As circunstâncias em que se
desenvolveu o plano deste breve estudo, há quase oito anos, estão em
parte superadas pelas modificações demográficas e económicas
ocorridas no sector agrícola do distrito desde então. A evolução da
Economia em geral e da política agrária, bem como o aparecimento de
novas estruturas de produção e comercialização organizadas dentro da
Agricultura, vieram dinamizar um tanto actividades estagnadas.
(1)
Em alguns aspectos essas alterações
foram profundas e o texto perdeu carácter de actualidade para
imergir num passado próximo, mas circunstancialmente já remoto
(economia do leite e da carne e avicultura, por exemplo). Noutros
casos, o momento do devir económico-social fixado não envelheceu
ainda, com matizes reconhecíveis no sector agrícola de hoje. De
qualquer modo o que se delineou foi apenas um esboço ou breve
apontamento que permitisse, sem perda de objectividade, infundir
carácter unitário a aspectos caracterizadores do sector agrícola e a
problemas gerais de mais urgente solução. Evitou-se voluntariamente
invadir determinados domínios da Economia agrária, em que há
técnicos especializados no distrito com larga experiência de
matérias de que nos limitámos apenas a dar informação sucinta e
muito abreviada (economia do leite e economia do vinho, por
exemplo).
O estudo inicial foi remodelado e
sofreu cortes no texto e em quadros numéricos que lhe fariam
diminuir a concisão sob a forma de artigo. Em verdade não se
considerou o distrito, mas somente o quadro administrativo composto
por 13 dos seus concelhos (que, por razões de simplicidade,
designaremos por região), não tendo sido incluídos os de Arouca,
Castelo de Paiva, Espinho, S. João da Madeira, Sever de Vouga e Vila
da Feira. Não houve com esta limitação o menor intuito de
hierarquizar, debaixo de qualquer critério, os concelhos do
distrito, subestimando a importância e truncando do conjunto os seis
concelhos já assinalados; tão-somente o propósito, (estando todos
eles quer nas suas gentes, quer na sua agricultura, à margem da
nossa experiência concreta de vários anos como técnico regional), de
preferirmos não os incluir a considerá-los sob o ângulo estatístico,
na crença ilusória e vã de que basta apenas deixar falar os números.
/ 32 /
A Região que integra os concelhos do
distrito considerados é constituída essencialmente, no ponto de
vista geológico, pela parte setentrional da orla litoral
mesozóica-cenozóica e por um núcleo de terrenos do Arcaico,
Precâmbrico, Câmbrico e por Granitos, que faz parte do rebordo oeste
do elemento morfológico fundamental da Península, a Meseta.
Contactam ambos por uma linha que corta transversalmente o rio
Vouga.
A orla litoral referida é na Região
uma extensa planície, entrecortada de breves ondulações, sendo a
norte do rio Vouga representada principalmente pelo Moderno e, a sul
do mesmo rio, pelo Moderno e Pliocénico, em duas vastas manchas
contíguas. É, no entanto, grande a sua complexidade geológica pelos
múltiplos afloramentos de terrenos sedimentares mais antigos, de que
se assinalam como mais importantes, ao norte do Vouga, junto de
Estarreja, uma pequena chanfradura de Pliocénico e Cretácico e, ao
sul do mesmo rio, uma mancha de Cretácico desde as imediações de
Aveiro até ao sul de Vagos, outra de Jurássico na região bairradina,
a oeste de Anadia, constituída por terrenos calcários, e inúmeros
retalhos de Triássico, constituído por arenitos vermelhos, de Angeja
a S. João de Loure, junto à Pateira de Frossos, em Eirol e Águeda,
nas margens da Pateira de Fermentelos e do curso inferior do
Cértima, e a leste de Anadia.
O rio Vouga com os seus inúmeros
afluentes e subafluentes e a ria de Aveiro, extensa laguna litoral
de cerca de 45 quilómetros de comprimento máximo, dotada em profusão
de braços e canais tentaculares, bem como as «linhas» de água
secundárias que nela desaguam directamente, assentes num substrato
geológico tão variado, imprimem à Região um facies geográfico
«sui-generis», com grande diversidade e complexidade de
aspectos.
A proximidade do mar e da ria de
Aveiro têm uma influência profunda sobre as condições da actividade
agrícola da Região, o primeiro actuando como regulador de clima, a
segunda fornecendo o moliço como fonte essencial de matéria orgânica
para a manutenção da fertilidade das terras de areia do litoral.
Do ponto de vista climático e de
solos (à parte os solos não evoluídos do litoral) o distrito
manifesta ao mesmo tempo influências atlânticas e mediterrânicas,
atenuando-se as primeiras progressivamente de Norte para Sul e
acentuando-se as segundas.
O distrito de Aveiro é, a seguir aos
do Minho e Douro Litoral, aquele que evidencia no Continente
influências atlânticas mais profundas bem patentes no seu regime
pluviométrico, humidade relativa do ar, regime de temperatura e
outros elementos de clima. Daí que seja o Noroeste, em que se
integra o distrito, uma das zonas do país mais favoráveis à produção
de forragens de qualidade e, de um modo geral, com vocação leiteira
acentuada, determinada pelas suas condições de clima e solos,
contrastando com os distritos do Sul. Apesar de tudo a rega impõe-se
no período estival para compensar o deficit hídrico das
forragens e de outras culturas.
No sector agrícola do distrito
assinala-se a rigidez da estrutura agrária com o predomínio de
explorações artesanais, minifundiárias, no âmbito da produção, e a
dificuldade de recombinar dois dos factores produtivos, terra e
capitais, ao nível de iniciativas empresariais modernas, adaptadas à
procura dos mercados. Em face do êxodo rural, que tem vindo a
acentuar-se, a reorganização da actividade agrícola tem sido
demasiado lenta, apesar da rarefacção progressiva de mão-de-obra no
campo.
Dadas as dependências
intersectoriais que o desenvolvimento económico forja é de crer que
a crise da Agricultura possa vir a repercutir-se desfavoravelmente
na Indústria e nas outras actividades da Região, gerando-se um
crescimento económico pouco harmonioso.
A crise da Agricultura levanta assim
o problema mais vasto do desenvolvimento económico regional. É a
esta luz que tem de ser encarado o êxodo agrícola acelerado, que em
muitos casos tem mais o aspecto de abandono ou fuga dos campos, e a
drenagem espectacular de homens, os mais válidos da grei rural, para
França ou outros países, que nos revela a impotência da Indústria em
reter parte do caudal humano que demanda o estrangeiro.
Poderá esboçar-se um quadro em que a
Agricultura regional seja mostrada na tessitura de alguns aspectos
económicos, estruturais e funcionais, mais importantes? É o que se
tentará, na medida do possível, com o recurso a elementos
estatísticos disponíveis.
(2)
A população residente na Região
considerada era de 352 643 pelo Recenseamento de 1960 (números
provisórios).
O crescimento demográfico apresenta
contudo grande disparidade no conjunto de concelhos que a integram.
No decénio 1950-60 (Quadro I) a taxa de incremento da população foi
superior a 1,5 % nos concelhos de Ílhavo e Aveiro e a 1 % nos de
Oliveira de Azeméis e Águeda, excedendo a média da Região (e a do
Continente).
Por outro lado, no mesmo período, e
no pelo oposto, a população diminuiu em valor absoluto nos concelhos
da Murtosa e de Oliveira do Bairro e no de Anadia quase se manteve
estacionário.
A cobertura demográfica no
território em apreciação pode ser referida ao nível dos concelhos
/ 33 /
(Quadro II) desde que se considerem as medidas com prudência e
apenas a título indicativo, dada a heterogeneidade relativa do
espaço físico e económico.
Na sua superfície, em números
redondos à volta de 200 000 ha.,
(3) a densidade demográfica
(população residente) em 1950, 164,7 hab./km2, era quase
o dobro da do Continente (no mesmo ano, a Itália tinha 155 hab./km2,
a França 76 e a Holanda 314).
Ainda sob o aspecto demográfico
verifica-se (Quadro III) que, no decénio 1951-60, apenas os
concelhos de Aveiro e Ílhavo constituíram centros de atracção
demográfica já que, em ambos, os respectivos saldos fisiológicos
foram ultrapassados pelo incremento da população; os restantes
perderam população em grau variável equivalente a parte dos seus
saldos, à excepção da Murtosa e de Oliveira do Bairro, nos quais a
população diminuiu em valor absoluto.
