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Aveiro em 1939

 

por um grupo excursionista do Teatro Aveirense (20)

– pág. 3 –

DE PASSAGEM

– Somos de Aveiro!...

E de passagem, em visita de recreio, pelas terras alheias, não diremos que a cidadezinha donde vimos é superior às suas congéneres. nem que é mais linda a nossa terra do que qualquer das lindas terras de Portugal que andamos percorrendo…

Saudamo-Vos!

E saudando-Vos, pedimo-Vos permissão para Vos dar uma pequena notícia de Aveiro e seu Distrito, desejando que a vossa felicidade nos permita um dia, a nós aveirenses, receber a honra da vossa visita...

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Aveiro não é uma cidade notável pelos seus monumentos, nem pelos grandiosos aspectos urbanistas próprios das capitais modernas.

É pequenina, humilde, popular.

O seu atractivo, a sua grande riqueza, a sua maior curiosidade é a Ria.

Resto de um antigo golfo separado do Atlântico por um cordão arenoso que se desalinhou das pedras de Espinho ao Cabo Mondego, comunica com o mar por uma barra artificial e abriga no seu interior um labirinto de canais, cales, esteiros e ilhotas entre os quais desaguam vários rios. O Vouga, o principal deles, esbraceja ainda por um delta, depois de divagar num largo estuário morto, hoje preenchido por campos, pateiras, juncais e salgueirais, e depois de percorrer um apertado vale entre montanhas, a recolher águas da Beira.

A cidade é modesta, mas preside a um distrito populoso, variado, rico de panoramas, complexo de actividades, marítimo, lagunar, agrícola, industrial, que pelos seus brios, labor, recursos e aptidões honra o nosso País.

Mercê da região em que assenta e das paisagens que a circundam, Aveiro, servida pelas linhas férreas Porto-Lisboa e do Vale do Vouga, é uma terra que não repele o visitante nem fatiga o turista que ali se detém. Constituindo pela sua localização um prático e cómodo centro de passeios e digressões, dispõe de um bom hotel, de pensões económicas, de vários cafés, de teatro-cinema, de um agradável e acolhedor Jardim-parque, de um excelente Museu de Arte que é dos melhores do País, de automóveis de aluguer, lanchas de turismo para excursões fluviais, estradas de fácil e rápida ligação com Lisboa, Porto, Coimbra, Viseu e Figueira da Foz.

O clima é privilegiado por isento de grandes oscilações e de penosos extremos.

Embora a região seja ventosa em certas épocas, por aberta às correntes aéreas do Oceano, nem os seus invernos conhecem os rigores dos frios impertinentes, nem os seus estios contam mais que alguns dias de calor bem suportável.

Do seu clima e da movimentação das águas que a cercam resulta uma salubridade digna de nota.

Tudo isto e os seus aspectos peculiares tornam a cidadezinha atraente, dizem alguns escritores, simpática, talvez, com o seu ar lavado, a simplicidade de maneiras do seu povo, e a sua paisagem cheia de azul, de sol, de alegria, em verdade única no País.

Uma estrada encostada às marinhas, através da Ria e da Gafanha, conduz aos estaleiros navais e às secas do bacalhau, às praias da Barra e Costa Nova, ao Forte, ao Farol, ao cais da Aviação Marítima de S. Jacinto. Outra leva a Ílhavo, que possui um interessante Museu de etnografia marítima, e à afamada fábrica de porcelana da Vista Alegre, com seu Museu, rico mostruário e capela monumental.

O percurso dessas estradas maravilha os visitantes. O horizonte é vastíssimo: mar, dunas, campos verdejantes, salinas, praias, ilhas e canais, sal rebrilhando, barcos à vela, pinheirais, agras e campinas, colinas e serranias!

A terra é um anfiteatro, vai do nível do mar até aos 1.100 metros de altitude. Ao sul o Cabo Mondego e a serra da Boa Viagem, ao norte os montes durienses fecham-nos o horizonte. Lá no extremo o pico do Trevim da serra da Lousã, os montes de Coimbra e do Lorvão, o Bussaco e o Caramulo, as Talhadas, o Arestal, a Freita e, sempre à volta, casario, povoados, ninhos de uma grei densa, prolífera e vigorosa.

Alguns quilómetros... e é a Curia, o Luso, o divino e histórico Bussaco; a Bairrada e o Vale da Mó; Águeda e o Panteon dos Lemos, a estrada dos Sanatórios do Caramulo; Albergaria e Sever; Estarreja, a Murtosa, a Torreira; Ovar e o Furadouro; Espinho e a Granja; Vila da Feira e o seu vetusto Castelo; Azeméis e S. João da Madeira com as suas fábricas; Cambra com o seu vale e Arouca com o seu riquíssimo convento. Tudo isso é digno de ver-se e vê-se com prazer e percorre-se sem enfado.

Aveiro orgulha-se desse Distrito, que é cheio de riqueza e de beleza e tem praias e vinhedos, campos e alcantis, areias soltas e rochas fraguentas, e com a sua gente humilde mas afável, onde se encontram raparigas que estranhos têm considerado das mais esbeltas de Portugal, com as suas festas e procissões, com os seus monumentos e com os seus canais, com a sua Ria e as suas indústrias, o seu clima, as suas especialidades, os seus arredores e os seus passeios. Aveiro não teme a vossa visita, porque não receia desagradar-Vos: por isso

–  Aveiro convida-Vos e deseja-Vos!

