Os
ventos cruzados nos ulmeiros
provocando torções descabelados
fogem-me dos dedos, em farrapos,
e eu
a querer afastar o horizonte
vendo-o em avanço desbragado,
absoluto, irracional, inconsequente;
sei
que a Terra continua a rodopiar
em
louca correria pelo cosmos
para
voltar ao ponto de partida
permitindo que, neste desembaraço,
o meu
tempo se esvaia sem remédio.
Vejo
formigas com a pragana
na
rotina certa do formigueiro
medindo o tempo do inverno
no
despacho da sua tarefa;
enxergo abelhas de patas encardidas
pejadas com pólen de urze e tília
a
dançarem no arraial da colmeia
no
receio dum outono precoce;
contemplo miríades de insetos
esquerdeados pela tóxica acidez
dum
mel adulterado em pote partido
com
odor a cigarro mal apagado.
Assim
encerra o ciclo deste tempo.
Entrementes cacofónica sinfonia
preenche com sons subliminares
o
espaço onde pernoita a peste
e
fomenta alucinações etéreas
em
cujas asas me vou despegar
assim
fugindo à acidez do tempo
não
excluindo alguma queda fatal
no
desamparo duma solidão
onde
mora o mantra dos avatares
convivendo com o nirvânico estado
que,
à revelia de todos os cânones
e
numa ocasional compaixão
talvez me livre neste meu Hades
do
castigo de Sísifo. Tão só.
Março de 2021 |