QUADRO I – População residente nos
concelhos em 1950 e em 1960 |
|
Concelhos |
População residente |
Variação da população residente |
% em relação a 1950 |
1950 |
1960 (*) |
Águeda |
32991 |
36612 |
3621 |
10,9 |
Albergaria-a-Velha |
18870 |
18789 |
919 |
5,1 |
Anadia |
28552 |
28815 |
263 |
0,9 |
Aveiro |
40187 |
47680 |
7493 |
18,6 |
Ílhavo |
21513 |
25296 |
3783 |
17,5 |
Mealhada |
17214 |
17759 |
545 |
3,2 |
Oliveira do Bairro |
17242 |
16734 |
-508 |
-2,9 |
Vagos |
20131 |
21430 |
1299 |
6,41 |
Estarreja |
24709 |
25213 |
504 |
2,0 |
Murtosa |
13172 |
12328 |
-844 |
-6,4 |
Oliveira de Azeméis |
41370 |
46263 |
4893 |
11,7 |
Ovar |
33348 |
35320 |
1972 |
5,9 |
Vale de Cambra |
19193 |
20404 |
1211 |
6,3 |
TOTAL |
327492 |
352643 |
25151 |
7,6 |
Continente |
7913802 |
8510799 |
596997 |
7,5 |
|
|
(*) Resultados provisórios do Censo
Demográfico.
QUADRO II – Áreas e densidades da
população total e activa agrícola, por concelhos |
|
Concelhos |
Área total
Km2 |
Habitantes
por Km2
1950 |
População activa
agrícola por Km2 |
Águeda |
337,28 |
91,7 |
20,1 |
Albergaria-a-Velha |
145,16 |
121,4 |
22,4 |
Anadia |
209,72 |
134,2 |
31,0 |
Aveiro |
208,64 |
191,4 |
28,1 |
Ílhavo |
67,68 |
304,7 |
36,2 |
Mealhada |
119,04 |
143,1 |
28,6 |
Oliveira do Bairro |
86,40 |
196,2 |
51,4 |
Vagos |
172,48 |
112,9 |
28,2 |
Estarreja |
125,16 |
197,4 |
32,1 |
Murtosa |
54,60 |
241,2 |
29,1 |
Oliveira de Azeméis |
153,32 |
269,8 |
34,8 |
Ovar |
160,20 |
208,1 |
24,1 |
Vale de Cambra |
148,28 |
129,4 |
30,3 |
TOTAL |
1987,96 |
164,7 |
---- |
Continente |
88419,04 |
88,5 |
15,9 |
|
|
NOTA – Área dos concelhos, excluindo
a Ria de Aveiro (em km2): Aveiro, 184; Ílhavo, 63,45; Vagos, 167,68;
Murtosa, 44.10; Ovar, 151,90
/ 34 /
|
QUADRO III – Saldos líquidos dos
movimentos migratórios da população no decénio 1951-1960 |
|
|
Concelhos |
Variação da população
residente |
Saldos fisiológicos |
Atracção |
Repulsão |
Atracção ou
repulsão |
--------------------- x 100 |
População residente
em 1950 |
|
Águeda |
3 621 |
2433 |
-- |
1179 |
--
3,5 |
Albergaria-a-Velha |
919 |
3593 |
-- |
3330 |
--
8,4 |
Anadia |
263 |
6182 |
-- |
-- |
--
11,6 |
Aveiro |
7493 |
3768 |
1 311 |
-- |
3,2
-- |
Ílhavo |
3783 |
4800 |
15 |
1407 |
0,1
-- |
Mealhada |
545 |
1952 |
-- |
2563 |
--
8,1 |
Oliveira do Bairro |
- 508 |
2055 |
-- |
2011 |
--
14,8 |
Vagos |
1299 |
3310 |
-- |
2105 |
--
9,9 |
Estarreja |
504 |
2609 |
-- |
2293 |
--
8,5 |
Murtosa |
-844 |
1449 |
-- |
2293 |
--
17,4 |
Oliveira de Azeméis |
4893 |
7821 |
-- |
2928 |
--
7,0 |
Ovar |
1972 |
4891 |
-- |
2919 |
--
8,7 |
Vale de Cambra |
1211 |
3021 |
-- |
1 810 |
--
9,4 |
TOTAL |
25 151 |
47 884 |
1 326 |
24059 |
|
Saldo |
22733 |
6,9 |
|
|
Na região, no decénio em referência,
o aumento do número de habitantes, 25151, foi
ligeiramente superior ao número de habitantes «repelidos», 22733,
que foram engrossar as correntes de emigração ou se fixaram noutras
regiões do país.
Embora a situação tenha melhorado na
década 1951-60, todo o pesado lastro tradicional de incultura e
atraso a que a gente do campo paga o principal tributo, fica bem
patenteado pelo impressionante registo das taxas de analfabetismo,
relativo a 1950 (Quadro IV).
|
|
QUADRO IV – Taxas de analfabetismo
na população maior de 7 anos em 1950 |
|
|
|
|
Concelhos |
% |
Águeda |
Albergaria-a-Velha |
Anadia |
Aveiro |
Ílhavo |
Mealhada |
Oliveira do Bairro |
Vagos |
Estarreja |
Murtosa |
Oliveira de Azeméis |
Ovar |
Vale de Cambra |
|
Continente |
|
30,0 |
36,0 |
33,1 |
27,5 |
28,1 |
35,1 |
36,0 |
39,8 |
35,1 |
35,1 |
32,6 |
35,9 |
39,8 |
|
40,3 |
|
|
|
|
A importância da Agricultura como
actividade económica pode ser apreendida, a partir da repartição
sectorial do Produto Interno Bruto e da População Activa, no âmbito
distrital.
|
QUADRO V – repartição sectorial do
Produto Interno Bruto e da População Activa (em %) |
|
|
|
|
Agricultura
e pesca |
Indústria |
Serviços |
Distrito de Aveiro |
P. I. B. |
32,6 |
45,6 |
21,8 |
População
activa |
40,3 |
28,5 |
31,2 |
Continente |
P. I. B. |
28,1 |
35,9 |
36,0 |
População
activa |
43,6 |
20,7 |
35,7 |
|
|
|
Fonte: «Níveis Desenv. Agrícola Cont.
Português», Fund. Gulbenkian, 1963. Prof. Eugénio Castro Caldas e
Dr. Manuel Santos Loureiro. |
|
Como se verifica, à escala do
distrito de Aveiro, existe um desequilíbrio profundo entre o Sector
Secundário (Indústria) e o Sector Primário
(4) (Agricultura e
Pesca) no ponto de vista de produtividade e de eficácia económica,
necessitando este último quase do dobro da população activa para
obtenção de uma quota-parte do P. I. B., que é mesmo assim inferior
à do Sector Secundário. É preciso, no entanto, ter em conta a
debilidade intrínseca e estrutural da Agricultura em relação aos
outros Sectores que lhe confere desvantagens, nomeadamente na
formação dos preços, mesmo em economias evoluídas.
A expansão do Sector Secundário num
ritmo capaz de absorver o fluxo humano proveniente do Sector
Primário, as características das unidades fabris a instalar, bem
como a sua localização, serão factores
/ 35 /
decisivos da valorização regional e condição necessária para
o progresso da sua Agricultura, permitindo-lhe atenuar o fosso que,
quanto ao nível de vida, a separa actualmente da Indústria.
Um dos factos mais característicos
dos estádios iniciais do desenvolvimento económico é a transferência
de mão-de-obra e capitais da Agricultura para a Indústria e Sector
Terciário que vão produzindo bens de procura mais elástica pela
progressiva modificação da estrutura dos consumos e de passo vão
expandindo e diversificando o seu aparelho produtivo pelo influxo do
progresso técnico. Assim se vão criando e aumentando os empregos da
Indústria em detrimento dos facultados pela Agricultura, cujo número
vai declinando.
