantas da capela, sacristia e casa do guarda, que, com outras, documentam os números 37 e 38 (o Castelo da Feira), do Boletim da Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais – Monumentos – e, em parte, foram fornecidos à Câmara Municipal da Feira.

A Comissão de Vigilância projecta, em breve, aproveitar a sacristia, dividindo-a, para a construção de sanitários, com seu vestíbulo e de um compartimento para arrecadações em benefício da casa do guarda que, também será valorizada com uma casa de banho: reserva-se espaço suficiente para a sacristia.

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Castelo da Feira, capela da Nossa Senhora da Encarnação, sacristia e casa do guarda (vista aérea). .  

Para evitar repetições, conforme se for desenvolvendo o trabalho, vou comentando alguns passos daquela descrição. Porém, desde já lembro que, como adiante procuro justificar, a ermida de Santa Luzia deve ter caído entre 1755 e 1758 (e possivelmente de 1755 a 1756) e esclareço que os dois altares laterais são encimados por óculos para serventia de luz e ainda que a sacristia tem outra porta que deita para as traseiras, voltada para a muralha do castelo.

Ao contrário do que anteriormente se disse, verifica-se que o altar da direita está pintado, em parte.

Também esclareço, como adiante refiro, que no actual cadastro dos «Próprios Nacionais», o registo da capela está feito em termos semelhantes aos apontados, embora não iguais.

Sobre o arco central que guarnece o altar do meio, encontram-se as armas com o brasão dos Pereiras.

Não encontrei na Repartição de Finanças o livro de cadastro com a descrição referida.

Encontrei, porém, no arquivo da «Comissão de Vigilância pela Guarda e Conservação do Castelo da Feira», um modelo n.º 568 – Cadastro dos Bens do Domínio Público – datado de 31 de Dezembro de 1940, escrito pelo próprio punho do Dr. Vaz Ferreira e por si assinado como presidente da aludida «Comissão de Vigilância», em que tudo se descreve como consta dos mencionados «Ferro Velho».

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Postal com a vista aérea do Castelo da Feira e capela da Nossa Senhora da Encarnação.

Este documento está transcrito no livro II do «Registo de documentos oficiais antigos e modernos da mesma Comissão, com o seguinte averbamento – «Nota no fim da 1.ª página 4119/4 – aposta na Repartição do Património».

*

Esta capela, nos séculos XVI e XVII, era conhecida por «Nossa Senhora do Castelo».

Assim a chamam no foral concedido por D. Manuel I à «Vila da Feira e Terra de Santa Maria» em 1514, pelo P.e Jorge de S. Paulo, no seu «Livro e memorial da fazenda...», do Convento do Espírito Santo, da vila da Feira, de 1616, por D. Rodrigo da Cunha em «Catálogo dos Bispos do Porto», 1623 e por Pereira de Novais no Anacrisis Historial (Episcopológio), de 1690. / 84 /

No fim do século XVII já era conhecida por «Nossa Senhora da Encarnação», como se vê no trabalho do padre Francisco de Santa Maria em «O Ceo aberto na terra», 1697.

Deste modo foi designada nos séculos seguintes, como se vê do tombo da Casa e Estado do Infantado, em 1703, pelo padre António Carvalho da Costa, na «Corografia Portuguesa», em 1708, pelo padre José de S. Pedro Quintela, na resposta ao questionário para a elaboração do Dicionário Geográfico – 1758 e em muitos outros autores.

No tombo da mesma Casa, feito em 1755, ainda a denominam por «Nossa Senhora do Castelo».

O Dr. Vicente Carlos de Sousa Brandão em artigo que, em 1841, publicou no Panorama (Vol. 5.º, pág. 370) disse, referindo-se à vila da Feira «foi reputada cidade e eram suas armas a imagem de N. Senhora com o menino nos braços sobre uma nuvem pousada num castelo, à qual depois se chamou a Senhora do Castelo Velho».

Na capela ainda existe uma velha imagem com esta invocação. É possível que a designação de «Nossa Senhora da Encarnação remonte à reconstrução da capela pela condessa D. Joana, em 1656, que mandou colocar nela a imagem daquela Nossa Senhora.

Em diversos textos também lhe chamaram capela de Santa Luzia, como seja na acta da sessão da Câmara Municipal da Feira, de 25 de Janeiro de 1843 e no livro de arrematações desta Câmara (fls. 14 de 29 de Janeiro de 1871), «auto de arrematação da obra do muro e rampa de pedra no adro da capela de Santa Luzia e na frente do Castelo desta vila».

Popularmente a capela foi e ainda é conhecida por «Senhora de Março», ou «do Castelo».

2

História

Desconhece-se a data da sua fundação e são poucas as notícias que dela temos até à sua reconstrução em 1656.

A informação mais antiga é-nos dada pelo referido foral concedido por D. Manuel I, à «Vila da Feira e Terra de Santa Maria», em 10 de Fevereiro de 1514.

«E outras defesas que traz o Castelo – a saber

...E outra junto deste E outra de santa Maria do Castelo (fls. I j).

...   ...   ...   ... ...   ...   ...   ... ...   ...   ...   ... ...   ...   ...   ... ...   ...   ...   ... ...   ...   ...   ...   ...   ...   ... ...

E paga sse mais polla capella de samta maria do Castello aa Coroa Real a saber. pollo cazal que for de Lourenço do Castello e pollos filhos de Jorge martiz seus herdeiros pollas Remdas e herdades da capella o que se segue. a saber. de trigo seis alqueires e de çevada sete alqueires e meio. E de milho seis alqueires da qual paga vem aos filhos de Jorge estevez isto. a saber. de trigo dous alqueires. E de çevada dous alqueires e quarta. E de milho hum alqueire e meo e os quaes paga pedro eanes.

E paga sse mais per outro casal que for de pero martiz que he todo da dita capella de trigo çinquo alqueires e quarta de çevada e outros çinquo alqueires e quarta de milho seis alqueires.

Paga mais gonçallo eanes de Villa boa polla Vynha da capella que estaa açima dos pellames de Vynho molle quatro almudes. E ssoya de pagar o manystrador desta capella polla vinha das eiras junto de Vasquo Fernandes huu puçal de Vynho o qual se ora nam paga porque nam he já Vynha. E a terra delle fica foreira a nos no foro que se der per quem os direitos Reaaes da dita terra tiver. E paga aluaro pirez por pero de aragam que for de fernando eanes de Vynho molle quatro almudes (fls. IIIj vº).

E paga mais Joham da ponte pollas Redas de santa maria do Castello e nos cincoenta e quatro Reaaes E pero de aragam polla mesma capella de çevada çinquo alqueires e quarta.

E as outras rendas e foros da dita capella posto que atee quy andassem nos tombos da dita terra mjsticamete com as outras Rendas nossas Ouvemos por bem de as apartar deste tombo nosso E pagaram / 85 / porem aa capella os direitos a ella obrigados e os foros que sempre pagaram ou per direito deverê de pagar.

(Forais do Distrito de Aveiro – Foral da Feira por Dr. Rocha Madail, no Arquivo do Distrito de Aveiro – Vol. V, pag 19).

Estes preciosos textos dão-nos, além da certeza da existência da capela – a que chamam de Santa Maria do Castelo – em 1514, a justificada presunção de uma maior e prolongada existência, como claramente se deduz da expressão «muito detraz» e da frase «e pagarãm porem aa capella os direitos a ella obrigados e os foros que sempre pagaram ou per direito deverã de pagar».

Nas inquirições de D. Afonso II, de 2 de Agosto de 1220 (ver «Inquirições de D. Afonso II na Terra de Santa Maria» pelo padre Miguel de Oliveira – Arq. Dist. de Aveiro, Vol. II, pág. 71 e 74) e nas de 1253 ordenadas por D. Afonso III para averiguação dos seus direitos, quer de reguengos, quer de domínio enfiteutico («Inquirições de D. Afonso III na Terra de Santa Maria», pelo mesmo padre Miguel de Oliveira – em Lusitânia Sacra – tomo VII, págs. 95 – 133), não há qualquer referência à capela, o que não é de estranhar, nem tem significado para o efeito que procuramos dada a natureza sumária daqueles inquéritos sobre os referidos bens e direitos.

O Dr. Vaz Ferreira dedicou um número do seu «Ferro Velho» à capela, intitulando-a «A capela do Castelo» (Correio da Feira, número 2669 de 18 de Fevereiro de 1950).

Referindo-se à imagem de Nossa Senhora do Castelo Velho, comenta:

«E tinha uma imagem de Nossa Senhora (ainda hoje existente na sacristia), a que chamavam a Senhora do Castelo Velho. Ora o Castelo Velho devia ser o anterior à remodelação da torre de menagem feita no fim da idade média, a seguir a ser doado o castelo a Fernão Pereira em 19 de Novembro de 1448, mais de meio século antes do foral».

