Achega para quem tiver de
montar o Museu Municipal
João Evangelista de Campos
Esta ACHEGA destina-se,
principalmente, a ajudar quem tiver de fazer a montagem do Museu de
Aveiro que a Câmara Municipal pretende efectuar. São elementos que me
vieram ás mãos nas minhas pesquisas e, pelo que se vê dos sublinhados
que fiz, verifica-se que os objectos cedidos pela Câmara o foram a
título de depósito; e, até, numa das actas se consignou que o Museu
Regional de Aveiro e a Confraria do Santíssimo Sacramento da Glória
ficavam obrigados à restituição dos objectos cedidos, logo que a Câmara
o exija.
Calculo que, quanto aos
artigos que serviram de base à criação do Museu em 1930 (ofertas do
saudoso e estudioso aveirense Dr. Alberto Souto), não haverá qualquer
problema para fazerem parte do Museu Municipal, pois devem estar
reunidos e á guarda do Museu Nacional de Aveiro – e foram-no com a
devida autorização ministerial, conforme consta da informação dada pelo
Dr. Alberto Souto e registada na acta da Câmara Municipal quando recebeu
esses objectos. Quanto aos outros, ou porque estarão inventariados como
pertencentes àquele Museu ou pela invocação de usucapião, é mais difícil
– talvez – obter a sua restituição. Suponho, no entanto, que tais
objectos não interessarão ao Museu Nacional, pois este é especialmente
de Arte Sacra, sendo pois natural que, por ordem superior, eles possam
ser entregues para figurarem no Museu Municipal.
Esta ACHEGA dá porém – penso
eu – a quem tiver de fazer a montagem do Museu Municipal os elementos de
prova que eles pertencem à Câmara Municipal e, portanto, devem ser
expostos neste Museu.
Vejamos, pois, o que
consegui averiguar a tal respeito:
Como se vê do ofício n.º 150
do Governo Civil de Aveiro, datado de 4 de Setembro de 1911 e assinado
pelo Dr. Rodrigo José Rodrigues, foi este quem tomou a iniciativa de
destacar o amanuense João Augusto Marques Gomes, cidadão de muito e
reconhecido mérito e competência como antiquário, escritor e, também,
cultor de arte diz-se naquele ofício – para construir a base do Museu de
Arte Sacra que a Comissão Municipal determinou instalar no Convento de
Jesus, para evitar a perda dos artigos contidos neste Convento.
Diz-se mais, no referido
ofício, que o Governo Civil põe toda a sua boa vontade e serviço à
disposição da Câmara, mantendo o referido amanuense encarregado de
proceder àquela instalação; julgava, no entanto, que a Câmara deveria
chamar para si a direcção daquele serviço e inscrever a verba necessária
para estes trabalhos.
A Câmara, na sua sessão de 6
de Setembro, resolveu agradecer àquele Governador Civil o esforço que
fez para a instalação do Museu Municipal no referido Convento, louvando
os serviços prestados por Marques Gomes e informando que a Câmara apenas
tomou posse dos edifícios dos suprimidos Conventos (o de Jesus e o das
Carmelitas) e não de quaisquer mobiliários e objectos de arte que neles
se encontram, pois estes estão confiados à guarda e responsabilidade do
Delegado do Procurador da República, nesta Comarca. Assim, só quando lhe
forem entregues aqueles bens, poderá estudar o plano da referida
instalação, de acordo com outras a fazer ali; e, só por ocasião da
organização do seu orçamento para 1912, poderá dotar convenientemente as
despesas a fazer com o citado Museu.
A
Câmara tomou posse dos edifícios dos Conventos de Jesus e das Carmelitas
em Julho de 1911, conforme se vê da acta da sessão de 13 daquele mês e
ano, e, nessa altura, telegrafou ao Ministro da Justiça a agradecer-lhe
a valiosa cedência daqueles edifícios. E, na sessão de 23 de Agosto, o
Presidente Daniel Gomes de Almeida propôs a instalação, no Convento de
Jesus, de várias instituições a cargo da Câmara, com o fim de a libertar
do pagamento das rendas de casa que pagava pelos locais ocupados pelas
mesmas, isto devido ao precário estado financeiro da Câmara.
Na sessão de 25 de Outubro
de 1911, a Câmara resolveu representar à Comissão dos Monumentos
Nacionais para que do Museu Municipal
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não fosse retirado qualquer objecto que a ele deva pertencer, pois
consta haver intenção de levar alguns desses objectos para o Museu
Nacional de Lisboa.
