O facto de pertencer ao quadro dos Serviços de Turismo da Câmara
Municipal de Aveiro levou a que me tivessem sido atribuídas tarefas no
âmbito das “Relações Internacionais”. Não é meu intuito fazer um relato
de todos os trabalhos que desempenhei neste sector, mas tão só pôr por
escrito alguns casos que considero interessantes, pelo que não me
preocuparei com a sequência cronológica, nem com a exactidão de datas,
para o que teria de fazer consultas documentais que diminuiriam o prazer
que me dá este exercício de avaliação – e, em certa parte, de manutenção
– do estado da minha memória que os anos e a consequente perda de
neurónios vão inelutável e aceleradamente corroendo.
Geminações
Para começar, decidi, sem que para tal tivesse nenhuma razão, começar
por experiências que tive no sector das “Geminações”, área esta em que
o Município de Aveiro atravessou uma fase de grande actividade, tendo
“Cidades Irmãs” disseminadas pelos quatro cantos do mundo: Brasil (Belém
do Pará e Pelotas), Japão (Oita), África (Santa Cruz – Cabo Verde e Ilha
do Príncipe – São Tomé e Príncipe) e Europa (Espanha, Ciudad Rodrigo e
França, Bourges e Arcachon).
Na sequência de uma visita de dois elementos da Vereação a uma cidade
francesa de que não me recordo o nome, a Câmara convidou a “Musique
Municipale de Bourges” para vir a Aveiro dar um concerto, sendo todos os
encargos, excepto a viagem de comboio, por conta da autarquia.
Fui incumbido de tratar do alojamento, refeições, organização do
concerto e programa social. Quando me foi entregue a lista dos
visitantes, surpreendeu-me, à primeira vista, o seu número (quase
noventa); a minha surpresa aumentou, quando constatei que havia uma
vintena de nomes femininos; e continuou a subir de grau, ao constatar
que seriam necessários vinte e tal quartos de casal. Nunca tinha visto
nenhuma Banda francesa... As senhoras seriam músicas? Majorettes?
Como se justificaria uma percentagem tão elevada de casais?
Segundo indicação que me tinha sido transmitida, por razões de ordem
económica, alguns visitantes deveriam ficar em quartos da “Escola Santa
Joana”, no largo Maia Magalhães, e os restantes no Hotel Imperial, onde
seriam servidas as refeições.
Solicitei dois autocarros dos transportes urbanos, aos Serviços
Municipalizados, e, no dia da chegada, acompanhado por uma colega,
esperámos a Banda, na Estação da CP. Quando o grupo desembarcou, o meu
grau de surpreendimento voltou a aumentar, na medida em que uma boa
metade do grupo era constituída por casais da terceira idade, de mala de
viagem na mão, mas sem transportar nenhuma caixa ou saco que fosse
susceptível de conter um instrumento. Distribuídas as pessoas pelos
autocarros, em função do local de destino, a minha colega dirigiu-se
para a Escola e eu para o Hotel.
Antes do jantar, fui interpelado por um senhor idoso que me perguntou se
tinha sido eu o responsável pela distribuição dos quartos. Face à minha
resposta afirmativa, quis saber a razão de semelhante pergunta, porque, tendo pago tanto como os outros,
ele e a mulher estavam alojados num quarto sofrível, num estabelecimento
de ensino, e outras pessoas estavam instaladas num hotel dotado de boas
condições. Respondi que deveria haver qualquer confusão, já que ninguém
pagaria nada pelos quartos nem pelas refeições, porque a estadia da
Banda seria paga pela Câmara. Redarguiu que não só não fazia parte da
“Musique Municipale de Bourges”, mas também que se tinha inscrito para
um passeio pago a Portugal, organizado pela predita Banda, digressão
essa que tinha sido publicitada na Imprensa regional, afirmações estas
que comprovou, exibindo o respectivo recibo de pagamento e, ainda, um
recorte de um jornal de Bourges.
Depois de ter procedido, da maneira mais discreta possível, a um breve
inquérito, apurei os factos que a seguir menciono, os quais transmiti ao
Presidente da Câmara, Girão Pereira, que foi o primeiro elemento da
edilidade a chegar para o jantar de boas vindas, o qual não ficou menos
estupefacto do que eu.
1º – A “Mairie de Bourges” era uma das mais importantes autarquias
detidas pelo Partido Comunista Francês.
2º – A “Musique Municipale de Bourges” não tinha nenhuma ligação com
aquela Câmara e tanto se podia chamar assim como “Musique 14 Juillet” ou
“La Musique Berruyère” (os habitantes daquela cidade são chamados
berruyers).
3º – A “Mairie de Bourges” tinha tido conhecimento da deslocação, mas
não tinha tido nela qualquer responsabilidade, ao contrário do que
pensava a Câmara de Aveiro.
4º – A viagem tinha sido organizada e publicitada somente pelo Maestro
da Banda que tinha cobrado bilhetes a toda a gente, inclusive aos
músicos, como se a Câmara de Aveiro não suportasse nenhuns encargos,
tendo, com isso, deduzi eu e mais tarde confirmou-se, arrecadado uma boa
maquia.
Posteriormente, este caso foi denunciado à “Mairie de Bourges” que pouco
pôde fazer, a não ser tornar pública a condenável atitude do Maestro,
porquanto não tinha sido cometida nenhuma ilegalidade, já que o convite
lhe tinha sido dirigido.
