ÉVORA E O TURISMO

Poucas cidades portuguesas possuem o fulgor histórico que irradia da cidade de Évora e nenhuma a excede nos encantos naturais e próprios para fascinar turistas.

Quem uma vez passou por Évora, mesmo sem propósito de digressão turística, logo foi atraído pelo mistério que paira nesse ambiente histórico. E, como que obedecendo a uma vontade estranha, dentro em pouco se encontra empolgado na contemplação de maravilhosos monumentos e sugestivas ruínas que evocam cenários, imagens e épocas de raro esplendor.

É a cidade onde, a cada passo, se entrelaçam motivos que prolongam o encanto, e as almas vão deixando docemente prender-se na teia das lindas histórias e saborosas lendas – aqui o sentido heráldico e heróico das apagadas letras de uma lápida; além o melancólico silêncio de um velho claustro; acolá o romance de certa janela caprichosamente cinzelada; mais a história amargurada daquela negra torre e lembrança das figuras principescas que se cruzaram neste pátio antigo...

É um nunca acabar essa galopada de imagens que nos arrasta para o mundo antigo, e mais nos fascina pela noite alta, quando entre as sombras das arcarias melhor se ouve a voz melodiosa das fontes... Essa voz aliciante que atravessa mais de três mil anos de história.

Évora merece bem o título de cidade-museu, porque nela se respira o perfume do passado, no que este tem de mais atraente para os turistas e civilizados. As suas pedras históricas, os seus palácios, templos e ruínas, os seus pórticos, capitéis e colunas tombadas, tudo são páginas gloriosas da vida de Portugal e do Mundo.

Olhando as suas muralhas, logo nos acode a visão das águias romanas que aqui pousaram triunfais, ao tempo em que a cidade já tinha fama e grandeza e se chamava Liberalitas Julia. Folheando as velhas crónicas damos conta da passagem dos godos e sarracenos. E não faltam / 137 / os mais belos documentos arqueológicos mostrando como desde a expulsão dos mouros com o lance ousado de Giraldo «Sem-pavor» – que oferece a cidade conquistada a D. Afonso Henriques (1165-1166) – não mais pára a peregrinação dos reis a esta cidade, alguns aqui fazendo moradia, associando a cidade dos bispos e letrados e os seus moradores, nobres e plebeus, aos mais famosos e gloriosos feitos que engrandeceram Portugal.

É em Évora que o primeiro rei português forma a «Ordem de Avis», cujos cavaleiros tiveram a sua primeira sede nas Casas do Conde de Basto. D. Sancho l, D. Afonso III, D. Dinis e D. Afonso IV, largo tempo fizeram de Évora a sua Corte. E desta cidade partiu Afonso, o «Bravo», para a batalha do Salado, conforme o atesta a inscrição em mármore, que se vê na Sé. Aqui casou, por procuração, D. Pedro com D. Constança Manuel; e D. Fernando, o amoroso, foi criado e assentou sua côrte em Évora, que também assistiu aos seus amores com Leonor Teles e aos sucessos trágicos e políticos a que tais amores deram lugar.

Reis, príncipes e princesas casaram em Évora, com pompas esplendorosas que deram brado, e em que tomaram parte embaixadores, arcebispos e grandes senhores da Europa. Aqui viveu o Mestre de Avis, antes e depois de ser rei. O grande Nuno Álvares Pereira governou Évora / 138 / durante muitos anos. E eram eborenses muitos dos briosos cavaleiros da «Ala dos Namorados».

Em 1481, o grande rei e chefe D. João II reuniu côrtes em Évora, onde se esboçam as primeiras desavenças entre a nobreza e o rei, sendo este apoiado pelo povo. Dessas desavenças resultaram algumas tragédias, como a execução do Duque de Bragança, decapitado em Évora, depois de aqui estar preso na famosa torre do Palácio das Cinco Quinas.

Com D. Manuel I, Évora assistiu a esplendorosas festas e saraus artísticos, onde passaram as figuras mais brilhantes da época – com Gil Vicente, Bernardim Ribeiro e Garcia Resende.

Com D. João III, Évora teve o primeiro grande Colégio dos Jesuítas, que seria depois Universidade, por onde passaram altos espíritos. Mas também experimenta pavorosas cenas de terror, assistindo aos autos de fé da Santa Inquisição»...

De Évora, onde residia como primeiro Arcebispo, partiu o velho Cardeal D. Henrique para ser rei. E nunca mais Évora deixa de ter fama – revoltando-se contra o domínio dos Filipes, dando pousada a D. João IV, poucos dias antes da Restauração; aclamando D. João V, de cuja magnanimidade partilhou; manifestando-se, com o arcebispo Frei Manuel do Cenáculo à sua frente, contra a invasão dos franceses; tomando parte / 139 / nas lutas liberais, que terminaram ali muito perto, com a Convenção assinada em Évora-Monte.

Com a decadência das ordens religiosas e dos faustos régios, Évora também decaiu no seu vivo esplendor. Mas tão profundamente havia entrado na História, que o tempo não apagou os vestígios das suas glórias.

O maior encanto turístico desta cidade é que a sua empolgante história está escrita e gravada nas suas maravilhosas pedras e ruínas – como o não vimos, tão perfeitamente, em qualquer outra cidade portuguesa.

Por certo, a paisagem aqui não tem o feminino encanto com que a lírica paisagem do Mondego envolve a também histórica cidade de Coimbra. É austera e grave a paisagem da planície. Mas quem passar por Évora, e subir às suas torres e mirantes na hora do entardecer, sentirá evolar-se da terra, nos largos horizontes das planuras, qualquer coisa de profundo e melancólico que não esquece mais, que nos faz pensar nos seus poetas e pintores e, sobretudo, no seu povo bravo, leal e rude, que amanha a terra a cantar e, resignadamente, semeia e colhe o pão que comemos no país.

É dessa planície e desse povo, dos seus costumes típicos e tradições, que nos vêm muitas outras sugestões de beleza e encanto regional que valorizam Évora como o mais rico centro turístico de Portugal.

 

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