GLOSSÁRIO DE DESIGNAÇÕES RELACIONADAS COM O BARCO MOLICEIRO, SUA
PALAMENTA E FAINA DA APANHA DO
MOLIÇO
(do livro
MOLICEIROS, de Diamantino Dias; edição da C.M.A.)
ALÇA — Ferro em forma
de S alongado, que fixa a ostaga à draga.
AMANHAÇÃO — Reparação
do barco.
AMURA — Cabo que fixa
a vela à calcadeira.
ANCINHOS DE APANHAR —
Compõem-se dum cabo de eucalipto de, aproximadamente, 2 m. de
comprimento e dum pente com 12 a 14 dentes. São utilizados para
mariscar, colher o arrolado e na apanha do moliço, nas marinhas de sal.
ANCINHOS DE ARRASTO —
Compõem-se dum cabo de eucalipto, de 4 a 6 m. de comprimento e dum pente
de carvalho com o comprimento de 1,50 m., por 0,08 m. de altura ao
centro e 0,05 m. nas extremidades, provido de 64 dentes de 0,10 a 0,12
m., afastados entre si, nas pontas, 0,02 m. Duas alças de ferro, com
dentes mais curtos, reforçam-no no seu ponto central. Estes ancinhos são
fixados, obliquamente, em ambos os bordos do barco, em número não
inferior a 2 nem superior a 4, e, arrastando pelo fundo da ria, arrancam
o moliço.
ANDAR À ROLA — Ser
impelido pela corrente e pelo vento, sem usar os meios de governo do
barco. Por extensão, diz-se de qualquer objecto a boiar, abandonado, na
corrente.
ANDAR À SIRGA —
Utilizar a sirga como meio de propulsão.
ANDAR À VARA —
Utilizar as varas como meio de propulsão.
ANDAR À VELA —
Utilizar a vela como meio de propulsão.
APANHA DO MOLIÇO -
Colheita e transporte do moliço.
ARGOLÃO — Argola em
ferro, situada na cobertura do castelo da proa, que serve para fixar o
pau das tira-viras e o mastaréu e, também, para calcar o traquete.
ARROLADO — Moliço que
se escapa dos ancinhos de arrasto ou se desprende do fundo e fica a
boiar ou vai dar às praias, impelido pela corrente e pelo vento.
BARCADA DE MOLIÇO —
Carregamento dum barco, que orça pelas 5 toneladas.
BARROTE DA PROA —
(Veja-se batente da proa).
BATENTE DA PROA —
Vertente do castelo da proa. (O mesmo que barrote da proa).
BICA — Peça
recurvada, talvez inspirada no bico de certos palmípedes, e que
constitui o ponto mais elevado da proa e da ré do moliceiro. A da proa é
articulada por meio de uma dobradiça, que lhe permite reduzir a altura,
quando o barco tem de passar sob uma ponte baixa.
BOLEAR — Bolinar.
BOLINÃO — Cabo com
uma das extremidades fixa à parte superior da vela, por 6 cordéis,
denominados pernas do bolinão, e com a outra ponta presa ao moitão da
bica. Serve para orientar o barco, de modo a ganhar barlavento.
BUEIRAS — Orifícios
que atravessam as cavernas, a fim de dar passagem à água, facilitando,
assim, o escoamento do barco. Alguns moliceiros têm 3 bueiras, em cada
caverna: uma central e 2 laterais; outros só têm a do meio. Também
algumas destas embarcações têm todas as cavernas com bueiras, enquanto
outras só as têm, nas 6 primeiras da proa, nas 2 situadas debaixo do
traste e nas 2 últimas da ré.
CACHOLA — Orifício
situado na extremidade superior do mastro, por onde passa a ostaga.
CAGARETE — Pequeno
compartimento situado por detrás da entremesa, na parte mais estreita e
elevada da ré, onde se deposita o sal, o peixe ou a carne salgada, para
consumo de bordo.
CALCADEIRA — Argola
em ferro, fixa na coxia, por onde passa a amura. Serve para calcar a
vela.
CAMARADA — Tratamento
usual entre os moliceiros.
CARREIRA — Canal
navegável.
CHANÇA — Recorte de
simples efeito decorativo, situado a meia altura da linha de contorno
exterior do leme.
CHELEIRAS — Duas
prateleiras, situadas a meia altura da câmara do castelo da proa, onde
se guardam os mantimentos e os utensílios domésticos.
CINTA — Bordo do
barco.
