A predominância dos núcleos de
produção leiteira, a nível das pequenas explorações agrícolas de
tipo familiar, característica desta zona de minifúndio, é
determinada pelas condições estruturais destas empresas, assentes na
policultura intensiva associada à pecuária, uma vez que o
encabeçamento da superfície forrageira disponível é factor decisivo
de grande intensificação cultural dos terrenos destinados ao
cultivo.
Os agricultores regionais, com base
num ajustado equilíbrio entre o equipamento utilizado e a mãe de
obra disponível que, na generalidade dos casos, se apresenta, a
nível da exploração, em situação de sub-emprego ou desemprego oculto
– procuram maximizar as receitas líquidas da sua exploração, à custa
de uma rigorosa economia na utilização dos factores de produção
externos e do pleno emprego dos factores internos disponíveis, e que
os conduz, naturalmente, à adopção de esquemas de cultivo
trabalho-intensivos, por forma a suprir as deficiências estruturais
dos seus aparelhos de produção artesanais.
Neste sentido, procuram assegurar a
produção forrageira da sua exploração, prioritariamente através de
culturas furtivas ou intercalares que não afectem as sucessões
culturais assentes nas culturas tradicionais de milho, feijão e
batata, nos terrenos de regadio ou no cultivo de cereais
secundários, a anteceder a cultura da batata, nos terrenos de
sequeiro. Daí a resistência que costumam opor à introdução de prados
temporários, precedendo as principais culturas sachadas – milho e
batata – face às suas menores exigências em mão-de-obra que não
permite rentabilizar o pleno emprego deste factor de produção, a
nível da exploração.
A constatação destes factos leva-nos
à convicção que toda a política de intensificação forrageira, a
nível regional, terá de se basear no conhecimento prévio dos
sistemas de produção de forragens tradicionais, de modo a
possibilitar a elaboração de calendários forrageiros provisionais
bem adaptados às características estruturais das explorações
agrícolas regionais.
Os dados que presentemente se
dispõem, relativos à análise económica da exploração leiteira
evidenciam que, na maior parte destas explorações, o rendimento do
produtor de leite se encontra na dependência de dois factores de
produção essenciais:
1) A quantidade de leite produzido
por ha de superfície forrageira utilizada pelas vacas leiteiras.
Esta quantidade é o produto:
– da produção de leite por vaca;
– e do número de vacas por ha de
superfície forrageira.
2) A quantidade de leite produzida
por unidade de trabalho.
Se procurarmos analisar, mais
pormenorizadamente, cada um destes factores, apercebemo-nos que, a
cada nível da sua utilização, o sistema de produção forrageira
intervém de forma determinante. Assim, e de forma esquemática,
poderemos apresentar a correlação existente entre as diferentes
variáveis que interferem na definição do sistema forrageiro:
– A produção de leite por vaca e por
ano é função:
1 – do estado sanitário dos animais
(mamites, brucelose, etc.);
2 – do nível inicial das lactações
(potencial genealógico dos animais;
/ 20 /
2 - O tempo de ordenha.
Um bom sistema forrageiro deverá,
assim, permitir:
– Uma elevada carga por ha de
superfície forrageira;
– Um bom nível de produção a partir
da ração de base com economia de concentrados;
– Uma boa produtividade de trabalho,
com investimentos moderados.
Tendo na devida conta os
condicionalismos da produção forrageira, a nível das pequenas
explorações agrícolas regionais que se situam, na sua quase
totalidade, abaixo dos 5 ha de S, A. U., toda a intensificação deste
sector terá que assentar numa progressiva alteração dos esquemas de
cultivo tradicionais, por forma a não pôr em causa o equilíbrio da
exploração e os níveis de emprego da mão-de-obra existente. Neste
contexto, a introdução do «Ray-Grass» de Itália, cujo ciclo de
exploração não ultrapassa os 18 meses, nos esquemas de cultivo
tradicionais de regadio, quer em sementeira de outono, quer em
sementeira de primavera, poderá vir a constituir a base de um
sistema forrageiro, simples e racional, a estabelecer a nível
regional, na medida em que é susceptível de fornecer uma produção de
erva escalonada ao longo de todo o ano, sem pôr em causa a
realização dos cultivos tradicionais de milho, feijão e batata.
Tradicionalmente, o «Ray-Grass» de
Itália semeia-se em fins do verão, fornecendo cortes e/ou pastagens
desde Outubro-Novembro e atingindo um máximo de produção no período
de Abril-Maio. Durante o verão, a sua produção é exígua e manifesta
tendência a um espigamento precoce neste período do ano. A sua
principal vantagem consiste em fornecer um elevado rendimento de
matéria seca por ha, que pode atingir as 12-15 toneladas, com uma
aplicação de 300 unidades de N por ano.
Pelo contrário, o «Ray-Grass» de
Itália semeado a partir do mês de Março-Abril fornece um primeiro
corte em Junho, atingindo, em Julho-Agosto, 50 % da sua produção
anual.