Deste modo a observação da estrutura
do emprego nos diversos concelhos (Quadro VI) pode reflectir,
aproximadamente, a disparidade que o espaço da Região apresenta sob o ponto de vista do
desenvolvimento económico. Aparecem-nos com estruturas pouco
evoluídas, tipicamente agrícolas, os concelhos de Vagos e Oliveira
do Bairro com mais de 70 % de população activa no Sector Primário e
apenas com a proporção de 10 %, singularmente baixa, no Sector
Secundário; num segundo escalão vêm os concelhos de Vale de Cambra,
Anadia e Murtosa. Contudo é preciso considerar que nos agrupamentos
de concelhos assim constituídos, há uma grande dose de simplificação
que aconselha à prudência nos juízos, dado que existem concelhos
onde se praticam culturas economicamente mais importantes, como a
vinha (exemplo de Anadia, Oliveira do Bairro, etc.) e outros não
(exemplo da Murtosa), etc. Por outro lado, como os dados de
apreciação são relativos a 1950, é possível que no transcurso de
mais de 10 anos, a posição relativa dos concelhos tenha sofrido
alterações, não se perdendo também de vista que o empolamento do
Secundário em determinados concelhos pode ter resultado, em parte,
da importância que neles ocupavam actividades artesanais.
|
QUADRO VI - Repartição sectorial da
população activa dos concelhos em 1950 (em %) |
|
|
Concelhos |
Sectores |
Primário |
Secundário |
Terciário |
Águeda |
Albergaria-a-Velha |
Anadia |
Aveiro |
Ílhavo |
Mealhada |
Oliveira do Bairro |
Vagos |
Estarreja |
Murtosa |
Oliveira de Azeméis |
Ovar |
Vale de Cambra |
|
56 |
52 |
64 |
42 |
48 |
56 |
73 |
80 |
52 |
63 |
36 |
35 |
68 |
|
23 |
29 |
15 |
25 |
30 |
18 |
10 |
10 |
29 |
18 |
49 |
45 |
19 |
|
21 |
19 |
21 |
33 |
22 |
26 |
17 |
10 |
19 |
19 |
15 |
19 |
13 |
|
|
|
Mesmo numa apreciação que não tenha
pretensões de aprofundamento, não deixam de verificar-se,
relativamente às actividades industriais da Região, os seguintes
factos:
a) A sua importância global
relativamente ao panorama económico do país (5.º lugar à escala
distrital, segundo a estimativa global do Prof. Castro Caldas e Dr.
Santos Loureiro, depois dos de Lisboa, Porto, Braga e Setúbal);
b) A extrema profusão de tipos de
indústrias ligeiras, algumas assinaláveis pela técnica e qualidade
do seu fabrico, outras pelo adequado dimensionamento das unidades;
c) O alfobre de empresários de
iniciativa que estão a modelar o futuro de alguns pontos do espaço
económico regional (Aveiro, Ovar, Águeda, S. João da Madeira, etc.);
d) A possibilidade da realização de
economias externas nas instalações fabris, quer pela utilização
económica de energia eléctrica, quer pela sua apreciável rede
rodoviária e férrea, em ligação estreita com o segundo pólo de
desenvolvimento do país, o Porto.
Entre a grande variedade de
indústrias existentes podem referir-se: celulose e papel, adubos,
motores eléctricos, construção naval, fundição, metalo-mecânicas,
porcelana, cerâmica, lacticínios, espumantes, conservas de peixe,
moagem, descasque e branqueamento de arroz, têxteis, serração,
carpintaria, resinosos, tintas, vernizes, bicicletas, etc.
Como infra-estrutura ligada ao
Sector Terciário, o Porto de Aveiro, mesmo na fase actual longe do
seu completo apetrechamento, é uma realidade de extraordinária
importância dinamizadora da economia regional.
Apenas se apreciarão, com base nos
elementos estatísticos disponíveis, (Inq. Expl. Agr. Cont., 1953, I.
N. E.), alguns aspectos da estrutura agrária. Verifica-se que no
conjunto dos concelhos, praticamente;
a) cerca de 70 % das explorações
possuíam uma área de cultura arvense inferior a 3 ha.;
b) cerca de 30 % das explorações
estavam fragmentadas em mais de 5 parcelas.
Paralela à verificação das reduzidas
dimensões e da fragmentação elevada das explorações, sabe-se (se
/ 36 / bem que não assente em dados
estatísticos) que também a propriedade rústica sofreu um «processus»
de pulverização, fragmentação e dispersão acentuados que modelaram
profundamente a estrutura agrária.
QUADRO VII – Tipos de Empresa (em
%), (Inq. Expl. Agr. Cont., 1953, I.N.E.)
|
|
Concelhos |
Número de explorações |
Familiares perfeitas (a) |
Familiares imperfeitas (a) |
Patronais |
Águeda |
5570 |
34,3 |
55,3 |
10,4 |
Albergaria-a-Velha |
3174 |
30,2 |
50,3 |
19,5 |
Anadia |
5553 |
26,7 |
53,0 |
20,3 |
Aveiro |
3945 |
30,7 |
54,8 |
13,5 |
Ílhavo |
2089 |
40,4 |
43,4 |
16,2 |
Mealhada |
2875 |
38,7 |
59,4 |
11,9 |
Oliveira do Bairro |
2772 |
40,3 |
28,5 |
31,2 |
Vagos |
3601 |
66,2 |
24,6 |
9,2 |
Estarreja |
3726 |
41,2 |
35,7 |
23,1 |
Murtosa |
2091 |
23,0 |
15,2 |
61,8 |
Oliveira de Azeméis |
5561 |
24,6 |
60,7 |
14,7 |
Ovar |
3444 |
23,7 |
42,3 |
33,9 |
Vale de Cambra |
2807 |
39,2 |
49,6 |
11,2 |
TOTAL |
47212 |
|
|
|
|
|
|
(a) As empresas familiares estão
extremadas em dois grupos: aquelas cuja fonte de rendimento é
unicamente a actividade agrícola (perfeitas) das que tinham outra
fonte de rédito (imperfeitas).
(b) No Distrito de Aveiro (lnq. Expl.
Agr. Cont.. 1953, I. N. E.) havia 62138 explorações agrícolas.
|
|
É bem evidente que apenas uma
classificação das explorações segundo a sua estrutura e rendimento,
dada a variação dos sistemas de produção, permitiria o seu
agrupamento significativo do ângulo económico-social.
De um modo geral as explorações da
Região são demasiado pequenas e excessivamente fragmentadas,
essencialmente assentes no trabalho humano e na energia forneci da
pelo gado bovino, com fraca utilização da máquina.
Quanto à estrutura do trabalho nas
empresas, pode admitir-se que, no conjunto dos concelhos, pelo menos
cerca de 70 % das explorações utilizavam exclusivamente trabalho
familiar e as restantes, além do trabalho familiar, recorriam também
a assalariados e daí o serem englobadas genericamente na categoria
«Patronais», designação bastante indefinida. Com efeito dentro da
categoria de «Patronais» há muitas explorações que, por certo,
utilizam assalariados apenas como complemento ao trabalho familiar
em períodos de ponta, por conseguinte, melhor lhes cabendo a
expressão de familiares (Quadro VII).
Pela estrutura do trabalho,
características dos empresários e da actividade produtiva, bem como
pela origem e natureza dos meios energéticos e equipamento
utilizados, a maioria das explorações do espaço geográfico
delimitado para estudo pode considerar-se predominantemente do tipo
familiar e artesanal.
O Quadro VIII, dá-nos a imagem, algo
desactualizada, da estrutura das explorações sob o ponto de vista
dos elos jurídicos do empresário com a terra. Que nos revela de um
ângulo geral sócio-económico? Talvez (dada a importância e segurança
que a posse da terra conferia aos seus proprietários) que a
proporção de explorações de conta própria associada ao arrendamento
e as de renda simples reflictam, em face duma determinada pressão
demográfica da população agrícola, um equilíbrio provisório e uma
fuga à proletarização para aqueles a quem a sorte não favoreceu na
partilha da terra.