É uma hipótese verosímil, mas à face dos documentos de que dispomos não tem a necessária consistência.

Na verdade essa imagem, que esteve na sacristia da capela e hoje está depositada no altar lateral da direita, foi chamada, como já disse, nossa Senhora do Castelo Velho pelo Dr. Vicente Carlos de Sousa Brandão, no citado artigo que, em 1841, publicou no Panorama.

Daí o supor-se que há uma referência ao castelo, anterior à reforma que sofreu nos meados do século XV, parece-me muito ousado, pois bastava o tempo decorrido após esta reforma para, mais tarde, o chamarem velho.

Demais, aquela imagem tanto podia ter estado na ermida como na capela.

O articulista, continuando, afirma com maior certeza: «Está na praça de armas o túmulo em que Gonçalo de Figueiredo foi sepultado na Capela do Castelo, tendo sido alcaide desde 29 de Junho de 1357 até à sua morte em 1378. Disto se vê que já no século XIV existia a capela da Senhora do Castelo Velho».

Não sei onde ele colheu esta informação.

Sem querer arvorar em «cardeal diabo», lembro que se o túmulo tivesse repousado na antiga capela, a condessa D. Joana, a quando da sua reconstrução, teria respeitado tal jazida e ainda que o túmulo em referência foi encontrado num desaterro feito para reconstruir uma muralha do castelo (a do nascente) nas traseiras do Paço dos Condes que foi demolido. (D. Fernando Tavares e Távora – «O Castelo da Feira, fls. 16).

Sobre este túmulo ouvi, em tempos, o Dr. Augusto Soares de Sousa Baptista, que foi de opinião ele ser do século XI ou XII: a averiguar.

Porque não teria ele estado na velha ermida de Santa Luzia, junto ao Castelo, uma vez que não sabemos a data da sua construção, nem mesmo se precedeu a capela do Castelo?

Se assim aconteceu, já é fácil admitir que ele fosse deslocado quando a mesma ermida ruiu.

Desde aquela data de 1514, em que foi concedido o foral, só de 1616 voltamos a ter uma referência autêntica à capela, a propósito dos objectos do culto da «Hermida de Nossa Snr.ª do Castello», a fls. 51 do já referido livro do padre Jorge de S. Paulo «Livro e memorial da fazenda deste convento...», reportado ao convento desta vila, a que chama do «Espírito Santo da Congregação de São João Evangelista».

A fls. 51 v., fala de objectos de prata pertencentes à capela de «Nossa Senhora do Castelo», o que adiante merecerá maior referência.

Em seguida, temos a notícia dada no «Catálogo dos Bispos do Porto», da autoria de D. Rodrigo da Cunha – 1623, fazendo incluir, nas ermidas de S. Nicolau da Feira a de «N. Senhora do Castelo». / 86 /

Em 1656 foi reedificado por D. Joana Forjaz Pereira de Meneses, 6.ª condessa da Feira.

Assim se diz na inscrição esculpida sobre o pórtico principal

ESTA CAPELA MANDOV FAZER A CONDEÇA DA FEIRA D. JOANNA FORJAZ PEREIRA DE MENEZES & SILVA =1656

Ao tempo, D. Joana já era viúva de D. Manuel Forjaz Pimentel, de quem teve D. João Forjaz Pereira e D. Fernanda Forjaz Pereira Pimentel, respectivamente, sétimo e oitavo condes da Feira.

No «Anacrisis Historial (Episcopológia») de Manuel Pereira de Novais, concluido em 1690 e editado por José Pereira de Sampaio (Bruno), cita-se esta capela por «Ermida do Castelo».

Na edição de 1912-1918, chama-lhe «Nuestra Senõra do Castello».

Passados anos, em 1697, o padre Francisco de Santa Maria, reitor do Convento de Santo Eloi de Lisboa, no chamado «o Ceo aberto na terra» (História das Sagradas Congregações dos Cónegos Seculares de S. Jorge em Alga de Veneza e de S. João Evangelista em Portugal), quando se refere à igreja de S. Nicolau do convento de S. João Evangelista, desta vila, diz: «Tem mais esta Igreja sete ermidas: a primeira de N. S. da Encarnação, sita no Castelo, a qual reedificou á sua custa a excelentíssima senhora D. Joana Forjaz Pereira Menezes e Silva, e toda de cantaria, sextavada, coisa perfeitíssima. Nela se guardam notáveis relíquias de Santos:...».

Em 1700, com a morte do referido 8.o conde da Feira, D. Fernando, o castelo, capela e todos os bens da coroa de que era donatária a Casa da Feira, da ilustre estirpe dos Pereiras, reverteram para a «Casa e Estado do Infantado».

A 3 de Maio de 1703, veio ao castelo, onde estava o palácio do condado, o Doutor António da Rocha Manrique, juiz do tombo daquela Casa para lhe dar princípio, verificando-se, na descrição da propriedade que abrangia o castelo, o seguinte passo: «tem de fora da muralha e entrada huma Capella que he de Nossa Senhora da Encarnação sextavada de pedraria e abobadada com tribunas e sacristia que fica a parte da poente...».

Em 1707, o padre António Carvalho da Costa editou o 2.º volume da sua «Corografia Portuguesa».

Nela publica a parte referente à «Comarca e ouvidoria da Feyra», que, pelo seu texto, se vê estar escrito em 1706: aí indica, entre as ermidas existentes na vila, a de «N. Senhora da Encarnação, sita no Castelo (cuja Ermida he toda de cantaria sextavada, e tem notáveis relíquias de santas)».

Vê-se que o autor colheu esta informação no «Ceo aberto na terra» do padre Francisco de Santa Maria.

Do auto de posse do castelo da Feira, conferido a D. Francisco, irmão do rei D. João V, consta quanta à capela:

«Como também entrou na capela de Nossa Senhora da Encarnação, que he do dito Palacio e na casa da sacristia e tribuna e serventias que para ella vão, abrindo e fechando o Missal e pondo as mãos pelos altares, que tem, que são três: abrindo e fechando as portas, e tomando as chaves».

A reprodução mais antiga da capela de «Nossa Senhora da Encarnação» só chegou ao nosso conhecimento em 1940, pela publicação que a revista «Portucale» (XIII, número 73 de Janeiro-Fevereiro desse ano, fls. 17) fez de um «desenho com aguadas a nanquim, de João Glama Stroberle (século XVIII) – de um álbum pertencente ao Sr. Almirante Carlos Braga».

Este desenho, cuja fotografia se publica, deu-nos, também, conhecimento da verdadeira localização da ermida de Santa Luzia.

Embora a reprodução não esteja muito clara, pode-se ver que, na generalidade, a estrutura exterior da capela e casa anexa é sensivelmente igual à de hoje, verificando-se que aquela está encimada, no seu tapo mais alto, por um motivo que me parece semelhante àquele que ainda existia na primeira década deste século, como se vê das fotografias que se publicam.

Tem duas pirâmides nos topos superiores dos cunhais da sua face poente, onde está praticada a porta de entrada, como ainda hoje se verifica.

A casa anexa, da sacristia e andar superior, também se apresentam com estrutura semelhante à de hoje.

No desenho não vejo reproduzida a escadaria de acesso àquele andar, hoje habitação da guarda, parecendo que a parte da muralha, onde ela hoje encosta, está livre.

A omissão pode ser atribuida ao pintor, mas também se pode admitir, para não falar de defeito de fotografia, que o acesso à parte superior se fizesse interiormente a partir da sacristia, ou pela parte traseira, do que ainda há vestígios. / 87 /

O espaço livre, entre a porta de entrada do castelo e a parede desta habitação, deixando bem à vista a muralha, convence que não havia escada.

Foi muito precioso o conhecimento desta primeira visão da capela.

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Desenho de João Glama.

Quanto ao ano a que se reporta aquele desenho do século XVIII, apenas conheço o que nos informa o Dr. Vaz Ferreira no seu artigo «Santo Luzia do Castelo da Feira», publicado no mencionado Arq. do Dist. de Aveiro, VoI. VIII (Março de 1942) a fls. 7.

«Possui o Sr. Almirante Carlos Braga, do Porto, uns álbuns ou, melhor direi, cadernos, de desenhos dum estudante de pintura em Roma, como se vê dos dizeres do frontespício dum deles. No caderno datado de 1741 encontram-se reproduções de monumentos italianos, quase todos de Roma, e nas quatro últimas folhas vêem-se representados: o convento de S. Francisco de Vinhais, pormenores de figura do mesmo convento, a ponte de Murça e numa sanguínea, o Castelo da Feira. Nas páginas anteriores aos desenhos de Vinhais e de Murça está escrito por mão do desenhista a nota do que representam. Mas na página anterior ao desenho do Castelo da Feira não há nota nenhuma. Parece que o autor sabia bem o que reproduzira, sem necessidade de pôr-lhe a indicação.

