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EXPOSIÇÃO COLECTIVA 50 ANOS - 11 de Setembro a 10 de Outubro de 2021


         Afinal o que pensam do mundo os criadores?         

 

«Toute forme d´art se justifie
seulement quand elle
est nécessaire pour représenter
quelque chose qui
n´est pas représentable d´aucune
autre manière.»
Fiedler

“O que penso eu do mundo?
Sei lá o que penso do mundo!...”

... fragmento do poema “O Guardador de Rebanhos” de Álvaro de Campos

Gertrude Stein, poeta, amiga íntima de Pablo Picasso, que a imortalizou num celebre retrato, dizia do mestre: «Ele não vê a realidade como vê o resto do mundo, de modo que, entre os pintores, é o único que não tem problemas para exprimir a verdade que o mundo pode ver, mas tem-nos para exprimir as verdades que só ele pode ver, pois essas não são o mundo que o mundo reconhece como mundo.»

Salientamos aqui a visão da realidade interiorizada por Picasso, através das palavras de uma das suas amigas, mas poderíamos enunciar as ideias de outros criadores, ideias que orientaram os seus percursos na arte e que podemos ler nos seus manifestos, em análises pormenorizadas das suas obras, ou nas teorias que, a partir da segunda metade do séc. XIX e ao longo do século passado, foram sendo desenvolvidas por teóricos da imagem sobre as mais diversas formas de visão. É o caso de Konrad Fiedler ou, mais recentemente, de Renato Hildebrand, para citar duas personalidades afastadas no tempo e que, de sobremaneira, de tempos a tempos entre outros, me interessa revisitar.

Vem isto a propósito de uma pergunta que, há muito, venho fazendo a mim próprio e que a propósito desta mostra procurarei responder:

Afinal o que pensam do mundo os artistas do AveiroArte? O que reflectem as suas obras?

Tomando como amostra as obras representadas nesta Colectiva, comemorativa dos 50 Anos de existência do Círculo, que procura representar a práxis artística de um grupo tão heterogéneo, como o foi e cada vez mais é, o Círculo Experimental dos Artistas Plásticos de Aveiro, atrevo-me a afirmar que, do pensamento que rodeia os seus seus artistas o que sobressai é um certo voyeurismo que emana da maior parte das obras aqui expostas, sendo elas na grande maioria dos casos, um intenso acto de ver, uma procura intensa de diálogo para com o receptor comum, um diálogo que procura incentivar toda uma multitude de estímulos, que procura proporcionar os factores nos quais assentam as mais diversas formas de ver, a sua coerência produtiva, a sua linha de produção artística. Assim sendo, o que as suas obras refletem, é uma visão multifacetada de mundos sem anarquizar o espaço de criação que suporta uma ideia, sem defraudar essa mesma criação.

Como afirmou Di San Lazzaro, a propósito da obra de Paul Klee, «Cada pessoa encontra ali o que procura e ainda mais, pois essas obras têm o privilégio de despertar indefinidamente o que há de mais íntimo, mais necessário e mais ameaçado no homem: o sonho.»

É precisamente isso o que encontramos ao ver as propostas que integram esta mostra: o sonho.

O sonho é o traço comum entre elas e, sendo assim, é pelo sonho que estes artistas pensam o mundo.

O estado actual da arte, a sua natureza, caracteriza-se pela ruptura de barreiras entra as diversas formas de expressão artística, sendo a combinação das mesmas que torna legítima a aposta na variedade. Mostrar essa variedade, a pluralidade de tendências, de formas, de técnicas, tem sido o propósito deste Círculo que se mantém, “teimosamente activo“, ao longo destes 50 anos.

Estamos certos que, se a dinâmica imprimida ao longo de todo este tempo se mantiver no essencial, se a adaptação aos novos tempos for cada vez mais uma realidade, se a renovação geracional se fizer, o AveiroArte irá continuar a convocar sentimentos e emoções reagindo contra as imposições mais castradoras do conformismo social, contra o racionalismo do mundo contemporâneo, cada vez mais evidente, com a certeza de que é pela Arte que exprimimos o que somos, o que sentimos e o que queremos.

 Sérgio Azeredo | Presidente do Círculo Experimental

dos Artistas Plásticos de Aveiro – AveiroArte

Aveiro - 2021

 

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