Todavia, e apesar de terem começado mal, as relações com Bourges
acabaram por se iniciar não só a nível oficial, mas também se tornaram
frequentes e diversificadas, com visitas recíprocas, por exemplo, das
Associações de Comerciantes, do Pessoal dos CTT, de Associações
Culturais – o “Grupo Folclórico de Eixo”, numa ida a Macon que eu
acompanhei, pernoitou e fez uma exibição em Bourges – e várias outras de
que não me recordo, tendo este bom entendimento culminado numa geminação
entre as duas cidades.
Aveiro foi mesmo convidada a fazer-se representar na “Foire de Bourges”,
importante feira do centro de França, onde foi montado um Posto
de Informação Turística, por mim e por uma colega (Maria Manuel
Vilhena Barbosa) que lá ficou até ao fim do certame, tendo eu regressado
a Aveiro com o Vereador Luís António Moreira Tavares, que participou na
cerimónia da Inauguração.
Durante essa visita inaugural, que também acompanhei, aconteceu-me algo
que não resisto a contar: o “Maire” Jacques Rimbault (homófono do poeta
Rimbaud), quando chegámos ao espaço ocupado pela Força Aérea Francesa
que, para captar pessoal para as suas fileiras, tinha montado um
stand, cuja grande atracção era o simulacro de um sistema de ejecção
de emergência para os pilotos de aviões de combate, resolveu exibir-se
para os seus votantes e, no fim, perguntou, do alto do seu metro e
oitenta e tal, se mais alguém gostaria de experimentar; subiu-me o
patriotismo à cabeça e lá fui eu dar um salto ao tecto do pavilhão, com
grandes queixas do meu estômago, que me deu a sensação de que teria preferido
ter ficado no rés-do-chão. Não ficaram por aqui as minhas experiências
militares em Bourges, porque, durante outra estadia, tive a oportunidade
de visitar a fábrica onde eram produzidos os mísseis, que se tornaram
muito conhecidos, (“Exocet” ou “Super-Étendard”, ou os dois, já não me
lembro), quando foram utilizados pelos argentinos, na Guerra das
Malvinas.
Não quero encerrar este capítulo sobre Bourges sem falar de um amigo
berruyer, chamado Robert Terminé, membro da “Associação de
Amizade França-Portugal”, de quem fiquei a conhecer alguns traços e
casos curiosos que ficaram registados na minha memória. Antigo
combatente da Segunda Grande Guerra Mundial, tinha levado um tiro numa
perna – não podia ver nenhum alemão da sua idade, sem pensar que poderia
ter sido ele o maldito boche que o tinha chumbado –, pelo que tiveram de
lhe extrair um bocado de osso que ele guardava religiosamente numa
vitrina exposta na sua adega, onde cheguei, por mais do que uma vez, a
beber uns copos e a comer uns aperitivos, pousados sobre um pesado manto
negro, com debruns dourados, que cobria a sua futura urna. Para terminar
este parágrafo dedicado a esse velho amigo, referirei algo que me foi
contado por ele. Um dia, em Salreu, de visita a casa de uns emigrantes
seus conhecidos, depois de almoçar, quis demonstrar os seus
conhecimentos de português; diga-se que gostava de o fazer, mas eles
eram tão reduzidos que, quando estava a falar comigo e eu deixava de o
compreender era porque ele estava a tentar comunicar na nossa língua.
Aproveitou ter aparecido o gato da casa e disse: “Eu gostar muito de
gatôs”; os donos da casa pensaram que ele queria gateaux (bolos)
para a sobremesa, foram buscá-los e ele disse “Eu dizer gostar do
chat (gato) ”; então, deram-lhe chá. Robert acabou por
explicar, em francês, que o que ele queria dizer era “Eu gosto muito de gatos”,
mas acabou por comer os ovos-moles, que ele bem conhecia e apreciava,
acompanhados de uma chazada.
De todas
as geminações, a mais potente e com
resultados mais evidentes e duradouros para Aveiro foi a celebrada
com Arcachon. Nasceu de um encontro casual de delegações das duas
autarquias, creio que em Bordéus, e, considerando as semelhanças
existentes, não entre as duas cidades que nada têm a ver uma com a
outra, mas entre as duas regiões – o bassin arcachonense e a sua
zona envolvente têm grandes parecenças com a nossa região lagunar –, as
visitas oficiais iniciaram-se e estabeleceu-se um intercâmbio a nível de
várias instituições. No que me diz respeito, efectuei deslocações a essa
cidade, acompanhando as seguintes entidades:
– uma equipa de juvenis do “S. C. Beira-Mar”, que participou num torneio
de futebol;
– o “Coral Vera Cruz” que deu um concerto, juntamente com um Orfeão
local, na Igreja de Notre Dame;
– uma delegação dos Bombeiros Velhos, convidada para o aniversário da
corporação local;
– os participantes do “Encontro Internacional de Aquicultura”, evento de
que falarei, mais à frente;
– quatro marnotos aveirenses que se deslocavam à Guérande, a convite da
União Europeia, para visitarem o salgado daquela península e trocarem
experiências com os seus colegas franceses;
– o doutor Vasco Branco, que tinha sido convidado para fazer um grande
painel cerâmico, num túnel da avenida marginal;
– o Vereador João José Ferreira da Maia aproveitou a ida comigo para tratar
de assuntos referentes à recolha e tratamento de lixos, quando eu fui
preparar as comemorações do “5º Aniversário da Geminação”.