Por três maneiras escreve o seu nome este artista: – «João Esterbele», no referido frontespício (talvez italianizando o apelido alemão) – «João Stroberle» e depois «João Glama» – explica uma nota escrita com a sua própria letra...».

Não diz onde e como colheu estas informações, sistema sempre de lamentar.

Deve ter visto o original e colhido, do seu possuidor, informações detalhadas.

Quanto à data: pelo que se afirma, não é forçoso concluir que o desenho reproduzisse a existência em 1741, mas faz presumir que diga respeito a uma data, pelo menos, aproximada a este ano.

Em 23 de Julho de 1753, o Doutor José dos Santos Ramalho, juiz do tombo dos bens e rendas pertencentes à aludida «Casa e Estado do Infantado», desta vila, deferindo ao que lhe foi requerido pelo licenciado Manuel de Pinho, procurador do mesmo tombo, mandou que o «escrivão desse fé do estado e forma em que de presente se achava o Palácio e o Castelo e qtas casas tinha para assim de presente e com clareza ficar metido no tombo...».

Depois de descrever o monumento acrescenta:

«e da parte de fora dos muros e Castelo logo a entrada destes para a parte do norte hua boa Capela com a imagem de Nossa Senhora da Encarnação sextavada de boa pedraria e abobadada com tres tribunas e huma Sacristia que fica pegada na mesma Capela para a parte do sul e por cima desta huma com janelas rasgadas para a parte do Mar», seguindo-se a «Medição da quinta pertencente a Casa que anda por conta desta» e do «Rocio que fica fora dos portas do Castelo que he onde se faz a feira de Março e principiando a medição da Capela de Santa Luzia que esta no mesmo terreiro direita ao norte pelo meio / 88 / tem oitenta e seis varas e na do norte acaba em ponta aguda».

A requerimento do mencionado procurador procedeu-se, então, ao «inventário das peças que de presente se achavão pertencentes a Capela da Casa...», ao que me referirei mais adiante, quando me ocupar dos bens móveis da mesma capela.

O tombo, prosseguindo arrolou os direitos de portado e dominicais a que a «Casa» tinha direito, na vila.

Do mesmo tombo – que está depositado na Biblioteca Municipal desta vila – ha várias referências à mesma capela, quer a propósito de confrontações de prédios foreiros, quer motivado pelos encargos enfitêuticos do seu administrador.

Destaca-se o «titulo de reconhecimento de tresentos e setenta reis que em cada hum ano he obrigado, a Casa deste Condado, o administrador da Capela do Castelo» – lavrado em 20 de Dezembro de 1755.

É do teor seguinte:

«Pelo Procurador do tombo – Licenciado Manoel de Pinho foi dito – que Dom Joseph de Alem Castro, fidalgo da Casa de Sua Majestade, comendador das Comendas de São João de Trancoso e outras e administrador da Capela de Nossa Senhora do Castello era obrigado a pagar em cada hum anno a dita Casa deste Condado pellas terras da quinta que possue no fora desta villa por nascente do seu Morgado de Villa Maior tresentos e setenta reis como consta dos livros de cobrança e sempre paga o dito foro de que pedia a mim escrivão e como se não achava reconhecido no tombo para se reconhecer e lançar no mesmo tirara relatório geral para o dito comendador administrador da dita Capella ser citado para vir ou mandar seu procurador Bastante reconhecer neste Juizo com o dito foro».

Seguem-se os termos de ordenamento e de apegoação, datados daquele dia 20 de Dezembro de 1755 e de «recusacão», donde se houve por reconhecido à revelia, com data de 23 seguinte.

O padre José de S. Pedro Quintela, vigário da igreja de S. Nicolau, desta vila – na resposta ao questionário expedido pelo Marquês de Pombal (conhecido por Dicionário Geográfico), de 30 de Abril de 1758, diz:

«Tem mais esta freguesia oito capelas que são: Nossa Senhora da Encarnação do Castelo a qual reedificou a sua custa a excelentissima senhora D. Joana Forjaz Pereira Meneses e Silva da nobilissima casa dos condes desta vila; e toda de cantaria, sextavada, coisa perfeita, nela se guardam notaveis reliquias de santos das quais muitas pelo curso do tempo teem levado descaminho; tem esta capela três altares, em um dos quais esta novamente colocada a imagem de Santa Luzia por se ter arruinado a capela da dita Santa que estava extra muros do mesmo Castelo, sem romagem...».

*

Em 1834, depois da vitória da causa liberal, o edifício da sacristia e a chamada casa do capelão, hoje ocupda pelo guarda, foram usurpados pelo marechal de campo graduado Joaquim José da Silva Pereira, que os integrou no seu património.

*

Veio para esta vila em 1824, por ter sido transferido do «Batalhão de Caçadores n.º 12» para o de «Caçadores n.º 11», aqui aquartelado.

Nesta vila casou com D. Maria Eduarda Bacelar Huete vindo, assim, a ser senhor da «Casa da Praça», que topava com a face norte do edifício dos Paços do Concelho, assim como da que hoje pertence aos herdeiros de José Soares de Sá, sitas na chamada «Praça Velha», hoje do Dr. Gaspar Moreira.

Deste seu casamento teve uma filha, D. Maria José Huete Bacelar da Silva Pereira que, em 1855, casou com o conselheiro Dr. Francisco de Castro Matoso da Silva (irmão do conselheiro José Luciano de Castro), que ascendeu a juiz conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça e faleceu em Agosto de 1905: ambos foram senhores da referida «Casa da Praça», sucedendo-lhes seus únicos filhos – Francisco e Fernando, que faleceram sem descendência.

O marechal, que sempre levou uma vida sossegada e regalada em quartéis e salões, era irmão do Conde das Antas: foi administrador geral substituto de Aveiro e deputado de 1834 a 1842 e de 1851 a 1856, o que tudo lhe permitiu, pela influência de que dispunha, grande benefício para o seu património, com manifesto escândalo público, como passo a dar notícia, no que interfere no objecto do meu estudo.

Num folheto intitulado «Brados ao Ceo contra a Sacrilega e perjura alienaçam do mais antigo raro e sublime monumento da glória nacional – o Castelo da Feira», escrito por J. P. M. Virtumilem 1841 (que parece ser José Pinto da Mota, de Vila Boa), aquele marechal é acusado, além do mais, de se locupletar à custa do património nacional – do Castelo e de outros bens a ele pertencentes.

Deste livro é conhecido um exemplar que está na mão de Francisco Vicente da Costa Neves e serviu para a transcrição que o Dr. Aguiar Cardoso dele fez no / 89 / jornal «Vila da Feira», no número de 21 de Julho de 1921 e nos seguintes.

Contém duas cartas assinadas por Henrique Vicente da Costa Neves (avô do referido Francisco Neves), que era escrivão da administração do concelho: uma de 19 de Maio de 1840 e outra de 2 de Junho seguinte.

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Demolição do muro que faceava, pelo norte, o carreiro junto à capela e de outras construções quando, em 1939, se deu início ao arruamento envolvente do castelo.

Naquela, conta que, nesta repartição, se recebera uma ordem para serem avaliadas umas casas que existiam dentro das muralhas do castelo, visto estarem omissas na avaliação dos bens nacionais, o que cumpriu com repugnância, depois de repetida a mesma ordem, por calcular o fim que se procurava atingir e o prejuizo que se queria dar à Fazenda Nacional.

Da diligência resultou uma dessas casas, o antigo palácio dos Condes, ser estimada em 1020$000 rs., outra, o celeiro, em 520$000 rs.

Mais informa que o referido marechal, que as pretendia pelo preço da chuva e que, para tanto, insistia, na sombra, pela sua inscrição e valorização no património nacional para as poder comprar, ficou exasperado com o resultado da avaliação e que, valendo-se da sua posição de administrador geral, «mandou aqui o administrador do concelho de Ovar com uns homens dali, a quem dava o título de avaliadores e sem que dessem cavaco à autoridade desta terra fingirão uma avaliação nova e passados poucos tempos aparece um edital da Junta do Crédito Público anunciando a venda de ambas as casas por 400 e tal mil reis! E que no dia 14 de Outubro de 1839 fora recebido um ofício do administrador geral de Aveiro mandando dar posse ao mesmo José Joaquim da Silva Pereira das casas que havia arrematado perante a Junta do Crédito Público em 13 de Setembro de 1839, pela quantia de 410$000 rs.

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Capela de Nossa Senhora da Encarnação e casa do guarda com seu andar: campanário sobre a capela.

Conclui «com efeito, como nessa ocasião eu estivesse a banhos foi-lhe dada a posse e com ellas ficou».

É oportuno, agora, transcrever do «Notícias da Feira» (número de 12 de Agosto de 1909) o que sobre a matéria, em 1899, disse o conselheiro Francisco de Paula Azeredo (Samodães), ao tempo tenente de engenharia, na memória que escreveu sobre o castelo da Feira, elaborada por ordem do Comando Geral.

