A
FREGUESIA da Oliveirinha fica nas proximidades de Aveiro, e no seu
concelho, e nela está a casa (vinculada até 30 de Junho de 1860)
do morgado da Oliveirinha,
onde nasceu a 14 de Dezembro de 1834(2)
o Sr. Conselheiro José Luciano de Castro Pereira Côrte-Real, filho
segundo génito do último morgado, o senhor Francisco Joaquim de Castro Côrte-Real.
Algo irei dizer da genealogia do chefe venerando do partido
progressista(3), sem dúvida a primeira individualidade política da lusa
praia, onde, mercê de Deus, não faltam estadistas; e ser o testa do rol
nesta superabundância, alguma
coisa significa.
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244 /
Vai isto à puridade, que não se traduza por cumprimento bajulador nem por
enfileiramento entre os filhos de Passos − pois que para políticas não
tenho inclinação.
E do Senhor José Luciano simplesmente acrescentarei pelo dever de
genealogista que casou em 1865 com a senhora D. Maria Emília Seabra,
filha do distinto jurisconsulto Alexandre Seabra e de sua esposa, a
senhora D. Justina Cancela, pessoas do maior respeito que eu (já lá vão
trinta e cinco anos) ainda conheci em Anadia.
As senhoras D. Henriqueta e D. Júlia de Castro, que se conservam
solteiras, são as filhas, como é sabido, do sr. José Luciano.
O pai deste foi, como já disse, o sr. Francisco Joaquim de Castro
Pereira Côrte-Real, vogal da junta governativa de Aveiro em 1845 e
presidente da Câmara Municipal da mesma cidade de 1857 a 1858. Pelo seu
casamento em 1826 com a senhora D. Maria Augusta de Meneses da Silveira,
foi senhor do vínculo da Oliveirinha e ainda dos de Salgueiro, Rabaçal, Fontão e Espinhal. Morreu em 2 de Maio de 1876, deixando os seguintes
filhos:
− D. Antónia Augusta de Castro, que foi casada com José Henrique
Ferreira, natural de Albergaria-a-Velha,
antigo deputado da nação, administrador geral do distrito de Aveiro,
cônsul de 1.ª classe, etc. C. g.
− Francisco de Castro Matoso da Silva Côrte-ReaJ,
nascido em 23 de Novembro de 1832 na casa da Oliveirinha (da qual foi
o herdeiro), par do reino, juiz do Supremo Tribunal de Justiça, do
conselho de S. M., etc., etc., que casou em 1856 com a senhora D. Maria
José Huet de Bacelar, filha do marechal Silva Pereira. O conselheiro
Dr. Francisco de Castro Matoso, já falecido, deixou dois filhos.
− D. Maria de Castro, casada com o Dr. Domingos Manuel Estêvão Pires,
de Estarreja, juiz de direito que foi de diferentes comarcas. C. g.
− José Luciano de Castro, já referido.
− D. Ana Amélia de Castro, que casou com o engenheiro João Carlos de Almeida Machado, natural de
Aveiro. C. g.
− E, finalmente, o senhor doutor Augusto Maria de
Castro, nascido em 22 de Março de 1846, casado com a senhora D. Isabel
Maria de Sousa Sampaio, de Cantanhede, com geração, entre a qual o Dr.
Augusto de Castro (Dr. Augusto de Castro Sampaio Côrte-Real),
deputado da nação em várias legislaturas, dramaturgo, escritor
consagrado e distinto jornalista e publicista, que
/
245 /
casou em 29-7-1905 com D. Maria Emília da Natividade de Barbosa Falcão
de Azevedo e Bourbon.
Era natural que seguíssemos agora a linha genealógica
do pai do sr. conselheiro José Luciano de Castro, mas, como
a casa da Oliveirinha veio para a família pela da mãe, tratarei primeiro da ascendência da senhora D. Maria Augusta
de Meneses da Silveira, que foi filha e herdeira de António
Venâncio da Silveira Matoso e Vasconcelos, fidalgo de geração, senhor da casa da Oliveirinha e dos vínculos atrás
nomeados, e de sua mulher D. Maria Albertina Henriqueta Álvares Pereira de Melo.
António Venâncio foi filho de Bento Venâncio da Silveira e Vasconcelos,
e este de Romualdo de Almeida da Silveira Matoso.
Até ao 3.º avô do sr. José Luciano
quase que segui o que
escreveu o Sr. MARQUES GOMES num opúsculo que em 1897
publicou em Aveiro(4), mas agora tenho de deixar a amarra, porque
iríamos errados.
Diz o publicista aveirense que Romualdo de Almeida era filho de Bento de
Almeida Cabral e de sua mulher
D. Isabel da Silva e, seguindo desta uma larga ascendência,
vai-lhe buscar a origem em Aires Gomes da Silva, regedor
das Justiças e IV senhor de Vagos.
Tudo isto era muito bonito e honroso porque uma procedência da ilustre prosápia dos Silvas é de tentar, mas de verdade tem o
pequeno senão de ser falso...
Romualdo de Almeida não era filho de D. Isabel da
Silva e, mesmo que o fosse, eu ponho as minhas dúvidas
na descendência desta dos senhores de Vagos; era filho da segunda mulher
de Bento de Almeida Cabral, de nome
D. Joana de Almeida de Figueiredo, como ele próprio o diz
na petição que dirigiu ao Santo Ofício (Torre do Tombo, m. I, n.º I, dos
processos deste tribunal) para ser admitido
como familiar, como efectivamente foi, e obteve carta em 25
de Junho de 1726.
