O ARQVIVO DO DISTRITO DE
AVEIRO dará sempre notícia das obras à sua Redacção enviadas quer por
autores quer por editores.
De harmonia com a prática
seguida pelas publicações suas congéneres, fará também algum comentário
crítico aos livros de que receba dois exemplares.
Arquivos de Angola − 2.ª
série, voI. VI, n.os 23 a 26. Luanda, 1949.
Arquivo de Beja − Vol. VI,
fasc. I a IV. Beja, 1949.
Biblos − Vol. XXV. Coimbra, 1949.
Boletim do Arquivo Distrital de Angra do Heroísmo - VoI. I,
n.º 1,
Angra do Heroísmo, 1949.
Boletim do Arquivo Histórico Militar
− 19.º voI. Vila Nova de Famalicão, 1949.
Boletim da Associação da Filosofia Natural
− N.os 13 e 14. Porto.
Douro-Litoral − 4.ª série,
n.os I-II. Porto, 1950.
Estremadura - Boletim da Junta de Provinda -
N.os 21 a 23. Lisboa.
Mensário das Casas do Povo
− N.os 43 a 51. Lisboa.
Portucale − 2.ª série,
n.os 23 a 27. Porto.
Prometeu − Vol. lII,
n.os 3-4. Porto.
Revista de Ensino -
N.º 1. Repartição Central dos Serviços de Instrução. Luanda, 1950.
Revista de Guimarães
− VoI. LX, n.os 1-2. Guimarães.
Revista de História − Ano I,
n.os 1 e 2. São Paulo − Brasil, 1950.
*
GASTÃO DE SOUSA DIAS − «Julgareis qual
é mais excelente...». No tricentenário da restauração de Angola − 1948. VoI. de 433 págs. Lisboa,
1949.
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A vida rural no Romance Português, de ANTÓNIO ÁLVARO DÓRIA − Lisboa, 1950.
É um grosso volume de 400 páginas que o Sr.
DR. ÁLVARO DÓRIA acaba de publicar.
Trata-se dum estudo sério e bastante original, em que o Autor
interpreta e aprecia os aspectos da vida rural em escritores
românticos, realistas e em escritores do século XX.
Não se limita ÁLVARO DÓRIA a tratar o assunto implícito no título
que deu ao seu trabalho. Expõe também as características dos movimentos literários a que os escritores pertencem, apontando as suas
causas,
o que dá ao seu trabalho, além do aspecto de síntese, o de investigação científica.
Aqui e além recorre a escritores franceses contemporâneos, o que,
em nosso entender, alarga processos e esclarece ideias.
Merece louvor a orientação pedagógica que preocupou
ÁLVARO
DÓRIA, iniciando os capítulos com o estudo do ambiente literário em que
viveram os escritores, para depois fazer a documentação das suas ideias
com os textos das obras respectivas; e as conclusões por que terminam
aqueles, orientam ainda o espírito pedagógico do autor.
Simplesmente, os textos escolhidos para os fins em vista, principalmente alguns, parecem-nos demasiado extensos, a não ser que o Autor
tenha o objectivo de os destinar aos frequentadores das Casas do Povo
para neles verem o seu retrato.
No prefácio, afirma o Sr.
DR. ANTÓNIO ÁLVARO DÓRIA, que é a primeira vez que, em Portugal, se procura estudar a vida rural no Romance
Português. Efectivamente, o povo não tem inspirado temas à literatura.
Só no aspecto linguístico tem dado matéria a alguns licenciados das
nossas
Faculdades de Letras, trabalho, talvez por isso mesmo, pouco publicado.
Quanto a outras ideias do Prefácio, não somos inteiramente concordes.
Afirma o Autor:
− Com o advento do Classicismo entrou em moda um «pastoralismo»
convencional, cheio de artifícios, com vocabulário estereotipado, sem
alma, sem objectivo e sem verdade, que punha na boca dos «pastores» e
das
«pastoras» uma linguagem impossível, como nem nas próprias cortes dos
reis se empregava.
Se ÁLVARO DÓRIA se quer referir às
Éclogas de escritores clássicos,
está certo. Mesmo assim, deveria substituir o termo «pastoralismo» por
«bucolismo» por ser este que melhor exprime o conceito de artifício, de
menos verdade, de linguagem mal adaptada, de falsos estados de alma
dos pastores, etc.
