Sofre. O
meu amigo Pedro Cuncos sofre imenso. Já tem a gorpelha onde armazena
a dor a rebentar pelas costuras.
De uma
forma genérica, sofre ao ver os senhores, realmente, donos do poder
(não os ministros, os presidentes das repúblicas ou os reis),
destruírem o planeta sem qualquer contemplação ou rebuço.
Escravizarem o ser humano através da lenta, cuidada e cada vez menos
subtil inoculação de pretensas novas necessidades, ideias, valores e
ideais, fazendo-os ricos ou miseráveis de acordo, exclusivamente,
com a sua vontade, os seus estranhos interesses e conveniências,
parecendo acreditarem que são eternos e intocáveis, e que o que
arrasam só é destruído para os outros.
A nível
deste rectângulo chamado Portugal, o meu compadre e amigo sofre
ainda mais, porque, acumulando ao genérico, tem o facto de tudo lhe
ser próximo. Tem ferindo-lhe a retina e os tímpanos, em todas as
gavetas da memória, o descaramento dos pequeninos e ardilosos
políticos deste pobre país, que há trinta anos governam, alternando
periodicamente entre rosa e laranja com leves pinceladas, uma ou
outra vez, de amarelo e azul, que se entretêm acusando-se entre si e
também aos outros, de tudo e mais alguma coisa, esquecendo-se de
fazer aquilo para que foram eleitos e são pagos: governar,
defendendo os direitos e interesses do povo, de todo o povo de igual
modo, sem consentirem, e muito menos incentivarem, a existência de
portugueses de primeira e outros de segunda.
Reduzindo a
questão ao Alentejo, ao seu tão amado Alentejo, aí, para o meu
compadre Pedro Cuncos, a dor é insuportável. Foi criado acreditando
que na “Pátria Alentejana” tudo era diferente: o clima, a largueza
do horizonte, os cheiros, os sabores, o cantar, e, sobretudo, o
sentido de fortaleza da honra, da dignidade, da inteireza e da
verticalidade das suas gentes. Foi por isso que, apesar de a vida o
ter “chutado” para longe, o seu sentir esteve sempre no Alentejo.
Foi por isso, também, que, sem fundamentalismos bacocos, procurou
ajudar, em todos os sítios por onde passou, na luta pela defesa do
seu povo e cultura. Mas, hoje, confronta-se com uma realidade que
nunca pensou ser possível nesta região: afinal, a resistência dos
alentejanos ao ataque das malfeitorias da globalização não foi assim
tão diferente. É vulgar agora sentir/ver, como em qualquer outro
lado, um número alarmante de pessoas, em fase avançada de
aculturação, que só olham para o seu inestético umbigo.
Crescem na
planície, a olhos vistos, preocupantes sintomas de egoísmo, de
hipocrisia e até de alguma subserviência a troco de pequenos favores
(como que uma espécie de tridente do diabo). Já pouco resta do seu
Alentejo. Às vezes, pergunta-se se ele não terá existido somente na
sua imaginação.
É por tudo
isto que o meu compadre e amigo Pedro Cuncos tem a gorpelha tão
cheia. |