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N.º 3

Publicação Semestral da Junta Distrital de Aveiro

Junho de 1967 

 

A colónia de Garças de S. Jacinto – Aveiro

POR

J. R. dos Santos

Prof. de Zool. e Antrop. da Fac. de Ciências da Univ. do
Porto e Secretário da Sociedade Portuguesa de Ornitologia

Osvaldo A. da S. Freire

Antigo Assistente de Zool. e Antrop. da Fac. de Ciências da Univ. do
Porto e Secretário da Sociedade Portuguesa de Ornitologia

 

A colónia de garças de S. Jacinto sobressai no quadro da nossa Ornitologia com certa relevância.

No nosso país são do nosso conhecimento apenas três núcleos de criação de garças brancas: o de Leixão do Farol ou Leixão da Gaivota, em Portimão; o do Bunhal ou Paul do Boquilobo, na Golegã; e o de S. Jacinto.

À colónia de nidificação na costa do Algarve fizeram referência os seguintes autores:

J. A. Reis Júnior, no seu Catálogo sistemático e analítico das aves de Portugal (1), pág. 53, refere que a «garcêta» Egretta garzetta garzetta (L.) é comum na costa do Algarve e cria em grande quantidade no Leixão da Gaivota, enorme bloco de calcário nas proximidades da barra de Portimão, isolado pelo mar e de acesso dificílimo. Trata-se duma «pedra ilhada», no género das muitas que se encontram ao longo da costa marinha do sul do nosso país. Reis Júnior acrescenta que desta garça têm sido caçados exemplares na lagoa de Esmoriz e na Ria de Aveiro.

William Tait, a pág. 160 do seu belo livro The birds of Portugal (2), foi o primeiro a dar conta desta estranha colónia algarvia de nidificação da «garcêta». Diz que esta garça a que chama «The charming little egret» é frequente na costa do Algarve, onde a encontrou a criar no Leixão do Farol, pequena, arredondada e inacessível pedra ilhada, perto de Portimão. Escreve: «The egrets nested on the short brushwood, and it was very picturesque to see them rise in a white cloud as we approached in a boat.»

Acalenta a esperança de que os nossos serviços oficiais, antes que seja tarde, venham a tomar as convenientes medidas para proteger a fauna em via de desaparecimento, e acrescenta: «They might well proclaim the said small islet a bird sanctuary in order to preserve the Egrets.»

Na Golegã, há alguns anos que o centro de aniIhagem da Faculdade de Ciências do Porto, criado e orientado por um de nós (S. J.), tem procedido à aniIhagem de garças juvenis. O número destas aves aniIhadas nos ninhos tem sido variável de ano para ano, mas sempre de algumas centenas; num ano atingiu mesmo um pouco mais do milhar. Não devemos andar muito longe da verdade se computarmos a colónia de garças da Golegã, relativamente às duas espécies Egretta garzetta (L.) e Bubulcus ibis L., na ordem dos 3500 a 4000 indivíduos, senão mesmo a passar. A colónia no núcleo de criação de garças de S. Jacinto é menor, mas, como veremos, nem por isso tem menos interesse científico.

 

A RIA DE AVEIRO – BREVES CONSIDERAÇÕES GEOGRÁFICAS

 

S. Jacinto fica na orla marinha da Ria de Aveiro, que é formada por vasta toalha de água com a superfície aproximada de 6000 hectares.

A Ria de Aveiro é o mais notável acidente do litoral peninsular. O Dr. Dantin Cereceda, que foi abalizado geógrafo e catedrático do Instituto de San Isidoro, em Madrid, autor do livro Ensayo acerca de las regiones naturales de España (3), no Resumem Fisiográfico de la Península Ibérica afirma que a Ria de Aveiro «no tiene semejante en todo el litoral ibérico».

Tomando em consideração o que Dantin Cereceda expande no 1.º capítulo do seu referido livro sobre as regiões naturais da Península Ibérica, podemos dizer que a Ria de Aveiro constitui uma singular região natural.

