Acesso à hierarquia superior.

Domingos Carvalho, Mutualismo. A força do associativismo democrático., Cadernos CA, N.º 3, 1ª ed., Lisboa, Casa do Alentejo, 1998, 40 pp.


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Breves referências
aos Montepios

 

Em números anteriores, a «Revista Alentejana» divulgou a existência de algumas instituições mutualistas, restos de uma actividade notável do Socorro Mútuo. Todavia, é tão vasta e profunda a história dos diversos sistemas de entreajuda que nos consideramos incapazes de elaborar as rubricas mesmo em simples enunciados: o que já foi publicado, em grossos e exaustivos volumes, ofusca as muito sucintas referências que as circunstâncias condicionam. Também é forçosamente limitado o espaço do qual dispomos em função do número de páginas orçamentadas.

Sede do Montepio Geral - Clicar para ampliar.

A decisão de adquirir o prédio onde ainda hoje se encontra a Sede do Montepio Geral foi tomada em 1 de Março de 1864

Apesar de tudo, achamos que vale a pena relembrar mais alguns passos da história mutualista, cujos contornos aparecem ainda na opacidade das associações sobreviventes.

Apresentamos, como exemplar modelo de resistência, os Montepios e as Caixas Económicas, distinguindo o exuberante, prometedor e triunfante Montepio Geral. Para a maioria das pessoas, esta instituição, alicerçada em princípios estatutários humanistas, funciona, tão-só, como entidade bancária de exploração tradicional. Todavia, seguindo a evolução e adaptação aos tempos correntes, o Montepio Geral conserva, nos seus fundamentos mutualistas, a diferença das explorações financeiras intrinsecamente capitalistas. Mais adiante, ou em outro artigo de um próximo número da «Revista Alentejana», falaremos da prosperidade e expansão deste robusto pilar do Mutualismo, cujos caboucos se abriram em 1840, reinava D. Maria II.


Valores duradouros

Os Montepios entroncam-se, de facto, na génese do Mutualismo; como já referimos em artigos anteriormente publicados, pretendemos transmitir aos leitores o que aprendemos sobre a finalidade idealista dos abnegados fundadores que, no galopar dos tempos, juntaram experiências e enfrentaram a adversidade com a força das suas convicções.
 
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Em toda a trajectória se destacaram valores convergentes, visando a ajuda mútua, a emancipação pela independência económica, a justiça na defesa dos direitos humanos, o pão pelo trabalho, a inteligência em constante pesquisa de meios científicos, conducentes à dignidade da vida. Dos Montepios recebiam os sócios benefícios na doença e na inabilidade, libertando-se, quanto lhes foi possível, da usura pública muito frequente.

Os empréstimos sobre valores não poderiam ser especulativos nem susceptíveis de «provocar doenças a quem os obtivera para as combater».

Essas experiências eram remotíssimas. Datam do século XII algumas delas. Em Freissingen, na Baviera, nasceu a primeira tentativa da fundação de um «banco de caridade», mas só no fim do século XV o entusiasmo galvanizou algumas formas de empirismo funcional, procurando afanosamente as linhas mestras do associativismo organizado.

Em 1462, um monge italiano (Barnabé de Terni) insistia, em Perusa, em pregações consequentes e aí reuniu forças para articular os primeiros peditórios para a fundação de um «Monti di Pieta». A propaganda granjeou muitas ajudas e depressa chegou a França.

Em França começaram, timidamente, a funcionar algumas lojas «Pieta» que não lograram consolidar-se, apesar da euforia. Não obstante, os líderes, os mais convictos e arrojados promotores fizeram renascer, em Paris, o «Monte de Piedade» que, em 1777, conseguiu abrir as portas.

Outro contratempo surgiu com o movimento / 37 / revolucionário que fez eclodir a Revolução Francesa. O projecto de desenvolvimento teve de ser suspenso temporariamente, mas, pouco tempo depois, a iniciativa ganhou a sua dinâmica (Decreto Termidor) e alcançou várias províncias. Em Grenoble, Montpelier e Toulouse, estabeleceram-se formas de empréstimos gratuitos, mas nem em todas as cidades se seguiu o mesmo método.

Em pleno século XVI, os Montepios lançaram o seu «grito» em Portugal, sem embargo dos Celeiros Comuns, que já existiam na forma intuitiva de solidariedade, deficientemente elaborada. Em 1562, as Cortes reunidas no Paço da Ribeira (regência de D. Catarina, viúva de D. João III), os «procuradores do Povo» reclamavam ajudas para colmatar as perdas provocadas pelos maus anos de safras; anos estéreis que apressaram o funcionamento dos Celeiros Comuns. Primeiro no Alentejo e, mais espaçadamente, por todo o País. A aprovação foi sancionada pelos Três Estados em todas as províncias.

Os Celeiros abriam no Sul, a 1 de Janeiro, e no Norte e Centro, em Maio.

Nos anos de fomes grandes ou de epidemias devastadoras, a pobreza recorria aos Celeiros, adquirindo cereais e legumes por preços acessíveis. As medidas de Previdência germinavam nas cabeças dos idealistas da época e daí resultou o «Fundo Global» devidamente contabilizado. Uma pequena quota mensal dava ao beneficiário o direito a assistência na doença e a pensão por morte.
 

Estas experiências foram perfilhadas, já no século XVIII, pelo Exército e pela Armada, durante cinquenta anos. A seguir estabeleceu-se o Montepio dos Professores Primários e Mestres-Escola (1813) e, com a Lei de 1816, foi obtido o «Compromisso de Montepio», sob a invocação da Imaculada Conceição. Bastaram poucos anos e já podiam beneficiar das diversas prerrogativas do Montepio quase todas as profissões liberais. Mas, em 1855, os secretários de Estado fundaram outro Montepio mais classista, que teve a duração de três décadas.

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