/ 37 /
QUADRO VIII – Explorações agrícolas
segundo a forma da exploração (ibidem) – em %
|
|
Concelhos |
Número de explorações |
Formas de exploração |
Simples (a) |
Mistas (b) |
Conta própria |
Renda ou
sub-arrendamento |
Águeda |
5570 |
60,6 |
10,7 |
28,7 |
Albergaria-a-Velha |
3174 |
51,8 |
16,9 |
30,9 |
Anadia |
5553 |
67,1 |
10,4 |
21,4 |
Aveiro |
3945 |
58,3 |
17,1 |
23,8 |
Ílhavo |
2089 |
65,0 |
8,5 |
26,6 |
Mealhada |
2875 |
81,5 |
3,6 |
13,9 |
Oliveira do Bairro |
2772 |
78,4 |
2,3 |
19,3 |
Vagos |
3601 |
50,4 |
12,1 |
37,5 |
Estarreja |
3726 |
58,3 |
7,1 |
34,6 |
Murtosa |
2091 |
83,8 |
1,0 |
15,2 |
Oliveira de Azeméis |
5561 |
60,4 |
18,6 |
21,0 |
Ovar |
3444 |
53,2 |
17,4 |
29,4 |
Vale de Cambra |
2807 |
66,0 |
17,3 |
12,5 |
TOTAL |
47212 |
|
|
|
|
|
|
(a) A forma de exploração de
Parceria não foi discriminada pela sua reduzida importância, com
percentagem inferior a 1 % em todos os concelhos, à excepção do
concelho de Vale de Cambra onde figurava com 4,2 % do total.
(b) Nas formas de exploração mistas.
apenas tem importância relativa, a conta própria associada ao
arrendamento.
|
|
A importância relativa, em valor, da
Produção Agrícola de origem vegetal e animal na Região estudada,
pode inferir-se, aproximadamente, a partir da Estrutura do P. I. B.
da Agricultura no distrito de Aveiro (Quadro IX).
Na estimativa do Quadro IX
verifica-se que o valor da Produção Pecuária é apenas de 32,9 % o
que, atendendo às boas condições agro-climáticas para a produção
forrageira na Região, pode ser interpretado, duma maneira muito
genérica, como um desvio das actividades agrícolas relativamente às
potencial idades naturais.
Na estimativa dos mesmos autores, o
valor das produções agrícolas principais no distrito, escalonava-se
do seguinte modo (ano de 1957, em contos):
1.º – Carne de açougue -- 140 000
2.º – Cereais (o milho é de longe o
mais importante) -- 112 000
3.º – Vinho e aguardente -- 109 000
|
QUADRO IX – Estrutura do Produto
Interno Bruto da Agricultura (1957)
|
|
|
|
P. I. B. da
Agricultura
(milhares de contos) |
Decomposição do sub-total
(em %)
|
Decomposição do Sector Agro-Pecuário (em %) |
Total |
Rendimento em
auto-investimento |
Sub-total |
Agro-Pecuária |
Silvicultura e pesca |
Vegetal |
Animal |
Distrito de Aveiro |
758 |
10 |
748 |
84,2 |
15,8 |
51,3 |
32,9 |
Continente |
14248 |
– |
14054 |
83,7 |
16,3 |
60,6 |
23,1 |
|
|
|
Fonte: «Níveis Desenv. Agric. Cont.
Porto», Prof. E. Castro Caldas e Dr. M. Santos Loureiro. Fund.
Gulbenkian, Lisboa, 1963. |
|
/ 38 /
4.º – Legumes e tubérculos (a batata
e o feijão têm importância saliente) -- 104000
5.º – Leite -- 69000
As produções de carne (sobretudo de
vaca e de porco), milho, vinho, batata, feijão e leite constituem as
actividades agrícolas mais importantes, sendo seguidas, a muita
distância, pelos produtos hortícolas, a fruta, o azeite, etc.
De um modo geral a produção pecuária
é uma actividade artesanal, não especializada, inserida nas
explorações agrícolas tradicionais.
No aspecto global, porém, avulta a
sua grande importância económica. Assim, na produção do leite de
vaca e Indústria transformadora respectiva, bem como na dimensão do
efectivo leiteiro (vacas turinas), o distrito de Aveiro detém o
primado no Continente. É todavia uma actividade muito dispersa e
pulverizada (a média do número de vacas por estábulo, no distrito
não atinge duas unidades), o que agrava os custos de produção ao
nível das explorações agrícolas e se repercute desfavoravelmente na
eficácia económica das operações de recolha e concentração do leite
deprimindo por vezes, e obviamente, a sua qualidade.
A produção de carne de vaca é uma
actividade complementar da produção de leite (bovinos de raça turina)
ou da produção de trabalho (bovinos mirandeses, marinhões, etc.).
A criação de porcos em «chiqueiros»
e de aves de capoeira, de grande relevo na economia das explorações
agrícolas minifundiárias, nas quais se insere e das quais depende e
se nutre quase exclusivamente, destinados a auto-consumo e à venda,
tem também uma feição tradicionalista não especializada.
O progresso técnico-económico da
exploração de bovinos na produção de leite e carne esbarra, a curto
prazo, com dificuldades consideráveis, pois trata-se de uma
actividade, em grande parte do ciclo produtivo, economicamente
ligada à produção de forragens no campo e como tal vinculada às
vicissitudes da aglutinação de explorações minifundiárias ou à
necessária coordenação e colaboração de pequenos empresários ciosos
da sua independência.
A porcicultura e avicultura modernas
podem ao contrário escapar às servidões que a reduzida dimensão das
explorações agrícolas e estrutura agrária defeituosa impõem;
funcionam como verdadeiras indústrias agrícolas, com dimensão e
investimentos orientados segundo a capacidade de absorção dos
mercados de consumo, com riscos meteorológicos anulados por não
dependerem directamente da produção de forragens no campo e
alimentadas por fábricas de rações autónomas e especializadas.
A economia vitícola, com múltiplas
explorações de muito escassa dimensão, enferma também de limitações
idênticas às já assinaladas na actividade pecuária.
Com base nos elementos de informação
disponíveis dividimos, muito genericamente, a Região, sob o ponto de
vista dos sistemas de produção, nas seguintes zonas:
(5)
Zona A
– Ao norte do Vouga, engloba os concelhos de Oliveira de Azeméis e
Vale de Cambra e ainda os de Ovar, Estarreja e Albergaria-a-Velha à
excepção de uma pequena faixa litoral. Está assente em formações
geológicas antigas do Arcaico e Precâmbrico, do Primário (sobretudo
Câmbrico) e Granito.
A parte interior da zona é muito
ondulada, ora cavada em vales largos, ora em vales estreitos e
profundos, a litoral, quase plana.
Zona climaticamente húmida e dotada
de uma rede hidrográfica muito importante que tornam fácil o recurso
à rega com água de rios, ribeiros, minas, nascentes e poços.
Caracterizada pela cultura muito
intensiva de forragens (azevém nas terras baixas, quando possível
«limado», ferrãs de cereais, nas terras altas, etc.) compatível com
a exploração do solo por empresas familiares de muito pequena
dimensão.
O milho, a que se associa muitas
vezes o feijão e abóbora, de longe a cultura arvense economicamente
mais importante, sucede no ciclo anual às culturas forraginosas
intercalares. Com efeito, pela regularidade de produção, melhor
capacidade produtiva relativamente aos outros cereais, fácil
conservação, pelas suas múltiplas utilizações é a cultura chave
insubstituível do sistema de produção para a estrutura demográfica
actual da zona em referência, que exige a máxima intensificação
cultural à base de trabalho.
Couval magnífico em terreno de areia
conquistado à duna e utilizado na cultura intensiva (Gafanha).
Além do milho que ocupa praticamente
todas as folhas de cultura anualmente, temos a produção de leite
(gado turino e arouquês) e carne (produção subsidiária do gado de
trabalho «marinhão», «crias» das vacas de leite, porcos).
A batata tem somente importância
social, sendo-lhe reservada anualmente nas explorações uma pequena
superfície (que não deixa contudo de produzir milho nos regos), cujo
produção se destina ao auto-consumo.
A vinha (em «ramadas» delimitando os
socalcos e terras de cultivo) tem importância económica somente no
concelho de Vale de Cambra e na freguesia de asseia (Oliveira de
Azeméis) integrados na região demarcado dos vinhos verdes.
Realizam-se aqui quase as condições do sistema minhoto de
exploração.
Horticultura pobre, à base de
couve-galega, para auto-consumo e venda de excedentes nos mercados
/ 39 /
locais. De assinalar apenas a produção de cebola em Maceda, Ovar,
alfobres para venda, em regra de couves, em Pinheiro da Bemposta
(Oliveira de Azeméis), etc.
