Visita ao refeitório do Internato.
No passado dia 11 de Janeiro, o
Senhor Governador Civil do Distrito, Dr. Francisco José Rodrigues
do Vale Guimarães, dignou-se visitar a sede da Junta Distrital e o
Internato Distrital de Aveiro.
Aguardado à entrada daquele
estabelecimento de assistência pelos Senhores Presidente e Vogais
da Junta Distrital, teve lugar a visita às velhinhas instalações
do Internato, no decurso da qual se fez ouvir a Banda de Música.
Seguiu-se a visita à sede da Junta
Distrital, onde os ilustres visitantes apreciaram o novo
anteprojecto do Internato Distrital de Aveiro, percorrendo,
depois, todas as instalações do magnífico edifício, recentemente
reconstruído.
No Salão Nobre realizou-se uma
sessão solene, a que presidiu o primeiro Magistrado Administrativo
do Distrito.
Visita à Junta Distrital.
Viam-se na mesa de honra os
Senhores Presidentes da Junta Distrital e da Câmara Municipal de
Aveiro, Governador Civil Substituto, Delegado do Instituto
Nacional de Trabalho e representante do Comandante Distrital da
Legião Portuguesa.
Em lugar destacado, Sua Excelência
Reverendíssima o Bispo de Aveiro.
Na assistência encontravam-se os
Senhores Engenheiro-Director de Urbanização, Engenheiro-Director
de Estradas, Presidente da Direcção da Caixa de Previdência,
Presidentes das Câmaras Municipais e outras autoridades civis e
militares, Vogais da Junta Distrital e antigos membros do mesmo
Corpo Administrativo, funcionários da autarquia distrital e alunos
do Internato Distrital de Aveiro.
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O Senhor Presidente da Junta
Distrital no uso da palavra afirmou:
Excelência Reverendíssima
Sr. Governador Civil
Sr. Presidente da Comissão
Distrital da União Nacional
Sr.s Deputados da Nação
Ex.mas Autoridades
Civis e Militares
Minhas Senhoras
Meus Senhores
Caros Rapazes da Nossa Casa:
Acabámos de visitar as obsoletas
instalações do Internato e a sóbria mas digna sede deste Corpo
Administrativo.
Para o fim deixámos,
propositadamente, o momento das boas vindas, porque não queremos
que escape a ocasião de pedir.
Dilataram-se as pupilas e o
coração com os impecáveis e comoventes acordes da nossa simpática
Banda Juvenil, para se apertarem nos escuros e degradantes
recantos do seu lar.
Aliviou-se a tensão com a entrada
neste edifício, de raro simbolismo, onde paira a recordação de
dois homens, opostos pelas ideias, ligados pelo sangue, pelo
génio, pela amizade fraterna: Jaime e Sebastião de Magalhães Lima.
Desprendeu-se a preocupação dos
nossos espíritos ao analisarmos o ante-projecto do novo Internato.
Ansiamos pela palavra do Governo e
pela bênção da Igreja, que quisemos fosse aqui representada a alto
nível por um dos troncos mais vigorosos e prestigiados da sua
Hierarquia, seguramente fadado para os cumes.
Cremos, portanto, Sr. Governador
Civil, que V. Ex.ª se deve sentir em festa nesta sua primeira
visita oficial à remoçada sede desta junta.
Quisemos rodeá-la de todo o
simbolismo que as nossas possibilidades permitiam, para lhe
testemunhar a devoção que lhe tributamos.
E quis Deus que fosse eu a erguer
a minha voz para exprimir esse sentimento – o que faço com o
respeito do subordinado, a comoção do amigo e a veneração do
correligionário.
Singular acaso, pois que foi V.
Ex.ª a pessoa a dar o primeiro impulso na minha reservada atitude
político – sempre cambaleante entre a genuína admiração por
Salazar e a repulsa por certos seus pretensos
/ 73 / colaboradores
– e a primeira pessoa também a enviar uma .palavra amiga pela
aceitação do cargo, que hoje imerecidamente ocupo e que tantos
desgostos já me causou, espevitando o meu egoísmo no sentido dum.
breve retorno à paz do meu lar e da minha profissão.
Olho neste momento em redor e vejo
um quadro policromado, em que figuram a dignidade da Igreja, o pão
do Governo, a disciplina das Autoridades, a obediência do
Funcionalismo, o espírito de servir dos meus Colegas e a ingénua
interrogação sobre o amanhã da Juventude!
