5.2 – Presença de rivalidades na obra entre...

 

5.2.1 – Cagaréus e Ceboleiros

 

 

Se bem que o título nos remeta para um tratamento do autor mais ou menos equilibrado entre os da Glória (ceboleiros) e os da Vera Cruz (cagaréus), uma análise mais atenta à obra Cagaréus e Ceboleiros: Aveiro – usos e costumes, retira-nos dessa falsa ilusão.

 

De facto, o equilíbrio é inexistente, já que, à excepção do título, os ceboleiros não são mais evocados por João Sarabando. Apenas o faz indirectamente, quando, ao abordar a temática da gastronomia da cidade, sobressaem pela afamada qualidade os doces conventuais, de que são exemplo o pão de 24 horas das freiras do Convento de Jesus e o arroz doce dos frades do Convento de S. Domingos, ambos na freguesia da Glória.

 

Pelo contrário, os cagaréus são aí tratados com grande demora e detalhe, indo desde o relatar de episódios pitorescos das gentes da Beira-mar, passando pelos seus hábitos e costumes mais característicos, não esquecendo, sequer, o retratar e descrever com pormenorizado cuidado da casa tipicamente beiramarense, quer exterior, quer interiormente.

 

É motivo de alguma curiosidade que um ceboleiro como João Sarabando deixe aparentemente transparecer maior afinidade para com os cagaréus. Mas, tal como nesta sua obra não é indicada qualquer rivalidade entre ambos, talvez para o autor ela verdadeiramente nunca tenha existido.

 

 

5.2.2 – Cagaréus e Gafanhões

 

 

Os Gafanhões são pessoas que já em época considerada recente, vieram para colonizar as Gafanhas, com o intuito de tornarem em terrenos agrícolas as areias que aí foram depositadas.

 

Por volta de 1677, chegaram os primeiros colonos, fertilizando as terras de areia, pobres em matéria orgânica, com o moliço apanhado no fundo da ria, originando, assim, a zona agrícola das Gafanhas.

 

Talvez por ser gente originalmente estranha à terra aveirense, sempre se notou alguma animosidade entre os da cidade e os das Gafanhas.

 

João Sarabando ilustra-nos, precisamente, este ambiente, com um episódio a que deu o título de Cagaréus e Gafanhoas (pág. 40), no qual presenciamos duras disputas verbais entre os “matulões” cagaréus e as raparigas da Gafanha, quando estas passavam pelas ruas da Beira-mar, a caminho dos campos perto de Aveiro, para a apanha da chicória (1ª metade do séc. XX).

 

 

5.2.3 – Cagaréus e Barrios

 

 

Barrios era o nome que os da Beira-mar chamavam ao naturais da Murtosa, alegadamente por estes andarem, invariavelmente, com “barris de água às costas, enfiados num pau”, quando vinham nos seus barcos recolher o moliço que havia sido retirado da limpeza das salinas de Aveiro.

 

Na página 41 da já citada obra “Cagaréus e Ceboleiros”, o autor diverte-nos com a troca de galhardetes bem acalorados entre barrios e cagaréus, que, por pouco, iam tendo consequências mais graves.

 

De facto, as rivalidades entre os cagaréus e as gentes vizinhas, não passam de pretensas rivalidades, sendo mais uma forma muito própria de comunicarem, de viverem e até de se divertirem.

 

 

 
 

Barco Moliceiro, na ria.

 

 


 

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