COSTANEIRA VOLANTE —
Última tábua do paneiro, desligada deste, com o fim de facilitar o seu
levantamento.
COXIA — Peça situada
junto ao casco, debaixo do buraco do traste, onde se encaixa a
extremidade inferior do mastro.
DRAGA — Cinta
interior, paralela ao bordo.
ENCALAS — Aberturas
situadas entre o bordo e a draga, onde se adaptam as falcas, as tamancas
e as forcadas.
ENCINHADA — Porção de
moliço colhido por um ancinho.
ENGAÇOS — Ancinhos de
ferro, com cabo de madeira, munidos de 3 dentes, utilizados na descarga
do moliço.
ENTREMESA — Tampa
móvel, com fechadura, que cobre o castelo da ré e constitui uma espécie
de degrau alteado, que serve de assento ao arrais. No espaço coberto por
esta tampa, guarda-se o barril da água, as forcadas e as tamancas.
ENVERGUE — (Veja-se
verga).
ENVERGUES — Cordéis
que prendem a vela à verga.
ESCOADOIRO OU
ESCOADOURO — Utensílio semelhante a uma pá, com as dimensões usuais de
0,40 m. de largura por 0,45 m. de comprimento e 0,80 m. na altura dos
lados, munido dum cabo, que forma manípulo. Serve para escoar a água,
que se deposita nos vãos das cavernas. (O mesmo que vertedoiro).
ESCOPEIRO — Utensílio
constituído por um cabo de madeira, tendo uma das extremidades envolvida
num pedaço de pele de carneiro, fixada com pregos. Serve para embrear o
barco.
ESCOTA — Cabo fixado
à parte inferior da vela e que serve para dar mais ou menos pano à
embarcação, regulando, assim, a sua velocidade.
ESCOTEIRAS —
Extremidades das dragas, à ré, onde se prende a escota.
FALCAS — Pranchas que
se ligam, entre si, por justaposição e que se colocam no bordo do barco,
para lhe aumentar o ponta!. Cada embarcação tem 4 falcas e 2 falquins,
que se adaptam, nas encalas, à razão de 2 falcas e um falquim por cada
bordo, desde a vertente do castelo da proa até à antepenúltima caverna
da ré. (Presentemente, nalguns barcos, estes limites são ultrapassados).
Justapostas, estas peças acusam uma altura de 0,40 m., a partir da
primeira falca, altura que decresce, até 0,25 m., na extremidade do
falquim. O comprimento da falca da ré é de 4,30 m., o do da proa é de
3,05 m. e o do falquim é de 1,15 m. Quando o carregamento do barco é
composto de moliço de arrasto, não se utilizam as falcas, porque o
próprio moliço impede a entrada da água.
FALQUINS — Falcas
pequenas. (Veja-se falcas).
FERRO — Fateixa de 2
ou 4 braços.
FORCADA — Pau em
forma de Y, que se apoia sobre o cagarete e se fixa, com um cabo, à bica
da ré servindo de apoio ao mastro, quando arreado.
FORCADAS — Peças de
madeira, com a altura aproximada de 0,55 m., que se encaixam nas
encalas, numa posição vertical. Servindo de apoio ao cabo dos ancinhos,
conjugam as suas funções com as das tamancas, para manter os ancinhos de
arrasto numa posição oblíqua.
FURA-BUEIRAS — Arame
utilizado para limpar as bueiras.
GADANHÕES — Ancinhos
de arrasto, com um pente de 32 dentes.
GAIOLA — (Veja-se
portinhola).
GOLFIÕES — Duas peças
de madeira, com as dimensões médias de 0,22 m. de altura por 0,80 m. de
largo e 0,06 m de espessura, colocadas sobre a cobertura do castelo da
proa. Servem para amarração da sirga, descanso dos ancinhos, das varas,
do ferro ou para a fixação do respectivo cabo, quando fundeado o barco.
(O mesmo que mãozinhas).
LABOIROS — Pequenos
montes de moliço juntos com os ancinhos de apanhar, nas praias e nas
marinhas de sal.
LADRA — (Veja-se
matola).
LAMBAZ — Compõe-se
dum cabo de madeira, com o comprimento médio de 1,50 m., tendo, numa das
extremidades, sobrepostos e pregados, vários pedaços de trapo. Serve
para a lavagem do barco.