E alongando a vista distingo com
nitidez a serena firmeza de duas veneráveis figuras nacionais,
seguro mandante e genial mandatário dos legítimos interesses da
Pátria, Presidentes Américo Tomaz e Marcelo Caetano!
Tudo isso me leva a recordar neste
momento e com toda a propriedade o que afirmei em Maio do ano
passado num colóquio político-administrativo:
«Para mim, homem comum, o rumo do
Regime cifra-se no primado dos homens sobre as leis.
Salazar já denunciou a crise de
dirigentes.
Não pode haver regimes perfeitos
com homens imperfeitos.
A principal tarefa que se nos
impõe num momento em que se nos deparam dois caminhos
–
o da morte ou o do regresso ao passado glorioso e honrado
–
é a formação moral, cívica, intelectual e política do povo
português.
Tudo o resto virá por acréscimo.
Para tanto não precisamos de
gastar divisas com a importação, sempre equívoca, de modos de vida
estranhos, quer eles sejam à base da pastilha elástica (demasiado
elástica) quer sejam à base da Vodka (demasiado rija).
Os regimes devem
constituir a tradução fiel do sentimento nacional.
E este está todo ele
imbuído de sugestões corporativas e cristãs.
Mas isso não significa que tenha
de haver uma subordinação à Igreja, que não pode nem deve
imiscuir-se no poder temporal, aliás na linha de pensamento do
Concílio Vaticano II.
Não obstante, parece ser de
aconselhar uma ajuda material à Igreja, pois que a formação cristã
do povo português é caminho seguro para uma governação mais fácil
na obediência e no comando.
/ 74 /
O cristão puro é honesto e o que
falta é honestidade.
Essa a causa principal da crise de
dirigentes.
Não se pode esquecer, no entanto,
que o País é constituído por cristãos e não cristãos e que há muita
gente honesta entre estes.
Outra causa que determina a crise de
dirigentes é a falta de patriotismo, habilmente provocada pelas
ideias comunistas, que espalham a crença de que as pátrias são
contrárias à fraternidade universal.
As potências que sopram essas ideias
não se esquecem, entretanto, de proclamar a superioridade dos seus
países, a cujo génio inculcam a invenção de tudo o que tem
contribuído para o progresso científico e económico do Mundo, desde
a prosaica batata aos satélites artificiais.
Por outro lado, nem sempre se terão
escolhido para os lugares de comando os mais aptos e trabalhadores.
Esse mal é agravado com o facto do
funcionalismo público ser mal remunerado, assistindo-se a uma
alarmante deserção para as empresas privadas, naturalmente dos mais
aptos e ambiciosos.
E os que ficam vêem-se na
necessidade de lançar mão de actividades extra funções, que só
prejudicam a própria Administração Pública.
Ora tudo seria fácil de remediar,
simplificando-se os serviços, restringindo o número de funcionários
e pagando-lhes convenientemente.
Se é evidente que testemunhamos um
constante aperfeiçoamento dos métodos de trabalho das empresas
privadas, porque não havemos de introduzir o estudo científico do
trabalho na maior e mais importante empresa, que é a Administração
Pública?
Há muito de amadorismo em tantos
sectores importantes da vida Pública, que urge estripar como erva
daninha, que impede o progresso da Nação.
Com a agravante de que nem sempre a
crítica séria e construtiva é aceite com a adequada filosofia,
talvez porque a chamada oposição ao Regime nos habituou a desconfiar
da seriedade das críticas, quase sempre marca das com o sinal da
barafunda demolidora.
Mas saibamos distinguir o trigo do
joio, para não cairmos na psicologia do bicho da conta!
Quando medito neste estranho
amolecimento de certos indivíduos perante os grandes problemas
nacionais não posso afastar o problema gravíssimo da Juventude.
Continuo a falar como homem comum,
que anda misturado com o chamado povo.
Desse contacto tenho retirado a
convicção firme de que o veículo mais perigoso da dissolução do amor
à Pátria é a camada intelectual, muito pela preocupação de dar nas
vistas e de se opor a tudo e a todos, muito pela sua má formação
universitária, onde serviram de joguete à habilidosa teia que é teci
da com invisíveis fios das mais distantes origens.
Sempre acreditei na Juventude, que é
generosa e pura, mas que é muito vulnerável à especulação
intelectual através da manipulação de indivíduos sem escrúpulos.
De modo que temos de aproveitar as
potencialidades extraordinárias da Juventude, dando-lhe saída para
ocupações que toquem a sua profunda generosidade.
É indispensável que a Juventude
aprenda a amar as nossas Províncias Ultramarinas.
E esse amor só pode ser despertado
conhecendo-as.