Finalmente, ajudei o pintor aveirense e meu amigo, Jeremias Bandarra, a
montar uma exposição comemorativa do supracitado aniversário, que esteve
aberta ao público, durante dez dias, na Sala de Exposições, anexa ao
“Hôtel de Ville”. Nessa mostra, para além de trabalhos dos mais
conceituados artistas plásticos e artesãos aveirenses, também se
prestava informação turística não só através de folhetos, mas também de
um “Quiosque Interactivo” que continha a informação constante do meu
“Roteiro” e na concepção do qual eu tinha colaborado com um técnico de
Informática de uma empresa de que era sócio o Eng.º Belmiro Couto. Tive
o grato prazer de ser procurado por uma pessoa que se tinha deslocado
expressamente de Paris para ver a referida máquina que, para meu
espanto, foi considerada, por esse visitante, como uma novidade.
Durante esta estadia, auxiliei as entidades locais na elaboração do
programa das festividades referentes ao predito aniversário, por
exemplo, fazendo as necessárias traduções, festas estas, cujo prato
forte foi constituído por um espectáculo a cargo da “Confraria de São
Gonçalo” e em que participou a fadista aveirense Lisete da Conceição,
com o guitarrista Armindo, que já tinha acompanhado Amália Rodrigues.
No que respeita à vinda a Aveiro de Delegações de Arcachon, referirei,
somente, que os Bombeiros do Sud Bassin não só se fazem
representar, ainda hoje, em todos os aniversários dos Bombeiros Velhos,
mas também que têm levado a cabo frequentes e importantes acções de
formação junto destes seus colegas aveirenses.
Mas o que me levou a afirmar que de todas “as geminações, a mais
potente e com resultados mais evidentes e duradouros para Aveiro” tinha
sido esta, foi a circunstância de ela ter sido determinante para que se
instalasse, em Aveiro, o actual “Centro Comercial Glicínias Plaza”, com
todas as consequências que isso acarretou a nível comercial, económico e
até urbanístico – creio não ser excessivo afirmar que foi a primeira vez
que a mancha citadina se estendeu para sul da 109.
Assim sendo, penso que merece que se dê notícia de um facto pouco
conhecido. Há perto de vinte anos, a “Leclerc” pensou em expandir a sua
rede de centros comerciais para a Península Ibérica, tendo incumbido um
seu funcionário de fazer uma prospecção. Aconteceu que essa pessoa,
quando visitou a Aveiro, pensou que esta cidade seria o sítio ideal para
instalar o Centro de que quereria ser o Director. Tentou marcar uma
entrevista com o Presidente Girão Pereira, mas ao fim de duas ou três
tentativas goradas, voltou para casa, situada na localidade de Pyla, que
pertence à comuna de Arcachon. Um dia, encontrou o respectivo “Maire”,
Pierre Lataillade, que tinha sido seu professor de Inglês, o qual já não
o via há uns tempos, pelo que lhe perguntou em que é que se ocupava;
disse-lhe que continuava a trabalhar para a “Leclerc” e falou-lhe do seu
projecto para Aveiro e dos seus problemas em falar com o Presidente da
Câmara local. “Se é só esse o teu problema, vai deixar de existir,
dentro de cinco minutos; vem comigo ao meu gabinete.” Um telefonema
e dois dias depois a desejada entrevista teve lugar. Mais tarde, foi
dito a essa pessoa, por um membro do “Conseil Municipal” de Arcachon”,
que quem lhe poderia ser muito útil, em Aveiro, seria eu, porque
conhecia muita gente, pelo que, durante uns dezassete anos, me vi
envolvido num processo de criação de Centros Comerciais, em Aveiro e
Figueira da Foz, acabando por ser sócio gerente de uma empresa
concessionária de estabelecimentos nessas grandes superfícies.
Com a outra Cidade-Irmã europeia, Ciudad Rodrigo, tive inúmeros
contactos, mas como a maior parte deles respeitou à “Mesa Luso-Espanhola
– Um Caminho para a Europa”, falarei deles mais adiante.
No que respeita às geminações africanas, a primeira tarefa de que fui
incumbido foi a do fornecimento de material para os alunos da Ilha do
Príncipe. Depois de ter sabido, através da Embaixada, qual era a
população escolar e a sua distribuição etária, adquiri, a peso, nas
livrarias da cidade, não só antigas edições de livros para as
disciplinas de Português (incluindo Gramáticas), Matemática e Ciências
Naturais, para os seis primeiros anos, mas também cadernos lisos,
pautados e quadriculados – a muitíssimo bom preço, porquanto,
pasme-se, as capas estavam desactualizadas e os meninos portugueses já
não os queriam – e, ainda, lápis, lápis de cores e borrachas que
me dei ao trabalho de cortar ao meio, para serem mais.
