3º Domingo de Páscoa
(ano B)
1ª leitura: Actos dos
Apóstolos, 3, 13-15.17-19
2ª leitura: 1ª Carta
de S. João, 2, 1-5
Evangelho: S. Lucas,
24, 35-48
A
partir daquela Páscoa, as milenárias histórias de deuses ficaram
mais ultrapassadas, cheias que eram de medos, castigos e de onerosos
rituais para conquistar as boas graças desse ser ou seres
superiores, como se estes fossem “divinamente corruptos”.
Já
antes de Cristo se procurava que Deus não fosse «comerciável». A
moedinha da viúva (Lucas, 21, 1-4), como notou Jesus, valia muito
mais do que os chorudos donativos para dar nas vistas, sem a menor
vontade de “dar o corpo ao manifesto” na construção de um mundo com
mais justiça.
A
relação dos Homens com Deus é claro que levanta problemas. Valha-nos
acreditar que Deus é a Palavra silenciosa e amiga a acompanhar-nos
do nascimento à morte – fazendo-nos ver que a vida não é só «isto» e
que, se pensarmos deste modo, «isto» até passa a ser muito melhor!
Para
bem sentir a amizade dessa Palavra, precisámos de «representantes de
Deus». A ideia de Messias (central nas três leituras deste domingo)
aí estava, concretizando a necessidade de um «salvador».
Porém,
não era fácil para os Judeus, como continua a ser difícil hoje em
dia, aceitar um salvador que não ponha em primeiro lugar a
libertação das condições sociais opressivas. Honestamente, quem vai
em lindas cerimónias religiosas, se realizadas sob o auspício de
poderes opressores, ou até de conluio com eles?
Os
primeiros discípulos gritaram aos quatro ventos que o verdadeiro
messias era mesmo aquele Jesus que fora crucificado – por não
aceitar uma «religião de conveniência» a quaisquer que fossem os
interesseiros. Doravante, não podemos permanecer na ignorância de
que se abriu uma porta de comunicação nova com Deus, como entre
filhos e pais que se adorem (1ª leitura) – e «filhos» responsáveis e
capazes de «projectos de salvação» (2ª leitura). Porém, a salvação
integral do ser humano, se feita com o «Espírito de Deus», tem que
saber utilizar, crítica e criativamente, os conhecimentos de
tecnologia, direito, economia, ética, política…
É que
não podemos descansar na esperança que há-de aparecer alguém (que
não nós…) com a sabedoria e coragem necessárias para pôr tudo em
ordem.
Sem
dúvida que é mais fácil seguir o carreirinho das leis e costumes do
que desbravar, com arte, caminhos novos; e que seja o Messias a
romper as sebes espinhosas e então, se a paisagem for do nosso
agrado, segui-lo-emos alegremente e com promessas de fidelidade…
Mas o
próprio Messias, com todo o seu arrojo, não destruiu a injustiça no
mundo. É que, bem vistas as coisas, ele não quer ser o único pagador
de promessas…
A palavra «Messias»
provém directamente do aramaico, significando «ungido». Ao ser
ungido com óleo, o rei passava a ser «o messias do Senhor», um
representante do «poder» de Deus, responsável pelo bem do seu
povo. Em grego, ungido diz-se «cristo» e David poderia ser
chamado «Cristo de Javé» (1 Samuel, 16, 13) «Filho de Deus»
(como se designaram muitos reis e imperadores) e «pastor»
de todo o povo. Reis, sacerdotes e profetas podiam ser os
«medianeiros» de Deus. A existência de reis iníquos e de falsos
profetas e a pergunta cada vez mais angustiante sobre o sentido da
vida, motivaram outro nível de esperança, centrada num misterioso
«príncipe da paz» «salvador». Quando este aparecesse,
chegaria «o fim dos tempos» imperfeitos e o começo do
«reino de Deus», ou seja dos tempos de perfeita justiça e
felicidade. «Jesus», porque agiu radicalmente em sintonia
com o «espírito» de Deus, ficou considerado o verdadeiro
«Messias» (ou «Cristo») e «Filho de Deus». Outros títulos
profundamente simbólicos na cultura judaica e muito difíceis de
definir se acrescentaram: «Filho do Homem», «Senhor» e «Logos»
(«Palavra» ou «Verbo»). O título mais importante é o de «Senhor».
Os outros títulos designam funções de mediação, que podiam ser
desempenhadas pelos reis e profetas. «Messianismo» passou a
ser entendido, mesmo fora do registo religioso, como a esperança
de uma mudança radical no nosso mundo e a projecção, num futuro
indeterminado, da imagem possível de sociedade perfeita.
22-4-2012 |