Continuação do texto da pág. 48

 

O referido laboratório foi entretanto instalado em construção própria, embora precária, tendo nós sido designado como orientador técnico dos estudos de celulose a realizar. Dois auxiliares não qualificados, constituíram, até à data em que ali trabalhámos todo o elenco activo deste pequeno centro de estudo.

Quanto a equipamento, foi possível guarnecê-lo de um mínimo de máquinas e aparelhos que permitiriam a realização de alguns estudos preliminares, dentro do que se havia planeado. Como é de calcular, as dificuldades de arranque e funcionamento foram muitas, não só pela nossa inexperiência como pelos problemas de toda a ordem que dominavam a época conturbada de então.

O Prof. Vieira Natividade, Director da Estação do Sobreiro, a quem ficámos devendo numerosos conselhos e ensinamentos no domínio da metodologia, programação e organização de trabalhos, sendo naturalmente um fisiologista distintíssimo, não podia dar-nos o apoio técnico especializado de que carecíamos. As dotações especialmente concedidas para o desenvolvimento dos estudos da celulose, eram limitadíssimas e cerceada: as tentativas de deslocação para estabelecimento de contactos e busca de elementos que nos permitissem resolver os problemas que surgiam. Também não podem classificar-se de significativas as relações estabelecidas entre os departamentos florestais incumbidos da execução dos planos de reflorestação e o laboratório da Celulose de Alcobaça.

Entretanto, foram analisadas várias espécies florestais, Folhosas e Resinosos, nomeadamente Choupos, Acácias, Ailanto, Castanheiro, Vidoeiro, Pinheiro bravo, Cupressus, etc., etc., e também resíduos agrícolas e plantas espontâneas, como palhas de cereais, despojos da poda da videira, giesta, caniços, etc., tendo-se feito inclusivamente tentativas para a extracção de celulose da rama da batateira, material que na época se propalou estar a ser usado por fábricas alemãs (!).

O laboratório da Celulose de Alcobaça foi sobretudo usado com sucesso para a execução de tirocínios de alunos finalistas do curso de Silvicultura que, ao elaborarem as suas teses adquiriam conhecimentos de base para uma possível especialização no estrangeiro.

Após a nossa saída de Alcobaça em 1945, o laboratório manteve-se com programas de investigação papeleira orientados pelo Eng.º Manuel Firmino da Costa, o qual dentre outros estudos técnicos sobre pastas de pinho pelo sulfato, levou a cabo um curioso estudo analítico dos principais papéis produzidos pela indústria nacional, considerando a sua importância para uma futura normalização e definição das característica: funcionais dos diferentes tipos consumidos. Com a passagem deste Técnico para a Companhia do Papel do Prado, em 1953, o laboratório de Alcobaça passou a ocupar-se mais especialmente de problemas de química aplicada, quer relacionados ainda com a indústria da celulose, quer estendendo-se a outros produtos extractivos ou derivados de origem florestal.

Em 1947, tendo regressado do estágio que realizámos em diversos laboratórios e Centros de estudo da França, fomos encarregados pela então «Junta de Investigações Coloniais» de organizar o estudo do aproveitamento e valorização das matérias primas vegetais do Ultramar.

Para instalação do novo laboratório foi-nos cedido o rés-do-chão de um prédio de Pedrouços, funcionando no 1.0 andar o Centro de Botânica da mesma Junta, do qual o laboratório que se designou de Histologia, e Tecnologia de Madeiras ficou constituindo uma dependência. As condições oferecidas eram, como pode calcular-se, francamente precárias, visto tratar-se de um espaço muito reduzido e de uma construção a muitos títulos imprópria.

Todavia, foi possível pôr a funcionar um laboratório de análises químicas de madeiras e instalar também um digestor que, juntamente com alguns aparelhos improvisados, permitiu dar início ao estudo de materiais trazidos de Moçambique por uma das missões botânicas que ali fizera prospecções em 1945. Os estudos de anatomia de madeiras tropicais foi igualmente aí iniciado, dele se encarregando o Eng.º Manuel Pinheiro Ferreirinha.