Este trabalho chegou ao conhecimento da “Associação Sul”, constituída
por africanos que se dedicavam à cooperação com os seus países, e, um
dia, fui procurado por alguns deles que me alertaram para a
possibilidade de, caso não fossem tomadas previdências, todo aquele
material poder ir parar à mão de alguém sem escrúpulos, que o viesse a
vender e embolsasse o respectivo lucro. Falei com o Presidente da
Câmara; mandaram-se fazer autocolantes com um barco moliceiro, onde se
dizia que aquele livro ou caderno era uma oferta da Câmara Municipal de
Aveiro. Contudo, considerando, por um lado, que essas folhas ou mesmo os
autocolantes poderiam vir a ser arrancados e, por outro lado, que esse
processo não poderia ser aplicado ao restante material, foi contactado o
embaixador português em São Tomé, cujo nome, se não me engano, era
Anacoreta Correia, que assistiu à abertura do contentor e à entrega do
material ao Ministro da Ilha do Príncipe, Eng.º Umbelina, conforme me
foi confirmado pelo próprio, quando, durante uma estadia, em Aveiro, me
acompanhou numa deslocação a Salamanca, onde foi motivo de curiosidade
pública, porque, apesar das inúmeras visitas que fiz a essa cidade, não
tenho ideia de lá ter visto nenhum negro.
Mais tarde, encarregaram-me de comprar tubagem (galvanizada e plástica),
para abastecimento de água da padaria de uma Missão Católica, situada
em São Lourenço dos Órgãos, no concelho cabo verdeano de Santa Cruz e
de arranjar roupa para os habitantes necessitados daquela Cidade Irmã. No
que se refere ao vestuário, organizei um peditório nos estabelecimentos
escolares concelhios e a resposta, se bem que abundante, por vezes não
foi a mais apropriada, pois recebi muitas roupas de lã e guarda-chuvas
que foram enviados para uma comissão que apoiava os moradores do bairro
de Santiago. Para acondicionar este material, pedi à Feira Nova, única
grande superfície existente, à época, que oferecessem cartões utilizados
para as bananas, que uma camioneta da Câmara foi buscar, durante uns
dias. Escolhido o vestuário, foi acondicionado, por categorias, dentro
das caixas que, após etiquetadas a marcador, foram enviadas, com os
preditos tubos, para a agência transportadora, para se juntarem à
ambulância e ao carro cisterna, oferecidos pelos Bombeiros Velhos que,
por sua vez, receberam contrapartidas da Câmara.
Passados uns tempos, desloquei-me a Cabo Verde, integrando uma Delegação
de Aveiro, chefiada pelo Presidente Girão Pereira e incluindo o 1º
Comandante e o Presidente da Direcção dos Bombeiros Velhos,
respectivamente, António Manuel Machado e Ulisses Rodrigues Pereira e,
ainda, o proprietário de uma empresa que se dedicava à adaptação de
viaturas para uso das Corporações de Bombeiros, pelo que tive a
oportunidade não só de assistir à inauguração-exibição da ambulância que
percorreu, com a sirene a tocar e integrada num cortejo automóvel, toda
a povoação de Pedra Badejo (nome da sede concelhia), mas também de
participar na primeira viagem do carro cisterna que foi abastecer um
novo depósito de uma pequeníssima aldeia, chamada Rebelo, perdida no
interior montanhoso da ilha de Santiago. Curiosamente, passados muitos
anos, em Aveiro, um cabo verdeano perguntou-me, para meu espanto, se eu
não tinha estado presente naquele acontecimento, para ele
importantíssimo. Visitei, também, entre outras coisas, por exemplo, o
antigo campo de concentração, do Tarrafal – por ironia, perto, há uma
bonita praia de areia branca, com o mesmo nome – e a Missão de São
Lourenço dos Órgãos, onde tive a oportunidade de beber, pela única vez e
sem receio, água não engarrafada e comer biscoitos provenientes da
padaria, para que tinham sido enviados os tubos.
Perguntei ao Padre pela roupa. Respondeu-me que esse assunto era da
responsabilidade da Câmara. Uns dias depois, quando dava uma volta pela
povoação, vi uma garagem aberta e, lá dentro, estava um Volvo que, soube
mais tarde, tinha sido oferecido por uma ONG sueca, mas, tendo avariado
e não havendo peças de substituição, estava encostado, tal como
acontecia a todas as outras viaturas com problemas semelhantes. Mas o
que me leva a falar desta garagem é que algo, no seu interior, me
pareceu familiar: entrei e vi, ocupando toda a parede do fundo e
empilhadas até ao tecto, as “minhas” muitas dezenas de caixas de roupa,
por culpa das quais ainda tenho, hoje, uma hérnia inguinal. Enquanto
estive na ilha, nunca ouvi ninguém falar das vestimentas. Assim, se já
não era um grande crente em alguns tipos de caridadezinha para com os
coitadinhos, a partir daí fiquei a ser total e irreversivelmente incréu,
nesta matéria.
Na véspera da nossa partida, fui encarregado de participar numa reunião
com representantes de associações locais que queriam apresentar
petições. Percebi que, se fosse para satisfazer os pedidos, seria o
Presidente quem estaria presente, pelo que tomei escrupulosamente nota
de tudo – instrumentos musicais e respectivo material para sonoplastia,
bolas, chuteiras e equipamentos de futebol –, dizendo, no final, que,
chegado a Aveiro, iria apresentar a lista a quem tinha poder de decisão
sobre o assunto.