MALHADAS — Terrenos
ligeiramente inclinados, situados à beira-ria, onde se descarrega o
moliço para lhe ser extraída a percentagem de água, que constitui uma
sobrecarga inútil.
MÃOZINHAS — (Veja-se
golfiões).
MARÉ DE MOLIÇO —
Percursos de arrasto necessários para completar o carregamento do barco.
Quantidade de moliço colhido durante uma maré ou durante um dia de
trabalho.
MARISCAR — Colher o
moliço do fundo com os ancinhos de apanhar, estando o barco parado.
MATOLA — Barco
moliceiro mais pequeno, com, aproximadamente, 10 m. de comprimento. Tem
os bordos mais altos do que o moliceiro tradicional, para compensar, no
que respeita a capacidade de carga, o que lhe falta em comprimento. Não
tem painéis decorativos, sendo o casco totalmente embreado a pez negro.
Pequeno barco de 3 m. de comprimento, manejado à vara, que, antigamente,
era utilizado para o carregamento do moliço colhido em locais onde não
podia chegar o moliceiro, como, por exemplo, nas praias ou sítios de
pouca profundidade. Estes pequenos barcos também eram conhecidos pela
designação de ladras.
MOIRÃO — Vara de 4 a
6 m. de comprimento, que se fixa no fundo da ria e serve para atracação
do barco.
MOITÃO DA BICA —
Roldana, onde se fixa o bolinão.
MOLICEIRO — Nome do
barco e do próprio tripulante.
MOLIÇO — Vegetação
submersa da Ria de Aveiro, sem distinção de espécies, que a seguir se
discriminam: Carqueja, Carrapeto, Cirgo, Corga, Erva, Erva de Arganel,
Estrume novo, Fita, Folha, Folhada, Limo, Mormassa, Mormo, Musgo,
Papeira, Pinheira, Pojos, Rabos, Seba, Sirgo e Trapa.
MOSCAS — Fios que
fixam a mura à vela.
MOTAS — Parapeitos de
descarga do moliço, de reduzidas dimensões. Valas de água arrendadas
pelos moliceiros, para a apanha do moliço.
MURA — Cabo que
debrua a parte superior e inferior da vela.
ORELHA — Peça de
madeira, situada por estibordo, junto à cinta, atrás do painel da proa.
Por cima desta peça e fixada na cinta, há uma pequena corrente de,
aproximadamente, 0,30 m., que termina por um gancho adaptável a uma
argola, situada a 0,20 m. Este conjunto, orelha e corrente, tem a dupla
serventia de prender o barco ao moirão e evitar que este danifique o
costado, pelo atrito resultante da agitação das águas.
OSTAGA — Cabo fixado
à verga, que serve para içar a vela.
PÁ DE BORDA — Prancha
de pinho, com o comprimento de 2,30 m., variando: na largura: 0,70 m.,
0,80 m. ou 1 m. Serve de quilha, quando o barco bolina, e coloca-se no
bordo, por sotavento, meia mergulhada na água e segura por cabos que, a
partir de ambos os orifícios abertos na sua extremidade superior, vão
enlaçar-se na parte inferior do mastro. Cada embarcação possui 3 pás,
que dão, também, serventia de prancha; com este fim, um dos lados é
aparelhado com breu pulverizado de serradura, para lhe dar uma melhor
aderência. (O mesmo que toste).
PADIOLA — Espécie de
escada, que se compõe de 2 varas paralelas, sensivelmente fusiformes,
com o comprimento aproximado de 2 m. e ligadas, entre si, por 6 ou 8
travessas de 0,50 a 0,60 m., também fusiformes colocadas a espaços
iguais de, aproximadamente, 0,15 m. É transportada por dois homens e
serve para a descarga do moliço. Quase sempre acompanha a embarcação,
dependurada na proa, por bombordo.
PAINAS — Dois
estrados iguais, que cobrem o vão entre as duas primeiras cavernas de
água, ajustadas no sentido do comprimento. Têm a função de lareira.
PANEIRO — Estrado
situado à ré, sob o lugar do arrais. A última tábua, costaneira volante,
é desligada, com o propósito de facilitar o levantamento do paneiro.
PAU DAS TIRAS-VIRAS —
Pau cilíndrico, que se coloca encostado ao barrote da proa, fixado ao
argolão por uma corda e que tem, na parte superior, uma ranhura
circular, por onde passa a tira-vira.
PAU DOS PONTOS — Vara
quadrangular, com 1,50 m. de comprimento, que tem marcadas, por incisão,
as medidas que orientam o Mestre na construção de todos os barcos.
