Manuel Fernandes Laranjeira
nasceu no lugar de Vergada, freguesia de Mozelos, do concelho de
Vila da Feira e faleceu em Espinho, a 22 de Fevereiro de 1912,
com 35 anos de idade.
Escritor, poeta e pensador de
real merecimento, as suas obras revelam bem o seu espírito e a
sua insatisfação, numa luta íntima contra a sua própria vida que
tragicamente havia de abandonar, sem que ele soubesse, como
confessava, para que a viveu.
Ainda aluno da Escola
Médico-Cirúrgica de Universidade do Porto, manifestou-se logo
pela violência das suas crónicas, publicadas em O Campeão,
jornal dos estudantes. Colaborou assiduamente no Teatro
Português, na Revista Musical, no Porto Médico,
nos Serões e na Ilustração Trasmontana. Manteve
também assídua colaboração no Jornal de Notícias, Voz
Pública, Norte e Pátria.
Em 1904, termina o curso de
Medicina, vindo a defender tese três anos depois com a Doença
da Santidade, ensaio psicológico sobre o misticismo de forma
que lhe valeu uma alta classificação.
Sempre insatisfeito, escrevia
infatigavelmente abordando os mais diversos assuntos.
Como conferencista, impunha-se
pelo seu poder sugestivo. A série de conferências que realizou
na Universidade livre, sobre A Vida, ficou memorável.
A obra de Manuel Laranjeira
encontra-se dispersa nas colunas de diversas publicações
periódicas. A obra impressa em livro resume-se, além do prólogo
dramático Amanhã (1902), da tese de doutoramento
Doença da Santidade (1907), A Cartilha Maternal e a
Fisiologia (1909), o livro de versos Comigo
(1912). No espólio do escritor foram encontradas três peças
teatrais: As Feras! (1 acto), Naquele engano de alma
(1 acto) e Diário Íntimo, esta incompleta.
Miguel de Unanumo, que sentia
uma grande ternura por Manuel Laranjeira, escreve no prefácio
das Cartas de Manuel Laranjeira – volume póstumo –,
publicado em 1943:
«Foi Laranjeira quem me ensinou
a ver a alma trágica de Portugal, não direi de todo o Portugal
mas do mais profundo, do maior. E me ensinou a ver muitos
caminhos dos abismos tenebrosos da alma humana. Era um espírito
sedento de luz, de verdade e de justiça...
/ 43 /
Seu livro Comigo (versos
de um solitário), dá-nos toda a sua alma. Está ali, bem
concentrado, o seu pensamento.
Era necessário ouvi-lo falar. E,
como em suas Cartas, creio que seja o seu epistolário o
que melhor nos revela toda a grandeza da sua alma.
Iluminou a sua cabeça, que era
portentosa no pensar, com a chama do seu próprio coração, que o
tinha aceso. Conheci poucos homens que tenham somado a uma
inteligência mais clara e mais penetrante, um sentimento mais
profundo.
E por isso sucumbiu.
Nele, como em Antero, a cabeça e
o coração travaram rude batalha.
Foi um grande, um enorme
pensador, mas sentia mais ainda. E não morreu. Vive dentro de
nós, os que lhe quisemos, e viverá em todos os que o
compreendam».
Do Livro Comigo, último
soneto, que bem revela a insatisfação do autor:
VENDO A MORTE
|
Em tudo vejo a Morte! e, assim,
ao ver
que a vida já vem morta
cruelmente
logo ao surgir, começo a
compreender
como a vida se vive
inutilmente...
Debalde (como um náufrago que
sente
vendo a morte, mais fúria de
viver)
estendo os olhos mais avidamente
e as mãos p'rá vida... e
ponho-me a morrer.
A morte! sempre a morte! em tudo
a vejo
tudo m'a lembra! e invade-me o
desejo
de viver toda a vida que
perdi...
E não me assusta a morte! Só me
assusta
ter tido tanta fé na vida
injusta
... e não saber sequer p'ra que
a vivi. |
|
|
|