17º Domingo do tempo comum (ano B)
1ª
leitura: 2º Livro dos Reis, 4, 42-44
2ª
leitura: Carta de S. Paulo aos Efésios, 4, 1-6
Evangelho: S. João, 6, 1-15
Se a gente pegar nos quatro Evangelhos e nos
Actos dos Apóstolos, facilmente organiza um roteiro de milagres. A
ideia mais tradicional é a de que uma pessoa excepcionalmente boa e
amiga de Deus espalha à sua volta a aragem benfazeja de uma nova
ordem das coisas, como se fosse o começo da «idade de oiro», já tão
badalada nas grandes civilizações da antiguidade.
«Milagre» outra coisa não significa senão
«maravilha». O traço característico não é uma intervenção dita
sobrenatural mas sim o chamar de atenção.
Se Jesus Cristo tivesse dado os 5 pães e os 2
peixes de que fala o evangelho, teria, quando muito, matado a fome a
umas 3 pessoas! Mas o evangelista sublinha uma arte já bem manifesta
pelo profeta Eliseu (1ª leitura): a arte de multiplicar o que é bom.
A história da humanidade é centralmente uma
multiplicação, bem a par da espantosa (“milagrosa”) expansão do
universo. Sim, também se multiplicam coisas más, e de tal modo que o
dilúvio bíblico parece uma tentativa de Deus para reduzir a zero a
tabuada humana – de tal modo se tinha multiplicado a iniquidade.
Mas, lá está, até ao fazer o mal, o ser humano mostra a tendência
profunda para o bem – e Deus deu-nos de novo, na figura de Noé, o
poder de multiplicar tudo o que é vida.
Assim foi que a vida de um par tão ingénuo como
Adão e Eva (nem sabiam que estavam nus…) se multiplicou em milhões
de milhões; com Eliseu (2º livro dos reis,4), uma medida de azeite
multiplica-se por todas as vasilhas do armazém da viúva sua amiga, e
os 20 pães de um homem bom alimentam mais de cem pessoas; assim a
água se transforma em vinho (João, 2); assim a fímbria de uma túnica
liberta poder (Marcos, 5,28); deste modo, um vulgar «filho de
carpinteiro» começa uma “nova ordem” no mundo, e o rude S. Pedro e
seus seguidores ajudam na “multiplicação” da paz e justiça com que
sonhamos…
(Eliseu quis ressuscitar um menino colocando
sobre ele o seu cajado. Mas foi preciso que o próprio Eliseu
aquecesse com o seu corpo o corpo do menino. A melhor técnica para
prolongar a vida, aliviar o sofrimento ou consolidar o bem-estar –
acaba por ser estéril, sem o cuidado pessoal e uma vontade genuína
de multiplicar o bem).
A ideia central é a de que com o pouco se faz
muito – também o famigerado “reino de Deus” se multiplica como o
pequenino grão de mostarda, vindo a transformar-se numa árvore
frondosa (Marcos,4,3032).
Não reside nesta arte a “justiça rentável” da
suspirada nova ordem económica?
E não é verdade que um simples sorriso pode
multiplicar o ambiente positivo à nossa volta? E que um «obrigado»,
um gesto de ajuda, um «se faz favor», um elogio… quando genuínos e
prazenteiros, multiplicam a felicidade de multidões?
Fiquemos com a aragem promissora da multiplicação
de respostas eficazes aos nossos mais profundos desejos e problemas.
Não deitemos fora os 5 pães nem os demos ao virar da esquina: estudemos a arte de os
multiplicar.
29-07-2012 |