Assim
termina a história de Abraão no Livro do Génesis, quando ficou
«repleto de dias». E como ele, muitos mais caminharam serenamente
para se juntarem aos antepassados, rodeados de carinho.
Esta
expressão tão doce e familiar suaviza a morte como separação e
fortalece a fé na reunião. É um momento, ou um processo, em que
sobressai o valor fundamental da união. E não apenas com as pessoas
que acompanham esse custoso momento, ou com as mais familiares do
passado. Faz-nos cair na conta de que cada um de nós é um elo
imprescindível da infindável corrente que forma a Humanidade.
Sentimo-nos ligados a toda a gente do passado, do presente e do
futuro – todos reflectimos as nossas alegrias e angústias, o bem e o
mal de que somos capazes. Todos formamos uma comunhão de profundos
sentimentos, de ideais, sucessos e insucessos.
E
lança-nos um aviso: somos responsáveis por desenvolver os dons e
facilidades que possuímos, para bem de toda a Humanidade. Certos de
que nenhum elo da Humanidade é inútil: com todos aprendemos e todos
nos despertam contra a tentação da imobilidade ou indiferença. Com
um carinho especial por quem dá o primeiro choro e o primeiro
sorriso no nosso mundo e por quem dele se vai despedindo.
Ser
próximo de quem se vai despedindo traduz-se num estímulo para
continuar com mais ardor a verdadeira missão no mundo de quem nos
passa o testemunho, por mais jovem ou desprotegido que seja. As
nossas festas e diversões, estudo ou trabalho duro, manifestações de
amizade e amor… tudo pode ser feito de maneira a tornar melhor o
mundo que nos foi entregue. E deixando boas dicas para quem nos
sucederá.
Na
verdade, cada um de nós é fruto de um passado e do momento que
passa; mas é também a semente para frutos cada vez melhores.
Se não
alimentamos o prazer de boas sementeiras no futuro, não conseguimos
enfrentar e dar sentido ao sofrimento e às catástrofes que nos
afligem. Abandonando os outros, ficamos sozinhos e indefesos perante
a morte. Ser um elo da Humanidade é fortalecer para sempre a grande
corrente de vida que forma a aventura humana. O orgulho de ser
humano traduz-se no «humanismo», mais notável quando nos unimos em
tempos de calamidade, mas que tem de estar sempre presente na
«política» de todos os dias, pois todos somos responsáveis por
garantir a melhor forma de viver.
A
sociedade humana baseia-se na comunicação. Que seja sincera e
verdadeira. Que procure compreender os problemas dos outros, com
respeito e cuidado e sem preconceitos contra a ternura. Como se os
problemas fossem nossos (e também são). É isto a compaixão. É isto a
comunhão, conceito afim a comunicação. É isto a proximidade.
Conceitos a que o papa Francisco tem dado importância especial, na
«largada» de todos os que se unem para nova e exigente caminhada.
Se a
técnica promove a comunicação, não pode ser para nos destruirmos uns
aos outros mas para aumentar o conhecimento, saborear mais a beleza
da caminhada e sentir a frescura da força que nos move. E darmos
conta da dignidade extrema da Humanidade que, ao longo do tempo e do
espaço, penetra cada vez mais profundamente no mistério da vida e no
mistério de Alguém que chamamos Deus, que é o mais perfeito Pai e
Mãe tanto na mais escura noite como no mais brilhante dia. E que nos
prepara a festa da Paz e Alegria em que todos nos juntaremos na Casa
Comum da Humanidade como única Família.
Aveiro,
22-10-2021 |