As variedades não alternativas desta
gramínea forrageira, semeadas em Março, não espigam e o seu valor
energético varia pouco com a idade, pelo que se apresenta como uma
forragem ideal para a produção intensiva, com um rendimento que é
susceptível de ultrapassar as 12 toneladas de M. S. no ano de
sementeira, desde que beneficie de uma adubação de 250-300 unidades
de azoto.
O quadro que se segue, evidencia a
repartição da produção do «Ray-Grass» de Itália, em função da
estação e da época de sementeira:
|
Estação |
Abril-Maio-Junho |
Julho-Agosto |
Set.-Out.-Novembro |
Sementeira de Outono |
60 a 65 % |
20 a 25 % |
10 a 15 % |
Sementeira de Primavera |
25 a 30 % |
45 a 50 % |
20 a 25 % |
R. G. I. em 2.º ano |
65 % |
10 a 15 % |
20 a 25 % |
|
|
Estes dados, embora de origem
francesa e susceptíveis de naturais ajustamentos a esta zona
ecológica, evidenciam o interesse que há em associar, num sistema
forrageiro intensivo, o R. G. de Itália, em sementeira de primavera,
ao «Ray-Grass» inglês ou de Itália, em sementeira de outono, por
forma a possibilitar um melhor escalonamento da produção de erva ao
longo de todo o ano.
A sua introdução nos sistemas
forrageiros tradicionais de regadio, nesta região, poderá fazer-se
facilmente, a partir do estabelecimento dos seguintos afolhamentos:
/ 21 /
1 – Com o «Ray-Grass» de Itália, em
sementeira de outono, em rotação bi-anual:
Milho X R.G.I. – R.G.I.
2 – Com o «Ray-Grass» de Itália, em
sementeira de primavera, em rotação trianual:
Milho X Ferrejo - R.G.I. – R.G.I. X
Couve
Para as sementeiras realizadas em
fins de Março – 1.ª quinzena de Abril, são de prever produções
compreendidas entre 3 e 4 ton. de M. S./ha., nos dois primeiros
cortes ou passagens, a efectuar entre Junho-Julho, 1,5 a 2 ton. de
M. S./ha. em 3.º corte ou passagem, em Agosto-Setembro e 1 ton. de
M. S./ha. em 4.º corte ou passagem, em Outubro-Novembro.
O primeiro corte terá assim lugar 2
meses a 2,5 meses após a sementeira, seguindo-se posteriormente mais
3 a 4 cortes ou passagens, espaçados de 4 a 5 semanas. No 2.º ano
após a sementeira, poderá ainda fornecer 2 a 3 cortes de Abril a
Julho, com produções idênticas ou superiores às registadas no ano da
sementeira.
O R. G. de Itália, semeado no outono,
poderá fornecer um primeiro corte ou passagem em Março-Abril, uma
2.ª exploração em meados de Maio e uma terceira, em fins de Junho,
com produções da ordem das 2 a 3 ton. de M. S./ha em cada
exploração. A partir de Julho a sua rebentação será mais fraca,
podendo ser, nessa altura, substituído no sistema de aforrajamento,
pelo R. G. de Itália semeado na primavera. A sua última rebentação,
em Setembro-Outubro, poderá compensar a diminuição que, entretanto,
se irá registar na produção do R. G. da Itália semeado na primavera.
As variedades não alternativas de «Ray-Grass»
de Itália, mais conhecidas entre nós, são de origem francesa:
Tetrone e Tiara. Tetrone, pobre em M.S., adapta-se mal à fenação,
mas revela maior resistência às ferrugens e uma maior
digestibilidade. Tiara afigura-se-nos convir de preferência às
sementeiras de outono, por ser mais fácil de fenar. A primeira
destas variedades já foi experimentada, com êxito, na Estação de
Fomento Pecuário de Aveiro, em Verdemilho, esperando nós, em breve,
poder confirmar localmente os níveis de produção previstos para os
diferentes ciclos de exploração, em sementeira de outono ou de
primavera, através de dados colhidos naquela mesma Estação.
Conclusão
– Gramínea de fácil implantação em regiões de clima fresco e húmido,
o «Ray Grass» de Itália pode fornecer uma elevada produção
forrageira, rica em proteínas e em minerais, graças a uma
fertilização azotada elevada, acompanhada de uma adubação de fundo
equilibrada.
Cavalos nas margens da Ria.
Face às possibilidades que se nos
oferecem na escolha de variedades e época de sementeira, a sua
exploração racional em pastoreio ou em corte pode fornecer uma
produção que se reveste de particular interesse nos períodos
difíceis do início e fim de inverno, para todas as explorações
forrageiras do litoral. Cultura complementar do milho-forragem, nos
afolhamentos e na alimentação dos bovinos, o «Ray-Grass» de Itália
pode proporcionar aos agricultores que o saibam cultivar e utilizar,
um meio de aumentar a carga pecuária das superfícies forrageiras
disponíveis, as produções animais e, consequentemente, os
rendimentos das suas explorações.
Aveiro, 21 de Fevereiro de 1977 |