Eis a cópia do documento:
«Ex.º Sr. Diz Romualdo de Almeyda e Sylveira Cavalleiro professo da Ordem de Christo natural e morador no lugar da
Oliveirinha freguezia de Santo Izidoro da villa de Eixo, filho de Bento de Almeyda Cabral natural que foi da cidade de Coimbra baptizado na freguezia da Sé e assistente no dito lugar da Oliveirinha,
/
246 / aonde falleceu, e de sua mulher D. Joanna
de Almeyda e
Figueiredo natural da villa de Esgueira freguezia de Santo André aonde
foi baptizada e moradora no dito lugar da Oliveirinha todos do bispado
de Coimbra, que elle Supplicante he solteiro, e tem grande desejo de
servir a Deus e a este Tribunal do Santo Officio na occupação de
familiar por se achar com os requizitos para o exercitar. O supplicante he neto pela parte paterna de Luiz Cordeiro Mattozo natural
do lugar do Espinhal, freguezia de S. Sebastião, aonde foi baptizado e
morador na cidade de Coimbra na rua das Covas freguezia da Sée, e de D. Antonia Soares natural e moradora na dita cidade na Rua das Covas
freguezia da dita Sée aonde
foi baptizada. E pella parte materna he neto de Sebastião de Almeida
Carvalho natural de Moimenta da Beira em cuja freguezia foi baptizado
bispado de Lamego e morador na dita villa de Esgueira e de sua mulher
D. Maria da Cunha da Silveira natural e moradora na mesma villa de
Esgueira freguezia de Santo André aonde foi baptizada. E assim o pay do
supplicante como o avô materno foram familiares do St.º Officio. P. a
V. Em.ª lhe faça mercê admitir O supplicante para a dita occupação de
Familiar do St.º Officio. E. R. M.ce»
Como se vê tem a casa da Oliveirinha de riscar do seu
brasão o leão de púrpura dos Silvas e quedar-se com as três faixas
vermelhas dos Silveiras, e vá que, se por um lado deixa de contar
entre os seus avós os reis de Leão (Froilas, Ordonhos, Bermudas e outros
nomes arrevesados), por outro pode derivar a sua estirpe dos Sousas,
segundo escreveu o erudito linhagista D. ANTÓNIO CAETANO DE SOUSA(5),
que também contavam nos seus testas coroadas em abundância.
Romualdo de Almeida da Silveira Matoso foi cavaleiro professo da ordem
de Cristo(6), familiar do Santo Ofício
− como já disse −, senhor da casa
da Oliveirinha e escrivão da câmara de D. Mariana de Áustria, que, como
todos estamos cientes, era a esposa daquele bom D. João V a quem a sorte
encheu as reais narinas de bom esturrinho e o papo de saborosos
ladrilhos de marmelada, afora as horas em que ele refocilava, ora nos
macios braços da madre Paula, ora no coro de Odivelas cantando cantochão
que era uma delícia
ouvi-lo...
Foi talvez com essas lições de solfa que o nosso Romualdo
/
247 /
houve por bem, num certo dia, marcar o compasso nas costas de um tal
António de Oliveira, esforço que lhe ia saindo caro porque na refrega
feriu também uma menina e moça, Sebastiana de nome, e vai daí os
ofendidos clamarem por castigo do agressor no juízo dos cavaleiros de
Cristo; e ele viu-se em trabalhos, e tanto que, para se livrar da negra
masmorra, obteve duas provisões de seguro, tendo a última
a data de 2 de Março de 1739, como se pode ver na Chancelaria da Ordem
de Cristo, livro 206, fIs. 366 v.
Já então o morgado da Oliveirinha devia ter casado, porque em 4 de Junho de 1729 foi aviso à Inquisição de Coimbra de que
tinham sido aprovadas as diligências sobre a sua futura, D. Joana Inácia
Coroniel.
Coroniel lê-se no documento, mas eu, em boa verdade, não sei se era
aquele o apelido, se Coronel, se Connell; o que eu sei é que aquela
senhora era filha do desembargador João Coroniel, superintendente das
ferrarias de Tomar, e
de sua mulher D. Josefa Crispina de Vasconcelos, neta
paterna do capitão de mar-e-guerra Estêvão Coroniel, francês de nação,
parece que conterrâneo de Lamennais e de Chateaubriand e portanto de
Saint-Malo, e de sua mulher D. Maria de Juro (?), natural de Lisboa ocidental, freguesia da
Encarnação, e neta materna de Manuel de Lima e de D. Maria Pereira de
Vasconcelos, da dita freguesia lisboeta.
Aquele apelido «Juro» de D. Maria deixa-me em dúvidas; aquilo deve ser
erro de quem me enviou a cópia dos documentos de onde extraí a notícia,
e a D. Maria não era de Juro mas talvez de Jaso, segundo creio.
De Romualdo foram filhos, que eu saiba, o
bisavô do sr. José Luciano,
Bento Venâncio da Silva e Vasconcelos, de quem já falei, e D. Inês
Margarida Coroniel de Vasconcelos, que foi casada com António Veríssimo
da Costa Monteiro Rangel de Quadros, 4.º administrador da capela dos
Santos Mártires em Aveiro, de quem vem outra progénie ilustre na linda
cidade da ria.