As eruditas considerações que Dantim Cereceda desenvolve sobre o conceito de região natural e os elementos que a constituem permitem afirmar, como ele escreve a pág. 67 do citado trabalho, que uma região natural fica definida e bem determinada pelos seus elementos constituintes: relevo, clima, vegetação, fauna e população humana. O primeiro destes elementos / 10 / é considerado por Dantin Cereceda como o princípio director que subordina e relaciona entre si todos os elementos componentes.

Na mesma página 67, Dantin Cereceda escreve: «La region natural aparece como el resultado final de Ia mutua reciprocidad de los factores integradores que intervienem en su composición, siempre que se tenga presente cómo reacionan entre si y se modifican; término final del conflicto entre princípios físicos y biológicos, con todas sus sumas e interferências.»

A ria de Aveiro é uma região onde a completa combinação dos referidos elementos constituintes ou definidores duma região natural são a expressão final, e bem característica, desta notável e singular região.

A Ria de Aveiro, como dissemos, é formada por uma vasta toalha de água com uma superfície de cerca de 6000 hectares. Em comunicação com o Atlântico pela «barra», do mar recebe a água salgada, que flui e reflui ao sabor das marés. Por outro lado, dos rios Vouga, Águeda, Antuã, Cértima, Caima e Mau, das ribeiras do Marnel e do Pano, e das Valas Negras, do Arrujo e da Vagueira, recebe maior ou menor quantidade de água doce, consoante a maior ou menor queda de chuva e, consequentemente, da maior ou menor abundância de água nos referidos rios, ribeiros e valas.

Deste modo a extensa toalha de água da Ria de Aveiro apresenta uma notável diversidade de biótipos, particularmente interessantes e de grande importância faunística. Os quatro braços mais importantes da Ria e a rede labiríntica de canais, valas e esteiros, que os continuam e penetram pelos concelhos de Ovar, Murtosa, Estarreja, Aveiro, Ílhavo, Vagos e Mira, proporcionam diferentes tipos de meios ou «habitats», particularmente favoráveis para a biologia de certas espécies vegetais (moliço) e animais, nomeadamente para as aves palmípedes e pernaltas.
 

   
 

Fig. 1 – Carta-esboço do pinhal de S. Jacinto. O sinal (+) indica os talhões que têm sido ocupados durante as épocas de nidificação e cria. As zonas a pontuado são terrenos de propriedade particular.

 

 

Na Ria há algumas ilhas, das quais, uma das maiores é a chamada «Ilha dos Ovos», que há anos um de nós (S. J.) preconizou fosse considerada como Reserva Zoológica (4), para constituir centro de nidificação da fauna ornitológica da Ria.

A velha designação de «Ilha dos Ovos» faz crer que tal nome tenha resultado da abundância de ninhos nela existentes, o que permitiria aos homens ali fazer ampla colheita de ovos. O mesmo, por exemplo, ainda hoje sucede com os pescadores de Peniche que, todos os anos, fazem abundante colheita de ovos, especialmente de gaivota, nas Berlengas e nos Farilhões.

 

A MATA FLORESTAL DE S. JACINTO

S. Jacinto (40º 39' N – 08º 44' W) lugar e praia da freguesia do mesmo nome, concelho de Aveiro, situa-se na ponta sul duma extensa faixa de areia que se ergue entre a costa atlântica e a margem poente do Canal Norte da Ria de Aveiro.

A mata dos Serviços Florestais, começada a semear em 1888 para fixar as dunas, e designada Mata de S. Jacinto, cobre a citada faixa de areia até cerca de 5 Km para norte da povoação de S. Jacinto, que fica no extremo sul da referida faixa.

Naquela mata vive uma colónia de garças pela primeira vez observada por um de nós (S. J.) em Maio de 1962.

Na mata de S. Jacinto, a essência florestal com larga supremacia numérica e de maior porte é o pinheiro bravo Pinus Pinaster Sol.

A sementeira dos pinheiros nuns pontos foi feita em linha ou às carreiras, distanciadas umas das outras, em / 11 / média, 1,20 m. Noutros pontos a sementeira foi praticada irregularmente, a lanço.