Mas, pensando em algumas Quintilhas e Cartas de SÁ DE MIRANDA
e em alguns Autos de GIL VICENTE, poderemos ver neles tratado um ruralismo objectivo de linguagem, de sentimentos e de costumes. Igualmente
desacreditamos dos «camponeses de convenção», de que fala o Autor do
Prefácio, em certas Pastorais de RODRIGUES LOBO, porque a linguagem,
os trajes, os sentimentos, e a paisagem onde se movem os pastores do
nosso cantor do Lis, têm grande dose de realismo rural.
Não concluímos, portanto, como
ÁLVARO DÓRIA, que coube ao
Romantismo a glória de ter introduzido na Literatura o processo da
documentação e da observação directa da paisagem e da gente do campo.
A parte mais valiosa do trabalho de
ÁLVARO DÓRIA é, quanto a nós, a Segunda Parte, cap. II: − A vida e o trabalho rural nos escritores do
século XX.
Do próprio índice se conclui que preocupou mais a análise o Autor.
Os escritores que lhe servem para estudo são, entre outros, AQUILINO
RIBEIRO, JOSÉ RÉGIO, SOUSA COSTA, MANUEL RIBEIRO, FERREIRA DE CASTRO,
JOAQUIM PAÇO D'ARCOS, MIGUEL TORGA, NUNO DE MONTEMOR, VIRGÍLIO GODINHO, HUGO ROCHA, etc.
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Admira que o Autor, antes de entrar propriamente no estudo destes
escritores, nos tenha dito que não há romance rural na Literatura
portuguesa actual. A conclusão parece-nos apressada.
Seria necessário esclarecermos primeiro se o romance rural não viverá
mais da «atmosfera das almas» dos camponeses, do que do registo
minucioso do meio em que eles vivem. Se nos pronunciarmos pela primeira premissa, não duvidamos de classificar alguns romances de FERREIRA DE CASTRO ou de AQUILINO RIBEIRO, e outros, de rurais, visto
darem-nos a expressão bem verdadeira de certos dramas que a nossa gente
do campo sofre atrozmente. A verdade psicológica não falta, por exemplo,
quando no meio rural encontramos o homem que tem fome e tenta evitá-la,
arranjando outro modo de vida, como aqueles pastores que deixam de
guardar ovelhas e fazem-se empregados de fábricas, ou os agricultores
que se metem a contrabandistas. Não haverá aqui vida verdadeira do meio?
Tem razão o Sr. Dr. ÁLVARO DÓRIA, quando duvida das causas que
aponta para o insucesso do romance rural entre nós. Com efeito,
parece-nos que não se torna necessário que o autor do romance rural se
familiarize com o documento, porque teríamos de pôr de lado o seu poder de criar. Assim como é indispensável que ele seja, para o
produzir, de origem rural. Até nos parece ser este o menos indicado,
pelo simples facto de «mutatis mutandis» não ser o momento mais asado a
um professor de Português passar uma redacção sobre a Primavera dentro
desta estação do ano.
Seja, porém, como for, o livro do Sr. Dr. ÁLVARO DÓRIA, pelos serviços
que presta à Literatura, até à Etnografia e ao Folclore, ensina-nos a
amar Portugal.
ALFREDO DOS SANTOS
O Testamento de Frei Simão (Esboço Histórico de Uma Vida Célebre)
por MANUEL MENTARFA. 48 páginas. Porto, 1950.
O Sr. MANUEL MENTARFA, publicista assaz conhecido em nosso Distrito, deu à estampa em princípios de 1950
o opúsculo supra, em que se ocupa, em termos de muito carinho e
simpatia, da figura de Frei Simão
de Vasconcelos, da quinta do Outeiro de Cesar (Oliveira de Azeméis),
herói e mártir das lutas civis que ensanguentaram Portugal desde 1828 a
1832. Nele desenvolve o autor a movimentada e trágica biografia de Frei
Simão, que em resumo se encontra nos «Anais do Município de Oliveira de
Azeméis» (Porto, 1909), donde extractamos o seguinte: ...«Frei Simão de
Vasconcelos, monge de Cister, ...depois de secularizado por um breve pontifício de 17 de Março de 1816, se recolheu à casa do Outeiro, em
companhia de suas irmãs. Como os seus sentimentos liberais chegassem
quase ao fanatismo, foi muito perseguido pelos realistas, sendo a casa
do Outeiro cercada e saqueada muitas vezes... no intuito de o prender,
o que conseguiram... no dia 28 de Maio de 1828, na ocasião em que ia
fugindo, depois de ter sido ferido por um tiro de bala pelas costas...