Bento de Almeida Cabral, já o disse, era pai de Romualdo
de Almeida, foi familiar do Santo Ofício (carta de 28 de Fevereiro de
1692) e senhor da casa da Oliveirinha, parece que pelo seu primeiro casamento com D.
Isabel da Silva, filha de João Tenreiro e de sua mulher D. Catarina da
Silva, moradora na Oliveirinha; neta paterna de António Delgado e de
Isabel Francisca, sua mulher, da vila de Aveiro, e materna de Sebastião
da Silva e de sua mulher Isabel Vieira, do lugar da Granja da freguesia
de Eixo.
Este Sebastião da Silva fá-lo MARQUES GOMES escudeiro de geração (?) e
neto de Aires Gomes da Silva, regedor das Justiças e IV senhor de
Vagos; mas repito o que já atrás
/
248 /
afirmei, que a actual família da Oliveirinha, contra o que
escreveu MARQUES GOMES, não vem destes Silvas.
Ainda diz o mesmo publicista de Aveiro que
Bento de
Almeida casou em 1680 com D. Isabel e que o vínculo da
Oliveirinha foi instituído em 13 de Junho de 1719, por
ele,
que já era administrador de outro no Espinhal(7).
Em 6 de Junho da 1699 foi avisada a mesa da Inquisição de Coimbra de
terem sido aprovadas as diligências a respeito
de D. Joana de Almeida e Figueiredo, e Bento de Almeida
Cabral casou, em segundas núpcias, nesse ano.
Era ele filho do licenciado
Luís Cordeiro Matoso e de
sua mulher D. Antónia Soares, moradores em Coimbra na freguesia da Sé,
neto paterno de Gaspar Cordeiro e de sua
mulher D. Ana Matoso, do lugar do Espinhal do bispado de
Coimbra, e neto pela parte dá mãe de António Lourenço Soares e de sua
mulher D. Luísa Gomes, que também moraram em Coimbra na freguesia da Sé. Este Bento de Almeida
tinha uma irmã, D. Maria Soares, que era casada com o lente da
Universidade Dr. Manuel Rodrigues do Vale.
D. Joana de Almeida e Figueiredo, a quem alguns
documentos também chamam D. Joana da Cunha da Silveira, segunda mulher de Bento de Almeida Cabral e portanto 4.ª avó do senhor José Luciano, nasceu em Esgueira e
era filha de Sebastião de Almeida Carvalho, juiz dos órfãos
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249 /
em Esgueira, familiar do Santo Ofício, natural de Moimenta da Beira,
onde nasceu aí por 1645, e de sua mulher D. Maria da Cunha da Silveira,
natural de Esgueira.
Sehastião de Almeida Carvalho era filho de Rui Vaz Pinto de
Figueiredo, de Lamego, e de D. Brites Morgado de Almeida, de Moimenta da
Beira, irmã de D. Fr. Gabriel de Almeida, bispo do Funchal e revedor do
Santo Ofício; neto paterno de Lourenço Cardoso de Meneses, de Lamego, e
de D. Violante de Figueiredo, de Sernancelhe, e materno de Sebastião de
Almeida Carvalho, também de Moimenta, e de D. Brites Morgado, de Ucanha.
Toda esta gente era nobre e de mui excelente prosápia, e por esta
linha
vai cruzar a família do senhor José Luciano na do Marquês de Pombal, que
tinha um morgado em Sernancelhe instituído pelo seu 3.º avô Sebastião de Carvalho,
desembargador do Paço.
A mulher do juiz dos órfãos de Esgueira, já o disse, chamava-se D.
Maria da Cunha da Silveira, natural desta vila − que o era então − e foi
filha de Nicolau da Silveira Bulhões e de sua mulher, D. Maria Madalena
de Araújo; neta paterna do capitão Álvaro Góis Bulhões, senhor de
Mataduços, e de D. Isabel de Oliveira e materna de Pedro Godinho Barbosa
e de D. Petronilha Baptista de Araújo, todos de Esgueira e de uma
linhagem ilustre.
Aquele Pedro Godinho
Barbosa, que vinha a ser 7.º avô
do senhor José Luciano, era irmão de D. Maria Gomes Godinho, mãe do
licenciado Pedro Leitão Pinto, c'apitão-mor de Esgueira, que foi também
meu 7.º avô. E assim fica estabelecida a ligação de parentesco que há entre as duas famílias,
facto a que já algures aludi.
Mas como não há bonito sem senão, é o caso que estes Godinhos, de
Esgueira, tiveram em tempo rumor de judeus (assim consta nos processos
dos familiares Agostinho Coelho de Figueiredo, Sebastião de Almeida
Carvalho e António Pinto Leitão, no Santo Ofício), mas não se provou e
antes passou por calúnia; e de facto, vários destes meus antepassados
tiveram cargos no temível tribunal, e entre eles o licenciado Pantaleão
Afonso Alfena a quem foi passada provisão de comissário em 29 de Março
de 1691.