É necessário aproveitar a
generosidade da Juventude.
E isso só pode ser alcançado
interessando-a em obras eminentemente sociais.
É necessário promover a saúde física
e espiritual da Juventude.
E isso só é exequível através de
manifestações desportivas e culturais.
Dêem-se ocupações nobres à Juventude
e ela não terá tempo de se deixar tentar pelo vício e pela
especulação comunista, exímia no tanger da corda mais sensível do
seu coração, do seu amor à liberdade, que ilusoriamente constroem à
custa das mais degradantes grilhetas.
Faça-se-lhe compreender que a
liberdade é sem dúvida um dom inestimável, mas que ele só é
alcançado quando respeitamos os limites da liberdade dos outros.
/ 75 /
Li há tempos um pensamento que dizia
que os velhos não sabem dar maus conselhos porque não podem dar maus
exemplos.
Preferia, no entanto, que a
Juventude compreendesse que há velhos que nunca deram maus
conselhos, mesmo na idade em que podiam dar maus exemplos.
Essas venerandas figuras da nossa
Pátria quereria eu ofertar à Juventude generosa do meu sagrado País
como padrão de vida, de tal modo que na minha velhice eu pudesse
verificar, com encantamento, que tinha desaparecido da Pátria aquela
maléfica casta de indivíduos que, mais que o Bem Comum, prezam os
bens comuns... em seu exclusivo proveito!».
Isto disse então, isto reafirmo
agora, em perfeita sintonia com o pensamento de Salazar, Américo
Tomaz e Marcelo Caetano –
três verdades distintas da mesma realidade histórica.
O Senhor Presidente da Junta Distrital
no uso da palavra.
Todos sentimos que a fase
ascensional do poderoso e matemático foguetão de arranque da apagada
e vil tristeza, em que mergulhávamos, teria, inevitavelmente, que
preceder a dolorosa ignição da nave nacional em percurso mais
harmonioso, mas que não admite erros de cálculo, que nos possam
levar por atalhos lunáticos, nem ricochetes de retaliações inúteis e
condenáveis, nem troca de ouro velho por cobre novo.
No que concerne ao nosso Distrito,
tenho confiança na hábil manobra do excelente Chefe que nos
dispensaram, com sacrifício seu mas proveito nosso, certo como estou
que saberá conduzir a barca da governação com mão tolerante mas
firme, de ouvidos abertos às solicitações justas e os olhos atentos
aos negrumes dos horizontes, sempre prontos a desencadear
tempestades que possam forçar ao recolher lamentável e apressado da
vela da liberdade, para que ela não seja feita em tiras.
Assim confiamos!
Que V. Ex.ª vá carregando de porto
em porto as petições das gentes necessitadas e que num deles faça
embarcar o sonho que nos embala
–
a construção do novo Internato
–
são os votos humildes mas sinceros e amigos dos membros desta Junta.
Já o seu honesto e dedicado
antecessor, havia emprestado a esse sonho o melhor da sua
influência.
Quando discursava o Senhor Governador
Civil.
Na hora em que é fácil esquecer os
que largam o mando, aqui lhe testemunhamos a nossa gratidão.
Estou certo, porém, que V. Ex.ª, com
toda a força irremovível do seu prestígio, que o levará a subir mais
altos degraus da Governação, irá, finalmente, tornar possível a sua
realidade, para que a chaga das instalações que visitámos seja
removida da face da bela terra que o viu nascer e que ama
estremecidamente.
É certo que esta Junta se tem
cansado de pedir e de ver diferida a resolução do seu mais premente
problema.
Talvez por isso eu fosse tentado a
terminar a minha saudação com aqueles expressivos versos do nosso
genial irmão Manuel Bandeira,
«Não te doas do meu silêncio:
Estou cansado de todas as palavras».
Mas é tempo de romper com o silêncio
e empunhar a palavra, que sirva de rumo à Juventude perturbada e ao
adormecido Povo Português, sem nunca descurar a bússola mais
infalível: o Exemplo!
Em brilhante improviso o Senhor
Governador Civil, após saudar Sua Excelência Reverendíssima o Senhor
Bispo de Aveiro e as demais entidades presentes, dirigiu-se ao
Senhor Presidente da Junta Distrital para afirmar:
«Quando o Senhor Presidente da Junta
Distrital, o meu prezado e distinto Amigo, Dr. Fernando de Oliveira,
me convidou para visitar a Junta Distrital, sempre pensei que se
tratasse somente da visita às instalações que eu não conhecia, nesta
casa que há tantos anos conhecia, e não uma visita como esta que
proporcionou, imprimindo-lhe a maior solenidade.