Zona B
– Ao sul do Vouga; engloba fundamentalmente o concelho de Aveiro
(menos as aluviões dos «campos» do Vouga) e o de Oliveira do Bairro,
se bem que a ela se possam agregar algumas freguesias limítrofes dos
concelhos de Águeda, Anadia, Vagos e Ílhavo.
Assente sobretudo em formações do
Pliocénico e Cretácico. Orograficamente é, na sua maior parte, uma
grande planície. Abundante toalha de água permite a cultura
intensiva regada por meio de poços.
Climaticamente é uma zona de
transição, polimorfa do ponto de vista agrológico, tem porém uma
característica comum que a identifica: a grande diversificação
cultural, a boa aptidão dos seus solos e a qualidade de muitos dos
seus empresários, patenteada no apuro técnico de algumas culturas
(trigo, batata, ele.).
Sistemas de produção à base de
milho, feijão, batata, forragens e trigo no concelho de Aveiro,
passa-se no de Oliveira do Bairro para outros em que a vinha
(6)
(na qual se pratica por vezes a cultura intercalar de batata), a
batata de folha, milho, feijão e forragens intercalares dão
carácter. O grosso da produção de batata é estival, de Junho a
Julho.
Horticultura praticada sobretudo
para auto-consumo com venda de excedentes nos mercados locais;
assinale-se, no entanto, a riqueza e variedade de espécies
cultivadas (couves, tomate, pimento, cebola, etc.). Em alguns
pontos, a produção de couve repolho e nabo para mercados longínquos
(Lisboa, por exemplo) em S. Bernardo (Aveiro), etc.
A cultura do arroz tem sobretudo
importância nas aluviões do Cértima (concelhos de Águeda e Oliveira
do Bairro) e Levira (concelho de Oliveira do Bairro).
Gado turino para leite e «marinhão»
para trabalho e carne; porcos, cruzados de bísaros e Large White, em
que se verifica grande absorção do sangue da última raça.
Zona C
– Ao sul do Vouga; engloba os concelhos de Águeda (menos os «campos»
de Águeda e a zona serrana) e os de Anadia e Mealhada, pertencentes
à região bairradina (menos a zona serrana).
Geologicamente as formações
predominantes pertencem ao Pliocénico, Triássico e Jurássico.
Planície, encostas e planalto.
Predomínio económico da vinha. O
sistema à base de milho, feijão e forragens, bem como a cultura da
batata, têm apenas um papel subsidiário.
Zona D
– Ao norte do Vouga; constituída pelo concelho da Murtosa e pelas
freguesias de Pardilhó e Veiros do concelho de Estarreja.
Areias do Moderno.
Pode dizer-se que esta zona repete
menos bem o sistema de produção base descrito na Zona A: milho,
feijão e forragens anuais intercalares.
(7) Ecologicamente o
solo de areia limita as produções de milho se bem que a incorporação
de matéria orgânica (moliço e estrumes) se pratique larga e
intensamente; talvez, em parte também responsável por este facto, a
economia de água pouco apropriada na vegetação do milho (toalha de
água superficial cujo nível depende de vários factores, nomeadamente
dos climáticos).
Outro tanto se pode dizer das
forragens, não encontrando o azevém o seu óptimo ecológico em
terrenos de areia mesmo quando bem providos de matéria orgânica, a
que se junta, em muitos casos, a falta de drenagem no período
outono-invernal que muito prejudica a sua vegetação.
À excepção de alguns oásis de
cultura, em aluviões riquíssimas, junto à Ria, o sistema de produção
referido só parece jogar em cheio no caso do feijão.
A importância da cultura da batata é
muito secundária.
Produção de leite (gado turino);
criação, recria e trabalho (gado «marinhão») e carne (gado «marinhão»
e porcos).
Zona E
– Gafanha (litoral dos concelhos de Ílhavo e Vagos).
Areias do Moderno e Dunas. Por vezes
os terrenos são rebaixados e constituem-se sebes de abrigo.
Abundante incorporação de moliços provenientes da ria de Aveiro,
além do estrume do curral, permitem a adopção de sistemas de
produção intensivos, à base de trabalho, particularmente nas terras
mais ricas em matéria orgânica e favorecidas pela proximidade da
toalha /
40 / de água. Têm particular importância, nos sistemas
referidos, a batata, o feijão e ainda a ervilha, chicória para café,
forragens (ferrãs de cereais), além do milho que alterna com a
tremocilha nas terras mais secas e menos providas de matéria
orgânica. Acrescente-se ainda, parece que em explorações mais bem
dimensionadas, a cultura da couve lombarda e do repolho para
mercados longínquos (Lisboa, por exemplo).
Relativamente recente a grande
generalização do gado turino para a produção de leite.
Esta zona favorecida pelo clima,
relativamente às outras zonas da Região, possuindo solos leves, de
textura arenosa que permitem as lavouras em qualquer época do ano e
a produção de batata no cedo, em Abril e Maio (cultura semi-temporã),
o que muito a valoriza em grandes mercados nacionais Porto e
Lisboa), torna-a também, por essa razão, susceptível de interessar a
exportação, como em alguns anos tem acontecido.
Constituída também por terrenos de
areia, a Gelfa é a zona do concelho de Vagos compreendida entre o
rio Boco e a Gafanha. Sistema de produção intensivo à base do milho
e forragens intercalares anuais. Tal como no caso da Murtosa, o
feijão é uma cultura importante. A produção forrageira (ferrãs,
serradela, trevo encarnado, nabo), é mais variada e o escalonamento
da produção do Outono à Primavera é talvez melhor conseguido. A
batata tem sobretudo importância para auto-consumo. Godo bovino (turino
e «marinhão») e gado porcino.
Zona F
– Aluviões sujeitas a inundações periódicas de água doce (cheias do
Vouga e afluentes e outras «linhas de água» no período
outono-invernal) ou de água salgada (marés-vivas no período
estival). Constituída pelo Baixo-Vouga, «campos» de Canelas e Salreu,
«campos» do Vouga e do Águeda, etc.
Não se define propriamente nesta
zona um sistema de produção autónomo, em virtude de todos os
terrenos em referência estarem inseridos em explorações agrícolas
ribeirinhas.
O seu aproveitamento ora se faz com
o arroz ou milho, precariamente quase sempre pelo condicionamento
das cheias, pela pastagem extensiva de ervagens naturais (sobretudo
na recria de gado bovino «marinhão») ou são «incultos», por vezes
produtivos (plantas aquáticas denominadas por «matos» e «estrumes»).
Sem se pretender realizar a análise
e caracterização dos aspectos psicológicos e sócio-económicos da
evolução que parece subverter actualmente o mundo rural, não deixa
de ter sentido enunciar com brevidade os determinantes imediatos
geradores da crise.
Um facto, a que já anteriormente nos
referimos, convém reter: o crescimento económico, em termos globais,
desequilibrado da Região, que confere à Indústria uma capitação do
Produto amplamente superior à da Agricultura. Outro facto
assinalámos sem que nos tivesse sido possível de momento
caracterizar adequadamente: o apelo que representa o nível de vida
de outros países (França, Alemanha, etc.)
Deste modo a fuga acelerada dos
campos vai abrir brecha no aparelho produtivo das empresas de
dimensões reduzidas da Região, ao desfazer o velho equilíbrio entre
mão-de-obra superabundante e meios técnicos reduzidos e arcaicos,
pela incapacidade de, a curto prazo, o adaptar (por meio de uma
recombinação eficiente dos factores de produção) a um contexto
socio-económico de rarefacção humana progressiva.
Surge assim a necessidade do
redimensionamento das empresas, em face das grandes transformações
do meio social e do meio técnico, e é crível admitir-se, que, pela
acção mais ou menos profunda do Estado, dada a ineficácia dos
mecanismos espontâneos. Levanta-se, por outro lado, aos
planificadores e às massas rurais conscientes, o problema central da
adequação dos sistemas de produção às condições do meio físico e
humano e às perspectivas do mercado. Com efeito, de nada servirá
projectar novas unidades produtivas sem encontrar resposta à
questão: que produzir?