Os nobiliários da casa vão buscar a origem destes
a D. Godinho Fafes,
senhor de Lanhoso, «a quem o infante D. Afonso Henriques no ano de 1132
fez doação do couto do
mosteiro de Fonte-arcada» e fazem por aí fora um estendal
de senhorios, honras, penachos, grandes feitos, santidades e sabedorias
que bem se vê que estão a encher alheiras com farelo...
Tudo isso pus de lado, e o que escrevi foi havido em documentos do
Santo Ofício, ainda que, da mesma forma,
/
250 /
mais podia dizer − o que só farei depois de completadas as investigações
que trago entre mãos. E sob este critério dou
por findas as informações genealógicas respeitantes à linha materna do
chefe ilustre dos progressistas.
Vem agora a linha máscula da genealogia do senhor José Luciano.
Já escrevi, mas vi outra vez, que o pai deste estadista
foi o sr. Francisco Joaquim de Castro Pereira Côrte-Real e
este, por sua vez, foi filho do capitão-mor e juiz dos direitos
reais da Vila da Feira, João de Castro da Rocha Tavares Pereira
Côrte-Real e de sua mulher D. Antónia Luísa de
Matos Côrte-Real, senhores da casa de Fijô na mesma supra dita vila.
Teve ainda João de Castro
carta de brasão de armas(8) que lhe
foi
passada em 2 de Abril de 1813, como consta do Arquivo Heráldico Genealógico do VISCONDE DE SANCHES
DE BAENA, págs. 282, n.º 1120.
Em duas palavras vou agora dizer para quem seguiu a casa de Fijô,
solar dos Castros.
O capitão-mor foi também pai (além de outros) de António de Castro de Matos Curveira Pereira Côrte-Real que,
como primogénito, herdou a casa; teve uma abalizada comenda
da Ordem de Cristo e casou com D. Emília de Jesus Lobo Caldas, filha de
Antónia Manuel Caldas, da quinta da Porta,
freguesia de Tagilde (Guimarães); foi seu filho o bacharel
António de Castro Pereira Côrte-Real, antigo deputado da
nação, fidalgo da casa real e de cota de armas, 1.º visconde
de Fijô, em duas vidas, e pouco depois guindado, só numa
vida, a conde, falecido em 19 de Maio de 1905.
O conde de Fijô havia casado com D. Brígida Varela Falcão: filha de José
António Varela Falcão, da casa de Paçô, em S. João de Ver, da Vila da
Feira, e deste casamento ficaram dois filhos, um dos quais é o actual
visconde de Fijô, o bacharel José de Castro Falcão Pinto Guedes
Côrte-Real,
que casou com a sua parenta D. Maria da Assunção Soares
de Albergaria, da casa do Buraco, no Couto de Cucujães.
O capitão-mor João de Castro teve por progenitor um
sargento-mor de nome Francisco Joaquim da Rocha Tavares
Pereira, que também foi juiz dos direitos reais de propriedade na Feira,
e professou na Ordem de Cristo onde foi cavaleiro, casando com D.
Violante Luísa Pereira de Castro, filha e herdeira de Manuel Pereira de
Castro, senhor da casa de Fijô e do morgado de Sernadelo.
/
251 /
E, assim, o apelido Castro e a casa de Fijô foram para
esta família pela linha feminina.
Foi pai do sargento-mor Salvador dá Rocha Tavares Pereira Côrte-Real,
senhor dos morgados de Castelões, de S. Martinho de Argoncilhe e de
Pigeiros, padroeiro «in-solidum» da igreja de Santa Maria de Pigeiros e
senhor da quinta e paço de Pereira. Morou em Ovar e casou com D. Ana
Maria de Sousa Vareiro e Ávila, filha do desembargador do Porto,
Dionísio de Ávila Vareiro e de sua mulher D. Mariana de Sousa Monteiro,
pessoas nobres naturais e moradoras na freguesia de Leça de Palmeira.
De Salvador da Rocha foi filho primogénito e, portanto, herdeiro de toda
a casa, Manuel Alberto da Rocha Tavares Pereira, que teve brasão
passado com as insígnias heráldicas dos Rochas, Tavares, Pintos e
Pereiras, em 15-10-1732. Esta carta não a cita SANCHES DE BAENA no seu
Arquivo, nem o meu erudito amigo Dr. JOSÉ MACHADO nos Brasões inéditos,
mas está o original na mão do meu primo Dr. Álvaro de
Moura Coutinho de Almeida de Eça, de Esgueira, que é casado com a actual
representante dos morgados de Ovar, Castelões, S. Martinho de Argoncilhe
e tal e coisas, honra
que não cabe aos Castros da Oliveirinha por descenderem
de um ramo segundo génito de Salvador da Rocha, como veremos.
Ides, pois, agora saber para onde se «esgueirou» a representação da casa do morgado Salvador da Rocha Tavares
Pereira Côrte-Real, e com muita propriedade emprego o pIebeismo «esgueirar» visto que essa representação foi para Esgueira,
unindo-se à casa dos Mouras Coutinhos, dos quais sou humílima
vergôntea...
Foi pai, Salvador da Rocha, de nove filhos. Cinco foram
muito reverendos abades, monges e beneficiados; mais duas senhoras,
D. Mariana Crisóstoma e D. Joana Paula; o sargento-mor Francisco Joaquim da Rocha, bisavô do sr. José
Luciano, e, por último, Manuel Alberto da Rocha Tavares
Pereira, que foi o primogénito e herdeiro de toda a casa de
seu pai.