A mata apresenta-se regularmente aberta por veredas, sesmos ou galerias florestais que se entrecruzam, dando ao pinhal um aspecto de quadriculado em xadrez, como bem mostra o esquema da fig. 1.

 

 

 
 

Fig. 2 – Vista parcial do Pinhal onde as garças nidificaram no ano de 1965.

 

 

As veredas orientadas no sentido norte-sul são os arrifes; as que se orientam normalmente, isto é, no sentido leste-oeste, são os aceiros; uns e outros sesmos delimitam os quadriláteros ou talhões em que a mata está dividida.

Os pinheiros do talhão, onde actualmente as garças nidificam, segundo informação local, devem ter cerca de 60 anos. Estão pouco desenvolvidos, apresentando os de maior porte uma altura que pouco deve exceder os 10 metros.

 

PARA A BUBULCUS IBIS

A colónia de garças cria na Mata de S. Jacinto há pelo menos 14 anos, e é constituída por duas espécies, a Egretta garzetta (L.) e a Bubulcus ibis L.

Cada uma destas espécies é conhecida entre nós por alguns nomes vulgares. Assim para a Egretta garzetta estão registados os seguintes: garça, garça ribeirinha, garça branca (Portimão), garcêta (Faro); chisco (Olhão), Lavandeira (Cabo de S. Vicente e Golegã), garzeta do mar.

Da Bubulcus ibis conhecem-se apenas quatro nomes vulgares: garça, garciote, garça boieira (Esmoriz) e garça da Barbária (Alpiarça).

São duas belas aves que têm ampla sinonímia.

 

   
 

Fig. 3 – Ninhos de garças em pinheiros já com pouca folhagem.

 

 

Com os elementos bibliográficos de que dispomos, pudemos apurar as designações sinonímicas que se indicam:

 

PARA A EGRETTA GARZETTA

Ardea Garzetta Linnaeus, Syst. Nat, Ed. XII, I, p. 237 (1766 – «Habitat in Oriente»).

Ardea nivea S. G. Gmelin, Reise d. Russland I, p. 164 (1770 – Südrussland).

Ardea Xanthodactyla Rafinesque, Caratt. nuov. gen. e spec. An. Sicilia, p. 5 (1810 – Italien und Sizilien).

Ardea Orientalis Gray, ZooI. Misc., p. 20 (1831 – Indien).

Herodias Lindesmayeri Brehm, Vogelfang, p. 294 (1855 – Griechenland).

Egretta garzetta vulgaris, major A. E. Brehm, Verz, Samml., p. 12 (1866 – Nomina nuda!).

Ardea (Herodias) procerula Cabanis, Journ. f. Orno 1868, p. 414 (Ostafrika).

Egretta garzetta garzetta (L.), Ernest Hartert, Die Vögel, der paäarktischen Fauna, vol. lI, Berlin, 1912, pág. 1239.

Egretta garzetta, L. Paulino de Oliveira, Aves da Península Ibérica e especialmente de Portugal. 2.ª edição, Coimbra, 1910, pág. 162.

Egretta garzetta garzetta (L.), W. Tait The birds of Portugal, 1924, pág. 160; Reis Júnior, Cat. sist. e analítico das aves de Portugal, Porto, 1931, pág. 53; A Themido, Aves de Portugal, Coimbra, 1952, pág. 178.

 

PARA A BUBULCUS IBIS

Ardea ibis Linnaeus, Syst. Nat., ed. X, I, P. 144 (1758 - Egito).

Ardea Veranii Roux, F. Bernis, Prontuário de Ia avifauna española, Madrid, 1955, pág. 12. / 12 /

Ardea bubulcus Audouin, F. Bernis, id. Id. Id.

Bubulcus ibis auct. ex. Linn., F. Bernis, id. Id. Id.

Bubulcus coramandelicus auct., F. Bernis, id. Id. Id.

Ardeola russata auct. ex. Wagl., F. Bernis, id. Id. Id.