Assumem, assim, carácter
prioritário, em relação a todos os outros aspectos, a reconversão
cultural e o ordenamento agrário.
Imediatamente se apresenta o
ilogismo dos circuitos comerciais em que se insere a actividade do
agricultor, que duplamente o esmaga, comprando, quase sempre aos
outros sectores a preços de retalho e vendendo os seus produtos a
preços inferiores aos preços de grosso, circunstância que agrava a
tendência que parece inevitável, a longo prazo, para a deterioração
dos termos de troca da Agricultura.
O problema particular da redução das
margens comerciais interessa tanto ao agricultor como ao próprio
consumidor.
A especulação parasitária de alguns
intermediários não deve, no entanto, cegar a visão para a
importância e as reais dificuldades, riscos e custo que comporta a
distribuição dos produtos agrícolas, nem os progressos técnicos de
que é susceptível e que só uma organização eficiente possibilita,
estranha ou não ao sector agrícola.
Como afirma Marc Latil «a
modernização da Agricultura, isto é, a participação dos agricultores
no progresso geral, implica ao mesmo tempo, uma produtividade
acrescida e um êxodo rural importante». Esse aumento de
produtividade deve procurar-se nas próprias explorações agrícolas,
conseguindo arranjos mais eficientes dos factores de produção, com
especialização
/ 41 /
Imponente conjunto de
socalcos, sustendo o solo arável e defendendo-o da erosão. Com larga
representação nas zonas serranas, em que ainda se pratica
frequentemente um sistema intensivo de duas culturas de ciclo anual
(erva e milho; aveia e milho; centeio e milho, etc.) sobrevivente do
passado, actualmente em declínio nestas condições. (Vale de Cambra).
de actividades, dando maior
participação ao factor terra e à máquina e utilizando técnicas
renovadas, objectivos que exigem empresários modernos, bem
preparados. Além disso, quer nos circuitos dos factores que chegam
às unidades de produção, bem como naqueles em que os produtos
agrícolas partem, realizando-se a sua distribuição até aos
consumidores, podem os empresários agrícolas reforçar a sua posição
económica (além de adquirir ganhos na produtividade) com vista ao
incremento do rendimento da Agricultura.
É bem evidente a insuficiência que
apresenta um possível elenco de todos os problemas que interessa
resolver nos limites geográficos da Região, secamente enumerativo,
sem tomar em devida conta as disparidades espaciais, por vezes, tão
flagrantes. Procurámos mostrar em esboço, através de alguns
indicadores demográficos e económicos, a pluralidade de aspectos que
apresentam os concelhos estudados.
É pois chegada a altura de
apresentar os problemas da Agricultura regional que carecem mais
urgentemente de solução:
I – Ordenamento agrário e
reconversão cultural. Reforço da posição económica dos agricultores
nos circuitos de distribuição
Somente a promulgação da lei de
Orientação Agrícola, cujo texto já foi apresentado para apreciação
ao Conselho de Ministros para Assuntos Económicos, poderá dar uma
linha de rumo segura à Agricultura da Região. Por certo marcará
opções globais no campo da Agricultura Nacional que poderão ser
objecto de regionalização adequada.
Convém, contudo, delimitar, de
acordo com os elementos disponíveis, alguns aspectos do que se
afigura desejável para a Região, mesmo que seja somente a título
indicativo:
ZONA A
Milho, forragens, etc.
Dever-se-á por todos os meios
possíveis empreender a generalização dos milhos híbridos para
forragem e a melhoria da sua técnica cultural, e antes que
/ 42 /
seja demasiado tarde, isto é, antes que as empresas patronais dos
regadios do Sul, estejam em condições de o produzirem quantidades
maciças e a baixo custo. Nas melhores terras e com o esmero da
técnica cultural as produções unitárias podem ser muito elevadas.
Não parece provável que o aumento do preço indicativo do milho possa
resolver em profundidade qualquer problema das pequenas explorações
desligado de outras medidas.
Parecem altamente desejáveis
subsídios para aquisição de sementes de milhos híbridos
(8) e
aperfeiçoamento da sua técnica de cultivo.
A introdução de forragens (trevo
ladino, trevo violeta, azevém vivaz, etc.), consentida pela
estrutura das explorações, parece ser também de manifesto interesse.
Uma cultura que não convém perder de
vista é o trigo, pois poderá ser de futuro uma cultura adequada para
substituir (ou alternar) com o milho em terras menos dotadas de água
de rega: o nível elevado de produções unitárias que é possível
atingir pode torná-la interessante em determinadas condições, muito
embora as áreas de cultura nas explorações agrícolas não permitam a
utilização de máquinas de colheita e debulha de muito elevada
rentabilidade.
Produção pecuária
A especialização e expansão da
actividade pecuária, baseadas no aumento da produtividade das
explorações, acompanhada da melhoria da produção forrageira (de
essencial importância na alimentação dos bovinos), são objectivos
fundamentais do progresso económico da Agricultura regional.
A comercialização de gado bovino e
porcino realiza-se ainda, em grande parte através das feiras. Estes
mercados tradicionais têm um carácter múltiplo e complexo, visando a
transacção de animais vivos que constituem, quer produtos finais do
sector agrícola, quer produtos intermediários destinados a alimentar
determinadas fases do ciclo da actividade pecuária dentro das
explorações agrícolas:
gado porcino
– leitões, (machos e
fêmeas), para abate e recria;
– bácoros (machos e fêmeas), para
recria;
– porcos, para abate;
gado bovino
– vitelos (machos e
fêmeas), para abate e recria;
– novilhos (machos e fêmeas), para
abate e recria;
– adultos (machos e fêmeas), no fim
ou não do seu ciclo económico;
nas diversas raças existentes, o
mirandêse o marinhão, estão em declínio; o turino, para leite e
carne, em expansão.
Nas feiras uma multidão de pequenos
produtores não especializados e independentes, com poucos animais
(muitas vezes com um ou dois apenas), afronta-se com um grupo
escasso de compradores, comerciantes e marchantes, qualificados no
ramo de negócio e conhecedores das condições reais da procura. A
capacidade de financiamento dos componentes deste último grupo é
quase sempre muito superior à da maioria dos produtores, quantos
deles, pressionados a vender para a obtenção urgente de uma receita
ou por imposição da escassez de forragem no campo.
O reforço do poder de negociação do
primeiro grupo formado pela massa de pequenos produtores é uma
necessidade evidente: a constituição de associações ou grupos de
criadores unidos para a venda (e para outras finalidades) poderia
ser um meio eficaz. Todavia a pequenez e o regime de poliprodução
não especializada das explorações são barreiras quase
intransponíveis. Poderá porventura qualquer associação humana
perdurar sem a adesão profunda dos seus membros?
A informação periódica das
tendências do mercado, com a publicação de cotações médias nas
diversas zonas do país, amplamente divulgada, poderia também ser uma
medida muito apropriada, a completar o efeito dos preços mínimos de
garantia oficiais.
A transacção de gado nas feiras
seria depurada das usanças antigas e obsoletas, substituindo-as por
normas objectivas e comercialmente idóneas (assim a venda de gado
pelo aspecto e a «olho» seria abandonada e adoptar-se-ia a
transacção baseada na qualidade e peso vivo, etc.).
A existência de grupos dinâmicos de
produtores especializados poderia contribuir para uma revolução
pacífica no saneamento e organização do mercado da carne que
atingiria a instalação de infra-estruturas apropriadas (matadouros
modernos, câmaras frigoríficas, etc.). Num estádio avançado o sector
agrícola firmaria a sua posição económica, integrando
horizontalmente e verticalmente, actividades produtivas, de
transformação, de abate, de «stockagem» e distribuição.
No que diz respeito ao circuito do
leite parece indicado que seja a organização da Lavoura, como único
interlocutor válido de que actualmente os produtores de leite
dispõem, quer a regular as entregas de leite à indústria
capitalista, quer o fornecimento de leite em natureza aos principais
centros urbanos. (9).
/ 43 /
ZONA B
Batata, culturas hortícolas, etc.
Pelas características que possui
esta zona parece ser nevrálgica no ponto de vista da valorização
regional.
A justificarem-se, como opção
económica desejável, as culturas hortícolas, seriam as áreas
actualmente dedicadas ao milho e à batata diminuídas parcialmente.