Casou este em Esgueira com D. Brites Margarida Pacheco Soares de
Albergaria, filha de João Gomes Godinho da Fonseca Soares, fidalgo de
geração e senhor da casa destes na então vila de Esgueira, e neta de
Bento Pacheco Soares, capitão não sei de quê, que em 26 de Outubro de 1688 obteve
carta de brasão de armas(9)
− e por sinal que este Bento Pacheco era
um dos meus sextos avós −.
/
252 /
Do morgado Manuel Alberto e de sua mulher D. Brites foi filho
primogénito e herdeiro outro Salvador da Rocha Tavares Pereira, que
casou, como seu pai, também em Esgueira, com D. Angélica Violante de
Sousa Colmieiro de Teles Coutinho, filha e herdeira de Xavier Francisco
de Sousa Colmieiro de Teles Távora, fidalgo da casa real, capitão de
cavalos, administrador das capelas de N.ª S.ª da Lapa em Condeixa e St.ª
Marinha de Alquerubim, do prazo de Alaguela e reguengo de Eixo, etc. e
neta de Baltasar de Sousa Colmieiro Teles Távora, fidalgo brigantino (nascido
em Bragança em 30 de Abril de 1693) que aí por 1738 foi casar a Esgueira
com D. Angélica de Moura Coutinho de Almeida de Eça, senhora da casa
supra referida.
De Salvador da Rocha e de sua mulher D. Angélica
nasceu o morgado Manuel Maria da Rocha Colmieiro, brigadeiro das milícias de Aveiro, fidalgo da Casa Real, senhor
de uma grande casa recheadinha de bons e sucosos morgadios e mais partes
por igual substanciais, e que deixou fama de grande valentia e
desembaraço.
Folheando a História do Marechal Saldanha, de D. ANTÓNIO DA COSTA, lá se
depara a narrativa de alguns feitos do façanhudo brigadeiro. Lembra-me
agora um que ouvi contar ao senhor barão de Cadoro, carácter primoroso
e um fino cavalheiro aveirense:
Esgueira, como antiga vila, tem um pelourinho:
uma coluna torcida sobre
um pedestal quadrilátero, encimada com um capitel coríntio, e do
entablamento que lhe está sobreposto saem quatro espigões de ferro, tudo
de um conjunto agradável e artístico. Como se sabe, um pelourinho representa o padrão das regalias e imunidades das antigas vilas, e Esgueira
orgulha-se do seu como um testemunho das suas glórias idas.
Um dia, a câmara de Aveiro lembrou-se
− visto que Esgueira já então não
passava de uma simples freguesia do seu concelho − de levar para a cidade
o pelourinho em questão. Os esgueirenses protestaram, e como a coisa
cheirasse um tanto a esturro a câmara sempre lá foi, mas foi levando operários para fazerem a demolição e tropa para o que desse
e viesse.
Aparece em Esgueira o ranchinho, e o povo que, repito, estava sedicioso,
acobardou-se à vista dos soldados. Já os
aveirenses iam deitar mão à obra, quando surge o brigadeiro Manuel Maria que subindo lesto os três degraus do monumento, de
durindana em punho a brilhar ao sol, gritou:
− Paga com a vida o primeiro que desrespeite o padrão
da minha terra!!!...
Bem se sabia que o homem não era para graças e a edilidade de Aveiro,
os operários e soldados, voltaram como
/
253 /
tinham ido, e o pelourinho ainda hoje se ergue altaneiro numa praça de Esgueira.
Para amenizar, mais outra aventura do brigadeiro Manuel Maria, sempre na
mira de mostrar que não era criatura com quem se brincasse.
No volume 7.º, pág. 25, do
Portugal Antigo e Moderno, de PINHO LEAL, lá
se relata o facto a que me vou referir; no entanto, é bom advertir que o
nosso brigadeiro era um liberal de gema e o PINHO LEAL um esturrado
partidário do senhor D. Miguel I, e daí a circunstância do escritor
aludir ao militar não sem um certo desdém e má vontade.
Já o disse, Manuel Maria da Rocha Colmieiro, era senhor, além de outros,
do morgado de Pigeiros, que se compunha − diz um documento, que possuo −
do quintão, quinta, paço e do padroado «in solidum» da igreja da dita
freguesia, morgadio que foi instituído no 1.º de Outubro de 1494 por Tomé da Rocha, cavaleiro do hábito de Cristo e cidadão portuense, com obrigação de umas certas missas na igreja de S. Francisco no Porto.
Parece que estes bens andavam vinculados a uns outros: umas casas no
Terreiro e rua da Reboleira, no
Porto, e dezasseis casais em Pigeiros.
O morgado de Pigeiros
apresentava o abade, que tinha uns 300$000 réis de rendimento, mas em
1834, visto terem deixado de existir os padroados das igrejas, ou
direitos de apresentação, apossou-se de várias propriedades dela,
alegando que lhe pertenciam. O abade colado de então, à vista do
incidente, teve por bem o prudente gesto de deixar a terra...
Foi então para a freguesia, como encomendado, o padre
António Caetano Osório Gondim, de Avintes, que também sabia amansar
pimponices. Tentou contra o brigadeiro uma causa de reivindicação,
gastou nela muito dinheiro, e depois de alguns anos de demandas acabou
por vencer. Venceu, mas parece que só depois do bravo Colmieiro ter
passado desta para melhor, vá-se dizendo...
