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Freguesia de Nossa Senhora da Glória, Aveiro, Junta de Freg. de Nª Srª da Glória, 1997, págs. 13 a 30.

FREGUESIA DE NOSSA SENHORA DA GLÓRIA

Saudades de progresso


Lembro-me como se fora hoje.


Nervoso, muito nervoso, pois sentia a responsabilidade da prestação da minha primeira prova oral na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, acabara de me sentar no banco corrido da enorme sala.


À minha frente, o júri que me iria examinar na cadeira de Direito Constitucional; um juiz desembargador e o Professor Doutor Carlos Moreira que eu conhecera somente da prova escrita.


Vicissitudes de estudante trabalhador, nessa altura chamado de "voluntário". O que eu era; o que sempre fui.


Depois de um "boa tarde" que me soou a ríspido, surgiu a primeira pergunta:

 

— Diga-me, senhor, qual é a sua naturalidade? Face ao seu ponto, tenho dúvidas.


Fiquei perplexo... Eu preenchera o cabeçalho da prova como sempre o fizera desde a minha Escola Primária e nunca alguém ficara com dúvidas.


E por isso respondi com convicção:


— Sou natural da freguesia da Glória, concelho de Aveiro.


— A sua resposta é incorrecta. Pense bem — interveio o Professor.


Olhei-o incrédulo. Fora assim que o meu professor da Escola Primária me
/ pág. 14 / tinha ensinado e fora assim que eu me habituara a preencher todos os documentos legais ou correntes em que tivesse de declarar a minha naturalidade.


E foi isto mesmo que eu me atrevi a dizer de viva voz.


— Pois, meu caro senhor, está mal. Esteve sempre mal. Eu sei que é essa a prática, mas tal não deixa de ser incorrecto. Acima de tudo para um estudante de Direito Constitucional. E já que não sabe, aí vai um pouco de História.


O senhor é natural da
freguesia de Nossa Senhora da Glória. Isto é que está conforme à Lei; isto é que a História releva.


E depois foi um desfilar de encantamento rico de factos e datas referentes à História de Aveiro que me deixou ficar embasbacado. Tanta coisa sobre a minha terra que eu desconhecia. Fiquei pequenino. Mandou-me embora com um "vá em paz" sem me fazer qualquer outra pergunta. Ao fim da tarde, soube pelo bedel que tinha passado exactamente com a mesma classificação que obtivera na prova escrita. Fiquei feliz por isso e por ter ficado mais rico de conhecimentos.


Mais tarde, em Novembro de 1985, vinte cinco anos passados sobre este meu exame, vim a fazer um pequeno arranjo gráfico para um opúsculo de
monsenhor João Gonçalves Gaspar, o historiógrafo aveirense que tanto me tem honrado com a sua amizade.


Seu título: "
Aveiro e as suas Freguesias — no sesquicentenário da freguesia de Nossa Senhora da Glória".


Li-o de fôlego, pois todo o seu conteúdo me fazia lembrar a verdadeira lição de História em que o meu exame de Direito Constitucional se tinha convertido.


Pelo seu rigor e recorte literário entendo dever transcrevê-lo com a vénia devida ao autor, sem mesmo omitir a sua breve justificação introdutória.

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