Pela acta da sessão de 4 de
Janeiro de 1912, verificou-se que, por solicitação do Governador Civil,
a Câmara resolveu que fossem transferidos, como depósito, para o Museu
Municipal que se está organizando os seguintes objectos pertencentes à
Câmara:
– 2 padrões em bronze de
almude e meio almude.
– 2 padrões em bronze, de antigos pesos;
– A bandeira antiga do Município;
– A bandeira da extinta Câmara de Esgueira;
– Os antigos chapéus do trajo camarário;
- 1 reposteiro bordado a restalho;
– Os talizes que têm servido na procissão de Corpus Christi;
– 1 baixo relevo em madeira, representando a Visitação de Nossa Senhora
a Santa Isabel.
O
Governador Civil, pelo seu ofício n.º 121 de 9 de Janeiro de 1912,
confirmou terem entrado no Museu aqueles objectos, acrescentando-lhe uma
maquete da estátua de José Estêvão e 3 xairéis antigos bordados a
restolho mas não mencionava nem os talizes, nem os chapéus.
Na sessão de 25 de Janeiro
de 1912, a Câmara, a pedido do Governador Civil (ofício n.º 194 de 23 de
Janeiro), resolveu ceder por depósito para o Museu Municipal a moldura
doirada do retrato de D. Manuel, a fim de ser aplicado – diz o ofício do
Governador Civil – a cingir uma exposição de fotografias oferecidas pela
Casa Biel, referentes a objectos que hoje estão já recolhidos no
indicado Museu.
O Governador Civil, pelo
ofício n.º 196 de 30 de Janeiro, agradeceu à Câmara a cedência da
referida moldura.
Na sessão de 19 de Dezembro
de 1912, a Câmara resolveu autorizar a saída, para o Museu Municipal, de
um livro de registo existente no seu arquivo, com capas de carneira e
incrustações metálicas, livro de valor artístico, que no dito Museu tem
lugar especial.
Em Abril de 1915, António da
Silva Melo Guimarães deixou, por testamento, à Biblioteca do Museu de
Aveiro, todos os livros que eram dos seus irmãos Joaquim e Manuel,
alguns dos quais têm honrosas dedicatórias de brasileiros e portugueses
ilustres, recomendando que esses livros fossem enviados ao Sr. Marques
Gomes, como se vê da notícia publicada no Jornal "O Democrata" com o n.º
365, de 9 de Abril de 1915.
Na sessão do Senado
Municipal de 18 de Outubro de 1915 foi resolvido conceder ao Museu
Nacional de Aveiro, nos termos das concessões anteriores, por depósito,
a colecção dos tomos, que existem no arquivo municipal, do Diário da
Antiga Câmara dos Deputados e a colecção das Ordenações do Reino.
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A pedido do Director do
Museu Regional de Aveiro, foi resolvido, na sessão de 17 de Outubro de
1918, deixar ficar à guarda do mesmo, e até que seja de novo colocado no
mercado do mesmo nome, a construir no Cojo, o medalhão que encima o
frontispício do Mercado de Manuel Firmino, em demolição.
Na sessão de 9 de Janeiro de
1919, foi resolvido confiar à guarda da Confraria do Santíssimo
Sacramento da Glória uma imagem de S. Sebastião, pertencente ao
Município e, bem assim, do Museu Regional de Aveiro o pendão municipal,
com a obrigação de aquelas duas entidades fazerem a sua restituição logo
que pela Câmara lhes for ordenado e pondo-se o pendão no seguro.
Nessa mesma sessão ficou
resolvido também fazer retirar, sem demora, da frontaria do extinto
Mercado de Manuel Firmino o medalhão que ainda ali se encontra, e
entregá-lo, nos termos da sua deliberação, ao referido Museu.
Na sessão de 30 de Julho de
1931, a Câmara autorizou o pagamento de 100$00 por uma placa
representando umas ai minhas, adquiridas para o Museu Municipal.
Ao Museu de Aveiro, segundo
se vê de uma notícia publicada no jornal "O Democrata" n.º 1366, de 6 de
Abril de 1935, ofereceu o nosso conterrâneo Manuel Luís Coimbra
Flamengo, residente em Lisboa, uma valiosa colecção de 154 moedas,
algumas das quais muito antigas e novas.
Isto foi o que me veio parar
às mãos; aceito, porém, que haverá outras coisas depositadas no Museu
Nacional – e que não interessem às suas colecções e possam interessar ao
Museu Municipal, por serem, ou terem sido, propriedade da Câmara, ou
oferecidas com o fim de virem a pertencer a este último Museu.
João Evangelista de Campos
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