Daí foi recolhido à cadeia da Vila da Feira, donde se evadiu».
Em 8 de Setembro de 1832, comandando uma guerrilha, «teve de se render
às ordenanças de Arouca, por falta de munições». «Daí foi levado para
Viseu, onde foi condenado à morte pela chamada Comissão Mista... no
dia 16 de Outubro, sendo fuzilado no outro dia, no Campo de Santa
Cristina, por uma força de milícias de Bragança, e enterrado na capela
de S. Martinho, sendo os seus ossos com os de outros liberais
arcabuzados na mesma época, em 25 de Agosto de 1836, trasladados, com
grande solenidade, para um condigno sarcófago na Sé de Viseu, construído a expensas
de um grupo de liberais da mesma cidade».
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É pena que à transcrição do testamento do ardente liberal se não
siga a da carta «em que se despedia da idolatrada família, entregando-se
a Deus». Talvez ela seja do sabor arrepiante da que Gravito, mártir
liberal aveirense da mesma época, endereçou à filha pouco antes de ser
enforcado, a qual corre impressa em dois livros de MARQUES GOMES
[«Aveiro, Berço da Liberdade» (1900) e «A Revolução de 16 de Maio de
1828, resumo do primeiro (1928)].
Fez bem MANUEL METARFA em trazer a público essa singular figura
de liberal e de patriota. É uma simpática homenagem a um dos homens do
nosso Distrito a quem devemos a defesa da liberdade, desse inestimável
apanágio da pessoa humana.
Na página 48, escapou ao autor a gralha
In Pax, que deverá ser emendada para In Pace.
J. T.
SANTOS CRAVINA − Amor de Mãe −, Porto, 1949.
É uma série de sonetos distribuídos por várias rubricas
− Amor de
Mãe, Vida da minha vida, Mãe que era Mãezinha, etc. − e incluídos entre
«Ladainha incompleta da Mãe das Mães» e «A Musa de Deus», após um
prefácio abonatório de EMÍLIA DE SOUSA COSTA, os quais se lêem com
simpatia.
Note-se, porém, que esta não resulta tanto do relativo cuidado de
elaboração artística como da sensação de lágrimas e luto em que a morte
da Mãe deixou SANTOS CRAVINA numa idade pouco afeita a comoções:
Durante quatro décadas contadas
tive os ternos carinhos maternais.
julgando-me criança, como as mais,
inda em colos maternos embaladas.
... ... ... ... ...
... ... ...
Ai! logo que a vi morta me dispus
a decantar as dores que a mataram
em glória às Chagas Santas de Jesus. (sic)
Págs. 52, 53.
Deste ambiente de câmara mortuária, em que chora quem perdeu ao mesmo
tempo que anota na sua pranteada os dons comuns a todas as Mães,
particularmente o do sacrifício em prol dos filhos, sobe o autor para o
elogio do amor materno que
... ... ... ... ...
... ... ...
excede todo o restante amor
e sendo o mais intenso, é natural.
Pág.31.
Não custa, pois, admitir em «Amor de Mãe»
− que podia ser chamado com justeza «Amor de Filho» − a existência de uma dose de lirismo
do sangue e do espírito, humano e divino, muito embora sem
originalidade, mas impregnado da resolução forte dum convertido que não
quer de modo algum interromper o seu diálogo com Deus.
Grande pena é não vermos SANTOS CRAVINA muito mais atento às exigências
da perfeição formal daquilo que escreve, para neste livro não caírem
sequer os erros primários deste teor:
... ...
... ... ... ... ...
...
Oh! − Mãe das mães, salvai os
filhos pervertidos
para que o Deus Teu Filho seja honrado
Pág. 17.
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... ... ... ... ...
... ... ... cruz
aonde os entes meus amados viram
Pág. 27.
Contudo, louve-se o autor pela lição poética de delicadeza filial bem
necessária a tantos cujos Pais são prosaica e... grosseiramente os
velhotes.
SANTOS CRAVINA - Cântico a São João de Deus −, Porto, 1950.
Com agradável aspecto, favorecido pelo desenho da capa e duas
reproduções interiores de obras de arte alusivas ao Santo, vem este
livro
ocupar o 22.º lugar dos publicados pelo autor a partir de 1930.
