Liturgia Pagã

 

Candeia que vai à frente...

5º Domingo do Tempo Comum (ano A)

1ª leitura: Livro de Isaías, 58, 7-10

2ª leitura: 1ª Carta de S. Paulo aos Coríntios, 2, 1-5

Evangelho: S. Mateus, 5, 13-16

 

«Alumia duas vezes» – não é?

Na verdade, dá-nos uma ideia do caminho a percorrer; dá-nos o conforto de nos sentirmos «com luz»; dá segurança aos pequenos passos que vamos dando, previne tropeços e quedas e, quando estas acontecem, ajuda a que nos levantemos. Não só ilumina perigos possíveis como o mau resultado de não lhes dar atenção. Mas deve iluminar sobretudo aquilo que é bom e belo.         

É a função dos profetas (1ª leitura), a que se juntam os discípulos de Jesus (evangelho). Quem dedica a sua vida a pegar nestas «candeias» (todos podemos ser «profetas», pois nunca foi um exclusivo dos sacerdotes) precisa de ter particular sensibilidade à Justiça e ao Amor e, com um «saber de experiência feito», mostrar como estes se devem materializar no dia-a-dia e nas mais pequenas coisas (Lucas,16,10). O cuidado diário pela justiça na vida quotidiana – na família, no trabalho, nos momentos de diversão… – é que proporciona o ambiente de bem-estar imprescindível para que a pessoa humana seja saudável e sinta prazer no trabalho e verdadeiro descanso na diversão; em poucas palavras: que experimente a esperança, o amor e o sentido para a vida.

Os sistemas religiosos recorreram à formação de «profissionais de candeias». Mas estes (sejam profetas, sacerdotes ou «leigos») não podem querer ir «sempre à frente», sobretudo se esta posição é alimentada pela tentação do poder, de exibicionismo ou da sede de se mostrar «superior». Por isso, é preciso que qualquer «pessoa de boa vontade» esteja apta a levantar a candeia da frente, facilitando que os «animadores/iluminadores» andem no meio e na retaguarda do grupo inteiro em marcha e conheçam por dentro os problemas, capacidades e desejos ou projectos de cada qual. (É tão reconfortante ver que ideias como estas são propugnadas e aprofundadas pelo Papa Francisco!).

À luz da Justiça e do Amor é que se consegue espalhar a luz sem preconceitos – muitas vezes radicalizados pelo fixismo de doutrinas seculares, como as que viam o mal ligado sobretudo ao comportamento sexual, ao divórcio… ou que diziam que «fora da Igreja não há salvação».

Falta falar (o radical de «falar» é o mesmo de «iluminar») de situações como o ambiente opressivo e gerador de graves desequilíbrios na saúde, causado sobretudo por quem detém funções de chefia – nas empresas, em cargos políticos ou religiosos, nas mais variadas instituições e na própria família. Falar de que há situações em que as pessoas acabam por ser destruídas por não concordarem com as ideias do «chefe», ou do grupo dominante, ou do grupo dos oportunistas e invejosos. E por que não iluminar os «buracos» na boa educação, na quebra de elementares regras de convivência – como o equivalente a «obrigado» e «se faz favor», oferecer o lugar, condução responsável, proteger o ambiente, amparar uma criança ou um velho…?

Não basta saber descrever teoricamente o país que vamos atravessando. Temos que o saber conhecer através dos passos que vamos dando, atentos aos vários tipos de cansaço e ao jeito de andar…

Os mapas antigos, as antigas reflexões, experiências e «normas espirituais» podem ajudar na preparação e planeamento da marcha. Importa iluminar as qualidades e defeitos de «edições anteriores», para que a experiência actual, com novos problemas, conhecimentos e conquistas, possa traçar um mapa cada vez mais exacto.

A luz, como o sal, não podem perder a sua força (evangelho). De outro modo, ambos irão parar ao lixo. Para não merecer tal fim, é imprescindível «tempo livre» para meditação, leitura, reflexão em grupo, formação em relações humanas…

Só com estes «retiros» é que as «candeias» podem resistir às «intempéries». E os «profissionais da iluminação» saberão animar e preparar os outros para reconhecerem que a todos cabe a «missão» de iluminar e de, como Jesus Cristo (Actos,10,38) «passar fazendo o bem». 

09-02-2014


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