10º Domingo do Tempo Comum (ano A)
1ª leitura: Oseias, 6, 3-6
2ª leitura: Carta de S. Paulo aos Romanos, 4,
18-25
Evangelho: S. Mateus, 9, 9-13
Politicamente incorrecto. Mateus tinha uma
daquelas profissões que ficava bem menosprezar, e em casa dele
podia-se juntar o piorio da sociedade. Com efeito, os publicanos –
ou cobradores de impostos – eram olhados como uns daqueles
profissionais que faziam o jogo de Roma (a potência ocupante), além
de facilmente serem injustos ou desumanos, e portanto
compreensivelmente condenados pela opinião pública da Palestina.
Decididamente, Jesus não tinha jeito para subir
na vida, na roda dos bem instalados ou das pessoas bem. No entanto,
ele estava muito consciente da sua missão e do valor dos seus actos:
o publicano Mateus valia muito mais no trabalho para o projecto de
Deus do que muitos dos «justos» fariseus, a nata da sociedade. Tanto
se pavoneavam estes na sua “justiça”, que Jesus os deixou seguir no
seu cortejo de vaidade (vaidade e “vazio” têm a mesma origem
etimológica), virando-se para os que tinham consciência de ser
«pecadores» (cfr. o cap. 23 de S. Mateus). Só estes estão preparados
para ouvir a voz de Deus. E quanto aos outros, Jesus advertiu:
«cuidado com o fermento dos fariseus e saduceus!» (16, 6) – só faz
crescer o orgulho, a confusão, o legalismo, as lutas fratricidas
pelo poder. Não são capazes de admitir que erram – e por isso não
podem sair do erro. Não são capazes de admitir a sua ignorância, e
por isso não compreendem as palavras de Oseias: «Procuremos conhecer
o Senhor. O conhecimento de Deus e a misericórdia valem mais do que
os holocaustos sagrados e os sacrifícios» (1ª leitura).
Os que não vivem de bem parecer (embora seja
desejável que o que é bem pareça bom) «acreditam contra toda a
esperança» (2ª leitura), contra os louvores desses sábios vaidosos,
contra o aliciamento ou ameaças desses que se têm como senhores e
dominadores; são os «simples» do Evangelho – isto é, os «não falsos»
– que se recusam a entrar nas jogadas daqueles que apenas se
preocupam com desenvolver a habilidade de manipular o poder,
esquecendo que cada um de nós deve ser médico honesto para todo
aquele que precisa de auxílio. Abraão acreditou que podia trabalhar
na obra de Deus (no seu plano de misericórdia), apesar de já se
encontrar longe do vigor da juventude; era velho, mas teve fé no
Deus junto de quem somos eternamente jovens e para quem nenhum ser
humano é inútil, por mais miserável que pareça a sua situação.
Jesus mostrou claramente que, para Deus, o valor
de cada pessoa não depende da hierarquia social. É de cada um de nós
a responsabilidade de ser por ou contra Deus – o que é o mesmo que
dizer «por ou contra a Humanidade». A nossa imperiosa preocupação
pela defesa da qualidade de vida de todas as pessoas sem excepções
tem muito a aprender da posição de Jesus: é fácil conviver com os
bem situados na vida, «é fácil convidar os ricos e os que nos podem
ajudar» (Lucas, 6, 32-35; 14, 12-14). O que importa verdadeiramente,
porém, é convidar aqueles que precisam de ajuda sem nos poderem
pagar. Afinal, é este o grande fundamento da «acção social», de toda
a missão educativa, e particularmente do sentido pleno de educação:
ajudarmo-nos uns aos outros a realizar a nossa semelhança com Deus,
que nos libertou para sermos livres de tudo o que nos possa
entristecer.
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MISERICÓRDIA
Sensibilidade do
coração à infelicidade (miséria) dos outros.
Antropomorficamente, é um dos principais atributos divinos
(centenas de aplicações na Bíblia). A acção de Deus para com
a Humanidade pode ser traduzida como misericórdia.
O termo latino corresponde a
três raízes hebraicas: râham, hânan, hâsad. Os
comentadores bíblicos dão mais valor à primeira: a sua forma
substantiva plural é traduzível por «compaixão», mas a forma
singular designa o «útero materno».
Vemos assim como o binómio
justiça/misericórdia simboliza a riqueza da pessoa divina –
tão paternal como maternal. A justiça sublinha a exigência e
transcendência da santidade divina; a misericórdia sublinha
a benevolência para com a fraqueza humana.
Praticando a misericórdia,
como é enfatizado ao longo de toda a Bíblia, é que nos
tornamos semelhantes a Deus. |
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