Como, 17 / Fev. / 64.
A missão, naquela manhã, era
destruir o poço que ficava na tabanca junto ao caminho que já
tinha uma história de lutas encarniçadas.
Saímos cedo para criar
surpresa. Passámos calmamente por detrás da casa do Brandão, onde já
estavam instalados os morteiros para possível apoio, e entrámos no
caminho sem o mínimo ruído metálico, sem ruídos nos passos lentos que
pareciam aumentar a distância que era duns 500 m.
Porém, quando entrámos na
bolanha do lado direito, rasa de água, chafurdando, os passos
começaram a distinguir-se. Um cão, desperto, ladrou. E eles
acompanharam-no. Um, dois, três tiros que encontraram o nosso silêncio.
Protegemo-nos atrás dos cômoros, água a correr por debaixo do peito,
estendido sobre as ervas e sargaços. Depois, de armas fixas nos quadris,
apontadas, avançámos curvados. Nada de novo... E começámos a montar o
cerco à tabanca.
De repente, o Montes viu um
bandido de mãos vazias a sair apressado duma porta qualquer,
acobertando-se. E disse para os outros:
– Não atirem... Vamos
apanhá-lo à mão! – E deu três passos.
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É que um homem vivo, um
prisioneiro, por vezes, vale mais que meia dúzia de mortos. Por isso
mesmo, é que há dias andara a correr como um doido atrás de três negros
matulões que corriam como galgos. Acho que bateriam o recorde dos 100 m.
Porém, o Montes não foi
longe, pois, mal dera os três passos, mais homens, estes armados de
pistola-metralhadora, saíram a correr para as suas posições E, então,
não esteve com meias medidas ou contemplações. Atirou a matar, pois
estavam a jeito.
E logo uma poeira infernal
se fez no descampado da tabanca, enquanto algumas balas altas
quebravam ramos verdes que nos caíam na cabeça, nos braços.
Estava de pé, por detrás dum
tronco, quando a chuva começou tempestuosa, em torrentes de estalidos e
chicotadas. A reacção foi enérgica, mas, a pé firme, de arma a vomitar
fumo e fogo enraivecido, tivemos que recuar para os cômoros da
bolanha, rompendo o cerco ardiloso que nos tinham montado. Os
morteiros caíam-lhes em cima.
Foi, então, que ouvi uma voz
dorida:
– Não me deixem aqui...
Olhei. Era o Oliveira que
fora ferido na cintura e que não podia mover-se. E já vinha sendo
arrastado pelo Silva. O destino parecia persegui-lo. Um dia, uma rajada
varara-lhe o dólman. E, agora, estava ali escorrendo sangue,
contorcendo-se. O enfermeiro, assistia-o, injectando-o, enquanto nós
íamos reduzindo ao silêncio o furor inimigo.
O cento e dezassete
exclamava admirado:
– Olhe acolá um...
Carregou no gatilho. Ficou
furioso. falhou a pontaria. O bandido atirou-se por terra. E ele
esperou, olhos bem abertos. Porém, quando ele se tornou a erguer,
apontou, de novo e desta vez acertou em cheio:
– Vá para o diabo! Já se ia
a safar...
Dei-lhe uma palmada no
ombro, palmada encorajadora:
– Bravo, cento e dezassete!
Bravo!
– Foi só apontar. E eis mais
um a juntar aos mortos.
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O cento e dezassete é franzino, pequeno:
– Vês, os homens não se
medem aos palmos. Bravo! E não tirávamos os olhos da frente.
Ao longe, começou a ouvir-se
o ronronar cadenciado dos aviões que cada vez se distinguia mais
próximo.
E soaram as últimas rajadas
à distância.
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