No
século XV o senhorio dos lugares de Angeja e Pinheiro, bem como do
reguengo de Figueiredo e da aldeia de Assequins, esteve nos Albuquerques,
João e Henrique, respectivamente pai e filho. Beneficiados por doações
numa só vida, nem por isso deixaram os donatários de transmitir de pai a
filho os bens doados, e assim havia de acontecer pelos séculos fora,
embora tivessem de solicitar novas doações ainda em vida dos donatários
a favor de um seu herdeiro, ou por falecimento dos mesmos donatários, e
posto que tivessem de pagar direitos à chancelaria do rei.
Mas por morte de
Henrique de Albuquerque, ou porque este não deixara descendência, ou por
qualquer desconhecida razão que o tornasse desmerecedor de que "o
senhorio se perpetuasse na sua geração, mas mais provavelmente pela
primeira razão, certo é que as terras reverteram à coroa, e delas dispôs
o rei como lhe aprouve.
Essas terras
pertenciam ao almoxarifado de Aveiro e foram possuídas pelos donatários
com todos os seus termos, rendas, jurisdições, direitos, foros,
tributos, maninhos, rossios, direituras, pascigos, montados, entradas,
saídas, pertenças e quaisquer outras coisas que à coroa coubessem. Na
doação se compreendia ainda a jurisdição cível e crime, mero e misto
império, com ressalva apenas da correição e alçada, ou seja o direito de
visita e emenda por parte do corregedor da comarca, e o de recurso das
decisões da justiça dos donatários para os tribunais do rei, importante
e essencial característica da propriedade senhorial, bem distinta do
regime feudal, que vigorou por essa Europa fora e aqui nunca pôde
aclimatar-se.
Estes
Albuquerques provinham do casamento de D. Teresa de Albuquerque com
Vasco Martins da Cunha, o velho, 7.º senhor
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de Tábua, este em segundas núpcias; casamento de que nasceram, entre
outros filhos, Pero Vasques da Cunha, que foi já senhor de
Angeja, Pereira, Assequins, Figueiredo, bem como dos coutos de Pinheiro
e Castanheira
(1).
Vagas, por
falecimento de Henrique de Albuquerque, e doadas as terras novamente e
também numa só vida a favor de Jorge Moniz, do conselho do rei D. Manuel
e seu guarda-mor, fruiu-as ele com a ampla liberdade com que as fruíram
os seus antecessores, até à data do seu falecimento, em 1509.
Os Moniz,
descendentes de Vasco Martins Moniz, que viveu no reinado de D. João I,
e casou com Brites Pereira, e foi o progenitor dos alcaides-mores de
Silves, eram representados ao tombar do século XV por Diogo Moniz,
fidalgo da casa de el-rei e alcaide-mor de Silves, que
figura em documentos do ano de 1490
(2).
Falecido o
referido donatário Jorge Moniz, tendo em atenção os serviços que ele prestara,
por carta de 31 de Janeiro de
1509, nova doação se fez ao moço fidalgo Diogo Moniz, seu filho
mais velho, das mesmas terras que seu pai possuíra e com a
mesma amplidão de regalias e direitos. E logo a seguir, por carta de 19 de Agosto de 1512, em atenção aos serviços recebidos
e aos que se esperava receber de Diogo Moniz, fidalgo da casa
de el-rei, contemplou-se o filho mais velho que ficasse do seu casamento com D. Brites da Silva, com a doação das mesmas terras, para depois do falecimento do pai. No tempo do donatário
Diogo Moniz é que o rei D. Manuel deu a Angeja o foral de 14
de Agosto de 1514, e às vilas de Figueiredo e Bemposta o foral
de 15 dos mesmos mês e ano
(3).
E sendo esse Jorge Moniz o filho varão mais
velho de Diogo
Moniz, por carta de 15 de Julho de 1572 lhe confirmou o rei a doação,
com a declaração de que os herdeiros de Diogo Moniz
teriam metade dos frutos que o lugar de Pinheiro rendesse, da
mesma forma por que até aí se partiam.
