Domingo XIII do tempo comum (ano C)
1ª leitura: 1º livro dos Reis, XIX, 16-21
2ª leitura: carta aos Gálatas, V, 1, 13-18
Evangelho: S. Lucas, IX, 51-62.
O Evangelho de hoje é um dos que mais me tem feito impressão, desde
a minha primeira juventude – aos onze anos pretendi ser Jesuíta, e
esforcei-me a sério durante muito tempo! Como conciliar a bondade de
Jesus, a sua alegria e exigência de «filhos» do Pai deus-amor, com a
exigência de nem sequer voltar atrás, por uns momentos, para nos
despedirmos carinhosamente da família e amigos? Na 1ª leitura, vemos
como Elias deixa que Eliseu, ao abandonar tudo para o seguir, vá
primeiro dar um abraço ao pai e à mãe. Será que Jesus se lembrou de
que era mais do que Elias? E de que a sua importância “imbatível”
impunha ser seguido incondicionalmente?
Relativamente à separação da família na adolescência, mesmo “para
seguir Jesus”, os últimos trinta anos revelaram ser um processo
claramente a evitar. Os próprios seminários alteraram profundamente
a sua estruturação. E só as ordens religiosas de clausura é que
mantêm uma grande ou mesmo total separação, para adultos. O afecto e
valores da família e grupo de amigos é imprescindível ao equilíbrio
pessoal e fortalecimento para as grandes decisões.
Como interpretar o evangelho de hoje?
Parece haver entendimento comum de que Jesus pretende frisar a todos
os seus seguidores, seja qual for o seu estilo de vida, de que, no
que toca à exigência central do Reino de Deus (amar como o Pai se
ama e nos ama) não pode haver misturas de sim e de não, nem
manobras diplomáticas – aceita, sim, a prudência da serpente que nos
faz escolher o momento mais oportuno para falar e agir.
Mas enquanto espero por este momento planificado, não posso fingir
que não estou comprometido com a justiça do Reino de Deus. Jesus
Cristo é o «caminho» que devemos seguir sempre: à mesa da família,
no trabalho, nos divertimentos, quando namoramos e fazemos amor, e
também quando “vamos à missa”. O Espírito do Amor, com as suas
exigências, deve estar presente em tudo o que façamos, para tudo
transformar em energia ao serviço do reino de Deus.
É deste Espírito que nos fala S. Paulo. «Viver segundo a carne»
opõe-se a «viver segundo o espírito», como a vida de escravo se opõe
à vida de um homem livre. São dois modos de vida do ser humano. Mas
«foi para a verdadeira liberdade que Cristo nos libertou», não foi
para nos limitarmos à natural condição humana de poder tomar
decisões, de não se sentir coarctado pele organização social e de se
deixar levar por caprichos. É a liberdade dos que seguem Jesus,
tomando a decisão de viver segundo o mandamento do Amor, de aumentar
a felicidade neste mundo, para todos sem distinção. A admoestação,
punição, medidas restritivas, etc., são necessárias mas só valem
como claramente ao serviço do Amor, e obviamente não podem utilizar
técnicas cruéis ou aviltantes do Homem.
Todas as rápidas cenas do evangelho de hoje são apresentadas quando
Jesus «tomou a decisão de subir a Jerusalém» e de aí enfrentar a
morte. Jesus queria que os seus discípulos compreendessem como é
terrivelmente duro tomar este tipo de decisão, incompatível com uma
vida tranquila embora correcta. É preciso praticar o amor e a
justiça dentro de casa, para os sabermos aplicar na organização
política. Mas o Homem verdadeiramente livre sabe que não vive apenas
como membro da nossa espécie animal. Há grandes decisões pessoais
que de facto têm mudado o mundo, dentro e fora do Cristianismo.
Nessas alturas, o novo espírito da liberdade dá-nos forças para não
nos deixarmos corromper pelo dinheiro, pelo poder, pelos interesses
de amigos e familiares. Se nos comprometemos a sério com amar nas
situações mais diversas, a nossa família, amigos, conhecimentos mais
ou menos “convenientes”... ficaram a saber também o caminho da
verdadeira liberdade e bem-estar. E nós podemos «lançar a mão ao
arado sem olhar para trás».
24-06-2012 |