Uma solução possível seria a
instalação de uma fábrica entregue a uma empresa que já tivesse dado
as suas provas na concorrência dos mercados estrangeiros, se
possível, com a comparticipação de capitais da Lavoura. As relações
comerciais da fábrica com os agricultores regular-se-iam mediante
contrato.
Evidentemente será necessário,
relativamente a esta ou outras possíveis soluções, e com toda a
urgência:
a) proceder às sondagens
e estudos suficientes no plano económico;
b) realizar ensaios de
adaptação de culturas horto -industriais;
que marcarão, em definitivo, a linha
de rumo a seguir.
Milho, forragens, produção
pecuária, etc.
O mesmo que na Zona A.
ZONA C:
Vinha
No plano regional salienta-se a sua
grande importância socio-económica. A cultura da vinha implica a
mobilização de capitais importantes e, por outro lado, só passados
alguns anos após a instalação, começa a dar rendimento. Além disso
valoriza terrenos em muitos casos impróprios para outra cultura,
pelo menos, de rendimento comparável ao que a vinha confere. Os
amanhos culturais que exige ocupam uma grande massa de rurais.
A produção de vinho nesta zona gerou
um sem número de actividades económicas de relevo: caves de
espumantes, fabrico de garrafas, construção de pulverizadores,
destiladores e outras máquinas, produção de sulfato de cobre e
outros fungicidas, comércio, transportes, etc. Mais do que uma
actividade produtiva limitada a vinha cria, assim, um tipo de
civilização com implicações económico-sociais e políticas.
A crise na viticultura, a que o
êxodo rural acelerado dá um carácter de acuidade, é um facto
incontestável que transparece nos índices de repulsão da população:
no decénio 1951/60 (vide Quadro III), os indicadores demográficos de
repulsão apresentam as taxas mais elevadas nos concelhos de Oliveira
do Bairro e de Anadia (à parte a taxa do concelho da Murtosa também
muito elevada).
A reconversão cultural ou o
redimensionamento da cultura vitícola exigem a aplicação de capitais
vultosos. Talvez a crise tenha provocado uma reacção psicológica
favorável a uma intervenção.
ZONA E
Gafanha Batata e culturas
hortícolas
As condições climáticas, como já se
disse, permitem a produção de batata semi-temporã, o que a favorece
muito no preço relativamente à produzida na Zona B; no mercado
interno; pode também interessar, como já se tem verificado em alguns
anos, à exportação.
Deverão continuar-se os ensaios de
adaptação de variedades de curto ciclo vegetativo susceptíveis de
interessar aos consumidores estrangeiros do Norte da Europa.
Algumas culturas hortícolas têm
amplas possibilidades nesta Zona.
Milho, produção pecuária, etc....
O mesmo que na Zona A.
ZONA F
A reconversão cultural desta zona
apenas será possível quando se realizar o estudo para a valorização
da Bacia do Vouga que permita a correcção do regime das cheias e que
torne completamente profícuas as outras obras complementares
necessárias.
Sobre este importante problema,
assim se pronunciou uma comissão de técnicos, em comunicação
apresentada ao Conselho Regional de Agricultura, em sua sessão de
11-12-1961, «Obras de defesa e enxugo mais importantes:
– Estudo para correcção do regime
das cheias dos rios e a regularização dos leitos na bacia do Vouga e
de todos os cursos de água que directa ou indirectamente afluem à
ria de Aveiro;
– Defesa e possível recuperação dos
terrenos vizinhos da ria de Aveiro;
– Obras destinadas a evitar os
efeitos nefastos da poluição das águas no rio Vouga e afluentes;
– Melhoramento dos regadios
existentes através da renovação e multiplicação dos seus órgãos de
rega e drenagem».
/ 44 /
II – Saneamento e disciplina do
comércio fornecedor de meios de produção importados ou provenientes
de outros sectores de actividade
O crescimento económico imporá cada
vez mais a integração da Agricultura na Economia Nacional e a sua
capitalização acrescida.
Nesta era de progresso da técnica a
Agricultura da Região é invadida por uma torrente de produtos, os
mais variados, – insecticidas, fungicidas, adubos, máquinas, etc. –
que vão embater directamente pela mão do agente de vendas, da casa
comercial das cidades e vilas, do retalhista da aldeia de encontro
ao empresário agrícola de boas letras ou de letras «gordas»,
suportando a grei rural, as custas de um circuito de distribuição
complexo. Diz-se: o agricultor é individualista e, por isso, não se
defende. Terá, contudo, mais sentido afirmar que é isolado e inerme,
já que o seu individualismo é, em muitos casos, de natureza
extrínseca, (isolamento geográfico, incultura, estrutura
sócio-económica das empresas, etc.).
Impõe-se, e assim, pensam os
lavradores esclarecidos da Região, o saneamento e a disciplina do
comércio. Seria de interesse para a lavoura subir, em relação a
alguns factores de massa por intermédio das suas Organizações, pelo
menos, até ao estado de grosso, pois razões de natureza
macroeconómica podem desaconselhar que vá mais longe.
III – Valorização humana e
profissional do agricultor e assistência à família rural
A promoção humana do mundo rural
através da Educação e Previdência Social são tarefas urgentes e
prioritárias que exigem pela sua complexidade colaboração estreita
de planificadores, realizadores e dos próprios interessados.
Deverá também acelerar-se o
aperfeiçoamento, intensificação e valorização da assistência e
vulgarização técnica.
Essa finalidade será melhor
alcançada se for assente metodicamente na experimentação agronómica
local e na análise económica de explorações agrícolas
representativas.
Importa promover, paralelamente a
medidas de interesse genérico, outras de carácter selectivo junto
dos empresários agrícolas mais aptos e capazes de vencer, pelo seu
espírito de inovação e audácia, as perturbadoras dificuldades do
presente, auscultando os seus problemas, reduzindo os entraves às
suas iniciativas, estimulando as suas acções, sem chegar contudo a
um paternalismo de excepção. Serão eles a força motora mais eficaz
nas diversas zonas agrárias da Região. O êxito económico dos
melhores empresários poderá constituir um incentivo para o despertar
de vocações em jovens com qualidades, tão necessários à renovação e
rejuvenescimento do conjunto dos chefes de exploração regionais, no
qual o peso percentual de gente idosa se tem acentuado.
IV – Meios correctores de
funcionamento e adaptação das explorações agrícolas e da melhor
utilização da terra como factor económico
Crédito e subsídios
Os benefícios que as empresas
comerciais e industriais retiram do crédito devem ser estendidos,
com preserve rança e rapidez, à actividade agrícola.
O crédito a curto prazo ao capital
circulante (adubos, fungicidas, etc.) deverá ser generalizado o mais
depressa possível por intermédio das Organizações da lavoura.
O crédito a médio e a longo prazo e
a juro baixo de factores fixos de produção (máquinas, etc.) e
melhoramentos fundiários (já instituído e regulamentado pelo Estado
pela lei de Melhoramentos Agrícolas) é também uma necessidade.
Deverá contudo a sua aplicação ser integrada no planeamento de
valorização regional que permita perspectivar os problemas das
unidades produtivas isoladas, em virtude da sua atribuição comportar
sérios riscos de ser improfícua ou pouco rentável. Parece-nos de
grande importância para estimular e abreviar as adaptações
necessárias, a concessão de subsídios sobretudo em factores de
produção de rentabilidade elevada e imediata (semente de milhos
híbridos, de forragens, etc.).
Redimensionamento das explorações
– emparcelamento e associações de agricultores
(10)
O emparcelamento da propriedade
rústica, regulado pela Lei n.º 2110 e Decreto n.º 44647, poderá ser
um instrumento de valorização económica na Região desde que se
reúnam condições favoráveis ao seu empreendimento, como sejam:
– abalo psicológico provocado pela
crise agrícola que facilite a adesão dos proprietários a uma
possível intervenção de emparcelamento;
– conhecimento suficiente das opções
regionais no plano das actividades agrícolas compatíveis com o
contexto económico nacional;
– estudo de explorações-tipo capazes
de proporcionar um rendimento adequado;
– existência de espírito
empresarial.