Bubulcus ibis Hasselg., Paulino de Oliveira, Aves da Península Ibérica e especialmente de Portugal, 2.ª ed. Coimbra, 1910, pág. 102 e 163.

Ardea bubulcus Sav., Paulino de Oliveira, id. Id. pág. 163.

Bubulcus ibis ibis (L.), William C. Tait, The Birds of Portugal, Plymouth 1924, pág. 160.

Ardeola ibis ibis (L.), Reis Júnior, Cat. sist. e analítico das aves de Portugal, Porto, 1931, pág. 52.

Bubulcus ibis ibis A. Themido, Aves de Portugal, Coimbra, 1952, pág. 178.

Bubulcus lucidus (Rafin.), A. Themido, id. Id. Id. («in Sharpe e Seabra»).

 

Segundo informação fornecida pelo Sr. Francisco Alves, guarda-florestal aposentado, a colónia de garças nidificaria no pinhal de S. Jacinto há cerca de 40 anos.

O Sr. Álvaro Lopes Cachaço, guarda-florestal em serviço na Mata de S. Jacinto desde 1956, informou-nos que, no ano em que ali foi colocado, ouviu os assalariados dizerem que as garças nidificavam no pinhal apenas há quatro anos, isto é, a colónia dataria portanto do ano de 1952.

O nosso amigo Sr. Geoffrey M. Tait, que é um distinto ornitologista, caçou na ria de Aveiro durante quase 50 anos, e diz-nos que desde 1910 até 1950 nunca ali viu esta garças. Neste período a sua actividade venatória foi intensa um pouco por toda a ria, a ponto de desde 1912 a 1944 ter morto nada menos de 6145 narcejas, além de muitas outras aves.

O depoimento deste caçador e ornitologista é bem mais para considerar visto ser autor do livro The Aveiro marsh (5) com um capítulo «Birds observed on the Aveiro marshes». Nele indica com a designação científica e os nomes vulgares em português e em inglês as 67 espécies que viu na Ria de Aveiro, e não cita nenhuma das garças da actual colónia de S. Jacinto.

Este depoimento corrobora a informação prestada pelo guarda-florestal Sr. Álvaro Lopes Cachaça, e permite-nos considerar o período de 1950 a 1952 como data provável do início desta colónia de garças.

Anteriormente a 1956, as garças nidificaram no talhão n.º 15 (6).

Os talhões utilizados para local de nidificação e cria, em 1956 e nos anos seguintes, e os respectivos períodos de ocupação, são os que a seguir se indicam:
 

 

Período de ocupação

Número do talhão

     ?  –  1955
1956 e 1957

1958 e 1959

1960 e 1961

1962 até à data

15

6

2

30

24

 

 

Como atrás dissemos, esta colónia foi observada por um de nós (S. J.), pela primeira vez, em Maio de 1962. Nesse ano a nidificação ocorreu no talhão n.º 24, no qual se podem distinguir, nitidamente, duas áreas contíguas: uma foi habitada em 1962 e 1963; a outra, a sul daquelas, em 1964 e 1965.

 

/ 13 /                                         OBSERVAÇÕES EM 1963

Nos pinheiros do talhão n.º 24 contámos, em 25 de Junho de 1963, 186 ninhos em 63 pinheiros, com a seguinte distribuição:

18 pinheiros com 1 ninho

14       »         »      2     »

  8       »         »      3     »

12       »         »      4     »

  3       »         »      5     »

  5       »         »      6     »

  2       »         »      7     »

  1       »         »      9     »

 

OBSERVAÇÕES EM 1965

Continuámos o estudo da colónia em 1965. No ano de 1964 não foi possível retomar o prosseguimento das observações iniciadas em 1962.

Em 1964 e 1965 a colónia manteve-se no talhão n.º 24, mas numa zona contígua e a sul da que havia sido ocupada em 1962 e 1963 e cujos pinheiros secaram.