O desenvolvimento da actividade do Laboratório de Histologia e Tecnologia de Madeiras era, como facilmente se depreende, fortemente condicionado pelo facto de lhe serem atribuídas apenas dotações eventuais que, além de insuficientes, provinham de saldos de verbas, só disponíveis portanto no final dos anos económicos, reduzindo a oportunidade de as utilizara escassos 2 ou 3 meses.

Mau grado as dificuldades apontadas foi possível mesmo assim realizar nessas instalações o estudo preliminar de algumas espécies de Moçambique, com particular destaque para um «bambu» do género Oxitenainthera que foi tratado pelo método do sulfato.

Dados os inconvenientes que advinham da sua dependência de um Instituto orientado especialmente para os estudos de Sistemática Botânica, considerou-se oportuno que aquele centro de investigação aplicada passasse a funcionar com estrutura própria.

Esta solução foi conseguida em 1950, sendo transferidas as suas instalações para um pavilhão construído no Jardim do Ultramar, em Belém. Este edifício, propositadamente construído para servir de restaurante na Exposição do Mundo Português de 1940, prestava-se, mediante pequenas obras de adaptação, a receber o equipamento já adquirido, permitindo, com relativa largueza a acomodação de todo o equipamento capaz de levar bastante mais longe os trabalhos iniciados em Pedrouços.

Feita nesse sentido uma exposição à Comissão Executiva da JICU, foi possível obter nos anos 52 e 53 dotações especiais que, embora não muito avultadas, permitiram a execução das obras necessárias e dotar o LHTM com um equipamento suficientemente completo para se poderem executar, segundo as normas internacionais estabelecidas, os ensaios e análises correntes, que permitiram qualificar, do ponto de vista papeleiro, as amostras de materiais celulósicos remetidas para estudo.

Julga-se oportuno assinalar que ao LHTM nunca foi dada oportunidade de enviar às Colónias Portuguesas qualquer dos seus técnicos que localmente procedesse à prospecção e colheita de materiais cujo estudo se mostrasse oportuno, colhendo dados económicos e outros que teriam particular importância na definição do valor dos materiais estudados.

Com recurso aos meios então postos ao nosso alcance foram analisadas para cima de 80 espécies tropicais diferentes, incluindo 32 «eucaliptos» e diversas espécies herbáceas e arbustivas. Os resultados dos ensaios foram quer registados em relatórios, quer publicados em revistas diversas que tiveram a sua divulgação e permitiram o estabelecimento de relações com laboratórios e Institutos estrangeiros da especialidade.

Faz-se ainda notar que o LHTM lutou sempre com grandes dificuldades para manter um «staff» de pessoal técnico estável visto não lhe serem dadas facilidades para a sua contratação. Praticamente apenas pôde contar com elementos colaborando em tempo parcial, beneficiando eventualmente da ajuda proporcionada por alguns finalistas do Curso de Silvicultura do I. S. A. cuja permanência, correspondente ao tempo do seu estágio e elaboração da tese, não ultrapassava os dois anos. A progressiva redução sofrida pelas dotações que ano a ano lhe eram concedidas restringia cada vez mais as capacidades de acção do LHTM. / 51 /

Sentindo-se entretanto que a actividade do LHTM era imprescindível não só para marcar a posição portuguesa num campo científico e técnico que não poderia ser descurado, dada a necessidade de acompanhar o incremento, o progresso e a inovação afectos à industrialização e comércio de matérias-primas florestais que muito interessava valorizar, procurou-se uma solução realista capaz de ultrapassar os obstáculos postos.