Volvidos anos, veio Vasco Martins Moniz, filho
daquele Jorge Moniz e de sua mulher D. Leonor Henriques, pedir a confirmação das terras por via de sucessão. Ou porque fosse caindo
em esquecimento a natureza precária das primeiras doações, ou menos
provavelmente porque tivesse havido qualquer alteração não registada nos documentos conhecidos, certo é que na
carta de 22 de Janeiro de 1585 se lhe reconhecia expressamente
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que por via de sucessão direitamente lhe pertenciam «as terras
reguengas e concelhos de Angeja, de Assequins, de Pinheiro e
de Figueiredo», confirmando-se a doação nos termos solicitados.
Vasco Martins Moniz consorciou-se com D. Violante de Menezes e desse
casamento ficou, como varão mais velho, Francisco
Moniz que, pedindo lhe fosse confirmada a doação por sucessão,
veio a consegui-la por carta de 7 de Fevereiro de 1624. E falecendo sem descendentes, pediu e obteve a confirmação de nova
doação; por sucessão, sua irmã D. Juliana de Noronha, em sua
vida e na de um filho e de um neto, descendentes desse filho, por
alvará de 8 de Agosto de 1662 e carta de 24 de Setembro de
1672. Mas agora já o senhorio, que vinha unido desde o tempo dos
Albuquerques, começava a fragmentar-se, amputando-se-Ihe
a vila de Assequins, de que se fez doação a D. Margarida
de Vilhena, viúva de João Saldanha da Gama; e impunha-se
sobre a casa de Angeja uma pensão de 40.000 reis a favor do
sargento-mor da vila do Crato, Gonçalo Gonçalves, pela boa
defesa que fizera dessa praça, pensão que mais tarde ficou a pagar-se à sua viúva.
D. Juliana casou com D. Pedro de Noronha, 9.º senhor de Vila Verde,
descendente do famigerado João Gonçalves de Gomide, de tão detestada
memória, que nem os filhos lhe adoptaram
os apelidos, preferindo os da mãe. Do casamento de D. Juliana
com este descendente dos Noronhas, nasceu D. António de Noronha, 1.º conde de Vila Verde, falecido ainda antes de sua mãe.
Por esse motivo, no senhorio das vilas de Angeja, Bemposta e Pinheiro
foi confirmado, por morte de D. Juliana de Noronha, seu neto D. Pedro
António de Noronha, 2.º conde de Vila Verde
e 1.º marquês de Angeja, por carta de 17 de Abril de 1685.
A este marquês se refere a carta de 20 de Fevereiro de
1739 adiante trasladada, em que se afirma ter ele servido militarmente por espaço de mais de 27 anos (de 1699 a 1725) em
Setúbal, na Catalunha e na província do Minho, nos postos de soldado, de
capitão, de tenente general e de mestre de campo
e general governador das armas daquela província, falecendo em
1731.
E quem se der ao trabalho de a ler inteiramente, encontrará dados biográficos notáveis, que se me afiguram, algo diferentes dos registados noutros lugares.
Por morte do 1.º marquês
−
prosseguindo
−
produziram-se a
solicitação e a confirmação do costume, a favor de seu filho mais velho D. António de Noronha, 2.º marquês de Angeja, e 3.º Conde de Vila
Verde, investido como donatário por carta de 3 de
Agosto de 1734, em atenção aos serviços prestados por seu pai.
Falecido o 2.º marquês, sucedeu-lhe seu filho D. Pedro José
de Noronha e Camões, 3.º marquês de Angeja e 4.º conde de Vila Verde,
sendo-lhe confirmada a doação somente em sua vida,
por carta de 12 de Fevereiro de 1782.
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E por alvará de 18 de
Agosto de 1788 e carta de 1 de Julho
de 1789, fez-se confirmação a favor do 4.º marquês de Angeja e
5.º conde de Vila Verde, D. José de Noronha, nas condições em
que vinha sendo feita, da doação de Angeja, Bemposta e Pinheiro, mais se
lhe reconhecendo e confirmando o senhorio e alcaidaria de Vila Verde dos Francos, por sucessão, bem como o
padroado da igreja de S. João da Praça, da cidade de Lisboa, que fora
doado a seu bisavô.
Tudo isto e alguma coisa mais se contém nas
cartas de confirmação registadas no Arquivo Municipal de Coimbra, por ser
esta cidade e durante muitos anos(4) sede da comarca ou correição a que pertenciam as terras, objecto das doações.
Coimbra, Outubro de 1937.
J. PINTO LOUREIRO
Ver os
DOCUMENTOS
na pág. seguinte.
(252 a 267)
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