«Lote n.º 532 – Arrematação perante a Junta de Crédito Público no dia 13 de Setembro próximo futuro... Distrito do Porto – Bens da extinta Caza do Infantado – N.º 3342 – Umas casas arruinadas, juntas ao Castelo da Feira da parte do norte, com dois pequenos terrenos a ellas adjunctas e confrontam do nascente com a quinta do Castelo, poente com o pateo, sul com o Castelo e norte com as casas da Capela... 208$400 n.º 3343: umas casas de celeiro junto ao dito castelo e a propriedade antecedente (excluido o pateo por ser serventia do Castelo) que por bem conhecidas se não confrontam – 200$000».

Recorda-se que os dois prédios foram licitados por 410$000 rs (sendo o palácio dos Condes por 209$000 e o outro por 201$000), ou seja mais 1$600 rs do que a avaliação, que já fora feita por preço aviltante.

Na mesma, continua a dizer Costa Neves – «5.ª Havendo, como se sabia, no Castelo desta Vila uma Capela e dum lado e doutra uma pequena morada de casas, a ambição do roubo foi acometido pelo desejo de ficar igualmente com casas, capela e se necessário fosse até com os santos que adornão; e mandão-se avaliar, cuja avaliação foi para Aveiro; mas como houvesse mudanças de Ministério e de Administrações ladras, nenhum êxito teve. Porem assim mesmo por ordem do Sr. José Joaquim foi mandada romper uma parede que se comunicava para um quarto das casas da Capela, e tomou posse clandestinamente dele, a título de que lhe pertencia...».

Seguem-se outras acusações que não interessam a este trabalho.

O Dr. Aguiar Cardoso, comentando os passos desta carta no citado jornal «Vila da Feira» (de 4 de Agosto de 1921), referindo-se ao mesmo marechal, disse: «E ocupava ainda o cargo (administrador geral do distrito) quando promoveu a venda de anexos do Castelo com o intuito de ele próprio os arrematar, como arrematou a vil preço, apossando-se ainda indevidamente da casa do capelão, cujos baixos eram a sacristia da capela, como ainda hoje se pode ver.

O signatário da carta publicada refere desassombradamente que ele rompera uma parede das casas que arrematara para se apossar dum quarto da casa do capelão, que não tinha entrado em arrematação. Esse fora o primeiro acto surripiante parcial; porque em breve se apossou do total, vindo a fazer-lhe um desgracioso segundo andar que em favor da estética, bem precisa de desaparecer».

Estas notícias dão-nos a certeza de que a capela, confinava pelo norte com casas que lhe estavam pegadas, estando, assim, ladeada por estas e pela chamada «casa do capelão», com a sacristia por baixo e que o andar sobreposto a esta casa, como se vê na fotografia que se publica, fora mandado construir pelo marechal, que veio a apossar-se de todo o edifício onde estava esta casa.

Na 2.ª carta, a 2 de Junho de 1840, o Neves esclarece que «em meu poder existe uma avaliação da Quinta do Castelo, feita a 29 de Janeiro de 1836 nos termos seguintes... Terrado da Devesa 500$000, terrado do lavradio junto ao Quintal do capelão 140$000 (cujo / 90 / quintal o Capelão já não possue porque de tudo tomou conta o sr José Joaquim...: e hoje nada existe da Nação se não as Casas junto à Capela e Castelo – o mais, como já disse, ele arrematou».

Na avaliação, o que se reflectiu na arrematação, houve deficiente e confusa descriminação de confrontações, e até ausência delas, como aconteceu com as casas do «celeiro» que, como já disse, receberam para esclarecimento dos seus limites a simples indicação de que «por bem conhecidas se não confrontam», o que veio a favorecer a usurpação.

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Casa do guarda com o andar e com o campanário: muro lateral à escada de acesso.

Virtumil, depois de argumentar que a venda fora ilegal por falta da designação dos limites legais das «novas desmembrações» conclui: «quando no caso dos Bens do Castelo concorre a gravidade de circunstâncias acessórias como a interceptação d'intradas e sahidas pelo Postigo d'arco e o terreno ao Sul da Cidade, comunicação com o Pardieiro, excavação da Muralha e outros males resultantes desta falta d’essencial Requisito e observancia da lei que o exige necessária e indispensavelmente».

Acrescenta mais adiante – «16. Finalmente as obmissoens de Declarações requesitos sobretudo confinação e confrontação incluindo no labradio o Quintal do Capelão por meio de equivoca expressão – junto a – sem ser avaloado».

Virtumil diz, ainda, comentando as confrontações dadas ao palácio dos condes, no aludido aviso de arrematação «...3.º com dous pequenos terrenos a ellas adjunctos = Alcunhando terrenos naturais os artificiaes terraplenos terraços e c. das obras dos reparos e subterraneos do Recinto do Monumento... 7.º E Norte com casas da capela = A pequena Casa da capela ao Sul desta, incosta pelo Poente à Muralha do Forontespício ao Poente: mas já a parte da Casa que fica ao Norte da Capela bem como esta, dista da mesma Muralha do lado do Norte sobre cujo Reparo no angulo do encontro com o lado nascente se acha o Palacio; e quando confrontasse pelo Norte e a Muralha com os terrenos exteriores entre ela e a capela Casas do Inclino e Pardieiro».

Vê-se, assim, que o marechal podia alcançar a casa do capelão partindo de qualquer dos prédios arrematados: o palácio ou o celeiro.

Como já disse, o Dr. Aguiar Cardoso, interpretando as palavras de Virtumil, afirmou que este «refere desassombradamente que ele rompera uma parede das casas que arrematara para se apossar dum quarto da casa da Capela».

Penso que este ilustre comentador não interpretou bem o que o Neves referiu, pois ele limitou-se a dizer que o marechal mandou «romper uma parede que se comunicava para um quarto das casas da capela e tomou posse dela, a titulo que lhe pertencia».

Entendo que esta parede era a da própria casa violada, que nada tinha que ver com qualquer construção urbana pertencente ao usurpador.

Para a alcançar deve-se ter servido do quintal dessa casa do capelão, de que se apossara como já referi, ou partindo do palácio (através do «pequeno terreno», ou seja, o terrapleno que separava o palácio da muralha), abrindo fenda na muralha do castelo, se porventura esta não estava desmoronada, ou alcançando a mesma muralha pelo prédio do celeiro.

Não interessa fazer melhor averiguação sobre este pormenor: basta saber que assim começou a abusiva ocupação da casa do capelão.

Esclareço que na matriz provisória da freguesia da Feira, do ano de 1854 e actualizada até 1859, que existe na Biblioteca Municipal da Feira, em nome de José Joaquim da Silva Pereira estão descritas sob número 14 – 3 – «umas casas com sua quinta chamadas do Castelo, que se compoem de lavradio, mato e devesas».

Pelo que consta do comtrato de compra e venda de 15 de Outubro de 1908, adiante referido, as casas aqui referidas devem ser as da quinta e a que ligava com a capela pelo lado norte.

Quando a Câmara Municipal adquiriu em 1939 os terrenos que envolviam o castelo foi derrubado um muro que separava a quinta do Castelo, vedando-a, dum estreito carreiro que faceava a capela pelo norte e conduzia às traseiras da casa do capelão, como se pode ver numa fotografia que se publica, tirada na ocasião daquela demolição.

Nas traseiras desta casa, onde reside o guarda do Castelo, ainda há vestígios de um antigo portal, situado no local onde estão praticados o fogão e a lareira da cozinha e, assim, afastada do sítio onde a casa topa com a muralha.

Cabe agora lembrar o que está exarado na acta da Câmara Municipal da Feira, de 25 de Janeiro de 1843: «foi presente outro ofício do mesmo Governo Civil com data de 12 do corrente remetendo por copia a Portaria do Ministério do Reino deste mez, pela qual sua Magestade a Rainha foi servida mandar-lhe declarar que pelo Ministério da Fazenda se expediram as ordens necessárias para ser cometida à Junta da Parochia desta vila a Conservação e guarda da Capelão / 91 / de Santa Luzia do Castelo, casa contígua. Deliberando sobre o mesmo assunto assentaram unanimemente que visto a duvida que neste acto ofereceu o administrador deste concelho em dar posse a mesma junta da referida Capela e casa contigua se dirigisse a Sua Magestade a Rainha uma respeitosa Representação pela via competente, a favor da mesma Augusta Senhora de designar resolver sobre a mesma duvida».

Sente-se, aqui, a influência do marechal que, havia pouco tempo, completara um longo exercício como deputado (1834 a 1842), o que repetiu uns anos depois (1851 a 1856), denunciando o seu poderio político, à sombra do prestígio de seu irmão – o conde das Antas.