Para acabar este capítulo sobre as geminações, direi que desta visita
resultou a vinda a Aveiro, a expensas da Câmara, de uma menina de uma
dezena de anos que tinha um grave problema cardíaco. Fui buscá-la a
Lisboa, com a minha mulher, proporcionei-lhe um passeio na Baixa,
durante o qual a criança, de olhos esbugalhados, não despegou o nariz
do vidro da janela e, no fim, quando lhe perguntei de que é que tinha
gostado mais, respondeu-me: “DA LUZ!!!”. Esteve uns tempos hospedada em
casa do doutor Rui de Brito, foi examinada por especialistas, mas acabou
por voltar para a sua terra, sem ser operada, já não sei por que
motivo.
Jogos Sem Fronteiras
Em 1979, Aveiro entrou nos “Jogos Sem Fronteiras” realizados em
Saint-Gaudens (França), voltando a participar nas edições levadas a
efeito em Annecy (França), 1981, Budapeste, 1982 e 1997, Roznov
(Checoslováquia), 1992 e Atenas, 1993.
Colaborei com os seleccionadores nacionais e treinadores locais, facultando-lhes os meios necessários às suas funções – em 1981, o
seleccionador nacional, José Goulão, pediu-me, até, para o ajudar na
escolha da equipa de Braga, utilizando os meus métodos e as minhas
fichas, pelo que me desloquei, com ele, ao Estádio 1º de Maio – e
acompanhei as equipas em todas as deslocações, excepto a Annecy, onde,
por razões, creio eu, de ordem política, fui substituído por um
funcionário municipal, meu amigo, que nunca tinha saído de Portugal e só
falava português. Uma greve dos CTT/TLP não possibilitou a retransmissão
desses Jogos, por ausência de som, conforme consta da acta nº 39 da CMA,
de 29-09-1981, mas juro, por todos os santinhos, que “não tive parte
nem arte em tal malcarrilhada”, como diria Gil Vicente, mas deu-me
cá um gozo... Curiosamente, em 1997, uma Câmara da mesma cor política
entendeu que a minha experiência poderia ser útil, pelo que pediu a
minha colaboração (na altura, já estava aposentado), tendo mesmo
acompanhado a delegação aveirense à Hungria, sem que para tal me tivesse
sido pedido para mudar de opções políticas, só não dizendo de cor,
porque nunca estive filiado em nenhum Partido.
As equipas de Aveiro, treinadas, na primeira intervenção, pelo professor
Costa Lobo e, nas restantes, pelo também professor de educação física,
António Bernardino, obtiveram vários lugares nas tabelas
classificativas, tendo mesmo vencido os Jogos de Roznov, pequena cidade,
hoje checa e situada perto da fronteira com a Eslováquia.
Para preparar a nossa primeira participação, desloquei-me a Lisboa, para
ter uma reunião com José Fialho Gouveia que, na altura, coordenava as
participações nos JSF, tendo-me sido dito que, para além da parte
desportiva, deveríamos ter muito cuidado com os aspectos social e
publicitário, porquanto se tratava de uma representação nacional e a
transmissão seria em directo (só aconteceu nas duas primeiras edições) e
em horário nobre. Um aspecto particular para que me foi chamada a
atenção, foi para que haveria troca de lembranças não só entre as
cidades concorrentes, mas também entre os participantes e que, até aí,
Portugal tinha deixado uma boa imagem. Chegado a Aveiro, transmiti o que
me tinha sido dito ao Vereador José da Cruz Neto, que me deu mão livre
para tratar do assunto.
Assim:
– Para as cerimónias públicas, a equipa vestiria casaco azul-escuro, com
o logotipo do moliceiro, bordado no bolso do peito, calça cinzenta,
camisa branca, gravata azul com riscas pretas (ainda tenho a minha),
meias pretas e sapatos pretos.
– Para os treinos e durante o dia, fato-treino vermelho, com cabeção
branco (design de Jorge Trindade).
– Foi criada uma mascote para a equipa, pelo predito designer
aveirense: um “Pato Bravo” preto, em peluche, com 1,70 m de altura, da
qual se fizeram largas dezenas de miniaturas, no mesmo material.
– Para cada cidade participante ofereceu-se: uma miniatura do barco
moliceiro, com 0,80 m, uma barrica de ovos-moles, das maiores, uma peça
da Vista Alegre, com decoração original baseada nos painéis dos
moliceiros, da autoria do supracitado artista, um prato cerâmico,
pintado à mão pelo artesão José Augusto, com um motivo regional, uma
miniatura da mascote, uma camisola branca com a imagem da mascote e o
nome da cidade onde se disputavam os Jogos, uma garrafa de vinho do
Porto e publicações turísticas.
– Para cada elemento das equipas, incluindo a nossa, deu-se: um saco
típico de Pardilhó, com o logotipo do moliceiro, também de Jorge
Trindade, contendo uma miniatura da mascote, uma camisola branca com a
imagem da mascote e o nome da cidade onde se disputavam os Jogos, uma
lembrança de quase todos os concelhos do Distrito, uma pequena garrafa
de amostra de vinho do Porto e, ainda, folhetos turísticos.
– Foram distribuídas pela assistência dezenas de miniaturas da mascote
e da camisola com a sua representação.
– Os encargos não foram tão elevados como poderá parecer à primeira
vista, porque muitas das coisas – camisas, gravatas, sapatos, as peças
da Vista Alegre, algumas das lembranças concelhias e o vinho do Porto –
foram oferecidas a troco de menções publicitárias, ditas por mim,
durante uma entrevista que me foi feita, com essa intenção, para a RTP,
por Fernando Pessa, ocasião essa em que falei, pela primeira vez, para
um público televisivo.