Constitui uma rudimentar régua de cálculo e tem por imediato auxiliar um
cordel vulgar — e nada mais.
PERNAS DO BOLINÃO —
Seis cordéis que unem o bolinão à vela.
PINTALHAS — Canas ou
ramos de árvore, espetados no fundo da ria, que servem de balizas de
sinalização.
PIQUE — Ponto mais
alto e estreito da câmara do castelo da proa, que tem a singular
serventia de arrecadar o pão, a vela do barco e cabos.
PODOA — Utensílio de
bordo que serve para partir lenha e aguçar os dentes dos ancinhos.
POR BAIXO DO VENTO —
Por sotavento.
POR CIMA DO VENTO —
Por barlavento.
PORTINHOLA — Pequena
gaveta, situada logo à entrada da cheleira de estibordo, fechada à
chave, para arrecadação dos documentos de bordo e algum outro objecto de
valor. (O mesmo que gaiola).
RAPÃO — Quando o
pente dos ancinhos de arrasto se parte pelo meio, aproveitam-se essas
metades, aplicam-se-Ihes cabos de cerca de 2 m. de comprimento e
formam-se estes ancinhos, geralmente empregados para apanhar o moliço, a
pé, nos cabeços que a baixa-mar deixa a descoberto.
RAPUCHO — Ponteiro em
ferro, com cerca de 0,20 m. de comprimento, que serve para tirar os
dentes partidos dos ancinhos.
RIZES — Ilhós abertos
nas costuras da vela, por onde passam cordéis, com o mesmo nome, que
servem para reduzir a superfície do pano.
SIRGA — Cabo que
serve para puxar o barco, quando este navega contra a corrente ou contra
o vento, junto às margens. (O mesmo que tira-vira, quando utilizada com
as funções desta).
TAMANCAS — Peças de
madeira, com o comprimento aproximado de 0,4 m., que se encaixam, nas
encalas, numa posição horizontal. Servindo de contracunha, conjugam as
suas funções com as das forcadas, para manter os ancinhos de arrasto numa
posição oblíqua.
TIRA-VIRA —
Modalidade de condução e nome do cabo empregado para tal fim. Prende-se
a tira-vira numa das extremidades do xarolo, faz-se passar,
seguidamente, pela ranhura do pau das tira-viras e amarra-se, por fim,
na outra extremidade do xarolo. Daqui, resulta que ambos os tripulantes
podem, ao mesmo tempo, trabalhar com as varas e governar o barco de
qualquer ponto onde se encontrem. Este cabo e modalidade de condução
também são designados par siga.
TOSTE — (Veja-se pá
de borda).
TRAQUETE — Vela
pequena usada, eventualmente, à proa, içada no mastaréu.
TRASTE — Prancha
fixada às dragas, por cima da coxia, com um orifício central, por onde
passa o mastro. É articulada longitudinalmente por dobradiças, para
facilitar o arrear do mastro.
TROÇA — Cabo que fixa
a vela ao mastro, na parte superior.
UTENSÍLIOS DOMÉSTICOS
DE BORDO — Um fogareiro de ferro, um caldeiro de ferro ou folha, várias
tigelas e palanganas de barro vermelho vidrado, colheres de folha e
garfos de ferro, uma bilha de barro vermelho ou barril de madeira com
pega de ferro, para a água, um podão, esteiras e roupa da proa,
constituída par mantas de agasalho e cobertas de trapo.
VARAS — Varas de
pinho de 4 a 6 m. de comprimento, que servem como meio de propulsão do
barco.
VARÃO — Ferro em que
se prende a escota e é fixado, interiormente, por estibordo da ré; este
varão arma na respectiva fêmea, colocada por bombordo, em local
correspondente. Fora das ocasiões de serventia e com o fim de facilitar
a passagem dos tripulantes, arma, então, na fêmea de descanso, situada a
estibordo.
VELA CAMBADA — Vela
colocada por bombordo, ao contrário do que é usual.
VERGA — Vara de
eucalipto, com o comprimento de 4 m., onde se prende a vela com os
envergues. (O mesmo que envergue).
VERTEDOIRO OU
VERTEDOURO — (Veja-se escoadoiro).
XAROLO — Vara de
pinho ou de eucalipto, com 2,50 m. de comprimento, que atravessa a parte
superior do leme e nas extremidades da qual se prendem as pontas dos
cabos do leme. |