O encorajamento à constituição de
Associações de Agricultores, nomeadamente de Cooperativas, é
plenamente justificado, sobretudo na transformação tecnológica
/ 45 /
dos produtos e a sua comercialização em sectores chave da economia
agrícola nos quais se torna evidente a reduzida capacidade
organizadora dos agricultores isolados (leite, vinho, gado, etc.) e
ainda na utilização em comum de determinados instrumentos de
produção (tractores, máquinas, etc.).
A constituição de Associações que
visem o redimensionamento das explorações e sua actividade
produtiva, pela agregação de diversas propriedades, também de grande
interesse, é talvez mais delicada no plano jurídico e encontra
certamente mais dificuldades no plano humano, sobretudo nas relações
empresa-propriedade da terra que exigem diversas condições e massas
humanas evoluídas aptas a aceitar limitações a um individualismo
extremo. Nunca se poderá perder de vista, por outro lado, que, num
contexto de economia capitalista, o espírito de empresa é
fundamental e que, só à luz deste critério, se deverá apreciar e
decidir o grau de intervenção de forma a evitar que resultem
estruturas demasiado rígidas e ineficazes no plano económico.
V – Coordenação dos Serviços
afectos ao sector agrícola
Sobre esta importante questão assim
se pronunciou uma comissão no parecer já referido, apresentado ao
Conselho Regional de Agricultura em sua sessão de 11-12-1961.
«É indispensável também que o
Governo tome medidas no sentido de determinar uma completa e lógica
cooperação entre todos os Serviços, Oficiais ou Oficializados, que
servem a Lavoura».
*
Será um facto incontroverso a
desvalorização social da Agricultura, não nas leis que procuram
corrigir quadros institucionais caducos, mas na mente do cidadão
comum?
Como reage, no âmbito regional, a
massa de agricultores perante as outras classes e como é encarada a
profissão agrícola pelos não agricultores?
Entre as duas guerras mundiais ainda
a tradição imperava profundamente nos costumes e técnicas de
cultivo; a posse da terra conferia estabilidade e segurança por
vezes superiores às de outras actividades, permanecendo o campo como
fonte directa de subsistências de inúmeras famílias de agricultores
da Região. Constituía máxima ambição de muitos rurais emigrantes
desse período o minerar dinheiro em países estranhos para, no
regresso à Pátria, se instalarem por conta própria como
agricultores, «colocando-o» em parcelas de terra que iam acrescentar
o património herdado. Quem não reconhecerá em muitos agricultores
sexagenários do termo de A veiro, ao admirar as suas minúsculas
explorações cultivadas com arte e esmero, os activos granjeadores de
poupança retirada aos salários da plantação e apanha de espargos, da
safra de arroz e outras tarefas, nos longínquos vales da Califórnia?
Culminam também, por essa altura,
transformações fundiárias prodigiosas no conjunto, da iniciativa de
muitas gerações de agricultores isolados, investindo nelas o seu
trabalho e o dos seus familiares (predominante também nas tarefas
agrícolas correntes), e, assim, conferindo dimensão sociológica à
frase que, há cerca de três lustros, ouvimos da boca de um gandarês:
«quem tem muitos filhos é rico, quem tem poucos é pobre»...
A árdua faina do gafanhão,
murtoseiro ou gandarês, transformando, peIo «rebaixamento» dos
terrenos e incorporação maciça de moliço, areais estéreis em
magníficas parcelas de cultura intensiva, o denodado esforço do
camponês valecambrense, arouquês, severense ou aguedense, semeando
de socalcos íngremes encostas de cerras e montes, conquistando à
montanha o ambicionado chão de cultura ou o industrioso
empreendimento de agricultores ribeirinhos dilatando a capacidade
produtiva dos solos de planície, ao abrir poços para rega em
pequenos retalhos de terra arável, são suficiente e significativo
atestado, num amplo espaço geográfico, da reduzida mobilidade
profissional, típica dessa sociedade tradicionalista a que a pressão
demográfica crescente obrigava aos actos heróicos.
O inevitável abandono à exploração
florestal e a prados ou pastagens estáveis de áreas alcantiladas, de
socalcos minguados ou terrenos com declives pouco próprios à cultura
mecanizada e a racionalização progressiva do trabalho no campo com
amplo emprego de equipamento e técnicas eficientes, bem como a
renovação do habitat rural, acompanhada da expansão dos meios de
comunicação e transporte, integrarão pouco a pouco o agricultor
regional na nova era, aliviando-o da servidão do espaço e do
isolamento geográfico.
Em oposição ao trabalho repetitivo
da produção em série do operário fabril, com rotinas estabelecidas,
a faina do agricultor moderno não deixará de exigir, na sua complexa
natureza, atenção no pormenor, imaginação relacionadora, adaptação
permanente a condições meteorológicas imprevistas. Como actividade
económica a produção agrícola constitui vital e insubstituível
alicerce de todas as comunidades humanas. A Agricultura suporta, não
obstante, as vicissitudes do aleatório no plano da
/ 46 /
produção, bem como as dificuldades resultantes do seu carácter
descontínuo e estacional, e de identificáveis mecanismos de mercado
que jogam frequentemente em seu desfavor. Por outro lado o surto e a
diversificação de novas actividades estão a criar oportunidades de
emprego frequentemente em condições menos penosas e ou
(paradoxalmente, por força das leis de marcado!) de melhor
remuneração que as da Agricultura.
Para que o êxodo rural, amplo
fenómeno social, característico das Economias em crescimento, não
esvazie o campo de conteúdo humano, dessorando completamente a
Agricultura da juventude e de homens aptos, será, afinal,
concretizável a necessária revalorização do sector agrícola, urgente
e acelerada, perante o fascínio da vida dos grandes centros urbanos,
nível de salários e outras regalias proporcionados pela Indústria e
Serviços?
Compreenderão, o citadino e o não
agricultor, as virtudes e necessidades de interdependência social, a
amplidão dos problemas e ajustamentos requeridos, a natureza do
drama que sob os seus olhos se desenrola?
_____________________________________
NOTAS:
(1)
Nomeadamente a criação da «Uniagri». União das Cooperativas de
Agricultores de Noroeste, com sede em Vale de Cambra.
(2)
Para a elaboração dos quadros de indicadores demográficos
socorremo-nos do trabalho de R. Dias da Cruz: «Identificação e
Delimitação de uma zona diminuída no centro do país», «Agros», 46 -
Jan. Fev. 1963.
(3)
Segundo o reconhecimento efectuado pelo S. R. O. A. em 1954-55 a
utilização do solo no distrito fazia-se do seguinte modo:
|
Utilização |
(hectares) |
agrícola |
94 726 |
florestal |
128 729 |
agro-florestal |
286 |
outras utilizações |
56 230 |
TOTAL |
279 971 |
|
|
(4)
Nas actividades do Sector Primário, além da Agricultura, salienta-se
o sal (com 272 salinas, ocupando uma área de 1 400 ha.) com uma
produção média anual de 55000 toneladas a que correspondem cerca de
15700 contos e a pesca que ronda o valor de 120 000 contos.
(5)
Não serão abordados quaisquer aspectos da exploração florestal.
(6)
O concelho de Oliveira do Bairro e a freguesia de Nariz do concelho
de Aveiro pertencem à região vitícola da Bairrada.
(7)
O recurso a prados temporários com base no trevo violeta e azevém
vivaz, se bem que importante, não tem o carácter de generalidade.
(8)
Concedido recentemente (campanha agrícola de 1971), se guindo outras
medidas já promulgadas anteriormente.
(9)
Ao longo da década de 1001-70 tem sido promulgada legislação variada
para regulamentar a produção de leite e carne e sua comercialização.
(10)
Ao ser elaborado este parágrafo foram voluntariamente excluídos, por
razões de brevidade, inúmeros problemas jurídicos, e económicos que
se ligam à terra e ao capital fundiário.
Existem actualmente diplomas legais
pelos quais o Estado concede empréstimos, subsídios e
comparticipações por meio de fundos administrados pela Junta de
Colonização Interna que permitem corrigir e renovar as estruturas de
produção e comercialização (Decretos-Lei sobre o Fundo de Fomento de
Cooperação de 23 de Novembro de 1962; sobre Agricultura de Grupo, de
11 de Agosto de 1969 e sobre o Fundo de Reestruturação Fundiária, de
8 de Outubro de 1969).
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