A Delegação deslocou-se em autocarro e, na fronteira espanhola, tivemos
problemas, porque, por mais que explicássemos ao agente alfandegário,
para que se destinava todo aquele material, ele dizia sempre que era
“mucha mercancía”. Valeu-nos um telefonema feito para Lisboa pelo
Presidente Girão Pereira, para seguir viagem, sem pagar os respectivos
direitos.
Em Saint-Gaudens, no dia aprazado para a troca de presentes, que se
efectuou no ginásio de um estabelecimento de ensino, fiquei desconfiado,
porquanto o nosso material ocupava, totalmente, o fundo da sala, e, para
as outras representações e equipas, só havia uma mesa para cada país.
Resumindo: para além de algumas brochuras e folhetos, só nos foi
oferecida, pela cidade jugoslava, uma prenda: uns calções de banho, para
o supracitado Vereador.
Concluindo: fizemos figura de ricos (para não dizer de parvos), mas
serviu-nos de lição. Nas seguintes participações, nunca mais se pensou
em fato de passeio; para utilizar aquele tivemos que inventar uma volta
pelas ruas da cidade. Os fatos de treino também provaram não ser
necessários. Para oferecer as lembranças, que passaram a ser muito
simples, utilizaram-se sacos de plástico do Turismo. O “Pato Bravo”
perdurou como mascote, pois foi um grande êxito, mesmo entre os
organizadores europeus e a nível televisivo apareceu, em várias edições,
nos ecrãs, mas só se levava o grande. Continuou-se a oferecer as
camisolas com a imagem da mascote, só mudando o nome da cidade, onde se
realizavam os Jogos. Para as cidades concorrentes, manteve-se a oferta
da miniatura do moliceiro e do prato da autoria do artesão Zé Augusto.
Mesa Permanente
Luso-Espanhola
Uma Rota para a
Europa
Quando, em 1991, a Lista, de que eu fazia parte, perdeu as
eleições para a “Região de Turismo da Rota da Luz”, fui convidado a
continuar como funcionário e, não tendo aceitado, dei por finda a minha
comissão de serviço e voltei para a Câmara Municipal.
A primeira tarefa que me foi confiada foi a de dar corpo a uma ideia
surgida no seio da “Mesa Permanente Luso-Espanhola – Uma Rota para a
Europa”. A Câmara de Aveiro tinha sido incumbida de criar uns jogos
desportivos que viessem a ser disputados pelos municípios portugueses e
espanhóis que formavam aquela Associação, cuja principal finalidade era
a criação de uma via rápida que os unisse à Europa, desejo esse que, em
Portugal, se veio a concretizar com o IP5 que deu origem à actual A25.
Propus que se organizassem, anualmente, os “Jogos Desportivos
Luso-Espanhóis – Uma Rota para a Europa”, nas modalidades de Andebol,
Atletismo (de estrada, masculino e feminino), Basquetebol, Futebol e
Natação (masculina e feminina), para jovens de 15 anos, integrando
equipas representativas de Aveiro (nos últimos dois anos, com elementos
da Figueira da Foz, pelo que se passou a chamar equipa IP5-Litoral),
Viseu, Guarda, Covilhã e Salamanca. Em 1991, tiveram lugar em Aveiro, em
1992, em Salamanca, em 1993, em Viseu, em 1994, na Covilhã e em 1995, na
Guarda. Propus a instituição de um troféu (uma talha da Vista Alegre,
com o Barco Moliceiro, a Sé da Guarda e a Plaza Mayor de Salamanca),
para ser conquistado pela equipa que vencesse os Jogos, três anos
seguidos ou cinco alternados, o qual foi ganho por Aveiro que venceu
todas as edições, se bem que as duas últimas integrada na equipa
IP5-Litoral.
Coordenei a participação de todas as representações aveirenses, cujos
aspectos desportivos foram sempre da responsabilidade das respectivas
associações distritais e colaborei com as outras cidades, sempre que tal
me foi solicitado. Esta colaboração foi reconhecida pelo Ayuntamiento de
Salamanca que me ofereceu um bonito quadro com duas placas metálicas,
uma com a Plaza Mayor e outra da qual consta a seguinte dedicatória:
“AYUNTAMIENTO DE SALAMANCA – II Juegos Deportivos Lusos-Españoles 'Un
camino para Europa' – A Diamantino Dias en reconocimiento a su labor
organizadora – Salamanca 1992”.
Para publicitar a primeira edição dos Jogos, organizei uma Caravana
Automóvel, em que cada viatura ostentava um mastro com a bandeira de um
dos municípios da “Mesa Permanente”, precedida por um carro com painéis
alusivos àquela Associação e aos Jogos em si, a qual saiu da Plaza Mayor
salmantina e percorreu as ruas dessa cidade e as de Ciudad Rodrigo,
Fuentes de Oñoro, Guarda, Viseu e Aveiro, terminando o percurso na Praça
da República. Por razões de falta de tempo, não se passou nem na
Covilhã, nem em Béjar, nem em Tordesillas, neste último caso, com
especial pena da minha parte, pois é uma cidade que me merece um
especial carinho, porquanto tive a honra de receber um convite pessoal
para assistir às cerimónias “Comemorativas do V Centenário do Tratado”.