A excursão dos Empregados no Teatro Aveirense


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VISITE AVEIRO

A  Beleza fascinante da sua Ria, maravilha da terra de Portugal! - Os canais da cidade com os seus típicos barcos - Seu Museu de valioso recheio artístico - O Convento de Jesus e o Túmulo de Santa Joana  - Seu Parque Municipal - A graça donairosa e a esbelteza das suas tricanas.

O que o visitante deve ver em Aveiro

O Museu Nacional (aberto todos os dias das 11 às 17, aos domingos até às 14 horas) tem valiosas colecções de arte. No Convento de Jesus, onde se acha instalado o Museu, deve admirar-se a sua interessante igreja de riquíssima talha doirada, e o formosíssimo túmulo – primorosa jóia em mosaico de mármores do século XVIII – onde jaz a excelsa filha do rei D. Afonso V, a Princesa-Infanta Santa Joana, que neste convento se fez monja e morreu. Visitar também a cela e as relíquias da Santa.

Perto do convento fica a Igreja de S. Domingos, em cujo adro se pode ver um magnífico cruzeiro em puro estilo gótico, dos fins do século XV. O portal da igreja data de 1719. No interior podem ver-se algumas obras de reconhecido valor artístico.

Seguir depois até ao Jardim Público e Parque Municipal, retiro atraente e muito bem cuidado, com vastos terrenos anexos destinados ao Estádio da cidade. Perto fica o Hospital da Misericórdia, magnificamente instalado.

Voltando para o centro da cidade, passa-se na Praça Marquês de Pombal, onde se encontra o edifício do Governo Civil (do último andar observa-se lindo panorama sobre a cidade e arredores) e a Igreja das Carmelitas, espécimen muito interessante pela sua talha doirada e azulejos setecentistas.

Depois da Praça da República, vêem-se os edifícios do Liceu Central, os Paços do Concelho, a estátua do grande tribuno José Estêvão, glória aveirense, e a Igreja da Misericórdia, da época filipina, digna de ser admirada.

Descendo a Rua Coimbra, chega-se ao Canal Central, cuja visita, até o Canal das Pirâmides, é de recomendar.

No começo da Avenida Central, que liga o centro da cidade à estação do Caminho de ferro, ver o monumento aos mortos da Grande Guerra, bronze de José Caldas, de bela feição artística.

Para poente fica o característico Bairro Piscatório, cheio de simplicidade mas de beleza e cor, onde se encontram os tipos mais castiços da região: o pescador, a tricana, a salineira e a peixeira, tipos de encantadora beleza, que se distinguem pelo seu porte donairoso, a esbelteza das suas linhas, e seu porte grácil... O visitante não deve deixar de percorrer este bairro, passear ao longo do Canal de S. Roque onde se nota sempre um intenso labor. Pode-se atravessar esse Canal pela pequena ponte de madeira que nele se encontra, e ir, junto às Marinhas de Sal (em laboração apenas nos meses de verão) até à  Ponte de S. Gonçalo, junto ao Canal das Pirâmides. Passa ao  Rossio e está de novo no centro da cidade. Neste local realiza-se, de 25 de Março a 12 de Abril, a «Feira de Março». Muito interessante e de notável beleza pictural é a «feira dos barcos», que se realiza em 25 de Março, pela manhã, no Canal Central.

É também digna de visita a Capela do Senhor das Barrocas, belo exemplar de estilo barroco, de forma octogonal, situada no extremo norte da cidade.

Características e de belo sabor local, em Aveiro, são as suas majestosas procissões (Cinzas, Passos, etc.) e festas populares; os seus cais e canais, a indústria do sal, a cerâmica artística e de construção; os seus afamados doces, especialmente os deliciosos ovos moles; as enguias de escabeche e os saborosos mexilhões de conserva. As caldeiradas regionais, à pescadora, habilmente confeccionadas, com o peixe da Ria, nos modestos mas asseados e acolhedores restaurantes da cidade, são de molde a satisfazer o mais exigente apreciador.


VISADO PELA COMISSÃO DE CENSURA 

 
 
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(20) – Em 24 e 25 de Julho de 1939, um Grupo Excursionista, constituído pelos funcionários do Teatro Aveirense, efectuou uma excursão à Covilhã, passando, no regresso, por Belmonte, Guarda, Celorico da Beira, Mangualde, Viseu, São Pedro do Sul, Vouzela, Oliveira de Frades, Ponte de Pessegueiro, Albergaria-a-Velha e Angeja. Para subsidiar a viagem, angariaram publicidade e produziram um pequeno jornal publicitário, que distribuíam gratuitamente pelas terras por onde passavam. É desta publicação que reproduzimos as páginas três e oito, em que se fala da nossa cidade e se convida a visitá-la. Esta interessante publicação está actualmente disponível na Internet, nas Memórias de Aveiro do espaço «Aveiro e Cultura». [HJCO]

 

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