Em 1843, era administrador do concelho José Correia leite Barbosa (Janeiro de 1842 a Maio de 1845) e presidente da Câmara Municipal o Dr. Francisco Corrêa de Pinho de Almeida e lima (11 de Janeiro 1843-1844).

Aquele Leite Barbosa foi um político muito facioso, que muito se preocupava em satisfazer os interesses dos seus amigos, como sucedeu com a defesa de Bernardo José Correa de Sá, no litígio que este manteve com a Câmara Municipal da Feira, do qual resultou ele apropriar-se da água que alimentava o chafariz do claustro do Convento do Espírito Santo, desta vila.

A «dúvida» que ele levantou naquela sessão da Câmara Municipal deve estar relacionada com a posse que estava a ser exercida pelo marechal que lhe convinha não perturbar.

Encontrei outra notícia na acta da sessão da mesma Câmara, de 30 de Dezembro de 1843, que deve estar relacionada com aquela deliberação tomada em 25 de Janeiro.

Trata-se da autorização de «pagamento de 9410 rs, importe da compostura das portas da Capella do Castelo desta vila, mudança do campanário do sino (o sublinhado é meu) e mais despesas feitas na mesma».

Esta deliberação convence-me que o bravo marechal conseguiu dominar a situação perigosa para os seus interesses, provocada por aquela portaria, pois já se não fala em posse da capela e casa contígua por parte da Junta de paróquia, mas sim à da Câmara Municipal, apenas quanto à capela.

É de crer que a mudança do companário se fizesse para possibilitar, ao marechal, a construção do andar sobre a casa do capelão, mas, por certo, foi muito desejada por ele para que desaparecesse aquele impertinente testemunho da posse do Estado.

Por isso, vá de o mudar para o domínio público / 92 / (capela) para que este e o particular ficassem bem diferenciados.

Mais tarde o campanário e sino voltaram para a cimeira da frontaria poente da casa do guarda, por cima da porta principal da sacristia, como era de uso, o que teve lugar depois de demolido aquele andar, quando se restituiu o prédio, neste particular, à sua antiga traça.

Não conheço qualquer outra deliberação da Câmara Municipal relativa à aludida portaria da Rainha.

É de supor que o marechal, tendo vencido a crise, com o patrocínio do administrador do concelho Leite Barbosa, tivesse conseguido, em Lisboa, que o respectivo processo baixasse ao túmulo de uma gaveta fechada.

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A casa do guarda sem o muro que ladeava a sua escadaria de acesso – quando se iniciaram as obras de arranjo urbanístico em 1939.

Não há conhecimento de qualquer facto que convença que o marechal tenha adquirido legitimamente o prédio em causa e não resta qualquer dúvida que dele se apropriou, pois ocupou-o, administrou-o e usufruiu-o, assim como os seus descendentes.

Foram deste género as únicas conquistas que alcançou com o seu engenho militar.

O referido conselheiro Francisco de Paula de Azeredo (Samodães), que foi ilustre professor da Universidade do Porto diz, na já citada «Memória»:

«Constou-me que este proprietário (o Dr. Francisco de Castro Matoso) considerava seu todo o terreno cingido pelas fortificações, excepto a torre de menagem e o caminho que a ele conduz. Um pequeno muro de construção recente que esta tapando a passagem por onde se subia ao adarve de oeste confirma esta informação. Contudo, é opinião minha que tal muro foi abusivamente construido».

É verdade, mas o povo sistematicamente derrubou essa vedação, até que o usurpador desistiu do seu intento. / 93 /

Nesta vila, ao tempo, era voz corrente que o conselheiro Matoso, quando falava, em Lisboa, do castelo da Feira, fazia-o de modo a querer convencer que ele era propiedade sua.

Lembro que este conselheiro Matoso era o genro do marechal.

*

Vejamos agora a sequência dos factos que culminaram pelo regresso da casa do capelão e sacristia ao domínio público.

Começou pela cedência a título precário, feita pelo conselheiro Matoso, desta casa, para habitação do guarda do castelo.

A propósito lembro o que o mencionado Francisco Neves escreveu no «Correio da Feira», número 328 de 20 de Janeiro de 1962, num artigo que intitulou «Recordando – O Castelo da Feira há meio século e as suas primeiras comissões de vigilância».

...         ...         ...         ...         ...         ...         ...         ...         ...         ...         ...

«A própria cedência da Casa do Capelão contígua ao Castelo, para residência de um guarda, deveu-se igualmente à iniciativa do Dr. Vaz Ferreira. Recordemos como foi obtida essa cedência: Tendo o conselheiro Fernando de Castro Matoso vindo a esta de visita às suas vastas propriedades, em meados de Setembro de 1905, o Dr. Vaz Ferreira teve por bem aproveitar a oportunidade para solicitar do neto do Marechal Silva Pereira, proprietário da referida casa, a cedência gratuita no que foi gentilmente atendido. Pouco depois, era a casa ocupada por um indivíduo de apelido Terra Seca, com a obrigação de exercer a permanente vigilância do monumento. Como era jornaleiro da Câmara Municipal, dificilmente podia cumprir a obrigação   exigida, e assim o Castelo continuava ao abandono». (Este conselheiro Fernando era filho do conselheiro Francisco Matoso).

Mais tarde, em Maio de 1910, a «Comissão de Vigilância», que se tinha constituido no ano anterior, passou a utilizar a casa do capelão para residência habitual do guarda do castelo como ainda hoje sucede, ficando a pagar renda.

Esta Comissão, em 1942, mandou tirar o emparedamento do portal de acesso da sacristia para a capela, como o Dr. Vaz Ferreira refere na mencionada descrição da capela, emparedamento que fora sinal evidente da diferenciação e limitação dos respectivos domínios.

O já mencionado conselheiro Dr. Fernando de Castro Matoso e sua mulher D. Alice Martins de Castro Matoso, por escritura de 15 de Outubro de 1908, lavrada no cartório do notário de Lisboa, Carlos Augusto Scola, venderam a João António de Andrade, a quinta do Castelo e a da Cerca (que pertenceram, respectivamente, à «Casa e Estado do Infantado» e ao «Convento do Espírito Santo», desta vila), formada, na sua parte urbana, por «uma casa sobradada com sacadas e uma outra em ruinas, do lado da capela do Castelo».

Esta casa em ruinas deve ser a que faceava a capela pelo norte.

Conclui-se, deste modo, que esta casa, legítima ou abusivamente, estava integrada na parte urbana da quinta do Castelo, seguindo a sorte desta no domínio da família do marechal.

Transmitida para o João António de Andrade pelo referido contrato de compra, operada por escritura de 15 de Outubro de 1908, foi demolida, por aquele, como consta da «Gazeta Feirense», de 18 de Março de 1909: «Vem agora o sr. Andrade de demolir a casa que ao lado norte existia contígua à Capela do Castelo, o que coloca esta vetusta ermida em maior realce sendo, porém, necessário que a junta da paróquia que della esta na posse (o sublinhado é meu) faça guarnecer e rebocar a parte agora desafrontada e isto a tempo, se possível for da, próxima festividade do dia 25 do corrente».

Por sua vez, por escritura que ainda não consegui ver, mas que deve ser de época aproximada à da aludida venda, ao António Andrade, de 15 de Outubro de 1908, o Conselheiro Fernando Matoso vendeu a este, a António Bernardo Coimbra e a Luís Cadilon, o palácio dos condes e o celeiro.

Segundo nos diz o Dr. Vaz Ferreira, em escrito adiante referido, o vendedor quis que a escritura se / 94 / fizesse em Lisboa, prontificando-se a pagar, a estes, as despesas de deslocação.

Como elas foram feitas pelo Andrade, o conselheiro cedeu-lhe, em compensação, a casa do capelão.

Sendo assim, é provável que não se tivesse feito a escritura da transmissão, ou que esta se tivesse operado por título particular.

Como o João de Andrade morresse em Junho de 1922, sem se concretizar o desejo da Comissão de adquirir a casa do guarda, deixando como seu único filho Benjamim Gama de Andrade, o Dr. Aguiar Cardoso intercedeu junto deste para consentir nessa transmissão, o que teve lugar em 12 de Novembro de 1927.

Não se fez documento, mas apenas um título de promessa de venda, por 2000$000 rs, quantia que foi paga: nele, Manuel Máximo de Aquino Ribeiro declarou, na qualidade de procurador do Benjamim Gama de Andrade, que havia ajustado com o Dr. António Augusto de Aguiar Cardoso a venda e por aquela quantia, do prédio das casas que o vendedor possuia «junto à capela do Castelo, para a Comissão do Castelo».

Para evitar repetições e melhor ordenamento da matéria, enquadro o fecho desta notícia, com o relato dos passos que levaram a integração da casa do guarda e da sacristia, no estudo, que vou iniciar, sobre a descrição da capela, casa e sacristia no cadastro do património nacional.

