Liturgia Pagã

 

Boas contas fazem bons amigos

Domingo XIX do tempo comum (ano C)

1ª leitura: Livro da Sabedoria, 18, 6-9

2ª leitura: Carta aos Hebreus, 11, 1-2, 8-19

Evangelho: S. Lucas, 12, 32-48

 

Continua a preocupação do domingo passado: saber viver. Saber aproveitar todo o prazer que o tempo nos permite – e por isso temos que dar muita atenção à melhor maneira de organizar a “gestão da vida” (evangelho). Os simples animais sabem viver quase desde a nascença. Para os animais de elite que nós somos, requer-se todo o poder de inteligência, perícia e imaginação. Aliás, nas bodas de Caná, o primeiro milagre de Jesus foi provocar-nos a todos para que queiramos um vinho sempre melhor. Foi um convite para vivermos à grande, como os cristãos deviam saber…

Na 1 ª carta aos Coríntios, recomenda S. Paulo: «quer comais quer bebais, quer façais qualquer outra coisa, fazei tudo para glória de Deus» (10, 31 - Mas vale a pena ler os capítulos 9 e 10). Se o prazer só é perfeito quando é louvor a Deus, teremos que saber o que é louvar a Deus. Ele próprio revelou o segredo nas mais diversas religiões e muito claramente em Cristo: amar os outros é espalhar o prazer da vida à nossa volta, é sentirmo-nos em grupo responsáveis pela administração deste mundo em que surgimos, como diz a leitura do evangelho.

Dar glória a Deus num jogo de futebol, numa aula, quando fazemos amor? Sem dúvida: esteja o nosso clube a ganhar ou não, sejam o professor e os colegas muito ou pouco fixes, fiquemos encantados ou desiludidos com o nosso envolvimento no amor. É muito difícil gozar a vida à grande como um cristão, porque exige lutar pela alegria e pelo bem-estar de todos, aprendendo a sermos «solidários nos bens e nos perigos» (1ª leitura).

Tão grande é o amor, que é nele que encontramos o prazer e o sofrimento de mãos dadas. Haverá um segredo para ver e sentir na dor o prazer da vida?

Prevalece o prazer, sempre que nos sentimos acarinhados – e não só pela roda de amigos e parentes. Já conta muito, e até pode transformar uma vida, receber um sorriso sincero e qualquer gesto de simpatia, nem que seja na factura de um almoço ou simples café. A nossa própria morte pode perder a sua aura de tragédia, se a «vivermos» num ambiente de carinho. A vida necessita de carícias – essenciais até para realizar o trabalho de todos os dias com o maior agrado e perfeição possíveis.

Para manter esta constância, “apesar de tudo”, ajuda muito partilhar (e sentir que é valorizado) o olhar da fé. Diz a 2ª leitura que «a fé é a garantia dos bens que se esperam e a certeza das realidades que não se vêem». É dar a volta ao desespero que aparece no livro de Coelet (domingo passado). É a vontade de reconhecer a força que tem impulsionado inumeráveis pessoas a escolher o maior bem (1ª e 2ª leituras). É sentir que a vida é apenas um momento da Vida, mas é por isso mesmo que podemos saborear a exuberância e o prazer da vida – justamente porque temos a perspectiva de Jesus Cristo.

É uma escolha que precisa de um bom projecto de gestão. Só assim é que o único «senhor da vida» (sabemos que nenhum ser humano o é) pode dar largas ao seu prazer por ver em cada um de nós «um administrador fiel e prudente» e, como diz ainda o evangelho, convidar-nos a todos para partilhar da sua mesa como bons amigos.

01-08-2010


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