As obras de restauro e ampliação processadas em 1958 no Laboratório de Tecnologia Florestal do I. S. A, com vista a dar apoio ao ensino da Disciplina de «Tecnologia Florestal» incluída no currículo de cadeiras a professar no Curso de Silvicultura pela reforma do ensino em 1954, ofereciam condições muito propícias para, mediante um convénio estabelecido entre a J. I. C. U. e o I. S. A. transferir para este Laboratório todo o equipamento respeitante aos ensaios de pasta para papel que constituía património daquela Junta.

Programas de colaboração já existentes entre os dois Laboratórios facilitaram a elaboração e aprovação de um Protocolo, tendo-se efectuado a mencionada transferência em Outubro de 1963.

Além da qualidade das infra-estruturas, a existência de pessoal auxiliar e técnico adstrito ao Laboratório de Tecnologia Florestal do I. S. A, representaram um efectivo progresso para as condições de trabalho e restrição de despesas.

Financeiramente, os laboratórios assim associados, puderam ainda beneficiar de verbas atribui das pelo MEIC, nomeadamente através de dotações especialmente concedidas pelo então Instituto de Alta Cultura (1970 a 1974). Embora essas verbas não se cifrassem em grandes quantias, a já existência de um equipamento de base permitiu com o seu recurso proceder à complementarização do equipamento existente e à renovação de alguns instrumentos em uso há mais de 25 anos.

Os programas de trabalho do l. H. T. M. continuaram incidindo sobre o estudo de espécies tropicais, particularmente essências exóticas introduzidas em Angola, que incluíam além da E. saligna X E. grandis, alguns choupos (P. deltoides) e também certos Pinus de crescimento rápido (Pinus elliotii, P. hale-pensis, P. patula, etc.).

Em relação aos programas do Laboratório de Tecnologia Florestal do I. S. A foram principalmente dirigidos para o estudo das possibilidades de obtenção de pastas de alto rendimento, quer por métodos termo-mecânicos, quer pelo método do sulfito neutro, tendo-se em vista encontrar um meio de reduzir, na medida do possível, uma importação que, como se sabe, ascende a mais de 40 000 toneladas de papel de jornal, correspondente a um sacrifício de divisas superior a meio milhão de contos.

Recentemente os programas de trabalho foram ampliados englobando novas linhas de acção, o que resultou de se ter estabelecido uma colaboração entre o Laboratório de Tecnologia Florestal do I. N. I. C. e o Laboratório de Tecnologia Florestal do I. S. A.

O projecto de investigação do C. E. F., iniciado em 1975, pretende levar a cabo uma análise do «Ecossistema Eucaliptal», avaliando os efeitos que pode representar no meio ambiente a cultura intensiva de uma exótica que, cobrindo uma área superior aos 200 mil ha., se afirma de uma enorme importância económica no sector silvo-industrial do País.

No aspecto propriamente tecnológico, é considerado naquele Projecto um «sub-projecto» cujo programa tem como preocupação o estabelecimento de correlações entre os tipos de ecossistemas existentes no País e as características do segmento da sua biomassa «madeira». Paralelamente têm vindo a processar-se estudos relativos ao aproveitamento para o fabrico de pastas celulósicas, de outros segmentos, nomeadamente a casca, o cepo e a ramagem.

São assim passados 40 anos de esforços para manter em funcionamento um núcleo de experimentação que no campo da Ciência Florestal desse apoio à resolução dos problemas necessariamente interligados entre a produção de pastas celulósicas e o abastecimento em matérias-primas. Entretanto a indústria progrediu no crescimento da sua produção muito para além do previsível e o significado económico dessa expansão é para o País dos mais promissores.

Permitimo-nos todavia insistir que cada vez mais se torna indispensável ao País poder contar com um Centro de Estudos devidamente equipado e financiado para, em moldes seguros e de acordo com uma integração adequada, poder planear a nível nacional, as soluções realistas dos problemas complexos que se põem.

Lisboa, 3 de Julho de 1978.

L. S.

____________________________________________

Professor Catedrático do Instituto Superior de Agronomia

 

 

 

Página anterior

Índice Página seguinte