*

O palácio dos condes e o celeiro já não existem. Aquele foi doado à Câmara Municipal da feira para aí se alojar uma secção da Guarda Nacional Republicana (ocupação que nunca se efectivou) e mais tarde, foi demolido: este celeiro foi deitado abaixo, pelos seus proprietários, para desafrontar a praça de armas do castelo.

A capela de Nossa Senhora da Encarnação fez parte do património dos condes-donatários da feira e depois de 1700 foi integrada, bem como os demais bens do condado, no do da «Casa e Estado do Infantado», passando ao da Fazenda pública pela extinção desta Casa em 1834.

Foi, depois, administrada pela Câmara Municipal da Feira e em seguida, pela Junta de freguesia, até que essa administração foi atribuida à «Comissão de Vigilância pela Guarda e Conservação do Castelo da Feira», a princípio em situação de facto, aliás autorizada e reconhecida oficialmente e depois titulada, como hoje se mantém.

Para constar, visto tratar-se de documento de interesse, passo a transcrever o seu texto.

«Auto de entrega: Aos dez dias de Fevereiro de mil novecentos e trinta e nove na secção de finanças do concelho da Feira compareceram perante o chefe da mesma secção Augusto Morais Neves, como representante e outorgante por parte da Repartição do Património, conforme o ofício n.º 802 de 7 de Fevereiro de 1939 do Director de Finanças do Distrito de Aveiro os Excelentissimos Senhores Ângelo Tavares da Silva, capitão de engenharia, da Direcção dos Serviços das Obras e Propriedades Militares na Primeira Região Militar, outorgando como representante e por parte do Ministério da Guerra, como se mostra pelo ofício n.º 333 datado de 30-1-939 e do doutor Henrique Vaz de Andrade Basto Ferreira, Presidente da Comissão de Vigilância pela Guarda e Conservação do Castelo da Feira. E pelo primeiro outorgante foi dito: Que na qualidade que representa e autorizado pelo mencionado ofício n.º 802 faz a cessão, a título precário, nos termos do artigo 6.º e seguintes do decreto-lei n.º 24489 de 13 de Setembro de 1934, à Comissão de Vigilância pela Guarda e Conservação do Castelo da Feira, do mesmo Castelo compreendendo todo o recinto das muralhas, barbacã, poterna, terraplenos, torre de menagem, cubelo do poço, caminho coberto, pateo da traição, tenalha, capoeira ou casamata e todas as demais pertenças do Castelo compreendidas dentro das muralhas e fora delas, a capela de Nossa Senhora da Encarnação e os terrenos ou terreno entre a mesma capela e entrada do Castelo e a estrada municipal, para a dita comissão continuar a sua missão (o sublinhado é meu), voltando à posse da entidade cedente, por simples despacho ministerial, se lhe for dada aplicação diversa daquela para que foi cedido. Que além das condições gerais constantes daquele diploma a cessão fica sujeita ao seguinte: a Comissão de vigilância fica com a incumbência de dar conta de tudo o que se passar digno de interesse para o antigo «Castelo da Feira», o que carecera de providências especiais, a esta secção de Finanças que por sua vez o comunicará à Direcção de Finanças do distrito. O Castelo está sendo restaurado pela Direcção dos Monumentos Nacionais. Pelo segundo outorgante foi dito que abria mão do aludido Castelo da Feira que até à presente data estava afecto ao Ministério da Guerra, que representa, como monumento nacional da arte militar, mas que passa para a posse da Repartição do Património por virtude de despacho ministerial de 18 de Janeiro do corrente ano. Apresentou o mesmo segundo outorgante a planta do Castelo da Feira de 5 de Maio de 1924 que fica junto a este auto. Finalmente pelo terceiro outorgante foi dito que, na qualidade de presidente da Comissão de Vigilância pela Guarda e / 95 / Conservação do Castelo da Feira, aceita, para esta, a cessão do mesmo Castelo, descrito neste auto, com as condições impostas, que em nome e representação da mesma Comissão se obriga a cumprir.

Nestes termos, o primeiro outorgante deu a entrega e cessão por operadas, sem mais formalidades. Foram testemunhas presentes Francisco Vicente da Costa Neves e Aníbal Alves Correia, que assinam com os outorgantes, depois de lhes ter sido lido este auto em voz alta na presença simultânea de todos, por mim Augusto Morais Neves que o escrevi e assino.

(Seguem-se as assinaturas.)

Em 10 de Fevereiro de 1939, o Dr. Vaz Ferreira, na mesma qualidade, enviou, por ofício, à Direcção-Geral da Fazenda Pública, uma exposição fazendo rectificações e lembrando actualizações a introduzir no tombo do Castelo como prédio n.º 1 da 1.ª Região Militar (com o carimbo da Repartição do Património número 962, L.º 41) e na já aludida planta, levantada pelo então tenente de engenharia José Fernandes de Carvalho, datada de Coimbra de 5 de Maio de 1924 (em resultado de obras feitas), peças que se encontram juntas aos mesmos autos.

Nesta exposição lembra, além do mais respeitante ao castelo, que «numa parte do Noroeste encosta à muralha e à Capela a casa do guarda adquirida em 1927 por esta C. de V. (Comissão de Vigilância») e ainda que ela «não menciona na descrição, como pertença do monumento, a capela hexagonal de linda arquitectura na sua simplicidade e construída em 1656, com três altares: um de N.ª S.ª da Encarnação (Senhora de Março) e dois da Stª Luzia tendo um a velha imagem que veio doutra capela que existiu mais para sul e deve ter ruido na primeira metade do século XVIII. Conserva-se ainda lá uma antiga imagem de Nossa Senhora que talvez seja a que o povo denomine Senhora do Castelo Velho».

Em 22 de Fevereiro de 1939, o Dr. Vaz Ferreira ainda na mesma qualidade, remeteu à dita Direcção-Geral, uma cópia da planta do castelo, com as alterações resultantes das demolições e restauros já então feitos (nos termos mencionados no dito ofício de 10 de Fevereiro de 1939), que ora se junta em fotografia, a fim de ser junta «ao p.º n.º 962, Lº 41 da Repartição do Património para assim ficar existindo no arquivo desse Ministério uma planta exacta do Monumento.

Em 31 de Dezembro de 1940 – ainda o Dr. Vaz Ferreira e naquela qualidade, mandou nova exposição à referida Direcção-Geral (para constar do registo do castelo no respectivo cadastro dos bens do domínio público – como monumento nacional), que foi anotado no fim da primeira página 4119/4 pela Repartição do Património, como já disse.

Dela consta: descrição do Castelo, confrontações, esclarecimentos históricos, visitas régias e esclarecimentos arquitectónicos.

Clicar para ampliar.
Planta (parcial) da capela e casa do guarda, levantada pelo tenente José Fernandes Carvalho, em 5 de Maio de 1924,com indicação das obras feitas posteriormente.

Quanto à capela, diz-se no mesmo cadastro: «Extra muros do Castelo existe uma Capela hexagonal reconstruida em 1656 pela condessa D. Joana. É pertença do Castelo. A casa anexa, presbitério e a antiga sacristia, estava talvez indevidamente, na posse de particulares e foi adquirida pela Comissão de Vigilância em 1927. Fora do Castelo há um terreno com a área de 600 metros quadrados que dá acesso ao monumento e é chamado vulgarmente feira de março».

Em ofício de 11 de Fevereiro de 1942, repetido no de 14 de Março seguinte, o chefe da Repartição do Património pediu ao presidente da Comissão de Vigilância para o informar se «a casa inscrita na matriz predial respectiva, sob o n.º 170, anexa ao Castelo da Feira, está afecta a essa Comissão, visto não ser possível identificá-Ia no respectivo mapa do cadastro.

O Dr. Vaz Ferreira, como presidente da referida Comissão de Vigilância, respondeu a estes ofícios, com o de 25 de Março do mesmo ano, onde esclarece que «o prédio n.º 170 da matriz predial (casa do capelão) é contígua à Capela de Nossa Senhora da Encarnação, junto ao Castelo da Feira e está desde 1927 na posse desta Comissão de Vigilância. Já anteriormente servia e tem continuado a ser a casa do guarda do Castelo. O terreno entre essa casa e a muralha norte que constituia pertença dela foi em 1940 entregue à Câmara Municipal para a abertura da estrada envolvente do Castelo e isolamento deste, pertencendo agora a esta Comissão de Vigilância somente a casa».

