Em números anteriores, a «Revista Alentejana» divulgou a existência
de algumas instituições mutualistas, restos de uma actividade
notável do Socorro Mútuo. Todavia, é tão vasta e profunda a história
dos diversos sistemas de entreajuda que nos consideramos incapazes
de elaborar as rubricas mesmo em simples enunciados: o que já foi
publicado, em grossos e exaustivos volumes, ofusca as muito sucintas
referências que as circunstâncias condicionam. Também é forçosamente
limitado o espaço do qual dispomos em função do número de páginas
orçamentadas. |
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A decisão de adquirir
o prédio onde ainda hoje se encontra a Sede do Montepio Geral foi
tomada em 1 de Março de 1864 |
Apesar de tudo, achamos que vale a pena relembrar mais alguns passos da
história mutualista, cujos contornos aparecem ainda na opacidade das
associações sobreviventes. Apresentamos, como exemplar modelo de resistência, os
Montepios e as
Caixas Económicas, distinguindo o exuberante, prometedor e triunfante
Montepio Geral. Para a maioria das pessoas, esta instituição, alicerçada
em princípios estatutários humanistas, funciona, tão-só, como entidade
bancária de exploração tradicional. Todavia, seguindo a evolução e
adaptação aos tempos correntes, o Montepio Geral conserva, nos seus
fundamentos mutualistas, a diferença das explorações financeiras
intrinsecamente capitalistas. Mais adiante, ou em outro artigo de um
próximo número da «Revista Alentejana», falaremos da prosperidade e
expansão deste robusto pilar do Mutualismo, cujos caboucos se abriram em
1840, reinava D. Maria II.
Valores duradouros
Os Montepios entroncam-se, de facto, na génese do Mutualismo; como já
referimos em artigos anteriormente publicados, pretendemos transmitir
aos leitores o que aprendemos sobre a finalidade idealista dos abnegados
fundadores que, no galopar dos tempos, juntaram experiências e
enfrentaram a adversidade com a força das suas convicções.
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Em toda a trajectória se destacaram valores convergentes, visando a
ajuda mútua, a emancipação pela independência económica, a justiça
na defesa dos direitos humanos, o pão pelo trabalho, a inteligência
em constante pesquisa de meios científicos, conducentes à dignidade
da vida. Dos Montepios recebiam os sócios benefícios na doença e na
inabilidade, libertando-se, quanto lhes foi possível, da usura
pública muito frequente. |
Os empréstimos sobre valores não poderiam ser especulativos nem
susceptíveis de «provocar doenças a quem os obtivera para as combater». Essas experiências eram remotíssimas. Datam do
século XII algumas delas. Em Freissingen, na Baviera,
nasceu a primeira tentativa da fundação de um «banco
de caridade», mas só no fim do século XV o entusiasmo
galvanizou algumas formas de empirismo funcional,
procurando afanosamente as linhas mestras do
associativismo organizado. Em 1462, um monge italiano (Barnabé de Terni) insistia, em Perusa, em pregações consequentes e aí reuniu
forças para articular os primeiros peditórios para a
fundação de um «Monti di Pieta». A propaganda granjeou
muitas ajudas e depressa chegou a França. Em França começaram, timidamente, a funcionar
algumas lojas «Pieta» que não lograram consolidar-se,
apesar da euforia. Não obstante, os líderes, os mais
convictos e arrojados promotores fizeram renascer, em
Paris, o «Monte de Piedade» que, em 1777, conseguiu
abrir as portas. Outro contratempo surgiu com o movimento
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revolucionário que fez eclodir a Revolução Francesa. O projecto de
desenvolvimento teve de ser suspenso temporariamente, mas, pouco tempo
depois, a iniciativa ganhou a sua dinâmica (Decreto Termidor) e alcançou
várias províncias. Em Grenoble, Montpelier e Toulouse, estabeleceram-se
formas de empréstimos gratuitos, mas nem em todas as cidades se seguiu o
mesmo método. Em pleno século XVI, os Montepios lançaram o seu «grito» em Portugal,
sem embargo dos Celeiros Comuns, que já existiam na forma intuitiva de
solidariedade, deficientemente elaborada. Em 1562, as Cortes reunidas no
Paço da Ribeira (regência de
D. Catarina, viúva de D. João III), os «procuradores do Povo» reclamavam
ajudas para colmatar as perdas provocadas pelos maus anos de safras;
anos estéreis que apressaram o funcionamento dos Celeiros Comuns.
Primeiro no Alentejo e, mais espaçadamente, por todo o País. A aprovação
foi sancionada pelos Três Estados em todas as províncias. Os Celeiros abriam no Sul, a
1 de Janeiro, e no Norte e Centro, em Maio. Nos anos de fomes grandes ou de epidemias devastadoras, a pobreza
recorria aos Celeiros, adquirindo cereais e legumes por preços
acessíveis. As medidas de Previdência germinavam nas cabeças dos
idealistas da época e daí resultou o «Fundo Global» devidamente
contabilizado. Uma pequena quota mensal dava ao beneficiário o direito a
assistência na doença e a pensão por morte.
Estas experiências foram perfilhadas, já no século XVIII, pelo Exército
e pela Armada, durante cinquenta anos. A seguir estabeleceu-se o
Montepio dos Professores Primários e Mestres-Escola (1813) e, com a Lei
de 1816, foi obtido o «Compromisso de Montepio», sob a invocação da
Imaculada Conceição. Bastaram poucos anos e já podiam beneficiar das
diversas prerrogativas do Montepio quase todas as profissões liberais.
Mas, em 1855, os secretários de Estado fundaram outro Montepio mais
classista, que teve a duração de três décadas. |
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