E agora a prova de que o
nosso herói era temível:
Durante a demanda a igreja foi incendiada, «ardendo
tudo quanto estava dentro, sem nada se poder salvar», diz o PINHO LEAL,
e acrescenta que o fogo foi posto, visto que principiou por várias
partes, tendo as portas sido previamente ensopadas em aguarrás.
Como se está a ver, foi o que se chama uma tentativa de corte do mal
pela raiz!
Havia casado, Manuel Maria da Rocha Colmieiro, com D. Maria Emília Leite
Pereira de Berredo, da família do brigadeiro José Pereira da Silva Leite
de Berredo, um dos revoltosos de 24 de Agosto de 1820, cuja vera-efígie
podeis admirar a pág. 505 do 2.º volume da História da Revolução
/
254 / de 1820, de JOSÉ DE ARRIAGA, e da genealogia dele, se vos apraz, podeis
tomar sucinto conhecimento a páginas 200 e seguintes da Descrição
topográfica de Vila Nova de Gaia, de MONTEIRO DE AZEVEDO, acrescentada
por MANUEL RODRIGUES DOS SANTOS, edição de 1861.
Deste consórcio veio ao mundo D. Antónia Jesuína da Rocha Colmieiro,
herdeira da casa, que casou com o seu primo João de Moura Coutinho de
Almeida de Eça, doutor de capêlo na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra (12 de Fevereiro de 1843), reitor por muitos
anos no liceu de Aveiro, fidalgo da Casa Real, etc., e destes nasceu em
Esgueira, a 22 de Junho de 1854, a actual representante e senhora da
casa, D. Antónia da Rocha Colmieiro de Moura Coutinho, que em 2 de
Setembro de 1876 casou com seu
primo co-irmão Álvaro de Moura Coutinho de Almeida de
Eça, bacharel formado em Direito, professor e reitor do liceu de Aveiro
e abastado proprietário, filho do conselheiro Bento Fortunato de Moura
Coutinho de Almeida de Eça, general de divisão, em cuja carreira seguiu
a arma de engenharia, antigo director geral das Obras Públicas e Minas,
etc., etc.
Chega o momento de volvermos ao morgado Salvador da Rocha Tavares
Pereira Côrte-Real, de quem foram progenitores Manuel Tavares da Rocha
Pereira, senhor da casa dita, e sua esposa D. Maria de Matos Soares da
Fonseca (por quem veio o apelido Côrte-Real para a família, visto que
esta dama era bisneta de João Nunes Cardoso Côrte-Real, senhor do
Gafanhão, filha de Salvador de Matos Soares, nobre de Ovar e familiar
do Santo Ofício, e de sua mulher D. Mariana de Pinho da Fonseca.
Na igreja matriz de Ovar, ao lado da capela do Senhor da Agonia, estão
gravados estes dizeres numa pedra da parede:
«Esta capella é de Salvador de Mattos Soares e de seus herdeiros. Mandou
fazer seu filho o prior de Carregoza. Anno de 1670».
Em frente do altar da mesma capela está no chão uma
sepultura brasonada com epitáfio que não me foi possível ler por estar
em parte coberta pelo degrau.
No alto do retábulo vê-se um brasão bipartido com as armas dos Soares de
Albergaria e outras que me pareceram as dos Matos.
Acrescentarei que aquele prior da Carregosa citado
acima se chamava Teodósio de Matos.
Está-me parecendo que não cairei em pecado mortal
deixando de escodear a progénie destes Matos Soares até
/
255 /
um certo Pedro de Assentar Soares, fidalgo de Entre-Douro-e-Minho, filho
de Lopo Vaz Soares, que nas Terras de Santa Maria, ou da Feira, firmou
os alicerces desta casa.
Seja assim e basta então que, ainda nesta
etapa, refira
que Manuel Tavares da Rocha Pereira e D. Maria de Matos
foram pais, além do Salvador ,em que falei, de Francisco
Matos, abade de Pigeiros por apresentação de seu irmão, Manuel de Matos
Soares Tavares, beneficiado, e quatro senhoras, das quais duas foram
servas de Deus em S. Bento do Porto, uma, D.Violante, sem mais
notícias por agora, e
outra, D. Joana, que casou com Diogo Leite Cabral, fidalgo
de Arouca, com geração bastíssima.
− Francisco Tavares da Rocha Pereira e sua mulher D. Maria Lobato
Godinho, moradores na sua quinta de
Argemil, na ,antiga comarca da Maia, foram os progenitores
de Manuel Tavares da Rocha Pereira e, portanto, salvo erro, quintos avós
por varonia do senhor José Luciano.
Francisco Tavares foi senhor dos morgados de Castelãos
e de Pigeiros, e sua mulher trouxe para a casa o de S. Martinho de Argoncilhe, instituído em 1613 pelos seus avós
paternos Domingos Godinho Homem e sua mulher D. Isabel do Carvalhal Ferreira.