A zona ocupada em 1965 tinha, aproximadamente, a extensão de um hectare. No decurso de duas das visitas que efectuámos nesse ano à mata de S. Jacinto (7 e 23 de Maio de 1965), procedemos à contagem dos ninhos e anilhámos algumas aves em diferentes estados de desenvolvimento, mas todas incapazes de voar.

Contámos, também, os filhotes e os ovos existentes nos ninhos.

 

Registámos os seguintes valores:

Pinheiros ocupados ...         ...         127

Ninhos            ...         ...         ...         434

Filhotes          ...         ...         ...         344

Ovos   ...         ...         ....        ...         537

Aves anilhadas nos ninhos  ...         240

 

/ 14 / Alguns dos ninhos incluídos na nossa contagem estavam inacabados. Considerámo-los porque nos foi dado observar algumas aves adultas transportando galhos finos e pequenos, o que constituía indício seguro de estarem ainda a edificar os seus ninhos.

 

   
 

Fig. 4 – Um pinheiro quase inteiramente despido de folhagem com 14 ninhos.

 

 

O guarda-florestal de S. Jacinto informou que, durante o inverno, a nortada tinha destruído os ninhos edificados na época anterior. Esta informação permitiu-nos considerar todos os ninhos contados como construídos para a nidificação em curso no ano de 1965.

Para se evitarem repetições que falseassem as nossas contagens, foram-se marcando os pinheiros com tinta, à medida que iam sendo observados.

Anilhámos somente 240 garças juvenis. Deixámos por anilhar as restantes 104, por serem demasiado pequenas e não segurarem as anilhas.

A distribuição dos ninhos pelos pinheiros era a que seguidamente se indica:

 

34 pinheiros com 1 ninho(s)

32       »           »    2      »

20       »           »    3      »

  6       »           »    4      »

  9       »           »    5      »

10       »           »    6      »

  6       »           »    7      »

  3       »           »    8      »

  2       »           »    9      »

  2       »           »   10     »

  1       »           »   11     »

  1       »           »   14     »

  1       »           »   18     »

 

Em 23 de Maio de 1965 verificámos que os pinheiros da zona ocupada pela colónia estavam quase completamente despidos de folhagem, indício seguro de que a próxima nidificação viria a efectuar-se noutros pinheiros. De facto assim sucedeu.

 

   
 

Fig. 5 – Garças pousadas e sobrevoar pinhal denso na vizinhança da zona de nidificação.

 

 

No solo estendia-se uma espessa camada de agulhas de pinheiro e de galhos secos. Não se via qualquer arbusto ou ervagem. É de crer que o sub-bosque tenha sido totalmente destruído pelos excrementos das aves.

Temos observado facto idêntico em todas as zonas da mata onde as garças nidificaram. Estas zonas apresentam-se totalmente despidas de vegetação quando finda a época da nidificação. Passado algum tempo, porém, desenvolve-se uma rica e densa vegetação espontânea, nomeadamente erbácea.

 

OBSERVAÇÕES EM 1966

No decurso de algumas visitas a S. Jacinto, no ano de 1966, continuámos a observar esta colónia.

No quadro que se segue, resumimos as contagens efectuadas nos dias 23, 28 e 29 de Maio de 1966.

 

N.º de árvores observadas... ... 198

N.º de ninhos existentes     ... ... 577

N.º de ovos... ... ... ... ... ... ... .. 1 198

N.º das aves juvenis... ... ... ...     558

N.º de juvenis anilhados... ...      193

 

A distribuição dos ninhos por unidade florestal era a seguinte:

 

88 árvores com 01 ninho(s)

36      »         »    02      »

19      »         »    03      »

17      »         »    04      »

14      »         »    05      »

05      »         »    06      »

03      »         »    07      »

02      »         »    08      »

06      »         »    09      »

01      »         »    10      »

02      »         »    11      »

01      »         »    12      »

03      »         »    13      »

01      »         »    18      »

 

Dos 558 garçotes observados, anilharam-se apenas 193, isto é, aqueles que, pelo seu desenvolvimento, permitiram a colocação das anilhas sem risco de estas caírem.

