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GRANDE
INVESTIGADOR DA INDÚSTRIA VIDREIRA
Aurélio Guerra deixou-nos
Aurélio Guerra era um apaixonado por
Oliveira de Azeméis. A história da indústria vidreira, em particular,
deve muito ao espírito de investigação de um homem que agora deixou o
mundo dos vivos. |
FALECEU
AURÉLIO GUERRA
Mais pobre
a história do concelho
No cemitério da nossa
cidade, terra que amou generosamente e cuja história estudou como muito
poucos, foi a sepultar Aurélio de Oliveira Guerra. O regresso definitivo à
terra que o viu nascer há 82 anos, o último percurso da vida terrena
acompanhado por um punhado de amigos.
Foram dolorosos os últimos e longos anos de
vida. Uma doença que há muito o afligia, que o retinha no leito, que lhe
limitava a sua ânsia de investigar, uma doença talvez nunca devidamente
esclarecida em toda a sua extensão, apesar do carinho, da dedicação, da
preocupação e dos desvelos dos familiares e amigos.
Uma doença, contudo, que jamais lhe embotou
as suas múltiplas capacidades, a ânsia de ler, de saber e de investigar, a
sua necessidade do contacto com o mundo, mau grado algumas dificuldades da
visão tenham exigido adaptações no seu leito de dor, fruto das novas
tecnologias e da dedicação sem limites de todos, de um modo muito particular
da esposa e da filha, que, pacientemente até à exaustão, até ao extremo
limite da resistência humana, tudo fizeram para lhe ofertar o possível gosto
pela vida, Ele que amou a vida como ninguém...
Ligado profundamente ao vidro desde que
nasceu, por tradição familiar e por paixão, dir-se-á, talvez, que o vidro
lhe ofereceu os mais gratos momentos, também os mais dolorosos. Como
recordou até à morte, o vidro ofertou-lhe, generoso, as maiores alegrias,
mas foi também no vidro que, cruelmente, injustamente, conheceu a dor, o
infortúnio, a traição de alguns...
Dir-se-á que foi de vidro o seu primeiro
berço, ali na de há muito desaparecida Fábrica do Cercal, em Santiago de
Riba-Ul. Na avançada Bélgica estudou o fabrico do vidro, no vidro trabalhou
entre nós.
Nos princípios da década de cinquenta,
revoltado pela ingratidão, travado impiedosamente de dar largas ao seu sonho
do vidro, partiu pata Moçambique, onde, no Dondo (Terras de Manica e Sofala),
é funcionário superior na Companhia de Cimento do Grupo Champallimaud.
1975 é o momento do regresso pelas
conhecidas razões, fixando-se em Aveiro, terra da esposa. Momento de se
entregar apaixonadamente ao estudo da história da sua terra, mormente a
história do vidro, trazendo até ao "Correio de Azeméis" trabalhos
absolutamente inéditos, da maior profundidade, suportados documentalmente,
lançando por terra falsos mitos de décadas. Consultou milhares de documentos
um pouco por todo o País. Ninguém como ele conheceu a história do vidro.
Quantos tentaram contestá-lo — e não foram poucos! — seriam "engolidos" pela
indestrutível valia dos seus argumentos, sempre e solidamente documentados.
A morte do vidro em Oliveira de Azeméis
antecipou-se na morte a Aurélio Guerra. Não raro a história é brutalmente
amarga. Uma amargura que importa reparar, adoçando-a com a rápida publicação
dos seus valiosíssimos trabalhos sobre a nossa indústria do vidro. Mais que
uma homenagem — de todo merecida — um inadiável serviço a prestar à História
de Oliveira de Azeméis.
"Correio de Azeméis" perdeu um dos seus mais
dedicados colaboradores. Pessoalmente, sinto esgotado o irrecuperável prazer
da sua amizade, o precioso tesouro do seu saber. Quando vemos partir um
amigo, mais um amigo, é como que morrer também um pouco de nós próprios.
À esposa e filha, bem como aos restantes
familiares, a solidariedade de quantos fazem o "Correio de Azeméis".
ANTÓNIO MAGALHÃES |