Mas fez mais o Sr. Presidente; fez
mesmo um discurso. Com as qualidades que lhe conhecemos, não admira
que tenha feito mesmo um discurso.
Recordou que a sua entrada para a
cena política foi, digamos, inspiração ou estímulo meu. Pois, Dr.
Fernando de Oliveira, neste momento, a melhor homenagem que lhe
posso prestar é dizer-lhe que motivo algum tive que me causasse
arrependimento por esse acto que pratiquei
–
e que não foi fácil –,
de conseguir o objectivo
visado.
É-me muito grato ver esta Junta
entregue à sua inteligência e à sua devoção.
Disse há pouco já haver sofrido
algumas amarguras e que ansiava pelo regresso. Não creio, Dr.
Fernando
/ 76 / de Oliveira, em
que um homem com a sua força de ânimo, com a sua disposição de
servir a coisa pública, se possa agastar por qualquer contrariedade.
A vida pública é cheia de contrariedades! Mos compreende-se o
desabafo e o desejo do Dr. Fernando de Oliveira».
Depois de aludir à restauração das
Juntas Distritais, decretada precisamente no ano do termo do seu
mandato como Governador Civil do Distrito, e de referir o valimento
da autarquia distrital, salientou os nomes dos primeiros presidente
e vice-presidente, Drs. António Rodrigues e Belchior Cardoso da
Costa, dos segundos (presidente e vice-presidente) Dr. Aulácio
Rodrigues de Almeida –
e ao invocar o seu nome e julgando interpretar o sentir de todos os
presentes como o seu próprio, prestou ao saudoso Dr. Aulácio as suas
homenagens e formulou um voto, voto muito profundo, muito sincero,
pelo seu possível e breve restabelecimento
–,
e Dr. Humberto Leitão.
E a seguir:
«Pois nesta minha primeira visita,
eu não posso deixar de render homenagem ao esforço de todos esses
homens e das suas respectivas equipas. Prestar homenagem por todas
as razões: esta própria restauração do edifício já diz, por si, do
espírito, do dinamismo, da vontade de servir que a todos animava,
que desde há nove anos deram vida ao organismo restaurado».
E a finalizar:
«Quanto à aspiração maior da Junta
Distrital, aquela para que todos os concelhos voltam as suas
atenções, apresentam as suas apreensões
–
a construção do novo Internato Distrital
–,
posso dizer que ainda antes de empossado, mas já depois de assente o
meu regresso a Aveiro, a segunda coisa de que tratei foi
precisamente a da construção do novo Internato.
O Senhor Governador Civil apreciando a
Revista "Aveiro e o seu Distrito"..
Tinha na minha mente as velhas
instalações do antigo Asilo e, na conferência que tive, antes de
empossado, com Sua Excelência o Ministro da Saúde, e passei em
revista tudo aquilo que de memória tinha em relação ao distrito, pus
mesmo o problema do Asilo e lhe disse que considerava essa obra das
mais urgentes, mais necessárias.
Disse mesmo que o Internato, antigo
Asilo, tinha nesta terra e teve nesta terra um grande papel. Ainda
bem me recordo de que muitos daqueles que na vida
/ 77 / aveirense
marcaram posições de destaque, saíram desta casa. Bastava essa
circunstância para reconhecer o papel enorme que o velho Asilo
desempenha, para sentir os anseios daqueles que vivem, dia a dia, as
dificuldades.
E posso dizer, Senhor
Presidente e Senhores Membros da Junta, que encontrei da parte do
Senhor Ministro da Saúde e Assistência perfeita receptividade para o
problema, a melhor disposição de o resolver em breve. Penso que não
demorará uma visita de Sua Excelência à capital do Distrito e
suponho que nesse dia, esse problema, que tanto tem apaixonado todos
os componentes da Junta Distrital, pois nesse dia, todas e quaisquer
dificuldades serão vencidas.
E teremos, portanto, a esperança de
ver, em breve, lançada a obra. É esse o voto do Governador Civil, é
esse o voto do Aveirense.
E para terminar, e ainda em
felicitação, dizer que a Junta Distrital não se deu ao luxo mas
caprichou em dispor da instalação mais digna, mais actual,
porventura de quantas haverá no País.
Até neste aspecto, a Junta Distrital
e os seus gerentes estão de parabéns».
*
* *
Terminada a sessão solene o Senhor
Presidente da Junta Distrital ofereceu ao Senhor Governador Civil o
último número publicado da Revista «Aveiro e o seu Distrito». |