Com a realização deste evento, aconteceu-me algo de original e caricato.
Como a caravana partia cedo, os condutores das viaturas, todos
residentes em Aveiro, teriam de dormir em Salamanca. Assim, uns dias
antes, desloquei-me a essa cidade e reservei quartos no Hotel Condal,
porque se situava na Plaza de Santa Eulalia, onde havia um grande
estacionamento subterrâneo. No dia seguinte, telefonou-me o Consejal
Angel Calvo, para me dizer que o hotel exigia o pagamento de
garantias para manter a reserva; pedi-lhe para reservar os quartos
noutro hotel de três estrelas e, passadas umas horas, comunicou-me que o
tinha conseguido no Hotel Pasaje, situado numa das passagens da Plaza
Mayor. Na noite em que lá dormi, tendo-me esquecido de comprar um jornal
para servir de soporífero e, como não havia TV no quarto, procurei nas
gavetas, na esperança de encontrar uma bíblia – muitos dos meus
conhecimentos na matéria foram assim adquiridos – e qual não foi o meu
espanto, quando vi que uma das gavetas da mesa-de-cabeceira estava
totalmente preenchida, mesmo nos bordos, com mensagens em espanhol,
português, francês, inglês e alemão. Consegui arranjar um pequeno
espaço, para deixar ficar a minha colaboração, naquela obra plurilingue
colectiva, escrevendo a tradução do provérbio francês que me veio à
cabeça (“faute de merles, on mange des grives”): “à falta de
livros, lêem-se gavetas”. Deitei-me a ler, de papo para o ar, a leitura
cumpriu a sua missão somnífera e eu acordei quando a gaveta me caiu na
cara. Depois deste episódio, creio que me posso gabar de ser a única
pessoa que já adormeceu a ler uma gaveta.
Para além dos Jogos, participei praticamente em todas as reuniões da
“Mesa Permanente”, em todas as cidades portuguesas e espanholas, sendo
mesmo a minha última tarefa, antes de me aposentar, em 31 de Outubro de
1996, a organização de um encontro desta Associação inter-municipal, em
Aveiro.
Rede Europeia dos Países com
Indústria Automóvel
Em 1991, fui com o Presidente Girão Pereira a uma reunião, na
Associação de Municípios, onde a Câmara foi eleita ou nomeada (não posso
precisar) para representar Portugal na “Rede Europeia dos Países com
Indústria Automóvel” (“REPIA”).
Mais tarde, o Presidente, que iria estar ausente da cidade, delegou-me a
representação, numa reunião daquele “Rede”, que teve lugar em Valladolid,
e na qual participaram, para além de mim e dos espanhóis, franceses,
italianos, alemães, belgas e britânicos (galeses). Como não estava
dentro do assunto, pedi autorização, que foi concedida, para ser
acompanhado e assessorado por um representante de uma associação de
fabricantes de componentes para a indústria automóvel, presença esta
que foi muito bem acolhida por todos os participantes que, exceptuando
o representante do Ayuntamiento que nos recebia, não eram políticos.
Passado pouco tempo, realizou-se nova reunião, em Bruxelas, convocada
pela “Comunidade Europeia”, que apoiava a “REPIA”, para ser feito o
ponto da situação, na qual estive também presente, por delegação que me
foi confiada, mais uma vez, pelo Presidente. Como não me poderia fazer
acompanhar por um técnico, pedi, à supracitada Associação, que me
fossem fornecidos elementos que permitissem que a minha participação
fosse o mais eficaz e útil possível, dados esses que me foram facultados
em francês e inglês.
A reunião, a que compareceram praticamente as mesmas pessoas da de
Valladolid, foi presidida por uma funcionária da CEE que começou por
dar a palavra a um dos galeses, situados à sua esquerda, que falou em
inglês; e as intervenções seguiram-se, no sentido dos ponteiros do
relógio: os franceses, em francês e os belgas, também em francês
(recordo-me que um dos seus problemas era a grande intensidade de
trânsito de camiões porta-contentores, no interior do Porto de
Antuérpia, que causava grandes demoras que prejudicavam o funcionamento
do sistema JIT (just in time), adoptado pelas suas fábricas de
montagem).
Eu seria o quarto. Era a primeira vez que participava numa reunião
àquele nível e estava à espera que houvesse serviço de tradução; em
Valladolid, compreendia que tal não tivesse acontecido e que nos
tivéssemos ajudado uns aos outros, agora, na sede da comunidade?!
Resolvi protestar e, quando chegou a minha vez, comecei a falar em
português, perante a estupefacção de toda a gente. A senhora, que
presidia, interrompeu-me, ao fim de dois ou três minutos, para perguntar
porque é que eu estava a falar em português; respondi-lhe que o fazia
por duas razões: porque era a minha língua materna, tal como tinha
acontecido com os três anteriores intervenientes e que o português era
falado por mais de 218 milhões de pessoas, o que o colocava em sexto
lugar na tabela das línguas mais faladas do mundo, enquanto o francês só
aparecia em nono lugar com 130 milhões. A senhora elucidou-me que, nas
reuniões de trabalho, não havia tradutores, e que os idiomas utilizados
eram o inglês e o francês, pedindo desculpa de tal não ter sido
mencionado na convocatória. Como conhecia o nível de francês dos
espanhóis e dos galeses, com quem tinha estado em Valladolid, comecei a
falar francês a carregar no acelerador; os franceses sorriram e a
senhora pediu-me se eu podia falar mais pausadamente. Ficaram
satisfeitos com os dados que eu forneci (já não faço a mas pequena ideia
qual era o seu teor) e tudo acabou em bem.
