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Filho, neto e bisneto de vidreiros da
Marinha Grande, Aurélio de Oliveira Guerra nasceu em 9 de Fevereiro de
1919.
Seu pai, Augusto de Oliveira Guerra
(1879-1941), era filho de Aniceto de Oliveira Guerra, oficial de vidro
da Real Fábrica de Vidros. No início do século, o jovem Augusto parte
com outros companheiros de trabalho para Oliveira de Azeméis, onde se
tornaria uma figura de relevo na história da indústria vidreira dessa
cidade, como, de resto, o presente estudo mostra de forma eloquente. Em
1904, Augusto de Oliveira Guerra casa com Emília Maria Brandão, filha
de António Pereira Moia, tamanqueiro, de Cidacos, freguesia de Oliveira
de Azeméis. |
Como o próprio Aurélio Guerra tanto gosta de
dizer, nasceu na fábrica fundada por seu pai, a Fábrica de Vidros Progresso,
mais conhecida como Fábrica do Cercal por se situar no lugar do mesmo nome,
na freguesia de Santiago de Riba-UI, concelho de Oliveira de Azeméis.
Nasceu, pois, no Vidro. Parecia, por isso, destinado a ser vidreiro.
O tempo de menino de escola passa-os entre
os livros e a fábrica, mais na fábrica que na escola. A sua paixão era o
vidro. Com o 5.º ano de liceu incompleto e apenas dezasseis anos de idade,
parte para a Bélgica pela mão de seu viajado irmão Manuel, catorze anos mais
velho e com a ajuda de uma família belga. Fixa-se em Charleroi e aí
frequenta a École lndustrielle Supérieur, onde conclui os dois
primeiros anos do curso de Technicien Verrier. No pouco tempo que ali
residiu continua a manifestar um grande interesse pelo desporto e pela
música. Em 1937 toma-se membro da Fédération des Sociétés Belges de
Patinages à Roulettes, apoiante do Olympic Club Charleroi, membro do
Sporting Club Charleroi e sócio do Jazz Club de Belgique.
Em 1938, regressa a Portugal. Seu pai havia
cedido a quota ao Centro Vidreiro. A 2.ª Guerra Mundial estava no seu
começo, e a indústria do vidro iniciava uma fase nova e decisiva em
Portugal. Aurélio Guerra vai trabalhar como encarregado num armazém, em
Coimbra, onde se demora cerca de dois anos.
Ele que integrara a primeira equipa de
Hóquei de Oliveira de Azeméis, fundada por CELÁ, veste a camisola do
Atlético de Coimbra.
Nesta cidade, Aurélio Guerra obteria, ainda,
autorização para iniciar a instrução de pilotagem na Escola de Aviação «Bissaya-Barreto»,
de Carlos e Vítor Gallo. Da sua caderneta de voo constam cerca de 120
aterragens e 12 horas de voo.
Em 1944 casa, em Esgueira, Aveiro, com D.
Marília Picado da Rocha Oliveira Guerra, voltando a envolver-se no negócio
de vidros, em Oliveira de Azeméis. Em 1946 é Director da União Desportiva
Oliveirense, agremiação fundada em 1922.
No entanto, em 1950, a convite de familiares
da esposa abala para África, fixando-se no Dondo, no distrito de Manica
Sofala. Trabalha durante mais de quinze anos, na Companhia de Cimentos de
Moçambique, do Grupo Champallimaud, como Chefe da Secção de Controlo Fabril
e Estatística. Dali, parte para Vila Pery, como gerente comercial ligado ao
ramo automóvel, vindo a exercer, depois, as funções de agente de uma empresa
de materiais de construção.
Regressa a Portugal em 1975, tendo exercido,
antes de se reformar, as funções de secretário do Cine-Teatro Avenida, em
Aveiro.
Conheci-o já aposentado, numa mesa do
Arquivo Distrital de Aveiro, sentado, em silêncio, inventariando de forma
criteriosa e honesta, tudo o que ali houvesse sobre o fabrico do vidro em
Oliveira de Azeméis. Vi-o correr para outros arquivos em busca de documentos
que dessem sentido às escrituras e registos que foi metodicamente reunindo.
Entra em arquivos públicos e privados. Conhece (ou revê), então, um
significativo número de pessoas: vidreiros, familiares de vidreiros já
desaparecidos, historiadores, e familiares seus, próximos e distantes — os
Órfão, os Neto, os Roldão, os Abreu, os Guerra, etc.
Ouve histórias, regista-as e deixa-se
fascinar pelas belas peças dos vidreiros da sua terra natal. Calcorreia
feiras em busca de velharias de cristal ou vidro vulgar. Chama a atenção
para a importância de um valioso património industrial que se perde. Lamenta
o esquecimento a que foram votados todos os que fizeram de Oliveira de
Azeméis um importante centro vidreiro do País. Interessa-se pelo percurso
individual de vidreiros como Francisco Miller. Reúne fotografias sobre as
fábricas, os seus patrões e os seus operários. Constrói genealogias, estuda
a bibliografia disponível sobre o vidro em Portugal.
Ouvi-lhe as dúvidas e as certezas sobre os
percursos do vidro na sua terra. E fui lendo, com muito interesse e agrado,
os artigos que, semana a semana, o “Correio de Azeméis” lhe foi publicando.
O estudo que agora se dá a ler é, na verdade, uma versão corrigida desses
textos, onde a memória e a história se esclarecem mutuamente.
Trata-se, pois, de um importante e decisivo
contributo para a história do vidro em Portugal. Aurélio de Oliveira Guerra
fixa definitivamente a cronologia de alguns dos mais decisivos marcos da
história da produção industrial do vidro em Oliveira de Azeméis, entre o
final do séc. XIX e nas primeiras décadas do actual.
Depois do trabalho dele tudo será mais
fácil!
Manuel
Ferreira Rodrigues |