Em 1950, já lá vão
dez anos, estava na moda o Hóquei em Patins, modalidade em que os
portugueses davam cartas, conquistando títulos sobre títulos; estes
eram festejados com um entusiasmo delirante, talvez porque no campo
desportivo internacional não tivéssemos outros motivos para desfraldar
bandeiras, talvez porque se encontrasse uma certa afinidade entre
“stik” e a pá de Aljubarrota...
O certo é que numa
dessas características «tertúlias» era assunto obrigatório o hóquei,
apreciavam-se êxitos a que ninguém assistira, criticavam-se tácticas
que todos ignoravam, recordava-se e engrandecia-se a actividade do
extinto Hóquei Clube de Aveiro.
Neste ambiente
extremamente propício, até pela circunstância de serem jovens na idade
ou no espírito os «parceiros» dessa mesa do Arcada, era fatal a
pergunta de alguém — «...e por que não fazemos nós ressurgir em Aveiro
o hóquei em patins?» — como fatal era a resposta — «vamos a isso!»
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Mais depressa do que é possível contar-se, organizou-se um encontro
entre «solteiros» e «casados», em que os vencidos se obrigavam a pagar
um jantar aos triunfadores. A Académica de Espinho emprestou o
material necessário e no ringue do parque, num dos dias das férias da
Páscoa desse remoto ano de 1950, as equipas alinharam, saudaram-se
e... «bateram-se» como leões! Os «casados», pensando no orçamento e
nas responsabilidades familiares, «sonhavam» com o jantar «de borla»,
e por ele tudo fizeram — «converteram» o árbitro à sua causa,
apresentaram um «regimento» de jogadores, «abusaram» do físico, etc.,
etc.. Os «solteiros» resistiram heroicamente, e depois de pensados os
ferimentos recebidos na «batalha», comeram com o maior apetite as
iguarias que os «outros» haviam mandado preparar, convencidos que não
lhes saia da bolsa...
E foi assim que
surgiu a Secção de Hóquei em Patins do Clube dos Galitos, pois os
trabalhos subsequentes mais não foram que a consolidação da ideia em
marcha.
Os «velhos» tinham
cumprido o seu dever, agora aos «novos» competia «arregaçar as mangas»
e caminhar, e foi o que fizeram.
Silvério Borges de
Sousa, Augusto Vieira Decrook, Joaquim Félix, António
Ferreira, Mário Gaioso Henriques, João Carlos Aleluia, Artur Batista Beirão, Jorge e
Fernando Corte-Real e Luís Alberto Casimiro lançaram-se ao trabalho
com decidida vontade e nenhum obstáculo houve que os fizesse parar,
porque sabiam o que queriam e para onde iam. A eles e à colaboração
prestada pelo Coronel Amílcar Gamelas, José Mortágua,
Manuel Félix,
António Cunha, Primo Pacheco, José Maria Monteiro, Manuel Sarmento
Morais, Dr. Francisco Lourenço, João Melo Freitas,
Eng.º António Gaioso,
José Luís Soares,
Américo Teixeira, Dr. João Gaioso, Dr. Mário
de Melo Freitas e José Laranjeira, deve a Secção de Hóquei a sua
existência e inestimáveis serviços.
Não cabe no âmbito
deste bosquejo a história detalhada da actividade de dez anos de
esforços e canseiras, de êxitos e desilusões, de vitórias — algumas —
e derrotas — bastantes.
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Limitemo-nos, pois, a assinalar os principais factos destes dois
lustros da Secção:
Em 1 de Outubro de
1950 realizou-se o primeiro jogo formal, com a Académica de Espinho,
que venceu por 12-1. A equipa do Clube dos Galitos alinhou com: Dr. F.
Lourenço, J. Mortágua, Dr. Mário Gaioso, Cap. A. Osório, Fernando
Corte-Real e Cap. S. Mano.
Em 1952, a Secção,
contra toda a expectativa mas com o maior brilho, venceu a Taça de
Honra do Centro, com um grupo formado por Silvério, Guimarães, Gaioso,
Martins, Corte-Real; Almeida e Ferreira.
Durante algumas
épocas, foi esta a equipa-base, que alcançou classificações honrosas,
como segundos lugares nos campeonatos regionais e vencedores da taça
de honra de 1953, chegando a participar na fase preliminar do
Campeonato Nacional desse ano.
Começou entretanto
a funcionar uma Escola de jogadores, em que algumas dezenas de miúdos
fizeram a sua aprendizagem na modalidade, chegando a constituir-se uma
equipa de juniores de relativa categoria, mais tarde desfeita com a
saída da cidade dos seus elementos, todos estudantes. Neste trabalho
de ensinamento, tão difícil como proveitoso, merece ser posta em
relevo a paciência e dedicação de M. Gaioso, M. Martins, Nuno Greno,
A. Lobo e J. Pratas sobre quem recaíram ou recaem as responsabilidades
da Escola.
Em organizações de
certo modo arrojadas, dada a diminuta capacidade para público do
ringue que se utiliza, apresentaram-se ao público aveirense equipas
nacionais de grande valor, como as do Benfica, S. N. E. C. I., Infante
de Sagres, Académico, Belenenses, etc....
Num desporto que
exige uma longa e permanente preparação, instalações e material à
altura, e porque tudo isto sempre tem faltado, nunca a Secção alcançou
triunfos memoráveis, embora nunca tivesse tido também comportamento
desprestigiante para o Clube em que se integra. Sem soluções de
continuidade ou quebras de vulto, a Secção de Hóquei vai cumprindo,
modesta mas dignamente.
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A Cidade e os Clubes de Aveiro devem-lhe um serviço pouco conhecido,
mas de real interesse — o arranjo do Ringue do Parque e a
possibilidade da sua utilização na prática do desporto, até aí vedada,
pelo estado de abandono a que se encontrava votado aquele recinto.
Quanto ao Clube dos
Galitos, não poderá esquecer que o movimento de renovação operado em
1954 foi iniciativa e obra exclusiva da sua Secção de Hóquei em
Patins. Se mais não houvesse, esta seria urna razão bastante para a
existência da Secção, um motivo de legítimo orgulho para aqueles que
um dia, já recuado no tempo, e à mesa de um café, quiseram que Aveiro
voltasse a praticar o hóquei em patins.
M. G.