É a seguinte a distribuição das aves anilhadas pelas 2 espécies:

– 84 E. garzetta

– 83 B. ibis

– 26 indivíduos, não conseguimos apurar a qual / 15 / das duas espécies pertenciam; não quisemos, no entanto, deixar de os anilhar.

A colónia nidificou em 1966, novamente no talhão n.º 24, numa zona contígua e a sul daquela onde tinha nidificado nos dois anos anteriores.

 

 

OBSERVAÇÕES EM 1967

Embora as observações no ano de 1967 tenham sido iniciadas no dia 12 de Abril, julgamos conveniente referir alguns elementos colhidos nessa primeira visita deste ano.

Vimos no chão, debaixo de pinheiros com ninhos, várias cascas de ovos, das quais, supomos, hajam nascido garçotes.

 

   
 

Fig. 6 – Garça juvenil.

 

De binóculo vimos chegar uma garça ao ramo dum pinheiro, entrar cuidadosamente no ninho e alapar-se suavemente. Isto nos levou a crer que naquele ninho houvesse já garçotes. Chamamos assim aos juvenis, embora este nome figure como nome vulgar da garça boieira.

Nesse mesmo dia, nas observações feitas de manhã e de tarde, verificámos que muitas garças andavam num vaivém apanhando ramitos secos que levavam para a construção dos ninhos. Parece pois que, em paralelo com uma fase inicial de construção de ninhos, havia garças no choco e em alguns casos, talvez, já ninhos com filhotes.

Uma observação acidental que fizemos foi a seguinte; num pinheiro com 3 ninhos apenas, vimos que aos mesmos chegaram ali e se mantiveram 3 garças brancas, Egretta garzetta.

 

   
 

Fig. 7 – Garça juvenil prestes a voar.

 

 

É de crer que no mesmo pinheiro existam lado a lado ninhos de garça branca e de garça boieira, como temos verificado nos salgueiros da imponente colónia do Bunhal ou Paul do Boquilobo, na Golegã. No entanto pode bem suceder que haja tendência para agrupamento específico. Mais um facto a esclarecer em futuras observações.

A montagem de uma torre permitiria realizar observações cuidadas, de modo mais conveniente, não só para o observador, abrigado na guarita cimeira da torre, mas também para as aves. Estas, não dando conta da nossa presença, ao fim de pouco tempo manter-se-iam calmas, sem agitação, maior ou menor, que se nota quando as observamos do chão, mesmo encostados ou atrás de um ou outro pinheiro. Além disso poderiam tirar-se fotografias em melhores condições.

A Direcção Geral dos Serviços Florestais e Aquícolas, à qual apresentamos, mais uma vez, agradecimentos pelos auxílios que tem prestado aos nossos estudos ornitológicos, acedendo a um pedido nosso, fornecerá, oportunamente, uma torre de observação, desmontável.

 

   
 

Fig. 8 – Pinheiros inteiramente despidos de folhagem e secos, onde as garças nidificaram há 3 anos.

 

 

As garças da Mata de S. Jacinto nidificam em pinheiros de uma zona relativamente pequena.

A área de tal zona está, evidentemente, condicionada pelo número de aves que formam a colónia, pela densidade de distribuição dos pinheiros e ainda pelo desenvolvimento e vigor dos mesmos.

Estes três factores condicionam o número de ninhos em cada árvore. Parece que o factor de maior relevância neste aspecto é o porte ou desenvolvimento dos pinheiros.

As nossas observações permitem concluir que é nos pinheiros mais frondosos que há o maior número de ninhos. Vimos um pinheiro bem frondoso que tinha 18 ninhos.

A colónia nidifica, em média, dois anos consecutivos na mesma zona, isto é, nos mesmos pinheiros. Estes / 16 / começam a perder a folha a pouco e pouco e terminam por secar. Isto leva as garças a fazerem novos ninhos em pinheiros de ramagem verde.