À noite, fui convidado para uma confraternização ibérica, porque os
espanhóis tinham gostado da minha “reclamação”, pois o facto de o
castelhano ser preterido em favor do francês e de terem que falar outra
língua, que não a sua, naquelas reuniões, também lhes ficava
atravessado. Quando cheguei a Aveiro, relatei ao Presidente da Câmara o
que se tinha passado na reunião, incluindo o meu “protesto”, a que ele
achou piada.
Encontro
Internacional de Aquicultura
Em finais de 1993, o Presidente Girão Pereira disse-me ter
conhecimento de que haveria verbas da Comunidade Europeia destinadas à
Aquicultura e encarregou-me de saber quais as possibilidades da Câmara
poder vir a ter acesso a elas.
Depois de consultar e obter a colaboração de um especialista em biologia
marítima e de dois representantes aveirenses de serviços estatais
ligados às pescas, elaborámos um projecto de intercâmbio de experiências
entre profissionais deste sector a nível internacional que, após ter
obtido o acordo da “Mairie” da cidade-irmã de Arcachon, um dos maiores
centros franceses de ostreicultura, e do Ayuntamiento de Chiclana de la
Frontera, que ocupava um lugar de referência a nível da aquicultura
europeia, foi apresentado a Bruxelas, onde foi aprovado.
Os “Encontros” efectuaram-se, no ano de 1994, em França e Espanha, o
realizado no país vizinho foi noticiado televisivamente, tendo eu sido
entrevistado para a Televisão da Andaluzia, realizando-se o de
Encerramento, no mês de Maio, em Aveiro. Os participantes,
principalmente os portugueses, manifestaram a sua satisfação pela
possibilidade que lhes tinha sido proporcionada de conhecerem diferentes
meios, realidades e técnicas.
Recordo-me de termos visitado os campos de ostras do “Bassin d' Arcachon”
e o “Lycée de la Mer” da vizinha cidade de La Teste e de, em Espanha,
termos conhecido as instalações de uma grande empresa, onde era
produzido o peixe, principalmente douradas – estavam a tentar com o
robalo e o linguado –, desde a maternidade, até aos viveiros de
alimentação semi-intensiva, e passando pelos laboratórios, onde se
fazia investigação avançada sobre aquicultura e piscicultura. Também
nunca me poderei esquecer de uma noite de “Flamenco”, incluído no
programa de animação, que eu tinha aprovado, sem saber que só acabaria
às 5 da manhã.
Durante o decorrer dos “Encontros”, tive que me deslocar a Bruxelas,
para dar conhecimento do andamento dos trabalhos e prestar contas, na
medida em que era a CEE quem suportava a quase totalidade dos encargos,
na sua qualidade de patrocinadora.
Uns meses após o encerramento dos “Encontros”, fui surpreendido, quando
recebi um convite para ir participar, aos candidatos a um novo projecto
europeu, de que não me recordo o nome, como tinham sido concebidos,
programados e levados a efeito os nossos “Encontros Internacionais de
Aquicultura”, de que eu tinha sido o coordenador, os quais tinham sido considerados por Bruxelas – com toda a franqueza e sem falsas
modéstias, nunca percebi bem porquê – não só como um êxito, mas também
como um modelo a ser seguido.
Enviei o texto, que me era pedido, em francês – seis páginas formato A4,
a que correspondia um tempo de leitura de, aproximadamente, 20 minutos
–, com um mês de antecedência, a fim de que o mesmo pudesse ser
traduzido para as restantes línguas oficiais e dei conhecimento do
convite ao Presidente da Câmara, Celso Santos, que me disse que iria
propor à Câmara para eu ser acompanhado por um Vereador. Chamei-lhe a
atenção para o facto de o convidado ser eu e não a Câmara, pelo que a
ida de um Vereador poderia vir a levantar problemas protocolares o que,
infelizmente, veio a acontecer, com grande pesar da minha parte, porque
tinha e tenho em grande apreço a pessoa em questão, que se viu relegada,
para lugares secundários. Por exemplo, no jantar de encerramento, não
consegui, por mais que pedisse, que lhe fosse dado um lugar na Mesa de
Honra, onde eu estive.
Quanto à minha intervenção, que foi seguida de um período de perguntas e
respostas, em francês, da minha parte, dado que não havia tradutores de
português, correu bem e recebi felicitações que, quanto a mim, se
deveram mais à qualidade do meu francês, que propriamente ao conteúdo da
comunicação.
Para terminar, direi que, recentemente (Agosto de 2015), li, no “Diário
de Aveiro”, declarações de um ostreicultor local que dizia que muito do
seu actual êxito se devia a uma visita que tinha feito, alguns anos
antes, a Arcachon, onde tinha tido a oportunidade de estabelecer
contactos que continuava a manter e a serem-lhe úteis. Fiquei
satisfeito, pois pensei reconhecer o nome de uma das pessoas com quem
tinha estado, naquela cidade, há vinte e um anos.
28.08.2015
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