5º
Domingo de Páscoa (ano B)
1ª
leitura: Actos dos Apóstolos, 9, 26-31
2ª
leitura: 1ª Carta de S. João, 3, 18-24
Evangelho: S. João, 15, 1-8
Não,
«não é o que pensa». A palavra «tareia» não é mais do que ligeira
alteração de «tarefa», termo árabe designando uma grande quantidade
de trabalho a que se é obrigado (veja-se o espanhol «tarea»).
Uma
«tareia bem dada» é fazer com que alguém «sinta no corpo» o esforço
bem suado, próprio de um treino para vencer na vida.
Neste
caso, a palavra «corpo» tem uma dimensão «holística» (palavra grega
que refere a totalidade): designa a pessoa integral. Como quando se
diz «dar o corpo ao manifesto», o que só é possível mobilizando
também a energia espiritual. E por isso é que um castigo físico dói
na alma e o desânimo nos põe doentes.
O
segredo está em que seja um treino-tareia oportuno, a seu tempo, de
acordo com as capacidades e o ritmo do sujeito. Só assim é que ser
obrigado não é ser escravizado. Só assim é que o esforço vale a pena
e a gente se prepara para vencer na vida. «Dar bem» uma tareia é
preparar o outro para realizar bem a tarefa e compreender que o
êxito tem que lhe «sair do corpo».
No
evangelho, Jesus Cristo compara-se a uma videira. As imagens de
vinha, videira e vinho marcam uma forte presença tanto no Antigo
como no Novo Testamento. São imagens que falam da vida: da energia
que é, do trabalho que dá, do prazer que a vida proporciona.
Uma a
uma, cada videira é podada como única e, com toda a força da
expressão, leva um «enxerto de tareia». É isso mesmo: «enxertar»
cuidadosamente a «tarefa» de bem produzir. A cada golpe bem dado
responderá um cacho bem chorudo, benfeitor da boa mesa e mais tarde,
após outra tareia bem dura, surge o vinho, invencível animador da
«pessoa integral».
O
«homem da poda», senhor de toda a sabedoria, diz Jesus Cristo que é
Deus – o «querido pai». Para Jesus dar tanto fruto como deu, sabemos
sobejamente a «tareia» que apanhou do «pai querido»! É caso para
dizer: para grande «tarefa» grande «tareia»!
E não
conta a 1ª leitura como os primeiros cristãos desconfiavam da
conversão de Saulo? Precisavam de ver que, a seguir à «tareia bem
dada» a caminho de Damasco, suportaria muitas «tarefas». Sabemos
como o resultado foi bem positivo.
Na
linguagem da Bíblia, «dar fruto» já tem o sentido de dar provas do
próprio valor. E como diz a segunda leitura, esta prova tem de ser
feita «com obras e em verdade».
A
palavra «verdade», na cultura hebraica, designa a solidez do objecto
ou da pessoa que permanece firme contra toda a adversidade. As obras
não podem ter a fugaz consistência de um fogo de artifício. Por
isso, Jesus se apresenta como «a vide verdadeira».
Não se
pode dizer que «só» em Jesus Cristo encontramos a Verdade. Graças ao
«Senhor da poda», não faltam, em todas as épocas, civilizações e
culturas, magníficos portadores e defensores da Verdade. Mas só é
«verdadeiro» cristão quem se esforça por conhecer o valor especial
de Jesus Cristo, vivendo como sarmento em que corre a seiva do
tronco principal.
Quais
são as boas «tareias»? E as boas «tarefas»?
Dotados que somos de vontade própria, nem uma «tareia bem dada»
produz automaticamente em nós bons frutos. E do bom desempenho da
«tarefa» só o tempo dirá. Contudo, por muito que doa a «tareia» e
seja difícil a «tarefa», há um sinal que não engana: a alegria de
«dar o corpo ao manifesto».
É uma
questão de nos empenharmos todos na forma mais justa do programa de
vida que constitui o «manifesto». Para o que convém ter a arte de
transformar em boas «tarefas» até as «tareias» mal dadas. Mas
sobretudo ter a arte de também nós colaborarmos em «tareias bem
dadas» – como «educadores» não só dos nossos filhos como também dos
nossos amigos e de todos os que desempenham cargos de
responsabilidade.
Tornamo-nos «educadores» na medida em que «crescemos e fazemos
crescer» (mas só «crescemos» se vemos que até uma criança nos pode
dar uma «tareia bem dada»…).
Não é assim que nos mostramos exigentes de «vinho de boa cepa»?
06-05-2012 |