Os ninhos são muito toscos e frágeis. Têm localizações variadas. As mais das vezes nos ramos; algumas vezes no topo do caule. Resultam da acumulação travada, por entrecruzamento, de pequenos galhos secos de pinheiro. O rebordo do ninho é um pouco mais espesso, o que lhe confere a forma de bacia, embora pouco profunda.

 

   
 

Fig. 9 – Pinheiro quase seco situado entre as zonas de nidificação deste ano e de há 3 anos.

 

 

Nos últimos anos, como atrás se disse, a zona de nidificação tem-se mantido no mesmo talhão n.º 24, em contiguidade com a zona anterior, como que em espraiamento ou expansão na direcção sul.

No período da nidificação e cria, a zona é ocupada intensamente por algumas centenas de garças.

Parece que o período de postura e subsequente cria se estende ao longo de alguns meses.

Não nos tem sido possível fazer observações convenientemente periódicas ao longo de todo o ano.

Seria necessário que, durante o período de criação, as observações fossem repetidas de 10 em 10 dias ou, pelo menos, de 15 em 15 dias, com a anilhagem dos garçotes que apresentassem o desenvolvimento indispensável à conveniente adaptação e suporte das anilhas.

O período de postura é, como dissemos, relativamente lato. Em 7 de Maio de 1965, observámos filhotes nos ninhos, alguns já bastante desenvolvidos, e em 4 de Junho do mesmo ano fomos encontrar muitos filhotes ainda em estado relativamente atrasado de desenvolvimento. Segundo informação do guarda-florestal, em Agosto, ainda se viam «passaritos novos». Há portanto garças que nidificam muito cedo e outras que o fazem tardiamente; a menos que façam duas posturas consecutivas, como sucede com algumas aves.

Nos meses intercalares a dois períodos consecutivos de nidificação e cria, conviria que se fizessem observações para averiguar se o local da criação é abandonado inteiramente ou se continua a servir de dormidoiro a maior ou menor número de garças, e, neste caso, se apenas às adultas ou só às juvenis, ou a umas e a outras. As juvenis seriam facilmente reconhecíveis pela presença das anilhas.

Como não temos feito observações directas nos meses intercalares aos períodos de nidificação, procurámos obter informes do pessoal que trabalha na mata e especialmente do referido guarda-florestal Álvaro Lopes Cachaço, que tem manifestado vivo interesse pela colónia de garças que há anos vimos estudando.

Informa este guarda que o período de criação vai pelo menos de Maio a Setembro, e que a maior parte das garças abandona o local da nidificação, permanecendo apenas um número reduzido que, ao fim da tarde, ali se junta e ali pernoita.

/ 17 /

RECUPERAÇÃO DE ANILHAS

 

Foram anilhadas 433 aves: 240 em 1965 e 193 em 1966.

Temos conhecimento de terem sido abatidas 21 destas aves (4,8 %).

Os pormenores relativos à anilhagem e à recuperação das anilhas constam do seguinte quadro:

 
Anilha N.º Espécie Data de Anilhagem Data de Recuperação Local da recuperação

5804 H

5819 H

5824 H

5828 H

5841 H

5891 H

5924 H

5947 H

5956 H

1203 J

1216 J

1241 J

1246 J

1290 J

1295 J

1301 J

1307 J

1312 J

6016 H

6047 H

6070 H

? (7)

? (7)

? (7)

? (7)

? (7)

? (7)

? (7)

? (7)

? (7)

Egretta garzetta (L)

Bubulcus ibis (L)

Egretta garzetta (L)

      »           »         »

      »           »         »

      »           »         »

      »           »         »

      »           »         »

      »           »         »

? (7)

Egretta garzetta (L)

    »          »          »

23-5-65

23-5-65

23-5-65

23-5-65

23-5-65

23-5-65

23-5-65

23-5-65

23-5-65

28-5-65

28-5-66

28-5-66

29-5-66

29-5-66

29-5-66

29-5-66

29-5-66

29-5-66

23-5-66

23-5-66

28-5-66

15-8-65

0-9-65

19-9-65

2-9-65

20-11-65

20-11-65

     ?

