Epifania do Senhor (ano
A)
1ª leitura: Livro de
Isaías, 60, 1-6
2ª leitura: Carta de
S.Paulo aos Efésios, 3, 2-6
Evangelho: S. Mateus, 2,
1-12
Assim poderíamos ouvir dizer aos Pais de Jesus, surpreendidos e
derretidos com tão carinhosas e ricas manifestações de estima pelo
seu Filho – depois de tantos tormentos para lhe encontrarem um
cantinho menos desaconchegado.
O evangelho de Lucas fala só da visita de gente simples dos
arredores (gosta de dar importância aos desfavorecidos da
sociedade!). O evangelho de Mateus centra-se nas semelhanças
possíveis entre a figura de Jesus como Messias e várias passagens do
Antigo Testamento. A lendária sabedoria do Oriente, o simbolismo de
presentes devidos apenas às mais importantes personalidades, a
profecia de que surgirá uma estrela para guiar o povo de Israel para
a vitória (cap. 24 do Livro dos Números) e muitas outras passagens
de Isaías e dos salmos… deram origem a contos muito imaginosos mas
reveladores da fé na missão daquele Menino.
Presentes ricos… outra coisa não seria de esperar de «magos» (a que
a tradição também chamou «reis», juntando o mais alto estatuto de
poder humano com a sabedoria dos mais altos estudos sobre o mistério
do mundo). E não se pouparam a esforços para preparar tão longa
caminhada. Só com aturados estudos e sincera meditação é que
souberam ler os sinais de coisas novas – e lançar um olhar crítico
sobre o valor das novidades mais estranhas. Por isso, o evangelista
põe estes «reis» sábios a «prostrarem-se por terra» como que
rendidos perante a novidade deste menino – que em adulto dirá que a
sua missão é dar «testemunho da verdade» (João,18,37): testemunho da
vida à luz da verdade, como alguém que é livre e transmite
liberdade.
A verdade é o bom uso da liberdade, é a não falsidade, é o
discernimento do que é bom e do que é mau, é a primazia dada ao
amor. Riqueza, poder… pobreza e sofrimento… tudo tem que passar pelo
crivo desta «verdade». Só somos livres se somos «verdadeiros», isto
é, conscientes das nossas limitações mas também das nossas
capacidades – como a coragem (um espírito livre!) para agir em
conformidade com o que escolhemos.
De tudo isto foi exemplo este Menino que nos veio convidar a uma
vida sem medo, sem desespero e sem tristeza. Sentir-se livre é
sentir-se não dominado por força alguma, é sentir-se forte apesar de
todas as adversidades, é cumprir o «projecto», já explícito no Livro
do Génesis, de sermos «à semelhança de Deus».
Só com esta liberdade e verdade, é que podemos cuidar do bem-estar
de todos, e só assim podemos dizer que amamos a Deus.
«Epifania» é também uma palavra “rica” para um menino pobre.
Significa «manifestação», em grego, e desde a antiguidade que se
aplica este termo ao aparecimento de deuses e forças sobrenaturais
no nosso mundo. Mas é preciso ter os olhos bem abertos como os dos
«reis magos» e a disposição sincera para se pôr a caminho, sem
preconceitos quanto a pedir conselho e cooperação: de poderosos como
de gente simples (muitas vezes mais «verdadeira»), de crentes como
de não crentes (frequentemente mais atentos e críticos quanto ao
essencial)…
«Reis magos» e «rei Herodes» representam diferentes reacções humanas
quanto à verdade.
Só o evangelho de Mateus fala destes «magos», que se perderam na
lenda, mas sobre quem poderíamos perguntar: será que eles, como os
pastores, partiram dali só para contar coisas maravilhosas? Será que
se deixaram de perguntar sobre quem era e veio a ser aquele menino?
Que fizeram daquela «experiência religiosa»? Ganharam força para
também darem «testemunho da verdade que liberta»?
Perguntas que também nos podemos fazer, depois de «beijar o menino»…
05-01-2014 |