Domingo de Páscoa
(ano C)
1ª leitura:
Actos, 10, 34-43
2ª leitura: Carta
de S. Paulo aos Colossenses, 3, 1-4 ou
1ª carta aos Coríntios, 5, 6-8
Evangelho: S.
João, 20,1-9
Todos os grandes acontecimentos começam nos cenários comuns da nossa
vida. Se não fosse assim, não significariam nada para nós.
O pior de muitas «disposições superiores» é verificarmos que não vêm
ao encontro da gente. Por outro lado, há uma espécie de preguiça que
nos impede de ir ao encontro do que é bom (o que, muitas vezes,
passa por ir ao encontro do mal para o erradicar).
O domingo de Páscoa começou num cenário de tristeza e ternura:
cuidar dos restos mortais de Jesus – aquele homem que não se sabia
bem por que razão vivera e morrera, e que tanto «mexera com a
gente».
Iam ao encontro de uma memória, ao encontro das saudades, ao
encontro de uma pergunta no ar (sem dúvida que semelhante à pergunta
que fazemos quando alguém muito querido nos morre).
Não encontrar o que procuramos é sempre angustiante. Porém, mais
importante do que não se encontrar o corpo de Jesus é o facto do
cristianismo não girar à volta de um monumento funerário (o culto do
sepulcro é muito posterior).
Quem ia à procura do corpo de Jesus, só encontrou novas questões: o
que é que teria acontecido? E por que é que aconteceu?
Os discípulos mais chegados começaram a lembrar e a relacionar o que
conheceram de Jesus, com a ajuda da riquíssima tradição religiosa do
judaísmo. E assim se dispuseram a encontrar quem de facto era Jesus
Cristo – um encontro nunca definitivo, que se torna mais intenso e
diversificado ao longo da vida de cada qual e da longa história de
todas as vidas.
O túmulo vazio reviveu a antiga e confusa ideia de que Jesus
voltaria para instaurar o reino de Deus; a sequência dos «encontros»
purificou o sentido de «reino de Deus» e de «ressuscitado» (o Novo
Testamento não fala de um cadáver ressuscitado, nem de um espírito
ou fantasma: apresenta alguém que existe realmente sob a aparência
de figura humana, mas que nem é fácil de reconhecer (como se pode
ver nos episódios de Maria Madalena e dos discípulos de Emaús). E
pelos tempos fora, muita luz e muitas sombras foram lançadas sobre a
questão central – o significado da vida de Jesus.
Por isso é que o «domingo de Páscoa» é a matriz de todos os
domingos: são um tempo para os encontros com a Vida. Vida que é
simbolizada na alegria de festas vistosas e de bom gosto, mas que
deveria ser sobretudo vivida na continuação do gesto familiar da
«última ceia», como quem se senta à volta da mesma mesa.
(Os domingos tornaram-se demasiado um teatro, e mesmo este só
pretensamente interactivo, com deixas que não vão ao encontro da
vida).
A vida e morte de Jesus revelou a vida como projecto divino, um bem
sempre ameaçado e sempre a defender, e que afinal não termina com a
morte: um projecto onde todos os dramas, aventuras, momentos de
prazer ou de tristeza… se passam num ambiente familiar. Onde é
possível encontrar-se com Deus como Pai, com quem se discute e pede
conselho sobre o que é a justiça, e a quem se pede uma «ajudinha»
para fazermos com que não falte «o pão de cada dia», para superar os
desencontros de uns com os outros – e para que nos ajude a sério a
ver onde está o mal.
Porque a vida é um tempo de encontros… |