15-9-65

0-11-66

29-1-67

26-11-66

0-8-66

28-8-66

15-8-66

0-12-66

0-9-66

0-8-66

12-10-66

0-10-66

0-11-66

0-10-66

Salreu – Estarreja

Vagos – Aveiro

Fontela – Figueira da Foz

Quintã – Vagos – Aveiro

Cacia – Aveiro

Ria de Aveiro (?)

Aveiro

Aveiro

Aveiro

Monte Farinha – Aveiro

Monte Farinha – Aveiro

Aveiro

Gafanha – Aveiro

Pardilhó – Aveiro

Aveiro

Monte Farinha – Aveiro

Aveiro

Vilalva, Acuña, Pontevedra – Espanha

Aveiro

Rio Novo do Príncipe – Aveiro

Aveiro

 

                                 

 

RESUMO DAS CONTAGENS EFECTUADAS EM 1963, 1965 E 1966

 
Ano Pinheiros ocupados Ninhos existentes Ovos Garçotes nos ninhos Garçotes anilhados

1963

63 186
1965 127 434 537 344 240
1966 198 577 1 198 558 193

TOTAL  ...  433

 

                        

Atendendo às contagens feitas em 1965 e 1966, podemos calcular que em 1965, a população de garças desta colónia seria de cerca de 1 750 aves, e que em 1966 atingiria 2900 aves.

Baseamo-nos no facto de cada ninho ser habitado por um casal de garças e admitimos que todos os ovos teriam sido viáveis, circunstância esta que não podemos asseverar mas que consideramos como provável.

Faculdade de ciências da Universidade do Porto.

29 de Abril de 1967

_______________________________ 

NOTAS

(1) – J. A. Reis Júnior, Catálogo sistemático e analítico das aves de Portugal, Porto, 1931, 136 págs. e 7 figs.

(2) – William C. Tait, The birds of Portugal, Plymouth 1924, XII + 260 págs. 17 figs. e um mapa.

(3) – J. Dantin Cereceda, Ensayo acerca de Ias regiones naturales de España, Madrid, 1922, Tomo I, pág. XV + 386, 4 mapas.

(4) – As reservas zoológicas, como o próprio nome indica, são áreas onde é proibido perseguir, molestar ou matar animais.

A reserva pode ser de vários tipos consoante a finalidade que se tem em vista.

Pode ser integral e chama-se santuário, tradução do inglês «Sanctuary». Neste caso a reserva é total, isto é, geológica, botânica e zoológica. Tem importância fundamental no aspecto paisagístico e no aspecto biológico. Pelo que respeita a este último não será permitido na área da reserva perseguir, inquietar ou matar os animais nem mutilar, derrubar ou arrancar qualquer planta, e até removê-Ia após a sua queda natural.

As reservas parciais visam aspectos restritos. Neste particular várias modalidades se podem considerar. Reservas zoológicas quando se pretende defender todos os animais da região considerada. Reservas Ornitológicas quando se visa a protecção e defesa das aves.

Há ainda a considerar os refúgios que são reservas destinadas às aves migradoras. Em vários países a protecção às mesmas há muito que vem sendo feita, nomeadamente pela organização de zonas ao longo das habituais rotas migratórias, onde é proibido caçar. Consequentemente, ali as aves estão livres da encarniçada perseguição dos caçadores. São zonas de calma, de segurança, de refúgio.

(5) – Geoffrey Murat Tait, The Aveiro marsh, Vila Nova de Gaia, 1949, 24 págs., 17 figs. e 1 mapa. Edição limitada a 100 exemplares.

(6) – O guarda-florestal da Mata de S. Jacinto, que foi nosso informador, foi colocado em S. Jacinto em 1956, ano em que se verificou a transferência da colónia do talhão n.º 15 para o talhão n.º 6.

(7) – Ave cujo estado de desenvolvimento não permitiu a determinação rigorosa da espécie. Trata-se, todavia, de um indivíduo de uma das 2 espécies mencionadas no texto.

 

páginas 9 a 17

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