Aida Viegas, Oliveira do Bairro. Memórias de um século. Águeda, AVI, 1994, pp. 111-116.

Feiras e Mercados

As feiras, locais onde inicialmente convergiam as pessoas para efectuarem trocas de produtos da sua região, foram desde sempre pólos de desenvolvimento dos lugares e populações onde se realizavam.

A origem destes mercados baseou-se na necessidade que o homem tinha de trocar os bens que produzia e lhe sobravam, por outros que lhe faltavam. Hoje é tão grande o número de feirantes e os artigos transaccionados tão varia­dos que nada ali falta.

Em Oliveira do Bairro realizava-se a 16 de cada mês uma feira de gado cavalar,  bovino e porcino, vindo mais tarde a limitar-se à chamada “feira dos porcos” que tinha lugar no cimo da ladeira da Raposeira. Esta terminou por motivos de higiene sanitária.

Na vila apenas se mantém o mercado que se realiza aos sábados de manhã, sendo antes conhecido por “praça” por ter lugar na praça pública ao longo da avenida princi­pal. Agora tem lugar próprio destinado a esse fim.

Oiã tem há vários anos um mercado, com espaço pró­prio, criado pela população e junta de freguesia, o qual serve razoavelmente as gentes da vila.

 

FEIRA DO SOBREIRO

A feira do Sobreiro, criada em Outubro de 1936, rea­liza-se nos dias 9 e 22 de cada mês, sendo um mercado bas­tante concorrido que traz à freguesia de Bustos muito desenvolvimento e nomeada, e grandes benefícios à popula­ção com o movimento que dá à terra e a receita que vai dei­xando.

  

FEIRA DOS BURROS

Feira antiga e curiosa era a chamada Feira dos Bur­ros que tinha lugar em Perrães na véspera da festividade de Nossa Senhora das Febres.

Ali se vendia gado cavalar e muar predominando este último, facto que deu o nome à feira. Tivemos conhecimento através de pessoas naturais de Perrães de que esta não se realiza vai para uns vinte anos.

 

FEIRA DOS CESTOS

À Feira dos Cestos ainda poderemos dar uma saltada lá para o dia vinte e três de Agosto, pois, embora com pre­sença muito reduzida de cesteiros e esteireiras, dado que o número destes é mínimo no concelho, esta feira ainda tem lugar todos os anos no Troviscal no dia que antecede a festa de S. Bartolomeu.

Lá, ao som da música que sempre alegra o recinto, poderemos encontrar cestos poceiros e de aro, em verga rústica, os quais têm inúmeras utilizações em casa dos lavradores.

Encontraremos também as esteiras feitas de tábua, pelas mãos hábeis das mulheres dos lugares ribeirinhos, Gesta, Perrães e Silveiro e, embora provenientes de outros sítios, poderemos ainda ali comprar belos melões e melancias.


Feira em dia de festa.

 

FEIRA DA PALHAÇA

A feira da Palhaça foi e continua a ser a maior e melhor feira do concelho e será certamente a mais antiga. Ali se pode comprar e vender quase tudo. A esta feira se deve, em grande parte, o desenvolvimento da terra.

O grande número de pessoas que ali afluem nos dias 12 e 29 de cada mês enchem de vida e animação todo o lugar, trazem novidades de toda a ordem, e não é apenas comercial e economicamente que o desenvolvimento chega à Palhaça através da feira, mas sim num todo global.

A verdade é que esta se tomou das mais conhecidas, talvez pela localização privilegiada da Palhaça, local importante de passagem desde longa data.


Feira da Palhaça. Foto gentilmente cedida pelo Museu da Palhaça.

Apresentamos uma fotografia da feira nos princípios do século, mais propriamente do ano de 1933.

Seguidamente vamos recordar alguns episódios pitorescos que animavam esta feira e que hoje já não podem ser presenciados.

Alguns fizeram furor até à década de 1960, outros ter­minaram mais cedo.

 

- O jogo da vermelhinha - Este jogo dava com fre­quência origem a cenas de grande discussão e até pancadaria, pelo facto dos jogadores se sentirem burlados, pois as regras do jogo eram quase sistematicamente viciadas.

- O “homem da banha da cobra- Enquanto a mulher vendia o unguento e mostrava aos fregueses como usá-lo, o homem ia lançando os pregões do maravilhoso produto que ainda hoje cura bicos de papagaio, dores de costas, irritações de pele, enfim... todos os males que, por desventura, possam apoquentar o ser humano. O insólito de tudo isto estava no facto do homem ter, durante todo o tempo, uma enorme jibóia enroscada no seu corpo que o ia percorrendo dos pés à cabeça. Esta, que teria um diâmetro muito próximo dos 15 centímetros, sendo deveras comprida, era exibida como um dos exemplares donde se poderia extrair a banha, que era vendida em caixinhas de papel.

Escusado será dizer que à volta deste charlatão se acotovelava constantemente grande multidão de curiosos.

- Carteiristas - Quem nunca faltava nem falta em nenhum recinto de feiras ou de festas são os carteiristas; esses porém, são dos poucos personagens que ainda não passaram à história.

 

- Borda d’água, Seringador - Aqui tínhamos previsão meteorológica a longo prazo, apregoada pelo vendedor de pequenos opúsculos que ainda hoje poderemos encontrar.

 

- Ceguinhos - Outra das grandes atracções eram, sem dúvida, os cantadores; quase sempre pobres ceguinhos que de alforge e viola às costas, demandavam feiras e outros locais onde se aglomerasse muita gente.

Traziam pregados ao casaco e ao alforge, com alfine­tes ou molas da roupa, os folhetos que um moço “de cego” vendia pelos assistentes enquanto o cego cantava ou apre­goava a tragédia da qual era arauto. Naqueles, em letra impressa, eram relatados em verso melodramas, fortes pai­xões que levavam ao suicídio, crimes passiona is, mortes súbitas e outras desgraças.

Estas cantigas, de cunho melodramático, contavam geralmente casos verídicos ocorridos na região, um tanto fantasiados, cantadas pelos ceguinhos em estilo de fado. Dado o seu sensacionalismo tinham muita audiência, for­mando-se grandes “adjuntos” ao redor do cantado. Este espectáculo quase podia comparar-se ao jornal do crime ou a casos de polícia. Porém, este modo de comunicação tinha vantagens em relação ao actual: as notícias corriam cam­pos e aldeias e andavam na boca de toda a gente por muito tempo. Hoje, volvidos mais de 60 anos, tivemos o gosto de ouvir uma senhora com 83 cantar-nos os seguintes versos, que relembra da sua juventude e relatam um, de tantos desses dramas.

Ó minha mãe venha ver
O Mário no chão estendido
Por causa da Corininha
Deu dois tiros no ouvido.

Corina estás à janela
Corina eu também estou
Por causa de ti Corina
É que o Mário se matou.

E a mãe do Mário endoidece
Da sala para a cozinha
Matou-se seu querido Mário
Por causa da Corininha.

Corina o Mário morreu
E tu não o foste ver
As coroas que lhe mandaste
Voltaste-as “àrreceber”.

Ó Corina tira o luto
Que o luto não te está bem
Tu hás-de vestir de luto
Em morrendo a tua mãe.

 


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