«Quem mais alto sobe...»
Seja qual for o conceito que SANTOS CRAVINA, tão apaixonado pela
letra de fôrma, possua de Poesia, ao leitor interessa exclusivamente o
que de poético a obra publicada lhe possa facultar ou sugerir pela
matéria versada, pelo processo usado, e pela linguagem que serve de
transmissor, de ligação de quem fala com o que ouve, de quem escreve com
aquele que
lê. E, se me não engano, tudo isto − matéria, processo e linguagem −
quando não embebido de Arte, só presta para manchar páginas e páginas,
dignas de melhor destino, ao longo de longo caminho de tédio que
enfastia
qualquer.
Que posição de poeta ocupa, nesta obra, SANTOS CRAVINA?
A escolha de S. João de Deus foi circunstancial e de intuito apologético, o que denota sensibilidade e oportunismo religiosos e
patrióticos na alma do autor; mas tal propósito evidente de celebração
jamais bastará
à criação da obra poética, ainda que tenha valor como atitude de
admiração.
De facto, a pessoa e vida de S. João de Deus prenderam, e com razão,
SANTOS CRAVINA, já que num Santo há sempre riqueza de material para o
Poeta; todavia o autor deste livro não soube trabalhar o que admirou e é
poético − a actividade e a contemplação do célebre filho de Montemor.
Por isso mesmo ficou-se parado, quase em contínua narração, poucas vezes
a traduzir espanto devoto, e nunca a cantar poeticamente. A descrição,
por conseguinte, asfixiou a exaltação comovida e vibrante que o título
Cântico nos prometera. E, como se isto não fosse tudo...
A linguagem de SANTOS CRAVINA rasteja terra a terra a cobrir as laudas
de um prosaísmo banal e barato donde não surge a beleza de imagens nem
se desprende a emoção; em vez disto levantam-se montões de vocábulos
mais ou menos perfilados em versículos de ladainha adocicada com «mães
pobrezinhas», «Caridade Infinitíssima» e «pobres criancinhas...» em que
«resplende» o «supernal» a granel!!
Ora vejam, ainda, a pobre Gramática, velha inimiga do autor:
Ó São João de Deus, a Deus
rogai
− por tua Fé, Esperança e Caridade
amor igual ao teu,
Pág. 11
Santa Mãe de Deus, rogai por todos os filhos
teus.
Pág. 82.
...e não considerem liberdade poética este anacronismo posto na boca do
Santo, a páginas 85:
S. João de Brito, rogai por Lisboa.
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Como se vê, o «Cântico a São João de Deus» não honra o cantor,
insatisfeito, aliás, consigo próprio, quando escreve com toda a verdade:
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Ai! − pobre de mim
que julgo ter no estro a diva inspiração
Pág. 151
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Ó Divino Espírito Santíssimo
só com miríades de infinitos dons inspirativos
um mortal poeta
poderia escrever dum Santo a morte terrenal!...
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
só por mim
nem um Santo saberia venerar...
Pág. 153
Afinal, SANTOS CRAVINA desmentiu-me: eu julgava que ele, posto que
desterrado da Poesia, para comemorar o 4.º centenário de S. João de
Deus, ao menos o venerasse...
Pois nem isto?
A. SARAIVA DE CARVALHO
Eng.º MENDES DA COSTA − Os Minerais e as Rochas úteis.
Recebemos da Editorial «Domingos Barreira» o livro
Os Minerais
e as Rochas úteis, pelo Eng.º MENDES DA COSTA.
Trata-se do n.º II da Colecção «Técnica» que aquela casa está a editar
e cujo fim é a expansão no homem vulgar das ciências de aplicação
técnica.
A obra põe de parte a terminologia e a especialização das ciências
ligadas ao estudo dos elementos minerais da Terra, para nos mostrar, num
encadeado de fácil consulta, o estudo dos minerais e rochas que o homem
utiliza para todas as actividades industriais conhecidas. E porque assim
é, e sem vislumbre de erudição, o livro Os Minerais e as Rochas
úteis torna-se indicado, não só para aqueles que da Terra tiram
qualquer finalidade prática, como também para todos os estudiosos que
às Ciências Geológicas estejam ligados.
É mais um trabalho a juntar à longa série de estudos que o Senhor
Eng.º
MENDES DA COSTA publicou sobre este ramo de Ciências, e que o Arquivo de
Aveiro gostosamente assinala.
A. P. |