Aurélio Guerra, Indústria Vidreira no concelho de Oliveira de Azeméis. Subsídios para a sua história. Maio, 1991/1994, 104 pp.

Notícia necrológica

GRANDE INVESTIGADOR DA INDÚSTRIA VIDREIRA

Aurélio Guerra deixou-nos

Aurélio Guerra era um apaixonado por Oliveira de Azeméis. A história da indústria vidreira, em particular, deve muito ao espírito de investigação de um homem que agora deixou o mundo dos vivos.


FALECEU AURÉLIO GUERRA

Mais pobre a história do concelho

 

No cemitério da nossa cidade, terra que amou generosamente e cuja história estudou como muito poucos, foi a sepultar Aurélio de Oliveira Guerra. O regresso definitivo à terra que o viu nascer há 82 anos, o último percurso da vida terrena acompanhado por um punhado de amigos.

Foram dolorosos os últimos e longos anos de vida. Uma doença que há muito o afligia, que o retinha no leito, que lhe limitava a sua ânsia de investigar, uma doença talvez nunca devidamente esclarecida em toda a sua extensão, apesar do carinho, da dedicação, da preocupação e dos desvelos dos familiares e amigos.

Uma doença, contudo, que jamais lhe embotou as suas múltiplas capacidades, a ânsia de ler, de saber e de investigar, a sua necessidade do contacto com o mundo, mau grado algumas dificuldades da visão tenham exigido adaptações no seu leito de dor, fruto das novas tecnologias e da dedicação sem limites de todos, de um modo muito particular da esposa e da filha, que, pacientemente até à exaustão, até ao extremo limite da resistência humana, tudo fizeram para lhe ofertar o possível gosto pela vida, Ele que amou a vida como ninguém...

Ligado profundamente ao vidro desde que nasceu, por tradição familiar e por paixão, dir-se-á, talvez, que o vidro lhe ofereceu os mais gratos momentos, também os mais dolorosos. Como recordou até à morte, o vidro ofertou-lhe, generoso, as maiores alegrias, mas foi também no vidro que, cruelmente, injustamente, conheceu a dor, o infortúnio, a traição de alguns...

Dir-se-á que foi de vidro o seu primeiro berço, ali na de há muito desaparecida Fábrica do Cercal, em Santiago de Riba-Ul. Na avançada Bélgica estudou o fabrico do vidro, no vidro trabalhou entre nós.

Nos princípios da década de cinquenta, revoltado pela ingratidão, travado impiedosamente de dar largas ao seu sonho do vidro, partiu pata Moçambique, onde, no Dondo (Terras de Manica e Sofala), é funcionário superior na Companhia de Cimento do Grupo Champallimaud.

1975 é o momento do regresso pelas conhecidas razões, fixando-se em Aveiro, terra da esposa. Momento de se entregar apaixonadamente ao estudo da história da sua terra, mormente a história do vidro, trazendo até ao "Correio de Azeméis" trabalhos absolutamente inéditos, da maior profundidade, suportados documentalmente, lançando por terra falsos mitos de décadas. Consultou milhares de documentos um pouco por todo o País. Ninguém como ele conheceu a história do vidro. Quantos tentaram contestá-lo — e não foram poucos! — seriam "engolidos" pela indestrutível valia dos seus argumentos, sempre e solidamente documentados.

A morte do vidro em Oliveira de Azeméis antecipou-se na morte a Aurélio Guerra. Não raro a história é brutalmente amarga. Uma amargura que importa reparar, adoçando-a com a rápida publicação dos seus valiosíssimos trabalhos sobre a nossa indústria do vidro. Mais que uma homenagem — de todo merecida — um inadiável serviço a prestar à História de Oliveira de Azeméis.

"Correio de Azeméis" perdeu um dos seus mais dedicados colaboradores. Pessoalmente, sinto esgotado o irrecuperável prazer da sua amizade, o precioso tesouro do seu saber. Quando vemos partir um amigo, mais um amigo, é como que morrer também um pouco de nós próprios.

À esposa e filha, bem como aos restantes familiares, a solidariedade de quantos fazem o "Correio de Azeméis".

ANTÓNIO MAGALHÃES

 

 

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