Introdução

Aveiro, na década de 1940 e 1950, era uma cidade com poucas realizações culturais, para as quais as pessoas se achavam motivadas, mas não conseguiam arranjar modo de se organizarem e fazerem aquilo que, na verdade, desejavam. Muitas vezes por incompatibilidade com o poder político instituído, que cortava pela raiz qualquer hipótese de associativismo ou procura de conhecimentos, outras vezes por desmotivação repentina, quando se encontravam as primeiras dificuldades do percurso. Outras ainda por certo comodismo das próprias pessoas, que se permitiam o luxo dum falso conforto do «deixa andar», em vez de avançarem definitivamente para a efectivação das carências de convívio e de cultura que de facto sentiam.

Mas a vontade de diálogo, de permuta de conhecimentos, de busca de cultura, à medida que o tempo avança, vão-se fortalecendo, vão encontrando formas de tornear os obstáculos. Descobrem-se formas que conseguem, ainda que com persistência, atingir alguns dos objectivos, mesmo que mínimos, de reunir as pessoas para o salutar desenvolvimento intelectual individual, dentro da permanente relação colectiva, que se começa a desejar cada vez mais alargada.

Foi interessante ver-se em Aveiro a existência e funcionamento regular de um Cineclube, que acabou por esmorecimento dos seus membros, talvez por se integrarem nesse falso comodismo do «deixa andar». Aqui, teremos de fazer um parêntesis de homenagem a meia dúzia de cinéfilos que, embora individualmente, mas tenaz e persistentemente, continuaram a desenvolver trabalho criativo neste campo.

Foi interessante verem-se tertúlias de café que, à falta de melhores locais de convívio e reunião, faziam ali as suas conversas e as suas análises, até sobre as obras de reais valores da literatura portuguesa.

Foi bonito verem-se os alunos finalistas do Liceu de Aveiro a realizar anualmente uma récita, em que, para além dos aspectos cómico-satíricos, se fazia uma peça de teatro representada pelos mesmos.

Foi interessante ver-se o clube d'Os Galitos a pôr em cena três espectáculos de características aveirenses, que procuravam enaltecer os usos e costumes destas gentes: «Caldeirada», «Molho de Escabeche» e «Cantar do Galo».

Foi admirável ver-se um punhado de jovens ávidos de conhe­cimento a levar por diante um suplemento literário juvenil num semanário da Cidade – Litoral – que tinha por nome VAE VICTIS.

Houve de facto aspectos interessantes, mas que não passavam de pontuais de curta duração e sem seguimento. A necessidade intrínseca das pessoas esperava por mais. Havia que encontrar formas continuadas de ocupar os tempos livres em actividades culturais, para enriquecimento próprio e para colmatar o vazio que muitos começavam a sentir. Havia que dar corpo a uma destas ideias interessantes, para que ela fosse o início de uma árvore de fortes raízes, bem alta, cuja altura nunca se veria, pois o ideal seria nunca mais parar de crescer.

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