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Liliana Jorge da Silva Loureiro
(Esc. Sec. Homem Cristo)

1º Prémio



ESPELHOS

I           

Uma vez mais olho para trás, para o passado. Vejo-me, de novo, jovem, fresca, viva, insensata, frágil e forte, uma adolescente confusa com todas as mudanças que ocorriam em mim num ritmo incontrolável. E sorrio ao me lembrar daquela inocência, dos medos, das paixões, das dúvidas, enfim, do medo de crescer e não voltar a sorrir, de mudar e não ser feliz. Agora, sento-me à frente do espelho e vejo o meu reflexo cansado. Já vivi o que tinha a viver. Já encontrei o meu lugar na vida e observo as minhas filhas na sua luta por um lugar ao sol. No espelho, vejo um rosto maduro, rugas no canto dos olhos já baços, o sorriso compreensivo de uma vida feliz e calma, os cabelos grisalhos. E uma vez mais a memória (ou deverei dizer a imaginação?) toma as rédeas da minha mente e eu volto a ver aquela jovem de pele macia, cabelo sedoso, sorriso inocente, olhos brilhantes, que ora mostram uma excitação infantil, ora se encobrem de nuvens de tristeza inexplicável. E vejo, no espelho, essa jovem, de quem guardo recordações tão turbulentas, levantar-se, descer as escadas a correr e agarrar-se ao pescoço do seu pai que finge estar zangado. Ele diz-lhe “Estás atrasada.” e ela sorri docemente, com ar de anjo, o que derrete o coração do seu pai que lhe retribui o sorriso. Lembrar-me-ei sempre daquela presença, tão forte, de meu pai, do seu olhar duro por cima dos aros dos óculos quando lhe pedia para sair à noite e como ele se tornava tão meigo e orgulhoso quando lhe beijava a palma da mão calejada e lhe dizia “É só um bocadinho.” “ A nossa menina está a crescer. Qualquer dia deixa-nos.” – dizia ele à minha mãe e eu repetiria na minha mente “Nunca! Nunca os abandonarei.”

Porém, eu não iria cumprir a minha palavra: iria encontrar o meu rumo, seguir o meu próprio destino. Mas, naquele momento, acreditava naquela determinação. Eles eram a minha vida e queria retribuir o amor que eles me dedicavam.

Levanto-me e dirijo-me à janela. Encosto-me ao parapeito e observo o jardim à luz crepuscular. Mas, de repente, ele ilumina-se – é outra vez dia! Vejo a minha jovem sair de casa para se encontrar contigo, prontas para mais um dia de escola. Pelo caminho, contar-lhe-ás todas as novidades do fim-de-semana. Como foste bela e incauta! Como te admirava! E como te invejava! Os teus olhos tão lindos, o teu corpo já tão adulto, o teu estilo tão característico, o teu ar tão desenvolto, o teu jeito tão especial para lidar com rapazes... Porém, eu não te conhecia. Não conhecia esse ser tão maravilhoso e frágil que apresentava pomposamente a toda a gente como “a minha melhor amiga”. Tenho saudades tuas, do teu espírito tão alegre e inconstante! Tu manter-te-ás para sempre adolescente e serás imortal na minha memória.

 

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– O que é que achas de mim, Lena? – perguntaste-me, um dia.

– O que acho de ti? Sei lá! O que é que queres que eu diga?

– Não. A sério. Diz lá! Podes ser sincera que eu não fico chateada. – insististe, pegando-me na mão. Olhei para a tua cara tão bonita e tentei decifrar o que é que tu querias ouvir. Talvez não fosse a melhor forma de agir, mas eu sabia que precisavas de ouvir qualquer coisa satisfatória.

Acho-te bonita, interessante, uma óptima amiga...sei lá! Tens inúmeras qualidades. – respondi-te, e os teus olhos brilharam.

– E os meus defeitos? Vá lá! Confessa que não tenho sido grande amiga...

– Tu és boa amiga... talvez andes um pouco afastada. Mas não faz mal. Temos amigos diferentes. – disse-te e tu apertaste a minha mão com mais força.

– Perdoa-me. Tenho medo de que te aborreças se te pedir que venhas ter com os meus amigos. Mas tenho um convite a fazer-te para te recompensar. – anunciaste, e finalmente compreendi o objectivo da conversa. Os teus pais nunca te deixariam ir a nenhum lado que eles não conhecessem a menos que eu também fosse. Pensei em dizer-te que não me apetecia meter-me em confusões, o que tu adoravas, mas, ao olhar para os teus olhos, perdi a coragem.

– A festa de anos do Rafael. – deduzi em voz alta. Riste-te, com aquele ar tão gaiato.

– Tens de vir! É a minha grande oportunidade! O Gabriel vai lá estar e eu quero ver se ele finalmente repara em mim. Além disso, o Rafael tem andado de olho em ti.

É claro que eu iria. E também é claro que o Rafael nem sabia quem eu era. Sorri-te e disse-te que sim. Tu abraçaste-me impulsivamente.

– És a minha melhor amiga. Nunca me afastarei. – Mas também tu me mentias.

Essa festa, essa inocente festa de anos, iria significar o princípio do fim. O teu fim, Guida, e o fim da minha inocência.

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