Aveiro é conhecida como cabeça de concelho desde o meado do século XIII,
e conseguiu prosperar tanto, que no século XVI figurava entre as mais
importantes povoações de Portugal, em virtude da sua grande população,
comércio, nobres que nela habitavam e seus donatários de sangue real.
Já Filipe I de Portugal reconhecera a importância de Aveiro, e de vila
simples que era, elevou-a à categoria de vila notável, por
provisão de treze de Maio de 1581.
Mais tarde, el-rei D. José elevou-a de vila notável a cidade, por alvará
de onze de Abril de 1759.
As razões desta mercê constam do próprio alvará e carta de elevação a
cidade, datada de vinte e cinco de Julho do mesmo ano, tendo talvez
influído no ânimo do rei, para fazer tal concessão, a atitude que a vila
tomou em face do regicídio de três de Setembro de 1758, cuja
responsabilidade foi atribuída ao duque de Aveiro, donatário desta vila,
e a outros nobres e populares.
Em 6 de Janeiro de 1759 a Câmara prestou juramento de fidelidade ao
monarca, em nome do povo da vila, perante o prior da freguesia de S.
Miguel, e todas as classes representaram que não queriam que a vila
continuasse a ter por donatário «o homem que havia atentado contra a
vida do seu rei e senhor.»
A 13 deste mesmo mês era executado o duque de Aveiro, os marqueses de
Távora e restantes implicados no atentado.
A vila de Aveiro não pediu que o rei a elevasse a cidade, mas ele
entendeu que devia fazê-lo. Houve quem escrevesse que simultaneamente
com a subida de categoria se mudou o nome de Aveiro para Nova Bragança,
para que assim desaparecesse totalmente a lembrança dos Aveiros. Di-lo,
por exemplo, PINHO LEAL, na sua obra «Portugal antigo e moderno»,
acrescentando que a rainha D. Maria I restabeleceu o velho nome de
Aveiro, quando subiu ao trono. Ora isto é inteiramente falso como se
prova pelo texto do alvará e carta de elevação a cidade, e pelos termos
das vereações que sempre mencionam «cidade
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de de Aveiro» em substituição da locução «mui nobre e notável vila de
Aveiro.»
Na sessão de 1 de Junho de 1759 a vereação resolveu agradecer ao rei a
mercê concedida a Aveiro pelo alvará já referido, e para isso encarregou
o aveirense João de Sousa Ribeiro, cavaleiro professo na Ordem de Cristo
e capitão-mor de Ílhavo, de beijar a mão a Sua Majestade e de lhe pedir
dispensa do pagamento dos direitos da mercê. O dito Sousa Ribeiro
aceitou o encargo, e em 29 de Setembro do mesmo ano, em sessão da
Câmara, estando presentes a nobreza e muito povo da vila, deu conta da
missão de que fora incumbido, informando que Sua Majestade havia
perdoado os direitos, conforme provava pela carta régia que apresentava,
passada nos termos do alvará e datada de 29 de Julho de 1759.
Lida a carta, ficou Aveiro desde esse momento considerada cidade de
facto, e em sinal de regozijo, resolveu-se que, à noite e nas duas
seguintes, houvesse luminárias e festas, e ainda, em acção de graças e
pela saúde e felicidades do rei D. José se fizeram no mesmo dia da
sessão festas de Igreja e procissão.
A "Gazeta de Lisboa", n.º 44, de 1 de Novembro de 1759, em
correspondência de Aveiro, assim, descreve todas estas festas:
«Aveyro 6 de Outubro.
Havia se aqui espalhado a voz de que o nosso Augusto Soberano pela sua
inata e natural grandeza queria elevar esta Povoação ao titulo de
cidade, e esperavam já os seus moradores com grande alvoroço esta mercê,
mas foi inexplicavel o jubilo no dia 29 de Setembro, quando Joam de
Souza Ribeiro da Silveira cavaleiro professo da Ordem de Cristo e
Capitão mór da Vila de Ilhavo, e um dos nossos principais cohabitantes,
entrando na Camara do nosso magistrado, onde se achavam juntos todos os
membros de que ela se compoem, entregou a carta régia desta erecção,
intimando lhes o desempenho da obrigação com que se achavam de beijar a
mão a Sua Magestade Fidelissima por esta honra, e pela generoza
magnanimidade com que ao mesmo tempo os excusava de pagar os direitos
novos, na Chancelaria mór do Reino, por esta especial graça, que logo se
publicou nos lugares costumados e se aplaudiu com infinitas
aclamações de vivas de todo- o Povo.
Feita a publicação sairam todos para a Igreja de S. Miguel Matriz desta
cidade, onde se celebrava solenemente no mesmo dia da festa deste
gloriozo Arcanjo e se achava exposto o Santissimo, e havendo concorrido
ali toda a Nobreza e quantidade inumeravel de Povo, se cantou com boa
musica uma missa solene, e orou com admiravel estilo o M. R. P. M. Fr.
Bernardo de S. José Magalhães da Sagrada Religião dos Pregadores. De
/
23 / tarde houve o mesmo concurso de gente. Cantou-se o Te Deum e se
fizeram varias preces pela duração da vida, saude, e felicidades do
nosso inclito Soberano; a que se seguiu uma pomposa Procissão por varias
ruas, que estavam custosamente ornamentadas.
Bordavam toda a frontaria da Casa da Alfandega as ordenanças da cidade.
Estava formado o Batalhão do Regimento de Infantaria da Praça de Chaves;
e todas estas tropas ao recolher se a Procissão fizeram varias descargas
não só das suas Armas, mas de dois canhões que disparavam continuados
tiros.
Achavam-se os animos destes moradores triplicadamente gostosos, pela
nova graduação da sua Patria, por se lhes haver acabado a importante
finta da siza que anualmente pagavam, e por se haver arrematado a renda
da Massa na esperança da introdução do comercio, pela nova barra que á
sua custa abriu o mesmo Joam de Souza Ribeiro da Silveira; a qual sondou
e examinou muito bem primeiro o arrematador.
Houve na mesma noite e nas duas seguintes, luminarias, iluminações de
diferentes e vistosos arteficios, e encamisadas de primorosa idea.
Correram se em algumas tardes touros, e tudo se fez com galantaria e
grandeza. Se o canal se conserva limpo como se espera e se estabelecer
com aumento o comercio, esperamos ver ainda levantar uma estatua ao seu
bemfeitor, com a Epigrafe de Pater Patriae.»
A primeira sessão da Câmara depois da que estamos tratando foi em 3 de
Outubro de 1759, e no respectivo termo da vereação já se emprega a
designação de «cidade de Aveiro», que continuadamente se tem usado até
nossos dias.
Aveiro ficou sendo, por ordem cronológica a 17.ª cidade de Portugal,
pois que já existiam as seguintes: Braga, Coimbra, Évora, Lamego,
Lisboa, Porto, Viseu, Bragança, Elvas, Tavira, Beja, Faro, Leiria,
Miranda, Portalegre e Lagos.
D. José elevou ainda a cidade as vilas de Penafiel (1770), Pinhel
(1770), Castelo Branco (1771) e Portimão (1773), não se tendo, porém,
efectivado a elevação desta última. A seguir publicamos a carta de
elevação de Aveiro a cidade, e os termos das vereações que a este facto
se referem.
F. FERREIRA NEVES
DOCUMENTOS
Os referidos documentos
encontram-se aqui reproduzidos no
formato PDF, correspondendo às
páginas 23 a 27. Para a sua leitura, clicar na hiperligação:
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