A Recuperação da fragata "D. Fernando II e Glória", in: "Revista da Armada", n.º 305 e 306, Jan. e Fev. 1998.


4. O RESTAURO ESTRUTURAL NO ARSENAL DO ALFEITE
REVISTA DA ARMADA”, n.º 306, Fevereiro 1998, págs. 17 a 21.


Fragata D. Fernando II e Glória e as alturas dos mastros relativamente ao convés.

Tendo-se decidido o restauro da Fragata, cujo arranque se formalizou em 1990, iniciaram-se no Arsenal do Alfeite (AA) os trabalhos de levantamento geométrico a bordo, tendentes a permitir reconstituir, através de desenhos, a estrutura do navio. A documentação técnica existente era escassa e de pouco ou nenhum detalhe. Os desenhos estruturais, necessários ao restauro, foram assim todos feitos de raiz. Para o efeito fez-se uso de regulamentos antigos do "Bureau Veritas", da "Lloyds", da ABS (American Bureau of Shipping) e da RNI (Regulamento Naval Italiano). Muitas outras obras foram também consultadas por conterem informação muito útil para o projecto estrutural. A feitura dos desenhos que permitiram a reconstituição do navio, designadamente dos pavimentos, porões, mesa de enxárcias, lemes, etc., bem como o apetrechamento dos interiores do navio tiveram a colaboração dos desenhadores do AA, sendo o principal protagonista o desenhador-Projectista Sr. Carlos Godinho.

Algumas diferenças entre os regulamentos e o levantamento efectuado foram sendo decididas de acordo com o que se considerou ser o tecnicamente mais acertado, embora se tenha sempre tentado privilegiar o historicamente correcto, excepto nos pontos em que a segurança ou manutibilidade do navio fosse preponderante.

Clicar para aumentar para o dobro do tamanho.

Quadro com uma listagem dos navios históricos.

A este respeito, refira-se a introdução de anteparas estanques, que suscitou alguma polémica, pois havia dúvida sobre a sua existência de origem. Estudos posteriores revelaram a existência na época, em outros navios, de anteparas de borda a borda e nos desenhos de arranjo de 1878 notam-se algumas divisórias transversais que podem ser interpretadas como anteparas. Neste ponto concreto, o tecnicamente aconselhável e historicamente correcto acabaram por se entender. Noutros pontos, como por exemplo a introdução de vigias na coberta, embora tecnicamente desaconselhável, prevaleceu o rigor histórico.

Os trabalhos iniciaram-se pela edificação da roda de proa, a reparação da quilha e a colocação do cadaste. Foram feitos cálculos das tensões na quilha, além de modelos à escala na zona em que a quilha tinha sido emendada com uma dupla escarva. Esses modelos foram então submetidos a ensaios de rotura à compressão nos laboratórios do Arsenal, tendo-se confirmado não haver diminuição da resistência estrutural do conjunto.

As madeiras empregues nesta fase foram de carvalho nas balizas e estrutura da popa e pinho manso nos vaus e dormentes.

Para o assentamento do forro, além da recuperação das numerosas tábuas originais em teca, recorreu-se a madeira de Kambala. Também os pavimentos e o forro interior foram executados em Kambala, tendo sido fundidos muitos milhares de pregos em latão de diversos tipos idênticos aos que se encontraram nos despojos do navio. Enquanto decorria o assentamento dos pavimentos e forros do costado, procedeu-se ao calafeto do costado e de parte dos pavimentos, trabalhos estes concluídos posteriormente no AA.

Tendo sido decidido que o navio deveria ter condições para efectuar com segurança trânsitos para outros portos do continente foram executados estudos de alagamento que recomendaram a adopção de quatro anteparas estanques estabelecidas em locais, onde de acordo com os desenhos mais antigos existentes (1873), seria previsível a sua localização. Refira-se que nas duas anteparas mais a vante se utilizou madeira de teca original.


Chegada da fragata D. Fernando II ao arsenal do Alfeite. Foto de Manuel Leitão.

/ pág. 18/ Na proa e popa destacam-se pelo seu volume e dificuldade, respectivamente, o beque e os alforges. Salientam-se também à proa, pelo impressionante volume das peças, as abitas e os escovéns. A roda de proa é também uma admirável peça pelo tamanho das peças de madeira que a compõem. O restauro estrutural incluiu, além do casco, as anteparas e pavimentos, o forro da borda falsa, as bonecas, as enoras dos mastros e as trincheiras. Alguns destes trabalhos foram ou estão a ser completados no AA.


 

Página anteriorPágina inicialPágina seguinte