Atlântico Norte, a Laguna de Alavário e o porto de Aveiro – pp. 50-52


X – Aos proprietários e agricultores das terras

Antes de chegar ao fim desta já muito longa dissertação, gostaria de dedicar algumas palavras aos proprietários e agricultores das terras, hoje um pouco afectadas, pelo maior volume da onda de maré, entrada Ria, devido ao retardo ter diminuído, em relação á passagem da Lua pelo meridiano do lugar e por conseguinte, chegar mais rápido, volumoso e longe do que atingia anteriormente, o que ocasiona inundar e especialmente ensalitrar mais as terras limítrofes interiores, que os proprietários primevos se apoderaram, e influenciaram os legisladores a legalizá-las.

Obviamente, que não será para os mandar seguir caminho diferente do que a sua determinação e pertinácia os aconselhar, nem de modo nenhum lhes proporcionar ditos e novos espécimes para agricultar. Porém, só para lhes recordar que o nosso mundo, isto é, o planeta Terra, desde que há 1.500 milhões de anos iniciara a sua formação, ainda não parou de evoluir, em cada século que fora passando, e para melhor a notar-se por todos, salvo para os velhos tarrincas, sempre a maldizerem o presente, diferente do seu tempo de rapaz, em que tudo era melhor.

Saudosismos, fora sempre o que nos ensinaram, para vivermos como no tempo dos nossos avós, espécime de salazarismo, a viver o passado, quando o tempo voa e de certeza, o que nos espera, é futuro.

Eu também gostei sempre e muito de ler e rever a História, não para a reviver, mas apenas para moderar ímpetos e repensá-los, a servirem-me de espécie de velho do Restelo que embora não tenha evitado as viagens e expedições das descobertas, / 51 / obrigara os expedicionários a mais e melhor se prepararem e acautelarem, para o que pudessem de difícil enfrentar.

Com o porto de Aveiro não só a servir o centro de Portugal, como toda a zona oeste central da Ibéria, não haverá nesga alguma do Baixo Vouga que não se venha a valorizar, não para agricultura como terra úbere obviamente, mas para edificar e desenvolver as várias indústrias e projectos que, inevitavelmente, irão aparecer.

Vem tudo isto a propósito do remoer de alguns, usualmente a comunicação social, ventilando a ideia de um suposto dique, para suster a infiltração da água salgada que atinge as terras, até aqui úberes e secas, agora encharcadas e insalitradas, envenenadas para agricultar.

Habitualmente tudo quanto seja abordado na comunicação social escrita, vista e falada, ganha vulto e publicidade que, quer seja ou não seja verdade, cria um impacto na sociedade que é aceite como verdade indiscutível, além de aumentar as vendas e os seus réditos económicos.

Mas debrucemo-nos sobre o tal dique, lembrado com o fim de suprimir avalancha de água salgada, que salga e inutiliza as terras, de modo que, a agricultadas, não servirão para nada.

Mas tal dique e criado pela própria Natureza, fora o que sempre houve na Laguna, desde que o genro do Reinaldo Oudinot resolvera abrir a barra pelo norte do molhe, ficado na história como o nome de meia laranja.

O que acontecera agora, depois de tanto dinheiro gasto e tempo perdido, fora que, julgo-o incidentalmente, quando não havia mais nada para fazer, havendo alguns blocos de pedra crescidos da obra acabada e feita, resolveram aplicá-los e crescer mais uns poucos de metros o paredão norte, mar dentro, e a Natureza aceitara a solução.

Assim, atingida a corrente das Canárias que, desde o principio do mundo sempre por ali perto passou e continua a passar sul / 52 / abaixo, ao encontrar agora o acrescente do molhe recentemente construído, esbarra nele, inflectindo barra adentro, não só a levar consigo a onda de maré, como também as areias que antes ali se depositavam desde 1808 a formar banco e, obviamente, a cerrar a barra, por esta ter sido aberta por norte do paredão projectado pelo Oudinot.

Fora então e a partir daqui que, agora as areias correm no fluxo da maré barra adentro, para chegado o colo da preia-mar parar e nesta paragem decantarem. E curiosamente o refluxo, isto é a vazante, se tornar mais rápida por o retardo em relação à passagem da Lua, pelo meridiano do lugar ter diminuído e assim criado um desnível a fazer correr mais a vazante do que o fluxo ou enchente tinha demorado.

Posto isto e para terminar, permito-me o simples conselho de que ninguém se deixe entusiasmar apenas por aparências, alongando mais o molhe norte além do indispensável. Pois até eu mesmo admito que, na escuridão do profundo Oceano, possa estar errado; e, em vez de areias movediças, que penso haver, o profundo Oceano seja rijo, duro e perigoso levar a cabeça do  molhe mais fora do que o conveniente e trazer outros inconvenientes.

Por isso apelo ao cuidado, parafraseando Miguel Ângelo: «não vá o sapateiro além da chinela.»