Em 17 de Maio de 1943, foi expedido um ofício, em nome do Director Geral da Fazenda Pública, dirigido ao Presidente da mesma Comissão, tomando posição quanto ao direito à referida casa, nos termos seguintes: «Dos elementos de estudo reunidos por esta Direcção-Geral acerca da situação jurídica do prédio n.º 170 da matriz predial, registado a favor dessa Comissão e que está na posse da mesma desde 1909, resulta o seguinte:

a) Sendo essa Comissão uma entidade meramente administrativa, não deve possuir património próprio, de natureza imobiliária;

b) Assim parecem menos regulares os registos feitos / 96 / em nome da Comissão resultando daí a conveniência de proceder à sua alteração;

c) A solução mais simples no caso seria a encorporação do referido prédio no Património do Estado a que pertence, em boa doutrina e a imediata cessão nos condições habituais a essa Comissão, para o fim a que presentemente está aplicado. É de esclarecer que se trata duma simples aplicação de doutrina e que esta Direcção Geral tem por essa Comissão o apreço merecido pelos seus bons serviços e devoção cívica.»

Este ofício motivou uma carta dirigido pelo Dr. Vaz Ferreira ao mesmo Director Geral em que resumiu a história do casa do capelão – «O caso é muito complicado. A casa do capelão, presbitério ou como melhor se lhe deva chamar, era uma dependência da capela reedificada em 1656.

Nos baixos é a sacristia e no andar superior, há porta para uma das tribunas da capela, de onde os condes ouviam a missa. Quando em 13 de Setembro de 1839 o futuro marechal José Joaquim da Silva Pereira, irmão do conde das Antas, arrematou os paços arruinados dos condes e uns celeiros existentes na praça de armas do Castelo, a lista 342 dos bens nacionais, à venda, dá a confrontação dos paços pelo «norte com casas da capela». Portanto estas não foram vendidas, mas o marechal «mandou romper uma parede que se comunicava para um quarto das casas da capela e tomou posse clandestinamente dele a título que lhe pertencia», como diz o secretário da administração desse tempo numa carta publicada. Ora, deste marechal, era filho o conselheiro Francisco Matoso de Castro Corte Real. Quando o filho deste vendeu a uns bairristas feirenses o paço e os celeiros, quis que fossem fazer / 97 / a escritura a Lisboa responsabilizando-se pelas despesas da viagem. O João António de Andrade que abonou essa despesas, recebeu em paga as casas da capela em 1914. Morrendo este Andrade, o filho vendeu-as à Comissão de Vigilância, mediante um simples recibo do preço em 1927. Não há títulos, não há registo. Mas em 18 de Outubro de 1911 a capela do Castelo foi arrolada pela Comissão Central da Execução da Lei da Separação. Parece-me que indevidamente; porque era uma capela já pertencente ao Estado, como anexa ou parte integrante do monumento nacional. Não virá um dia a Comissão de Separação querer apossar-se também da casa, como pertença da Capela? O bom seria arrancar mesmo a capela dessa Comissão visto que pertence directamente ao Património Nacional.

Quanto à casa pertencer ao Estado não creio que haja dúvidas. A Comissão de Vigilância está na posse dela, como está na posse da capela e do castelo, para guardar e conservar todo o monumento e todas as suas pertenças».

Sugere, em seguida, como solução: «Talvez simplesmente mandar declarar na matriz predial que o prédio n.º 170, bem como a capela, são pertenças do Castelo e propriedade do Estado (como tal a registar no livro competente do cadastro) na posse, para guarda e conservação, da Comissão de Vigilância».

Em resposta a esta carta, em 25 de Junho, de 1943, o chefe da Repartição do Património comunicou que se transmitiram «instruções à Direcção de Finanças de Aveiro, a fim de a Casa do Guarda e Capela anexa, junto do Castelo da Feira, serem inscritos como bens do Estado na Matriz Predial e descritos nos Mapas de Cadastro do Património do Estado, com dispensa de outras formalidades» visto os elementos fornecidos pelo Dr. Vaz Ferreira.

Em 28 de Junho a Direcção de Finanças de Aveiro informou o chefe da Secção de Finanças deste concelho da Feira que a Direcção Geral da Fazenda Pública concluira, depois do estudo de diversos elementos constantes do processo existente naquela Direcção, que a «Casa do Guarda» e a capela anexa, junto do Castelo desta vila, se deviam considerar como propriedade do Estado, determinando, em consequência, que se procedesse «à inscrição dos referidos bens na matriz predial e à descrição dos mesmos nos Mapas de Cadastro do Património do Estado».

Em 2 de Julho seguinte, o chefe da Secção de Finanças, informou o seu director, de Aveiro, que «a casa do guarda está inscrita no artigo 170 da matriz predial urbana da Feira, como «casa de sobrado, sita no Castelo, de construção antiga, superfície coberta 72 m2, quintal-área 30 m2, com o número de polícia 854».

A capela está descrita na mesma matriz no artigo 171, assim: «Capela de Santa Luzia, sita no Castelo, com a superfície coberta de 266 m2

Ambas estão inscritas em nome do Estado.

Em 7 de Julho de 1943, o mesmo Director de Finanças de Aveiro ordenou, em repetição de uma ordem já anteriormente dada, que fosse incluída nos mapas de Cadastro do Património do Estado, a enviar em Janeiro seguinte, a «Casa do Guarda» e a capela anexa.

Em 12 deste mês o Dr. Vaz Ferreira, como presidente da Comissão de Vigilância, remeteu para constar do registo no livro do Património o estudo, que já transcrevi no início deste trabalho, sobre a capela, estudo que está anotado naquele registo na 1.ª página.

Presentemente (1972) o castelo, capela e casa do guarda estão registados no livro modelo 26 – Próprios Nacionais – 2.ª parte, copiado do mapa n.º 1 do cadastro dos bens do domínio público de 30 de Julho de 1938.

«= 25.º – Um castelo, construido todo a granito, denominado «Castelo da Feira» cuja notícia mais remota vem do século XI. É de tipo ogival constituido por uma torre de menagem quadrangular e flanqueado por cubelos terminados por coberturas de formas cónicas.

Esta torre é rodeada de terraplanos em variados níveis, limitados por espessas muralhas perfuradas de torneiras e seteiras em que predominam as cruciformes. Além disto possui galerias subterrâneas uma das quais vai dar à casamata e outra ao páteo onde se abre a porta da traição; possui ainda um profundo poço que serve para dar luz através de oito janelas dispostas verticalmente e uma escada de caracol que mergulha no solo até ao fundo desse poço, ignorando-se ainda o intuito desta original construção.

Encontra-se ainda e dentro dessas muralhas as ruinas das alcáçovas que foi moradia dos Condes da Feira, das estirpes dos Pereiras, senhores das Terras de Santa Maria da Feira e seu castelo de jure e herdade.

Extra-muros do Castelo existe uma capela de certo merecimento arquitectónico e do tipo renascença encostada à fortificação e pertença sua, pois foi construida pela condessa da Feira D. Joana Forjaz Pereira de Menezes, sua donatária, em 1656. Mas a casa da Capela que foi anexa e que comporta a sacristia, foi particular, hoje pertença do Castelo (deve-se intercalar por ter havido erro de cópia... Fora do Castelo) há um terreno / 98 / com a área de 600 metros o qual dá acesso ao mesmo. A parte do Castelo que se mantém apresenta-se em bom estado de conservação.

É considerado Monumento Nacional.»

Tem à margem – «Por despacho ministerial de 18 de Janeiro de 1939, e sob proposta da Direcção Geral da Fazenda Pública, autorizada a devolução à posse do Ministério das Finanças, o antigo prédio militar, denominado Castelo da Feira, sendo o auto de entrega lavrado em 10 de Fevereiro de 1939, ficando sob a administração da Comissão de Vigilância pela Guarda do Castelo. Ofício n.º 802 de 7 de Fevereiro de 1939 da Direcção de Finanças de Aveiro».

Na matriz urbana verificam-se as inscrições nos seguintes artigos:

171 – Capela de Santa luzia, com a superfície de 266 m2;

172 – Castelo;

1065 – (antigo 170) – Casa de sobrado, habitação do guarda do Castelo, com três divisões, área coberta 80 m2, a confinar do norte com a capela de St.ª Luzia, do sul e nascente com o Castelo e do poente com terreno público.

Fui informado que houve, em tempos, na Repartição de Finanças, um livro de cadastro do património nacional (livro 22, se não estou em erro) de onde constava a descrição do castelo e da capela.

Este livro desapareceu devido a um conluio entre um antigo proprietário da quinta do Castelo e um funcionário da mesma repartição, ambos já falecidos, de modo àquele subtrair-se ao encargo do pagamento de foros à Igreja de Fornos.

Foi organizado um outro livro com base numa informação prestada pelo Dr. Aguiar Cardoso, sendo remetida uma cópia para Aveiro. Quando, há anos, se venderam papéis da mesma repartição, julgados inúteis, o encarregado da sua apartação, por lapso, incluiu neles aquele livro 22, o que se verificou quando aqui se procedeu a uma inspecção de Finanças.

Ainda se tentou reavê-lo do industrial da fábrica de papel que o havia comprado, mas foi tarde: já estava triturado...

Tirou-se cópia do de Aveiro.

Não a encontrei no arquivo da Repartição de Finanças.

