5º Domingo da Páscoa (ano A)
1ª leitura: Actos dos Apóstolos, 6, 1-7
2ª leitura: 1ª Carta de S. Pedro, 2, 4-9
Evangelho: S. João, 14, 1-12
Há
pedras sólidas para construções resistentes, há pedras boas
tristemente abandonadas e há pedras que fazem tropeçar o caminhante.
E à volta destas pedras, as leituras de hoje abordam conceitos que,
desde o séc. I, têm dado «pano para mangas»: «oração» (1ª leitura),
«pedras vivas» (2ª leitura), e «caminho, verdade e vida»
(Evangelho).
Na
opinião de vários especialistas, «caminho, verdade e vida» teria o
seguinte sentido: só há um modo de acesso ao Pai, um único
verdadeiro caminho, que conduz à vida. O evangelho de João
identifica Jesus com este caminho, devido à sua misteriosa união com
o Pai. Jesus é apresentado como o momento alto da história da
salvação, que é a união dos Homens com Deus.
O
conceito hebraico de «verdade» não é o tradicional “dizer as coisas
tal como elas são” ou a “manifestação exacta da realidade” (aliás,
nenhum destas definições se pode aplicar à realidade divina, que é
impossível de conhecer adequadamente, como adverte a própria
Bíblia). O conceito hebraico está mais próximo do de «rectidão» e
«justiça», e ainda de fiabilidade e firmeza – conceitos que se
aplicam a Jesus como «caminho». O «Espírito da Verdade» (o Espírito
Santo) é que nos leva a discernir a rectidão, a justiça e o valor de
Jesus.
No
Cristianismo primitivo, como nas religiões antigas, «vida» significa
«salvação». «Ultrapassar a morte» não significa imortalidade: Jesus
não veio salvar-nos da morte física nem tornar-nos imortais – veio
revelar-nos a Vida verdadeira, que está para além do nosso
entendimento, mas de que nos foi dado um vislumbre. «Ultrapassar a
morte» significa estar perto de Deus, estar com a Vida – em que
Jesus viveu e vive para sempre. Jesus facilitou o acesso a esta
Vida, apresentando-se como caminho. Uma Vida onde a morte está fora
de questão.
A
oração exprime o grande fundamento de todas as religiões: a ligação
com o divino. É um encontro com Deus, que nos fortalece na alegria e
na tristeza. Jesus ensinou-nos a orar com a maior simplicidade
possível, sem querer dar nas vistas, falando dos nossos problemas e
responsabilidades. Se não nos preocupamos com o bem comum, não
agimos como «filhos» de Deus. A oração, por mais arrebatada que
pareça, tem pois que dar frutos para bem da comunidade.
E
também ajuda a ter «cuidado com as pedras do caminho». Ajuda a ver
que a pedra rejeitada por “empreiteiros” indignos pode ser a que tem
mais valor (2ª leitura). “Empreiteiros” mormente do mais alto
estatuto social, político, financeiro ou religioso – que só escolhem
aqueles que se sujeitam a ser pedras de calçada, por cima das quais
se pavoneia o cortejo dos corruptos ou inúteis. Os que se dedicam à
Justiça e Rectidão são facilmente e liminarmente postos de lado.
Contudo, se não esconderem a sua dignidade, farão tropeçar todo o
cortejo e corrigir o mal (Mateus, 21, 42-44).
Pela
oração, ganhamos olhos capazes de reparar nas pedras esquecidas ou
rejeitadas, e de como se pode activar o seu valor (1ª leitura);
também ganhamos coragem para não nos deixarmos cativar pelos
cortejos da mentira e corrupção, nem ficar inertes como pedras que
só servem para tropeço de quem procura caminhar bem. Preferimos ser
pedras sólidas da cidade humana onde habite o Espírito da Rectidão e
Justiça.
|