Foram irmãos do morgado Manuel Tavares da Rocha Pereira: António Tavares
Pinto, mestre de campo no condado da Feira e familiar do Santo Ofício (Torre
do Tombo, m. 20, dilig. 606); Roque Pinto Lobato, frade franciscano;
André Homem, lente jubilado na religião beneditina e
em 1717 abade de S. Bento, no Porto; mais um frade; duas
freiras para contrapeso e ainda três meninas que morreram novas.
Aquele mestre de campo deu-se à trabalheira de tirar
várias inquirições por onde mostrou que na sua família
«ouverão Maltezes, Commendadores e Agentes da Curia
Romana», diz um documento que aqui tenho...
De Francisco Tavares da Rocha Pereira foi pai Manuel
Tavares da Rocha Pereira Pinto, senhor e administrador dos morgados de Castelãos e do de Pigeiros que, parece, «herdou por ser o
parente mais próximo pela geração do instituidor e família dos Rochas»;
viveu no Porto e foi casado com D. Marta
da Cunha, filha de Jorge da Cunha e de sua mulher D. Madalena Nogueira.
Por sua vez este Manuel Tavares era filho de Francisco Tavares Pinto
Pereira, senhor do vínculo de Castelãos, e de
Margarida da Rocha, sua mulher, moradores no Porto, de
quem a seguir falarei.
SANCHES DE BAENA no Arquivo heráldico-genealógico,
escreveu que o apelido Rocha é de grandes senhorios e de
ilustres casas na França, Castela, Aragão, Galiza, Nápoles e
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256 /
na Hibérnia, e que da mesma forma os achamos em Portugal sem que se
saiba de onde são oriundos, dizendo JOSÉ FREIRE MONTARROIO que
já encontrou este apelido em documentos coetâneos de D. João I. Num
calhamaço manuscrito que figura na minha estante, de nome Armeiro da nobreza em
Portugal, diz o seu autor, JOSÉ MARQUES DA SILVA, ex-cátedra, que os
Rochas são franceses, que fizeram assento em Viana e que já no ano de
1126 se acha Arnaldo da Rocha como companheiro de D. Gualdim Pais...
Mas estes de quem estou tratando têm o seu cipo num simples e modesto
dourador. Com isto, claro, não quero menoscabar as tradiçães nobres de
uma família que respeito e com quem mesmo estou ligado por diversos laços
de parentesco. Enxertias destas, que nada deslustram e hoje nada
significam que mereça reparo, há-as em todas, em todas as árvores
genealógicas por mais besuntadas que estejam com o verniz da
fidalguia...
Mas vamos ao caso.
Pedro Anes, dourador e morador na invicta cidade,
casou com Isabel Fernandes e a eles emprazou o mosteiro
de Santo Tirso o casal de Argemil, junto ao referido mosteiro, em 1528 «como tudo consta do cartório que
vi», escreveu o Dr. ALÃO DE MORAIS (Sedatura Lusitana-Hispânica,
ms. 321 da Biblioteca Municipal do Porto). De Pedro Anes engalhou
Leonarda da Rocha e desta António da Rocha Vilela, s. g., e Margarida
da Rocha, mulher de Francisco
Tavares Pinto Pereira, como dito é.
Nestas famílias antigas houve quase sempre um frade rábula e
trapaceiro que desenterrava e cronicava farófias
nobiliárquicas da casa, e aos Rochas Tavares não faltou, mercê de Deus.
Foi ele um padre prior, Fr. JOSÉ DE SANT'ANA, monge bento, filho de
Salvador da Rocha Tavares Pereira Côrte-Real e de sua mulher D. Ana
Maria de Sousa Vareiro
e Ávila, criaturas de quem falei algumas páginas atrás.
Vai-se agora ver como o caso do dourador lhe causou engulhos e como lhe
ficou atravessado na sua «prezumsão»... Escrevia ele para o irmão, o
morgado Manuel Alberto:
«O livro 3.º do Reçibo (?) se não pode ler, por má letra. No 4.º a
fl.ª
35, anno de 1558, se acha no prazo de Argemil o seg.te Emprazo a vós
Margarida da Rocha p.ª vos como p.ª pessoa, e q. vos possais nomiar a
seg.da e a seg.da q. possa nomiar a 3.ª de maneira que sejão 3 pessoas
q. não sejão de maior condisão, o nosso cazal de Argemil, o qual cazal
trazia por titollo e prazo Pedro Annes dourador e sua Mulher, vosso
Avô e Avó, q. foi 3.ª pessoa no do prazo vossa Mai Leonarda da Rocha,
q. vos renunçiou a 3ª d.ª isto he a forsa do prazo. Inda
/
257 / não tive ocasião de ver o tit. de Fran.co
T.res em o vendo avisarei. Inda q. a palavra dourador dizem os
reçebedores (?) seria apellido,
contudo por q. não venha tempo em q. disso fassão misterio, na carta
que me escrever, diga, q. quanto ao reparo q. eu fiz dessa palavra
vendo a inquirição de Thomé da Rocha, acha nella q. P.º Annes lhe
chamavam dourador por apellido, e não q. tivesse officio porq. hera pessoa da
p.ra nobreza do Porto p.ª desvaneçer a prezumsão q. pode aver......»
Agora noutra:
«Achei q.m me lesse no livro 3.º dos prazos as folhas do prazo de Argemil, intitulado da capella, e diz assim: A vós
P.º
Annes dourador em prim.ra vida e a vossa m.er Izabel Fernandes e a
hum f.º ou f.ª e não o avendo a huma pessoa q. o prim.ro de vós quizer
nomiar em sua vida ou a hora da morte, q. não seja de maior condição
q. vós...» etc.