A actual descrição no cadastro dos «Próprios Nacionais» tem por base, como disse, a que serviu para preencher o mapa n.º 1 do cadastro dos bens do domínio público de 30 de Julho de 1938 que, embora comporte situações de facto já muito ultrapassadas então, tal como existiram em vida do Dr. Aguiar Cardoso (como seja a referência às ruínas da alcáçova) encara outras posteriores à morte deste ilustre investigador (quando se diz que a «casa da capela, que foi anexa e que comporta a sacristia, foi particular, hoje pertença do Castelo»).

Isto torna evidente que o cadastro não corresponde ao que foi copiado do existente na Direcção de Finanças de Aveiro.

Nesta Direcção, o castelo e capela estão descritos no modelo 26, em livro cujo termo de abertura é datado de 2 de Abril de 1922, de modo muito sucinto: «n.º 25 – Um castelo construído a granito, denominado Castelo da Feira com sua esplanada e capela, sito no lugar do Castelo, freguesia e concelho de Vila da Feira».

Há um complemento à descrição, que se prevê ter sido feito em 1938 ou 1939, segundo a letra do funcionário que o escreveu: diz respeito, já com desenvolvimento, apenas ao castelo.

Entre os anos de 1940 a 1943 recebeu nova anotação em «observações», do seguinte teor: «O Castelo da Feira está descrito na matriz urbana da Feira sob o artigo n.º 172. Anexa ao «Castelo» está a «casa do guarda», que está inscrita na referida matriz sob o artigo 170 com a seguinte descrição: «Casa de sobrado, sita no Castelo, de construção antiga, com o número de polícia 854; tem de superfície coberta 72 m2 e um quintal com a área de 30 m2. Ainda anexa ao «Castelo» encontra-se a Capela, descrita na matriz em referência sob o artigo n.º 171 da seguinte maneira: «Capela de Santa luzia, sita no Castelo, com a superfície coberta de 266 m2».

Assim e em conclusão:

a) A capela de Nossa Senhora da Encarnação é antiquíssima, de época anterior a 1514: no parecer do Dr. Vaz Ferreira, já devia existir no século XIV;

b) foi reedificada em 1656 pela condessa da Feira, D. Joana Forjaz Pereira de Menezes e Silva;

c) está ladeada, pelo sul, pela sacristia que tem um andar onde vive o guarda, casa que antigamente era conhecida pela «do capelão»;

d) houve, em tempos, outra casa que a ela estava ligada, para norte;

e) a capela e referidas casas pertenceram à Casa dos Condes da Feira» e, depois da extinção desta, por / 99 / falecimento do Conde D. Fernando, passaram para a «Casa e Estado do Infantado»;

f) depois da implantação do regime liberal, pela extinção desta Casa, passaram para o Estado, mas o marechal de campo graduado José Joaquim da Silva Pereira, apossou-se, ilegitimamente, da casa do capelão e da sacristia;

g) seu neto, o conselheiro Fernando de Castro Matoso transmitiu esta casa para João António de Andrade;

h) A casa para norte da capela foi incorporada na quinta do Castelo, que fora adquirida pelo marechal e foi vendida, por aquele conselheiro Fernando Castro Matoso, ao mesmo Andrade que a mandou demolir em 1909;

i) em 1927 o único filho deste, Benjamim Gama de Andrade, transmitiu a casa do capelão, ou da guarda, para a Comissão de Vigilância pela Guarda e Conservação do Castelo da Feira;

j) a capela, depois de extinta a «Casa e Estado do Infatado», em 1834, sempre se manteve como propriedade da Fazenda Nacional;

k) conheceu-se na sua administração, depois daquela Casa, a Câmara Municipal e a Junta de freguesia;

I) hoje, a capela, sacristia e casa do guarda, estão registadas no cadastro do Património do Estado: quanto a esta casa, isto só resultou depois de diversas diligências que tiveram o seu termo em 1943;

m) Presentemente, todos estes bens, assim como o castelo, estão entregues, oficicialmente, à guarda e conservação daquela («Comissão de Vigilância»).

*

A capela de N. Senhora da Encarnação sempre teve, na sua frente poente, um logradouro que se estendia para norte e sul abrangendo, na sua área o local onde esteve a ermida de Santa Luzia.

Por isso, quando se fez o referido tombo da «Casa e Estado do Infantado» ele foi incluido no descritivo do auto lavrado a 23 de Julho de 1753.

«O Rocio que fica fora das portas do Castelo que he onde se faz a feira de Março e principiando a medição da capela de Santa Luzia que esta no mesmo terreno direito ao norte pelo meio tem oitenta e seis varas e de largo na cabeceira do sul vinte e nove varas e do norte acaba em ponta aguda.

Ainda no corrente século nele se fazia, anualmente, uma feira em 25 de Março, que se chamava «de março» ou «da linhaça», com festividade na capela. Constava esta de missa solene a grande instrumental, com sermão e procissão que, com a imagem de Nossa Senhora da Encarnação e incorporação de Irmandades, percorria todo aquele logradouro quando não ia até à capela de Nossa Senhora de Monserrate, na vizinha «Casa das Ribas».

Durante muitos anos, na noite de 25 de Março, havia espectáculo no teatro de D. Fernando lI, desta vila.

Penso que as últimas vezes em que se realizaram foi nos anos de 1898 (com o drama «Anjo Maria» e a comédia «Audácia numa sala») e de 1901 (com as comédias «Um sujeito apressado» e «Capitão de Lanceiros»).

Nestas récitas actuaram actores-amadores locais.

Antigamente, a festividade e a feira faziam-se com regularidade.

Na primeira década deste século ainda assim sucedia, senão em todos, ao menos em muitos anos.

Posteriormente tudo foi caindo em desuso: creio que a última vez que teve lugar, pelo menos quanto à festividade, foi em 1944.

Ficou na lembrança popular a que se realizou a 25 de Março de 1893, custeada pelos irmãos Henrique e Alexandre Brandão, sócios da antiga fábrica de conservas Brandão Gomes & C.ª, de Espinho, quando aquele ofereceu, à capela de Nossa Senhora da Encarnação, a velha imagem da Santa Luzia, que estava na antiga ermida deste nome (Arquivo do Distrito de Aveiro – Vol. VIII, fls. 5) e a de 1909, com a valiosa ajuda daquele Henrique Brandão.

Há a certeza de a procissão se ter alongado até à capela de Nossa Senhora de Monserrate em 1911 («Gazeta Feirense», número 123 de 27 de Março) e 1942 («Tradição», número 506 de 21 de Março, onde informou que a procissão já se não fazia há cerca de quarto de século).

Apesar de estas procissões se terem realizado durante muitos anos, com base em tradição que desconheço, nunca a imagem desta capela de Nossa Senhora de Monserrate tinha ido processionalmente à capela do Castelo.

Porém, em satisfação de um voto que fiz juntamente com minha mulher, ela teve lugar em 13 de Novembro de 1960, como em pormenor relatarei quando estudar aquela capela de N. Senhora de Monserrate.

A mais antiga referência àquela procissão, que se fazia em 25 de Março, encontrei-a a fls. 281 do já mencionado trabalho do P.e Jorge de S. Paulo [Livro e memorial da fazenda deste convento (do Espírito Santo da Vila da Feira)...]:

«No anno de 1660... no Castelo onde fizerão de novo a procissão pregou hum franciscano não quizerão os religiosos (os do convento) ir na procissão nem / 100 / quizerão que fosse o St.º Lenho e ouverão de aver des... mas atalhou-se a isso com levar o P. Vigr.º a reliquia na procissão a tornar a trazer com authoridade e porqe alegava a Snrª Condeça qe avia de ir reliquia e qe não avia outra e qe o parrocho da fregª tinha obrigação de a haver e mostrar resão a que se satisfez mas ficando queixosa».

E ainda quanto à festividade, do livro de «Registos da Câmara Municipal» (1827-1834), a fls. 101, consta que foi determinado superiormente que esta «festividade de Nossa Senhora da Encarnação do Castelo da Vila da Feira continuasse a realizar-se no dia 25 de Março na forma do costume.)

Pelo mesmo registo ainda se sabe que Agostinho de Santa Gertrudes e Sousa, capelão da «Real Capella de Nossa Senhora da Encarnação do Castelo da Villa da Feira», pediu a faculdade para poder transferir a festa que anualmente se celebra ali no dia vinte e cinco de Março para outro qualquer dia, em que não concorrão os embaraços que o suplicante representou.

Sua Magestade não foi servido conceder a pretendida mudança e manda que se observe a similhante respeito o que se acha estabelecido, o que participo a vossas mercês para sua inteligência e execução... Palácio de Queluz 12 de Setembro de 1831 – Conde de Basto.»

E assim se manteve.

Todos os anos se reza missa na capela, no dia de Santa Luzia – 13 de Dezembro.

Continuação do artigo – >>>

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