E depois recomenda:
«...guarde para si estas clarezas q. não venha tempo em q. com ellas
se nos retruque...»
Pois aqui ficam as «clarezas» com as tripas ao sol, por
muito que custe à alma do troca-tintas do frade!
O que eu não sei explicar é como passou para o filho da
Margarida da Rocha o morgado de Pigeiros, instituído por
Tomé da Rocha.
− Francisco Tavares Pinto Pereira, agora na berlinda como ficou
anunciado, era filho de Jerónimo Tavares Pereira, cavaleiro fidalgo, e
de sua mulher D. Maria Pinto, dos Pintos de Paramos.
O Jerónimo, que viveu na sua quinta da Amoreira em
Cambra, foi filho de Francisco Tavares, também cavaleiro fidalgo,
instituidor em 1545 do morgado de Castelãos na sua capela de Nossa
Senhora da Graça da igreja daquela freguesia de Castelãos de Cambra, e
de sua mulher D. Maria
Pereira, que uns fazem filha de Braz Pereira, homem fidalgo
e primo do conde da Feira(10), e outros de D. Manuel Pereira, conde da
Feira(11).
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258 /
Ainda há outras opiniões, mas para confusão já basta. Segundo uma vez
me contou, se bem me lembro, o
senhor marquês de Castelo Melhor, o conselheiro Francisco de Castro
Matoso, fundando-se naqueles documentos que dizem que a sua nona avó era
filha do 3.º conde da Feira, pretendeu para si a renovação deste título,
que está extinto; mas a tal se teria oposto alguém da família dos
viscondes de Vila-Nova do Souto de El-Rei, dizendo que eram eles os
representantes daquele ramo dos Pereiras, e portanto a eles caberia a
renovação do título. Mas adiante.
O instituidor do morgado de Castelãos, Francisco Tavares de nome, foi
filho de D. Isabel Tavares «que casou com «João de Cabanas por namoro,
contra vontade de seu Pay, porque este João de Cabanas era escudeiro
da casa de Ruy Pereira chamado o Conde Pay do 1.º Conde da Feira D.
Diogo Pereira(12) e era de inferior família de hum Lugar da Serra
chamado Cabanas donde elle tomou o Apelido; já no tempo do dito
casamento o tinha feito o mesmo Conde tomar o hábito de Christo, e lhe
queria muito, principalmente pelo valor com que se houve na pendencia
que o dito Conde teve com o Conde de Marialva, e como o dito Conde da
Feira era oposto ao dito João Annes Soares(13) por este em nada lhe
querer ceder solicitou meyos para o mesmo casamento não so por
vingança ao mesmo mas para acomodar bem ao dito João Cabanas; morou na
quinta do Ramalhal de Castelãos que era sua, e alguns dizem que o
dito Conde lha dera o que parece ser falso por ser de natureza de praso
de vidas de que são diretas senhoras as freiras de Arouca», prosa
esta que textualmente copio de um manuscrito genealógico que pousa na
minha mesa de trabalho.
Do Cabanas e de D. Isabel (que tiveram sete filhos) vem larga prole de
entre a qual os Noronhas da quinta da Prelada, junto ao Porto, e os
condes de Alentém, mas não vale metermo-nos nessa meada senão teríamos
muito que nos alongar.
D. Isabel Tavares era filha de uma D. Maria do mesmo apelido, mulher de
João Anes Soares, que outros também chamam Julião Soares, «Fidalgo da
Casa Real m.to rico e «apotentado no concelho de Cambra aonde tinha
varias quintas,
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259 /
[Vol. X - N.º 40 - 1944] q. ao depois se repartirão em seus descendentes; morou
na quinta
do Outeiro da freguezia de Castelãos do concelho de Cambra, − não
consta de q.m era filho mas sim que era da familia dos fundadores
de Grijó e Tio de D. João Soares, Bispo de Coimbra», diz-nos o sobredito
manuscrito.
Pelo que respeita à D. Maria Tavares não sabem os linhagistas, pelo
menos os que consultei, de quem ela era filha, mas dizem as cartas de
brasão passadas aos Castros, citadas anteriormente, bem como uns
nobiliários da casa, que vinha dos senhores de Mira e Pescados de Aveiro.
Bragança, 1910.
FRANCISCO DE MOURA COUTINHO
OBSERVAÇÃO IMPORTANTE
A noticia que acaba de se ler é um extracto da parte substancial de uma
série de folhetins que, sob o mesmo titulo, meu Pai publicou no "Jornal
de Bragança", semanário bragançano, nos números 5 a 9 e 11 a 16, de 23
de Março a 8 de Junho de 1910. Sobre esses folhetins escreveu ele depois
um livro com o mesmo titulo, que se conserva manuscrito. Esse livro com
bastantes notas, adições e algumas correcções não está presentemente em
meu poder. Emprestei-o para que dele se tirassem algumas notas genealógicas
para um «In Memoriam» do Senhor Conselheiro José Luciano
de Castro, e, pela conveniência de se publicar agora este original, não
tive tempo de solicitar a sua restituição.
(Nota de FILIPE GASTÃO DE MOURA COUTINHO)
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